Desemprego, desestruturação econômica e concentração de renda

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Recentemente a Organização Não Governamental Oxfam divulgou um relatório destacando que os bilionários brasileiros tiveram um incremento de suas fortunas em US$ 34 bilhões, com isso, a pandemia nos mostra como a sociedade brasileira se chegou a uma situação de extrema desigualdade e exclusão social, onde metade da população está recebendo o auxílio emergencial do governo federal, que garantiu R$600 reais para aqueles que sofreram os impactos negativos da pandemia, sem este auxílio muitos indivíduos teriam grandes dificuldades de sobrevivência e seus constrangimentos sociais seriam mais acentuados, gerando mais degradação social, mais incremento na violência urbana e desesperanças generalizadas, vivemos num momento temerário de medos e instabilidades crescentes.

A pandemia está gerando grandes dificuldades na sociedade mundial, as quedas econômicas se espalharam em todas as regiões, nos Estados Unidos a queda de 32% do PIB foi histórica, as quedas na Europa foram na casa ultrapassou os 10%, com isso, o  covid-19 acentuou as dificuldades econômica global, levando os países a uma recessão, um incremento no desemprego, aumento nas dívidas públicas, endividamento das empresas privadas, falências generalizadas e dificuldades políticas, levando a impactos preocupantes.

O CEO e criador da Amazon, Jeff Bezos, bilionário norte-americano registrou no mês passado o maior aumento de riqueza que um indivíduo já viu na Terra em apenas um dia, sua fortuna cresceu US$ 13 bilhões, se continuar assim, ele se tornará o primeiro trilionário do mundo em 2026, um recorde histórico e ainda mais, quando percebemos que o capitalismo contemporâneo está gerando um exército global de pobres, miseráveis e desigualdades crescentes em todas as regiões, desde os países ricos até nos países pobres.

No caso brasileiro, percebemos os impactos econômicos são violentos e assustadores, exigindo uma união de todos os entes federados, desde o governo federal, os governos estaduais e os entes municipais, sem esta união, a reconstrução trará mais instabilidades e incertezas, com repercussões sobre o emprego, gerando mais desemprego e subemprego, com isso, percebemos desajustes na arrecadação de impostos e pressões sobre os gastos públicos, como forma de reduzir os problemas sociais para toda a coletividade.

O crescimento do desemprego pode ser visto como um dos maiores desafios da sociedade contemporânea, no caso brasileiro, percebemos que o desemprego cresce de forma acelerada desde 2016, com poucas ações ativas e estruturadas para reverter este ambiente, muitos acreditam que o espírito empreendedor deve ser o instrumento mais efetivo para retirar a economia nesta situação, mas num ambiente marcado por grandes limitações estruturais e conjunturais, a reversão deste desemprego se mostra muito lento e pouco efetivo.

A crise do covid-19 deve levar a maior queda do padrão do poder de renda do país desde a década de 1940, quando começou a série histórica acompanhada pelo IBGE. Segundo os dados do instituto, neste ano a queda esperada será de 6,7% do produto interno bruto, com isso, percebemos que mais da metade dos brasileiros perceberam que está em uma situação pior do que antes da pandemia, até então, o maior recuo havia em 1981, nesta pandemia estamos percebendo que o governo está conseguindo fazer história.

Segundo os levantamentos da Conferência Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), de 2011 a 2020, o PIB per capita deve recuar 8,2% ante uma alta de 28% na década anterior, marcado pelo boom dos preços dos commodities, como a soja e o petróleo, que impulsionaram o crescimento econômico do país, aumentando a inclusão social e um incremento de políticas públicas que transformaram a sociedade brasileira.

Outro dado relevante divulgado pelo Instituto Locomotiva, a pedido do jornal O Estado de São Paulo, mais de 54% dos brasileiros afirmaram que o padrão de vida piorou, seis em cada dez deles estimam que vão levar mais de um ano para reconquistar o que tinham. Outros dados divulgados nestes dias nos levam a grandes instabilidades e incertezas, os planos de saúde perderam mais de 285 mil clientes, ficando com 46,8 milhões de usuários, segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), dados preocupantes, estas pessoas migram diretamente para o Sistema Único de Saúde (SUS), impactando diretamente sobre os gastos de saúde e piorando os serviços, num momento de pandemia, crescimento de infectados e desesperanças.

O setor da educação, percebemos um incremento na inadimplência em todas as instituições privadas, aumentando o desligamento de professores e profissionais ligado ao ensino, desde as escolas infantis, do ensino médio e superior. Nas escolas da cidade de São Paulo, segundo os dados do Sindicatos dos Estabelecimentos de Ensino do Estado de São Paulo (Seeesp), percebemos um aumento na inadimplência era de 32,1%, impacto direto no aumento do desemprego e da redução de salários dos pais, levando seus filhos a matricular-se em escolas públicas, sabidamente mais atrasados das escolas privadas, fragilizando a formação de seus filhos e reduzindo as chances do mercado de trabalho, marcados por um ambiente mais competitivo e centrado na tecnologia, no conhecimento e no desenvolvimento científico.

O desemprego é um verdadeiro flagelo para a sociedade, são recursos produtivos que estão sendo inutilizados, pessoas que perdem suas dignidades, sem empregos formais, sem direitos decentes os indivíduos são obrigados a se sujeitarem a péssimas condições de vida, sobrevivendo a custas de migalhas e perpetuando uma condição de indignidade, sem oportunidades e desesperanças. Em pleno século XXI, um país como o Brasil, extremamente rico e dotado de riquezas variadas, esta condição de desemprego e de subemprego impede o indivíduo a viver uma cidadania ativa, sem direitos mínimos. Neste ambiente, a pandemia nos mostra claramente como estamos cultivando um genocídio com nossa população, uma ferida que cresce de forma acelerada e cujos impactos seriam sentidos nos próximos anos e todos somos responsáveis por este morticínio.

Uma discussão sobre a questão do desemprego no Brasil nos leva a perceber claramente o fosso social que existe entre os diferentes tipos de empregos e da rentabilidade do setor público. Como destaca Marcos Mendes analisando dados de 2013, percebemos que o Judiciário brasileiro é o que mais gastam no mundo: US$ 130 por habitante, contra US$ 35 no Chile, US$ 19 na Argentina e US$ 16 na Colômbia. O poder é tão flagrante no caso judiciário brasileiro, que os advogados do setor público, detentores de estabilidade e de salários elevados e garantidos, conseguiram, através da Lei 13.327/2016, estendeu as práticas dos “honorários de sucumbências”, mais um privilégio que garantiu mais de R$ 550 milhões em 2019, com isso, percebemos castas dotadas de grandes salários, uma pequena parte do funcionário público federal ganha remunerações absurdas em detrimento de uma grande parte dos trabalhadores, que ganham salários reduzidos e arrochados, desta forma fica claro a distância entre as remunerações no funcionários do judiciário e do Legislativo e dos outros setores da União.

As políticas desenvolvidas pelo governo federal em prol do emprego são tímidas e limitadas, concentrando seus argumentos nas dificuldades do setor público nacional, com isso, reduz os investimentos públicos e limita os gastos em obras, infraestrutura e novas políticas públicas, principalmente neste momento de pandemia, adotando uma austeridade que dura muitos anos, matando os grupos mais fragilizados da sociedade, aumentando o contingente de trabalhadores desempregados, crescendo o subemprego e a informalidade, com números elevados de excluídos, sem planejamento econômico e sem perspectivas de combate a desigualdade crescente na sociedade brasileira.

Neste ambiente de pandemia, crises sanitárias, recessão econômica e crescimento da desigualdade social, faz-se necessário uma política de investimentos públicos nas mais variadas áreas e setores da sociedade, sem estes investimentos liderados e capitaneados pelo governo federal e em concomitância com os governos estaduais e municipais, e das empresas estatais, marcados por planejamento público, com ampla atuação dos bancos públicos, não apenas na Caixa Econômica Federal, mas também direcionado e fomentado pelo Banco Nacional Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), instituição fundamental e imprescindível para fomentar os investimentos governamentais e na construção de um ambiente de cenários positivos nos anos vindouros. O Banco do Brasil também tem um papel central e fundamental, sua capacidade de investimentos na sociedade nacional, auxiliando setores dinâmicos como o agronegócio são imprescindíveis, além de impulsos nos setores da classe média, atolada em dívidas e carentes de recursos novos para gastos importantes para movimentar os setores produtivos, atuando nas empresas micros, pequenas e médias, responsáveis por mais de 90% dos empregos na sociedade nacional.

Uma política ambiciosa deve constar os investimentos nas áreas educacionais, novos créditos para as faculdades e universidades, além de escolas do ensino médio e fundamental, setores que passam por grande insolvência, sem créditos e sem perspectivas, cujos recursos não estão chegando, levando muitos empresas educacionais a bancarrota, matando um setor importante para o desenvolvimento da sociedade nacional, responsáveis por empregos qualificados, altamente qualificados e de mão-de-obra marcados pela criatividade e pela flexibilidade, palavras centrais para um momento caracterizado pela Quarta Revolução Industrial.

Desde os escritos de John Maynard Keynes, o mundo passou a conhecer novos instrumentos de recuperação econômica, naquela época os manuais tinham dificuldades na geração de novos empregos para o soerguimento da economia. Com o economista inglês e seus escritos, o mundo percebeu a importância dos investimentos públicos para alavancar a economia nacional, neste instante, percebemos que não vamos conseguir retirar a economia deste imbróglio sem os gastos públicos, as obras infraestruturas, nos empréstimos para os setores produtivos e estímulos para os grupos nacionais necessitados e carentes de recursos monetários. O ambiente é propício para um planejamento nacional, onde os setores devem somar esforços para a recuperação da sociedade nacional, sem esta atuação contínua dos grupos nacionais e uma política geral de integração dos grupos produtivos, as faturas aparecerão de forma acelerada com crescimento das desigualdades, da exclusão social, no desemprego crescente e o enterrando do sonho de sermos o país do futuro.

 

 

 

 

 

 

 

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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