Considerações sobre a eleição

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Em época de eleição, nos vemos inundados pelos mais exóticos candidatos a cargos eletivos, desde as figuras de sempre do jogo político, que vivem e fazem da política um meio de vida e forma de sobrevivência, até os mais engraçados, pitorescos e aproveitadores, que veem na eleição uma forma de aparecer e, quem sabe, conquistar o direito de ocupar um cargo público e, com isso, começar a usufruir das benesses do Estado brasileiro, muitas vezes sem nenhum compromisso com a ética e com a moral, apenas se preocupando com seus interesses particulares, mesquinhos e imediatos.

Na situação atual que vivemos, onde encontramos um país marcado por variados conflitos, ao vermos o discurso oficial, o que percebemos é um país em ótimo momento, inflação controlada, investimento em alta, desemprego em baixa e perspectivas positivas para o futuro, mas, na verdade, este é o quadro atual em que vivemos na atualidade? A inflação se encontra no teto da meta, controlada pela mão forte do Estado sobre setores centrais da sociedade, tais como energia e combustíveis, os investimentos estão em queda e os investidores acusam o governo de intervencionismo excessivo, o desemprego embora baixo sinaliza reversão e as perspectivas futuras não são muito positivas, os dados recentes divulgados pelo IBGE, queda de 0,6% do produto interno bruto no segundo semestre, mostram uma situação decepcionante.

Conversando com alunos, professores e pessoas comuns, o que encontro é uma verdadeira ojeriza com relação ao governo atual, críticas sistemáticas e agressivas, para não dizer mal educadas com relação à presidenta da República, no meu ver exagerada e excessiva, culpando-a por todos os desajustes existentes na atualidade, mais que exagero é uma mostra clara do pouco conhecimento que a população tem dos problemas nacionais.

Embora alguns problemas devam ser atribuídos ao seu governo, muitos deles estão relacionados a desafios históricos do país e perpassam os mais variados governos, sendo um problema nacional e que, a meu ver, não podem ser debitados na conta deste governo ou, pelo menos, não podem ser debitados completamente nas costas do governo atual.

A construção de uma terceira via se faz necessário, o dualismo PT X PSDB já cansou a sociedade, uma disputa infantil e grosseira que, nos últimos 12 anos, vem minando a lógica política e criando um verdadeiro Fla X Flu eleitoral, onde um rejeita os feitos do outro, agindo sempre como irmãos siameses que se odeiam mas que não conseguem viver um sem o outro, condenados como um castigo divino a conviverem grudados.

Ao analisar o país nos últimos vinte anos, enxergamos uma sociedade marcada por grandes avanços, desde a estabilização dos anos 90, protagonizadas pelo governo tucano de FHC, até as melhorias nos indicadores sociais do início do século, capitaneadas pelos petistas, ambas motivadas por políticos que deixaram sua marca na sociedade brasileira e serão lembrados nos anais da história brasileira como responsáveis por avanços notáveis na sociedade.

Este dualismo foi alimentado pelos dois lados nos últimos anos mas, principalmente pelo presidente Lula, que cunhou e difundiu a frase, nunca na história deste país, onde um partido se apropria dos feitos do outro, alterando nomes de programas e investindo maciçamente em propaganda, escondendo da sociedade que o mais importante para o país são os resultados destas políticas, se exitosas e meritórias devem ser seguidas, mantidas e aperfeiçoadas, mas sempre sabendo reconhecer os feitos e iniciativas de governos anteriores que, mesmo cometendo equívocos, foram os pioneiros na adoção de alguma destas políticas.

O dualismo PT X PSDB acabou contribuindo para minar a credibilidade da política brasileira, quem ouve a presidente da República fazendo discurso nos palanques da vida, se assusta, pois, de cada dez palavras, no mínimo duas fazem menção destrutiva ao governo tucano dos anos 90, esquecendo muito dos avanços obtidos neste período, avanços estes que possibilitaram outras melhoras obtidas na gestão petista, tais como a redução da inflação e o embrião das políticas sociais, tais como o Programa Bolsa Escola, embrião do atual Bolsa Família, lembrando, que a política social do Partido dos Trabalhadores (PT) era o Programa Fome Zero, que não empolgou nem mesmo os militantes do partido e foi substituído pelo atual programa.

Uma questão importante que precisamos discutir com mais atenção, é com relação aos avanços sociais obtidos pelo país nos últimos anos, todos percebemos uma melhora considerável na redução da pobreza, dados recentes divulgados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) nos auxiliam nesta reflexão, pela pesquisa, neste século, 56 milhões de pessoas em todo o subcontinente foram retiradas da pobreza, onde Peru e Bolívia apresentaram os melhores e mais consistentes resultados.

No caso do Brasil, a pobreza foi reduzida de 43,1% da população em 2000, para 24,5% em 2012, estes dados são bastante animadores e motivo de grande comemoração, agora, o mais importante, é que estas pessoas saíram da pobreza e não foram alçadas diretamente para a tão sonhada classe média, infelizmente, sua nova denominação descrita na pesquisa é de vulneráveis, um conjunto de pessoas que podem ver sua situação evoluir para a classe média ou perceber sua situação retornando para a pobreza, tudo depende do crescimento da economia e o surgimento de novas oportunidades, são estes os responsáveis pelos pedidos de mudança que encontramos na atualidade, o baixo crescimento ameaça fortemente os avanços obtidos anteriormente.

O Brasil merece mais, depois de anos de melhorias, faz se necessário, voltarmos a crescer e melhorar nossa inserção internacional, em um mundo globalizado é fundamental a construção de uma sociedade mais homogênea, mais coesa e com uma desigualdade cadente, todos seremos beneficiados por esta nova sociedade, onde a classe política será cobrada fortemente e os avanços serão comemorados como fazemos quando a seleção brasileira consegue fazer um gol e ganha um jogo de copa do mundo.

Neste ambiente de incertezas, uma terceira via se faz necessário, quem sabe um novo candidato, num primeiro momento Eduardo Campos representou este novo, mas os infortúnios da vida fizeram com que a morte o levasse prematuramente, embaralhando a política e trazendo novos contornos para o mês de outubro, resta esperar para ver, será que diante de tantos desastres naturais da política brasileira, um novo desastre abra novas perspectivas para o país na pessoa da candidata do PSB Marina Silva? Acho difícil, mas nada é impossível neste mundo complexo e cheio de incertezas e instabilidades.

Só o tempo poderá nos mostrar o novo rumo da sociedade brasileira lembrando que, o mais importante nesta transformação é que cada cidadão assuma seu papel nesta sociedade para afugentar os fantasmas que insistem em comprometer nosso futuro e nos condenar a uma perspectiva de stop in go, onde os retrocessos são sempre maiores que os avanços, pelo menos quando nos referirmos ao mundo da política e do poder, as perspectivas para o futuro são inquietantes e preocupantes, mas como Deus é brasileiro, há sempre motivos para termos esperança num futuro melhor.

 

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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