Considerações espíritas sobre o obsidiado: vítima ou algoz?

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A Doutrina Espírita nos foi trazida ao mundo pelos espíritos por intermédio do intelectual francês Allan Kardec, com estas revelações a sociedade mundial tomou contato com uma nova realidade, neste momento se descortina o mundo espiritual, nos mostrando que estagiamos no mundo material, mas a verdadeira vida se dá no mundo espiritual, estas descobertas de caráter revolucionário geraram constrangimentos para muitos e esclarecimentos para outros, as novidades assustavam e geravam preocupações para todos os indivíduos.

O espiritismo nos mostrou casos chocantes de obsessão e de possessão, mostrando ao mundo uma realidade nova e muito mais complexa, os obsessores eram vistos como espíritos maldosos e violentos pela sociedade da época, que escolhiam as suas vítimas aleatoriamente e se compraziam das dores destes obsidiados, vítimas de espíritos atrasados e dotados de sentimentos inferiores, esta visão se mostrou limitada com as ideias e os pensamentos inaugurados pelo movimento espírita, nesta doutrina se descobriu que, no mundo, não existem vilões e nem mocinhos, personagens dos contos de fadas infantis, embora muitos irmãos sofredores se dizem esquecidos e vítimas de perseguições, se colocando como vítimas da maldade alheia, não existem vítimas, somos todos algozes.

Numa conversa com algumas pessoas que vivem momentos de obsessão, a grande maioria se diz vítima de espíritos cruéis, irmãos agressivos que os querem ver mortos e enterrados, para conseguir seu intento, usam de todos os instrumentos de controle e de dominação, levando muitos irmãos ao suicídio, alguns levam os obsidiados a se agredirem fisicamente , com variadas formas de mutilação, além de estimular doenças e comportamentos agressivos, agredindo e maltratando suas vítimas, seus familiares e amigos ou pessoas próximas que queiram auxiliar, enxergando nestas atitudes uma forma de se vingar de desequilíbrios e agressividades de outras encarnações.

Neste ambiente de vinganças e de agressividades entre desencarnados e encarnados, percebemos um laço forte entre estes irmãos, muitos se manifestam nas seções mediúnicas e bradam destruição e constrangimentos aos seus perseguidos, falam alto e tentam intimidar os doutrinadores, querendo mostrar poder e controle da situação, usam termos mais agressivos e, em muitos casos, palavras e expressões deselegantes.

Os espíritos obsidiados não devem ser vistos como vítimas, não existem vítimas, se neste momento estão sendo obsidiados, e Deus autoriza todo este processo, é porque em algum momento cometeram equívocos que justificam esta situação, a justificativa para estas perseguições, muitas vezes, não pode ser encontrada nesta vida atual, mas em outras encarnações, quando em convivência com o atual obsessor cometeu algum abuso que gerou este ressentimento que ora está sendo cobrado de forma veemente, gerando graves constrangimentos e criando laços de rancor que podem perdurar por muitos séculos, tendo casos de obsessão que duram mais de trezentos ou quatrocentos anos, período longo marcado por dores, rancores e intensos ressentimentos.

Joana de Angelis nos mostra que, para o obsidiado, a obsessão é uma prisão interior, uma cela pessoal, onde a grande maioria das pessoas se mantém sem lutar por libertação, acomodada aos vícios, centralizada nos erros. O Espiritismo veio para nos auxiliar a sair desta cela que impomos a nós mesmos, por ignorância e pelas dificuldades que temos de encarar de frente nossas dificuldades e limitações, com seus ensinamentos que consolam, mas, sobretudo, nos libertam e nos auxilia em nosso crescimento moral e espiritual.

A Doutrina Espírita nos mostra que a nossa vida não se restringe a atual vida, somos espíritos imortais e estagiamos no mundo físico a mais de 40 mil anos, como nos mostrou André Luiz, em Nosso Lar, desde então, estamos sujeitos a um processo contínuo de experiências físicas e, com estas, crescemos e evoluímos até nos tornarmos espíritos puros, estas andanças são complexas, mas nos levam a uma visível melhora individual e a uma sociedade mais consistente e renovada.

A obsessão deve ser compreendida como alguma influenciação que os encarnados sofrem dos irmãos que passaram para o mundo espiritual, os desencarnados, num estágio mais elevado o obsessor passa a controlar, de forma tão precisa e violenta que o obsidiado passa a se comportar da forma que o obsessor deseja, levando-o a fazer escolher e definir estratégias, o controle total do obsessor pode levar o obsidiado ao suicídio, neste momento percebemos que de uma simples obsessão, a situação passou para um caso de possessão.

Todos nós fomos ou ainda somos obsidiados, é importante destacarmos esta questão de forma clara e direta, estamos todos obsidiados ou sujeitos a sermos obsidiados e, como nos mostrou Suely Caldas Schubert, no livro Obsessão e Desobsessão: “Desde que não conseguimos a nossa liberdade, desde que ainda não temos a nossa carta de alforria para a eternidade, desde que caminhamos sob o guante de pesadas aflições que nos falam de um passado culposo e que ressumam sombras ao nosso redor… é porque, em realidade, ainda somos prisioneiros de nós mesmos, tendo como carcereiros aqueles a quem devemos”.

O obsidiado deve ser visto como um companheiro de vidas anteriores, muitos deles atuaram em falcatruas ou em trambiques visando lucros fáceis e recursos amoedados, são espíritos bastante próximos, muitos casos nos mostram claramente sentimentos fortes de amor e de admiração, encobertos pelo ressentimento e pela dominação do rancor, das mágoas e da vingança.

Todos estes sentimentos foram construídos ao longo do tempo, muitas parcerias foram consolidadas em experiências anteriores, muitos acordos foram rompidos e muitos prejuízos materiais foram efetivados, gerando uma perseguição intensa e um sentimento forte de revanchismo, levando estes irmãos inconscientes a uma dura realidade da vida, com dores, mágoas e lágrimas escorrendo de seus corpos físico e espiritual.

Muitos desencontros são gerados nos relacionamentos amorosos, muitas conquistas levam a dores, mágoas e ressentimentos, promessas descumpridas, casamentos desfeitos, namoros arruinados e corações partidos, sentimentos antes próximos dos amores terrestres são transformados em agressividades e violências mundanas que muitos irmãos levam por séculos e séculos cravadas no íntimo, são dores que incomodam severamente os corações incautos, que se entregam ao rancor e, com isso, evitam uma reflexão mais íntima e sincera das suas dificuldades emocionais e espirituais.

O obsidiado deve ser visto como um irmão que precisa de auxílio, e mais, deve ser compreendido como uma pessoa que está nos auxiliando muito mais do que imaginamos, afinal, todos os desequilíbrios que este irmão nos mostra são desajustes que temos e que cultivamos, muitos deles durante muitos anos e, até mesmo, séculos. Quando recebemos estes irmãos, mesmo sabendo que eles momentaneamente querem o nosso mal, temos a oportunidade de refletir sobre a nossa conduta ou os nossos comportamentos e hábitos, isto porque, quando nos visita, busca na nossa intimidade situações que precisamos evoluir, sem esta transformação não conseguiremos nos melhorar e galgar novos espaços, mais sólidos e consistentes, nesta nova experiência no mundo material.

No livro Nosso Lar, André Luiz nos mostra uma situação familiar que ilustra de forma precisa esta questão, num determinado momento sua mãe, um espírito de grande desprendimento e evolução espiritual se compromete a reencarnar e, novamente, contrair núpcias com seu pai, mesmo sabendo que este acumulou inúmeros casos e relacionamentos extraconjugais e dentre eles, manteve durante alguns anos duas mulheres que, ao desencarnar o perseguiam obsessivamente, lhe causando graves desequilíbrios emocionais e a permanência em regiões nebulosas por muitos anos, mesmo sabendo de tudo isto, sua mãe aceitou receber estas irmãs como suas filhas numa próxima encarnação, doando seu ventre para que estas nascessem e seus sentimentos para que estas irmãs crescessem e se desenvolvessem, um belo exemplo de evolução, desprendimento e abnegação.

A nossa reflexão íntima nos ajuda a compreender aonde este irmão, ora obsessor, está atuando, uns atuam na sexualidade e nos desejos sexuais, outros se concentram nas questões financeiras e monetárias, outros ainda se comprazem em desequilibrar nossos relacionamentos, incentivando o uso de drogas e o consumo excessivo de bebidas, além de ver outros obsessores buscando desequilibrar as questões profissionais e de saúde. Somos seres em constante evolução e apresentamos desequilíbrios em algumas destas áreas, normalmente em muitas delas, uns são mais propensos a desajustes numa das áreas, enquanto outros apresentam desequilíbrios em outras, mas todos apresentamos estas fragilidades e precisamos vencer tais desequilíbrios, sob pena de nos vermos envoltos em processos obsessivos severos e violentos, com grandes traumas e comprometimentos.

Estas dificuldades todos os indivíduos trazemos transcritos em nossa períspirito, estão inscritas desde muitas encarnações, em alguns momentos evoluímos em uma das áreas e deixamos outras de lado, a evolução, diante disso, demanda tempo, perseverança e muitos esforços, lutar contra nossas dificuldades nos auxilia a encontrar um progresso mais próximo e mais consistente.

Somos os nossos maiores obsessores, estamos constantemente cultivando pensamentos negativos e inferiores, agindo de forma diferente dos valores que aprendemos em nossas experiências cotidianas, somos os nossos maiores algozes e estamos, constantemente, culpando aqueles que momentaneamente querem o nosso mal, precisamos evoluir para que tenhamos maturidade para encarar as realidades da vida de frente, sem esta maturidade emocional e espiritual vamos continuar repisando nossos problemas, criando traumas, angariando inimigos e levando-os para as próximas existências.

Amores mundanos e conquistas centradas em promessas e constrangimentos, podem levar sentimentos sólidos a se transformar em rancores e ressentimentos agressivos, obsessores se julgam vítimas de relacionamentos frustrados e de conquistas vis, prometem vingança e desperdiçam muitos anos ou décadas de suas vidas com perseguição, muitos destes casos são amores mal resolvidos e sentimentos ainda latentes, que unem dois irmãos que conseguiram transformar sentimentos nobres em agressividades, esta obsessão pode levar ambos a desequilíbrios generalizados e até, em casos extremos, a possessão, situação onde o obsessor controla o obsidiado por completo, comandando seus pensamentos, sentimentos, comportamentos e suas atitudes.

Muitas vezes prometemos casamento, relacionamentos sérios ou compromissos futuros para um irmão ou irmã desequilibrados, sabemos que não vamos efetivar esta promessa mas, mesmo assim, a utilizamos para angariar benefícios físicos, financeiros ou sexuais, esta promessa gera uma proximidade entre os dois indivíduos, com o encerramento do relacionamento um destes irmãos não se conforma e passa a perseguir seu eterno amante, em muitos casos vira uma verdadeira paranoia, esta perseguição começa no mundo material e, muitas vezes, continua durante muitos séculos no mundo dos espíritos, gerando dores, mágoas e tentativas variadas de vingança.

Muitos abortos feitos por pessoas imaturas e inconsequentes podem gerar graves processos obsessivos, obsessões agressivas e violentas, se o indivíduo abortado se sentir inferiorizado e, com isso, acumular sentimentos de vingança e ressentimento, a perseguição pode se transformar em um instrumento concreto de destruição, gerando rancores e ressentimentos que podem perdurar por anos, décadas e até séculos, acumulando dores, lágrimas e ranger de dentes que poderiam ser, facilmente, evitados através do perdão verdadeiro.

A Doutrina Espírita nos mostra que somos responsáveis por todos aqueles que cativamos e conquistamos, se nos aproveitarmos de alguém seremos condenados a ressarcir este irmão, todas as promessas que fazemos devem ser efetivadas e quando as fazemos com interesses duvidosos teremos que arcar com as consequências de nossos atos, muitos enxergam isto como uma punição, mas devemos ver não como uma punição de Deus, mas, como um processo de educação do espírito imortal.

A transformação moral, a vivência no bem, a opção pela oração constante, o cultivo dos reais valores da vida aos poucos anulará os condicionamentos para a dor, favorecendo a harmonização interior, que é, sem dúvida, fator de melhor saúde física e espiritual. A Doutrina dos Espíritos nos auxilia para que possamos amenizar as nossas dores mais íntimas, não só pela compreensão de suas causas, mas também por intermédio de todo bem que possamos fazer, diante disso e, com estes esclarecimentos, mais fácil se torna para o ser humano a caminhada, mesmo sabendo que a estrada é esburacada, a certeza da presente de Deus em nossos corações nos dá o alento necessário para alcançar nossa evolução e nosso progresso, transformando a caminha em luzes para nossa evolução moral e espiritual.

 

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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