Capital, Trabalho e Tecnologia à luz da Doutrina Espírita

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            Vivemos em uma sociedade dominada pela concorrência e pela competição dos agentes econômicos, neste mundo contemporâneo a concorrência está dentro das organizações, das mentes e dos corações, afetando trabalhadores, empresas e governos, gerando um aumento da produção e um crescimento da tecnologia, trazendo impactos positivos e negativos.

Nesta sociedade do século XXI, o mundo se encontra envolto em inúmeras discussões, desde a degradação do Meio Ambiente, passando pelo incremento na violência e na exclusão social, até nas transformações do emprego e no mundo do trabalho. Todas estas mudanças estão sendo fortemente discutidas pelos organismos internacionais, com o objetivo de reduzir os conflitos e construir um ambiente mais equilibrado e saudável, dirimindo as desigualdades e vislumbrando uma sociedade mais consistente.

            Nesta sociedade contemporânea, percebemos que muitas das estruturas que sustentaram o mundo estão em franca transformação, as famílias se encontram em crise, as escolas também vivem momentos de instabilidades, a ciência passa por fases de contestação, as religiões que sempre se destacaram nas coletividades, estão sofrendo muitas críticas e rejeições, diante disso, para onde caminha a humanidade e como será as organizações sociais nas próximas décadas?

A Doutrina dos Espíritos nos mostra que vivemos um momento de transição, neste instante, muitos dos vícios e desequilíbrios deverão ser corrigidos para que o Planeta Terra caminha para se transformar em um mundo de regeneração, deixando para trás séculos de mundo de expiação e provas. Muitas destas mudanças sociais, econômicas, políticas e culturais em curso, deverão ser vistas como o momento preparatório para o nascimento de uma nova sociedade, onde muito dos vícios desta coletividade serão retirados ou diminuídos de forma acelerada, tudo dependerá das opções e dos trabalhos dos seres humanos.

Na estrutura econômica dos países estamos percebendo grandes transformações que estão criando grandes instabilidades em todas as áreas e setores, o aumento do desemprego e a exclusão social em crescente são mostras claras das dificuldades que estamos vivenciando e temos condições de pensar e repensar estas questões sob pena de deixarmos uma lacuna entre os seres humanos, uns vivendo envolto em tecnologias e produtos de alto luxo e requinte, enquanto outros grupos rastejam em situações deprimentes e degradantes, mesmo sabendo que as riquezas do mundo são suficientes para satisfazer as necessidades mínimas de cada um dos cidadãos encarnados no planeta Terra.

Como nos mostra o espírito Vianna de Carvalho, na obra Atualidades Espíritas:

“A Terra tem condições para manter quase cinco vezes mais o número de seus atuais habitantes, já que nas esferas espirituais estão programadas para a reencarnação mais de 20 bilhões de seres, que aguardam o momento próprio”.

Com o avanço científica e tecnológico, a estrutura produtiva está capacitada para produzir mercadorias, bens e serviços para alimentar e satisfazer as necessidades materiais de todos os cidadãos, mesmo sabendo do potencial produtivo das economias, encontramos uma grande quantidade de pessoas vivendo em condições de indignidade, alguns especialistas falam em algo em torno de 750 milhões de pessoas nesta condição. Esta discrepância de renda e de recursos para a sobrevivência é obra dos seres humanos, de suas ambições materiais e de sua busca compulsória por recursos financeiros e monetários, enquanto não nos conscientizarmos da importância de garantir para todos os indivíduos recursos mínimos para a sobrevivência, não vamos conseguir ter a mente e a consciência tranquila nos momentos de descanso, mesmo não admitindo intimamente, as dores assolam todos aqueles que enxergam nos outros muito mais do que uma pessoa em sofrimento, mas um irmão em desequilíbrio e que necessita de ajuda de toda a sociedade.

Nesta nova sociedade o mundo corporativo ganhou grande relevância no imaginário coletivo, este mundo afeta as relações sociais e as formas de pensamento, transformando todas estas relações em espaços competitivos e dominados por metas e produtividade, mesmo questões de difícil quantificação, estão sendo colocadas nas planilhas dos gestores, em busca de algoritmos ou aplicativos que consigam quantificar sentimentos e emoções. O grande problema deste capitalismo selvagem que vivenciamos na atualidade é que ele está dominado pelos interesses materialistas e imediatistas, deixando de lado questões imateriais e invisíveis, levando os indivíduos a mergulharem no trabalho e nas atividades cotidianas e, diante disso, adoecem com fortes dores na alma e transtornos emocionais.

O pensamento espírita apoia e estimula a ciência, o conhecimento e a reflexão crítica, suas bases estão assentadas em valores que perpassam a religião, a filosofia e a ciência, nos trazendo conhecimentos e instrumentos de compreensão das raízes da vida e da vivência em comunidade, nascemos juntos para que consigamos evoluir juntos, ninguém se desenvolve de forma isolada, ninguém cresce espiritualmente se refugiando em castelos cercados de milicianos ou de religiosos cantando músicas esquisitas e dedilhando versos apaixonados. O Espiritismo nos mostra de forma clara e direta, que somos seres em constante evolução, vivemos uma única vida em diversas e múltiplas existências corporais, alternando momentos na matéria e momentos no mundo imaterial, objetivando uma melhora constante e um crescimento do espírito, visando nos tornarmos espíritos puros.

Nesta sociedade, percebemos que a tecnologia está gerando ganhos e perdas, como quase tudo na vida, os ganhos devem ser potencializados e estimulados, enquanto as perdas devem ser revertidas. Na relação entre trabalhadores e capitalistas, devemos inaugurar uma nova sociedade, marcada muito mais pela cooperação do que pela competição, estes atores devem trabalhar de forma integrada visando uma melhoria para todos os agentes produtivos.

O consumo é importante para a sobrevivência dos seres humanos, adquirir alimentos, vestuários e outros produtos para sua sobrevivência material é imprescindível agora, não se pode admitir o uso do consumo desordenado e irresponsável, que atua diretamente para criar ilusões nos indivíduos para que estes comprem em demasia, mesmo sabendo que estas aquisições são exageradas e desnecessárias.

A relação entre capital e trabalho deve ser reconstruída, a tecnologia deve ser introduzida para dirimir os excessos e os desperdícios, sempre atuando para melhorar as relações sociais, deixando de lado as desavenças e lembrando que quando os indivíduos acumulam contendas no mundo material e partem para o mundo dos espíritos com rixas e desentendimentos, estes irmãos terão grandes dificuldades para seguir caminhos equilibrados, levando em seus corações rancores e ressentimentos acumulados em questões anteriores.

Rancores e ressentimentos acumulados nesta vida são levados para o mundo espiritual, assim como o amor cria vínculos positivos entre os indivíduos, as mágoas e o ódio geram vínculos negativos, prendendo estes indivíduos em uma teia de vinganças e perseguições constantes, onde um atrapalha o outro, ri da desgraça alheia e não percebe que ambos estão nas mesmas condições, são irmãos em desequilíbrios dominados por dores e desesperanças.

Nesta sociedade, dominada pela tecnologia e pela concorrência, os responsáveis pela organização das instituições devem se conscientizar da importância da cooperação, a entrada excessiva da tecnologia vai gerar desemprego e desesperança, diante disso, cabe aos donos do poder olharem para seus pares e criarem instrumentos de inserção e sobrevivência digna para todos, o que vai adiantar termos uma economia pujante e ganhos monetários elevados, se uma pequena parte da coletividade acessa estes bens e recursos, uma grande maioria vive na marginalidade, sem proteção e sem perspectivas. Neste ambiente, a instabilidade será a tônica reinante e os medos estarão em todos os lugares, uns chorarão de fome e de indignidade, enquanto outros chorarão de medo de serem vitimados por assaltos e violências generalizadas, ou seja, todos sofrem.

Esta discrepância não se limitará ao mundo atual, num momento próximo estes contendores se encontrarão no mundo espiritual, depois da morte física todos estarão lado a lado para seus julgamentos íntimos, neste momento as injustiças não mais acontecerão e a vitimização não mais poderá ser utilizada como uma justificativa dos malfeitos anteriores. Muitas inimizades perduram por séculos, criando mágoas e ressentimentos dos mais atrozes possíveis, a doutrina espírita nos mostra a importância da reconciliação, se as pessoas tivessem a consciência dos males que podem evitar com o perdão e a reconciliação, com certeza, muitos deles abandonariam a agressividade e as desavenças em prol de sua saúde emocional e espiritual.

O capital tem um papel social dos mais nobres, o dinheiro auxilia na construção de casas, protegendo as famílias do frio e da insegurança, auxilia na construção de hospitais que acolhem os enfermos, ajudam na construção de escolas e universidades que mostram as noções básicas do mundo científico e completam a educação introduzida pela família, sem dinheiro, muitos dos benefícios não seriam materializados para os indivíduos. O grande problema do dinheiro está na forma como os indivíduos os utilizam, quando o utilizamos de forma correta e dignificante ele nos auxilia e ajuda a coletividade, agora quando não o utilizamos da forma correta ele nos prende e nos transforma em seus escravos, com isso, esquecemos o papel social e nos deleitamos com os prazeres materiais, gerando vaidade e nos afastando dos bons espíritos e dos bons pensamentos.

A visão espírita sobre o dinheiro e o capital destaca a importância destes para o progresso social, mas destaca que estes recursos devem circular a fazer com que todos os indivíduos tenham condições de sobreviver de forma digna e decente, quando o capital se concentra nas mãos de poucos, percebemos os desequilíbrios tomando conta da sociedade, a melhor forma de gerenciar os recursos é entendendo que somos todos irmãos e devemos olhar uns para os outros, pois neste momento podemos estar em uma posição positiva e de destaque na sociedade, gozando as benesses do dinheiro e do poder por ele conquistados mas, num outro momento ou numa outra encarnação, pode ser que acordemos no outro lado, carente de recursos e de assistência, necessitando da caridade daqueles que numa outra oportunidade pode ter sido os pobres e degradados.

Apesar de percebermos a importância do capital e da tecnologia na sociedade contemporânea, é importante não esquecer as palavras sábias do Dr. Inácio Ferreira, contidas na obra A escada de Jacó, quando perguntado sobre o conflito, em curso na época, no Iraque, “…gastam se milhões de dólares na construção de um único míssil, mas não investem a mesma soma em obras sociais que favoreçam os que vivem na miséria. Por essa razão, a guerra está apenas se deflagrando… Espera-se por uma catástrofe de maiores dimensões”.

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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