Transformações globais

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Neste espaço todas as semanas fazemos reflexões sobre questões interessantes para a sociedade internacional, assuntos econômicos relevantes que impactam sobre a sociedade, comentários políticos e análises sociais que repercutem com a comunidade. Diante disso, estamos percebendo o surgimento de novos horizontes econômicos e políticos que estão ganhando relevância na sociedade mundial, como a retomada de políticas protecionistas, subsídios para setores estratégicos e novas formas de atuação dos governos nacionais, que estão crescendo e se tornando visíveis na economia dos Estados Unidos, que antes era visto como um paraíso da globalização e do livre comércio, percebemos alterações evidentes como o incremento das políticas protecionistas, abandando o livre comércio de forma pragmática para defender seus interesses econômicos e financeiros.

Neste cenário, os governos norte-americanos, desde Donald Trump e mais incisivamente o atual presidente Joe Biden, vem adotando políticas fortemente protecionistas, com o despejo de trilhões de dólares para alavancar a produção nacional, com medidas tarifárias para proteger a produção interna, atraindo grandes conglomerados asiáticos para o mercado interno e a geração de emprego local, como forma de reconstruir laços industrializantes que foram perdidos num momento de crescimento das finanças em detrimento da estrutura industrial. Essa política deve ser vista como o reconhecimento da sociedade norte-americana de que sua estrutura econômica e produtiva não é mais hegemônica e dominante no cenário global, sentindo a concorrência da economia chinesa, que como destacou o renomado jornal inglês Financial Times: “Desculpem, EUA, a China tem uma economia maior do que a sua”.

Neste momento, percebemos que a economia norte-americana que liderou a economia internacional, saindo de um cenário unipolar para uma estrutura global descrita, por especialistas, de uma sociedade multipolar, onde encontramos novos eixos que lideram a economia mundial, surgindo novos conceitos, novos valores e novos comportamentos, exigindo das nações novos conceitos, buscando novas formas de autonomia e novas formas de soberania, além de liderança e capacidade de compreender os novos desafios da sociedade contemporânea.

Todas as nações que se desenvolveram buscaram fortalecer seu capital humano, com forte investimento em educação, capacitando e qualificando sua população e criando instrumento para a competição desta nova economia internacional, centrada no mundo digital, de novas tecnologias, de novas inovações e de novas oportunidades para os cidadãos. O mundo criado e estimulado pela globalização pelos Estados Unidos está perdendo espaço para uma nova sociedade, mais protecionista, onde o Estado Nacional está ganhando uma nova centralidade, criando os instrumentos de política econômica e de política públicas para estimular seus atores econômicos e produtivos, melhorando a produtividade, gerando mais e melhores empregos, incrementando a renda dos trabalhadores e melhorando as condições de vida dos cidadãos.

Neste novo horizonte, os mitos econômicos estão sendo repensados, as ideologias perdem espaço para a realidade contemporânea, defendemos liberalismo e a livre concorrência como forma de chegar ao oásis do progresso material quando estamos no pódio maior do crescimento econômico mas, nossas atitudes e comportamentos mudam quando nos vemos ameaçados, desta forma repensamos nossas ciências e retomamos, novamente, nosso histórico de protecionismo e passamos a retomar o pragmatismo e adotamos a expressão: faça o que eu digo mas não faça aquilo que eu faço.

Neste momento, percebemos que as nações desenvolvidas estão retomando políticas estratégicas de desenvolvimento econômico, incrementando investimentos para suas comunidades, retomando empresas estratégicas, melhorando instrumentos de fiscalização e consolidando suas capacidades de regulamentação e, ao mesmo tempo, as nações em eterno subdesenvolvimento se esforçam para entregar suas riquezas para grandes conglomerados internacionais, perpetuando nossa indignidade, nossa exploração e nosso eterno subdesenvolvimento.

Ary Ramos da Silva Júnior, Bacharel em Ciências Econômicas e Administração, Especialista em Economia Comportamental, Mestre, Doutor em Sociologia e professor universitário.

A quem interessa reduzir a formação básica dos jovens no ensino médio? por Cássio e Cara

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Proposta na Câmara corta 30 minutos por dia de acesso ao conhecimento

Fernando Cássio, Professor da Faculdade de Educação da USP, integra a Rede Escola Pública e Universidade (Repu) e o comitê diretivo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação

Daniel Cara, Professor da Faculdade de Educação da USP, é coordenador honorário da Campanha Nacional pelo Direito à Educação

Folha de São Paulo, 11/12/2023

Tramita na Câmara dos Deputados o projeto de lei 5.230/2023 que pretende corrigir a reforma do ensino médio.

Elaborado pela equipe do MEC como resultado de uma consulta pública, o texto do PL precisa ser aperfeiçoado, mas expressa o incontestável: o novo ensino aprovado a toque de caixa no governo Temer era pior do que se imaginava.

Além de amplificar desigualdades escolares, a reforma se mostrou administrativamente inviável, com escolas e redes de ensino tendo que planejar a oferta e a alocação de professores em dezenas (e até centenas) de disciplinas com pouco conteúdo científico. Maltratou a saúde física e mental do professorado e sabotou os sonhos de muitos jovens.

Milhões de estudantes que há pouco fizeram as provas do Enem não tiveram aulas durante metade do ensino médio. Eles próprios afirmam que um itinerário formativo sobre sustentabilidade envolvendo empreendedorismo com sucata ou a fabricação de tijolos não pode ser chamado de “aula”.

Entre avanços e tropeços do PL de agora, há uma disputa em torno da carga horária da chamada “formação geral básica” (FGB). A proposta do MEC é reservar, dentro das 3.000 horas letivas totais do ensino médio, uma carga horária mínima de 2.400 horas para a FGB (as 13 disciplinas escolares), que a atual reforma havia minguado para 1.800 horas.

Na Câmara, o relator designado para o PL — Mendonça Filho (União-PE)— é o ex-ministro da Educação de Michel Temer que aprovou a reforma de 2017 e já se declarou mobilizado na defesa do “legado” do ex-presidente. Ele tem o apoio de secretários estaduais de Educação para cortar 300 horas da formação científica dos estudantes. O objetivo é driblar a necessidade de contratação de professores nas redes estaduais —simplificar o currículo para baratear a educação dos mais pobres.

Uma nota técnica produzida por pesquisadores que estudam políticas de ensino médio, que também analisaram as 79 emendas apresentadas ao PL 5.230/2023, mostrou que essa redução para 2.100 horas significa retirar dos estudantes 30 minutos por dia de acesso ao conhecimento. É como se o ensino médio durasse apenas 2,7 anos nas escolas públicas, em comparação aos três anos das particulares.

Antes de defenderem o encurtamento da formação escolar nas escolas públicas, parlamentares e secretários de Educação deveriam responder quantas das aulas de física ou história eles trocariam por oficinas de “brigadeiro gourmet” nas escolas privadas de seus filhos e netos.

Dificuldade em lidar com conceitos filosóficos ou antipatia pelas aulas de biologia são comuns para jovens que ainda estão por perceber que o conhecimento que parece inútil nos torna pessoas pensantes e capazes de dar sentidos inéditos às coisas do mundo. Sim, precisamos conhecer os estados de oxidação do carbono para entender a enrascada climática em que nos encontramos. E, sim, precisamos de aulas de sociologia para problematizar mazelas que se perpetuam na mesma proporção do enriquecimento das elites nacionais.

Elites que, representadas por especialistas em educação fabricados por institutos e fundações empresariais, propuseram e defenderam a atual reforma do ensino médio, e seguem convencidas de que é preciso surrupiar horas-aula da formação científica de estudantes da escola pública para “modernizar” o currículo.

Futebol e dinheiro, por Francisco Fernandes Ladeira

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Francisco Fernandes Ladeira, A Terra é Redonda, 10/12/2023

O futebol virou negócio até nos resultados. Frequentemente, vence quem tem mais dinheiro
Segundo um conhecido ditado popular, dinheiro não traz felicidade. Entretanto, no cenário futebolístico dos últimos anos, dinheiro tem, de alguma forma, trazido felicidade; pelo menos para as torcidas dos clubes que possuem recursos suficientes para investir nas contratações dos melhores jogadores.

Não por acaso, no recém-terminado Campeonato Brasileiro, os três elencos mais caros do país – Flamengo, Palmeiras e Atlético Mineiro – estiveram entre os quatro primeiros colocados. Além disso, o último campeão nacional não pertencente a este trio “bilionário” foi o Corinthians, em 2017.

Em âmbito subcontinental, o fato de o Brasil ter vencido as cinco últimas edições da Taça Libertadores da América também pode ser explicado pelo poderio financeiro, pois, nossos clubes, além de repatriarem jogadores que atuavam na Europa (diferentemente de argentinos e uruguaios, com bem menos recursos), têm contratado atletas que se destacam em outros países sul-americanos. Assim, ao mesmo tempo em que se reforçam, enfraquecem seus rivais.

Na Europa, onde cifras astronômicas são investidas no esporte mais popular do planeta, as diferenças entre clubes são ainda maiores. Isso reflete no fato de as principais ligas e torneios do continente serem dominados por alguns poucos clubes, como Barcelona, Real Madrid, Liverpool, Manchester City e Bayern de Munique.

Já em torneios mundiais, quando se enfrentam as principais equipes da Europa (verdadeiras “seleções do mundo”) e da América do Sul, o predomínio europeu é gritante. Afinal de contas, desde 2013, o mundial de clubes é vencido apenas por times do Velho Continente.

Isso não significa, evidentemente, afirmar que jogadores europeus são melhores do que seus congêneres sul-americanos (basta mencionar, por exemplo, que a última campeã mundial é a Argentina).

Em outras épocas, quando o futebol ainda não era tão globalizado e o poderio monetário não desequilibrava, os clubes da América do Sul, em geral, eram melhores do que os da Europa (haja vista a vantagem no número de vitórias em torneios internacionais, registrada até a década de 1990).

Lembrando o título de uma famosa música, interpretada pela cantora estadunidense Cyndi Lauper, “money changes everything” (dinheiro muda tudo). No caso abordado neste texto, muda até o futebol, já não tão “imprevisível” como outrora. Quem tem dinheiro, investe maciçamente, tem os melhores jogadores e, consequentemente, vence os principais torneios.

*Francisco Fernandes Ladeira é doutorando em geografia na Unicamp. Autor, entre outros livros, de A ideologia dos noticiários internacionais (CRV).

A ideologia do empreendedorismo, por Cesar Sanson

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Cesar Sanson, A Terra é Redonda, 09/12/2023

Dois séculos e meio depois assistimos ao retorno das origens do capitalismo nas relações de trabalho

O capitalismo (re)descobriu uma nova forma de organizar o trabalho sem precisar se responsabilizar com os direitos e ainda por cima com uma vantagem, transfere aos próprios trabalhadores os custos de financiamento de direitos básicos, como por exemplo a previdência social.

Ao menos dois exemplos evidenciam esta nova realidade, o primeiro é a uberização em que trabalhadores exercem o seu trabalho desvinculados da garantia de direitos; o segundo, é o contrato entre empregador e trabalhador utilizando-se do recurso do microempreendedor individual (MEI). Essa modalidade é também conhecida como pejotização. As mudanças na regulação da terceirização que não distingue meios e fins da atividade laboral e a Reforma Trabalhista, fez explodir a contratação via MEI. Em ambas as formas, o capital não assume o pagamento de direitos.

Vemos agora milhares de trabalhadores trabalhando sem direito nenhum ou tendo que financiar seus próprios direitos. A pergunta é porque os trabalhadores aceitam esta condição. Para além dos problemas estruturais do mercado de trabalho brasileiro caracterizado pela informalidade em que a falta de alternativas empurra as pessoas para a aceitação desta situação, há outras razões nem sempre tão explícitas.

Uma delas, é que estas mudanças vêm acompanhadas e sustentadas pela ideologia do empreendedorismo que parte do pressuposto que o sucesso de uma pessoa, particularmente na vida laboral, depende apenas dos seus esforços, da sua perfomance, da sua vontade, de sua perseverança e de suas intuições visionárias. Muitos creditam o crescimento das modalidades de trabalho por conta própria a esta ideologia.

Engana-se, porém, quem acha que estes trabalhadores se consideram empreendedores. Há evidências que uma porção significativa é seduzida para o labor sem direitos menos em função do discurso ideológico e mais pela pretensa autonomia que a modalidade uberização e pejotização promete.

Foi-se o tempo em que trabalho com carteira assinada e jornada de 8 horas era o emprego sonhado.

A resistência ao emprego fordista se deve a jornada de trabalho padronizada em que o trabalhador precisa estar num mesmo local pela mesma quantidade de horas diariamente e muitas vezes subordinado a um chefe ou supervisor autoritário. Este tipo de emprego garante direitos – salário regular e mínimo, férias, adicional de férias, 13º, previdência social – porém nele a autonomia é tolhida.

Há outro problema com o emprego de padrão fordista, paga-se muito pouco.
Colocado tudo na balança, entre um emprego com carteira assinada engessado e um “emprego” do tipo Uber, muitos optam pela segunda alternativa. Não é incomum em conversas com trabalhadores uberizados os mesmos afirmarem que largaram o emprego porque agora se sentem mais autônomos e ganham o mesmo ou até mais.

A adesão de milhares a uberização e pejotização do trabalho se encaixa unicamente a partir das explicações acima? É evidente que não. Assim como é evidente – as pesquisas revelam – que os trabalhadores uberizados querem direitos, porém, preservando a sua autonomia. Vem daí a resistência a “celetização” – contrato CLT – da regulação do trabalho. É crescente o número de trabalhadores que não aceitam e não querem mais trabalhar de forma subordinada.

Trata-se de uma mudança significativa no mundo do trabalho porque dessa vez o discurso do capitalismo, de que você pode ganhar dinheiro organizando a sua própria vida, encontra forte adesão entre os trabalhadores.

A luta de classes permanece, mais se tornou mais complexa.

*Cesar Sanson é professor de sociologia do trabalho do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), autor de O Trabalho nos Clássicos da Sociologia, o – Marx, Durkheim e Weber (Expressão Popular, 2021).

A dolorosa queda do Santos, por Juca Kfouri

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Nada marcará mais o futebol brasileiro em 2023 do que o rebaixamento santista

Juca Kfouri, Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

Folha de São Paulo, 10/12/2023

O menino tinha oito, nove, dez anos, e acordava cedo mesmo nas férias escolares de dezembro e janeiro para ser o primeiro a pegar o jornal na porta de casa no Itaim Bibi.

Era corintiano, mas, nos tempos em que as notícias não chegavam a jato, o garoto queria não ler nas páginas do caderno de esportes (sim, em 1958/59/60, havia caderno de esportes nos jornais) que Pelé tinha sido vendido para o Real Madrid, Benfica ou Milan, que viviam anunciando interesse em contratá-lo.

Uma criança se preocupava porque o melhor jogador de um time rival poderia desfalcá-lo.

Diga-se que naqueles tempos a seleção brasileira tinha uma importância tão grande como os tais cadernos de esportes, e, guardadas as proporções, com o time de camisas amarelas aconteceu meio que a mesma coisa.

Voltemos.

Pelé e Santos eram faces de moeda única, e torcer pelo time de camisas imaculadamente brancas, obrigatório para quem gostasse de futebol.

Porque nunca houve na história do futebol um time como aquele em seu auge, no começo da década de 1960.

O Real Madrid é o maior clube de futebol do mundo, é inegável, mas como aquele Santos que enfiou 5 a 2 no Benfica na decisão do Mundial, no estádio da Luz, em Lisboa, em 1962, jamais houve nada igual.

Os tempos passaram, e a Vila Belmiro testemunhou outros ótimos esquadrões, campeoníssimos, embora nada nem parecido.

É possível dizer que o Santos é tão grande, mas tão grande, que sua grandeza só é superada pela do Rei Pelé.

Alfredo Di Stéfano não é maior que o Real Madrid, Lionel Lionel Messi não é maior que o Barcelona, Diego Maradona não é maior que o Boca Juniors, Zico não é maior que o Flamengo etc.
Pelé, tivesse jogado em quaisquer desses gigantes, seria maior que eles.

Porque Pelé só não é maior que o próprio futebol, irmão gêmeo dele e sinônimo.

Pelé é o Pelé dos Pelés, como Michael Jordan é o Pelé do basquete e Muhammad Ali é o do boxe.

O menino cresceu, e o Santos do Rei passou 11 anos sem perder para o time dele.

Empilhou taças e mais taças enquanto o Corinthians jejuava por inacreditáveis 23 anos.

O mundo reverenciava o Santos como a nenhum outro time brasileiro então —e até hoje.

Só a camisa branca santista rivalizava em excelência com a merengue madridista. Nenhuma outra.

Resumi-la a Pelé seria, além de injusto, impreciso, até porque nada se resume em Pelé, tudo extrapola.

E Dorval, Mengálvio, Coutinho e Pepe. E Gylmar, Cejas e Rodolfo Rodrigues. E Carlos Alberto Torres, Mauro Ramos de Oliveira, Calvet, Ramos Delgado, Zito, Pagão, Jair Rosa Pinto, Clodoaldo, Edu, Giovanni e Paulo Henrique Ganso. E os Meninos da Vila, e os que vieram depois em 2002, Diego, Robinho, Elano e Neymar.

Nenhum deles, por tudo o que fizeram pelos gramados mundo afora, merece a dor do rebaixamento.

Economia Verde

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Vivemos num momento de grandes alterações em todos os setores da sociedade internacional, a globalização e o incremento da competição nas estruturas produtivas está transformando a economia global, com o surgimento de novos modelos de produção, novos negócios, novas exigências e qualificações dos trabalhadores e o crescimento da chamada economia verde, ao mesmo tempo, que as antigas formas de energia vem perdendo espaço na economia mundial, gerando incertezas e instabilidades, além das resistências dos grupos econômicos que sempre ganharam com o modelo energético atual, fortemente dependente dos combustíveis fósseis.

As transformações do sistema econômico e produtivo internacional estão moldando o nascimento de uma sociedade, exigindo políticas efetivas, consistentes, sérias e rigorosas para a construção de um novo consenso da necessidade e de uma matriz energética alternativa para dinamizar a estrutura produtivo. Esse consenso é imprescindível para a legitimação das ações da sociedade para a construção de um modelo energético mais limpo e com menor dependência dos combustíveis fósseis, mas numa sociedade marcada por grandes polarizações políticas, discursos inflamados e debates centrados em notícias falsas, este consenso, embora imprescindível, nos parece muito distante.

Somos uma nação dotada de grandes vantagens energéticas, poucas nações do mundo apresentam um potencial tão elevado como a brasileira, somos dotados de energia variada e dotada de grande conhecimento nesta área, ou seja, estamos vivendo um momento imprescindível para aproveitar essas oportunidades, reduzindo as dívidas sociais acumuladas à muitos séculos, construindo políticas públicas que possibilitem investimentos em educação, saúde e bem-estar social, desta forma, impulsionando os dispêndios em ciência e tecnologia, fundamentais para a construção de uma sociedade desenvolvida, mais igualitária e com maior autonomia no cenário internacional.

Mas percebemos que essa transformação energética apresenta grandes dificuldades estruturais, embora percebamos que a sociedade global esteja percebendo os graves desequilíbrios no meio ambiente, as alterações climáticas, o calor exagerado, o crescimento de maremotos e tsunamis, mas é imprescindível destacar que muitos setores grupos sociais e econômicos ganham com este modelo econômico e produtivo, desta forma, utilizam seu forte poderia financeiro para impedir alterações que podem reduzir seus ganhos substanciais.

Se compararmos os valores prometidos para os países desenvolvidos nos grandes fóruns internacionais na casa dos 100 bilhões de dólares para combater os impactos do aquecimento global, percebemos que essa quantia é imensamente menor do que os dispêndios das nações desenvolvidas para financiar a indústria bélica, cujos gastos militares está na casa dos 2 trilhões de dólares, recursos que poderiam retirar, em definitivo, mais de 800 milhões de pessoas que passam fome na sociedade global, segundo dados atualizados pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Neste cenário, a sociedade brasileira tem todos os instrumentos para receber bilhões de dólares de investimentos produtivos, gerando empregos, melhorando a renda da população, atraindo empresas e organizações produtivas em todas as regiões, atraindo empresas que demandam energias a custos menores e não os encontram em seus países de origem. Os próximos anos são imprescindíveis para atrairmos novos investimentos, para isso, precisamos fortalecer as instituições nacionais, aumentando os dispêndios na educação e na saúde, garantindo um capital humano altamente qualificado e capacitado para compreender os desafios da era do conhecimento.

A economia verde pode abrir novos horizontes e novas perspectivas para a economia nacional, somos dotados de grandes vantagens competitivas para enfrentarmos os desafios contemporâneos, reconstruir nossa indústria é imprescindível, além de elaborar um projeto sólido de nação, exigindo sólidas contrapartidas dos grupos internacionais, investindo na educação, na pesquisa e abandonando o complexo de vira-lata que predomina a suposta elite nacional.

Ary Ramos da Silva Júnior, Bacharel em Ciências Econômicas e Administração, Especialista em Economia Circular, Mestre, Doutor em Sociologia e professor universitário.

A crise climática, segundo Thomas Piketty

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Fiona Harvey – A Terra é Redonda – 04/12/2023

A desigualdade em matéria de carbono é atualmente um dos problemas mais prementes do mundo

As questões de classe social e econômica devem estar no centro de nossa resposta à crise climática, para enfrentar as enormes desigualdades entre a pegada de carbono dos ricos e dos pobres e evitar um retrocesso contra as políticas climáticas, afirmou o economista Thomas Piketty.

Serão necessárias regulamentações para proibir bens e serviços que tenham emissões de gases de efeito de estufa desnecessariamente elevadas, como jatos privados, veículos de grandes dimensões e voos de curta distância, disse ele numa entrevista ao jornal The Guardian.

Os países ricos também devem criar impostos progressivos sobre o carbono que levam em consideração a renda das pessoas e sua capacidade de reduzir as emissões, uma vez que as políticas atuais não se adaptam às necessidades reais das pessoas.

“Temos que colocar a classe e os estudos sobre a desigualdade entre as classes sociais no centro de nossas análises sobre os desafios ambientais em geral”, afirmou Thomas Piketty. “Se não o fizermos, não conseguiremos obter uma maioria [de pessoas a favor de uma ação forte] e não seremos capazes de realizar isso”.

O proeminente economista francês é o autor da obra seminal O capital no século XXI e um dos principais pensadores mundiais sobre a desigualdade. Seu trabalho foi muito influente após a crise financeira de 2008 e ele está cada vez mais atento à crise climática como codiretor do World Inequality Lab.

Até o momento, embora os ambientalistas tenham apontado o dedo para os países desenvolvidos, contrastando suas elevadas emissões com a difícil situação do mundo em desenvolvimento, qualquer forma de análise de classe – abordando as preocupações das pessoas pobres nos países ricos – tem estado em grande parte ausente, segundo Thomas Piketty. “Um dos grandes fracassos do movimento ambientalista tem sido sua tendência em ignorar a dimensão de classe e a desigualdade social. Acho isso muito surpreendente”.

Ele disse que a questão da desigualdade em matéria de carbono é atualmente um dos problemas mais prementes do mundo. A profunda desigualdade em matéria de carbono “é agora maior do que já foi alguma vez desde o século XIX”, afirmou. Este é um fator importante para os ataques que estão sendo feitos à política climática por alguns setores.

As políticas energéticas mal orientadas em todo o mundo sobrecarregam as pessoas pobres, para quem a energia, a alimentação e a habitação representam uma parte muito maior dos orçamentos familiares do que para os mais abastados. Segundo Thomas Piketty, este fato está provocando uma reação negativa.

Se as políticas climáticas forem vistas como injustas, afetando as pessoas de baixa renda enquanto as que têm estilos de vida luxuosos continuam intocadas, movimentos de protesto surgirão, como os “gilets jaunes” que paralisaram a França há cinco anos, disse. “Todas as pessoas compreendem agora que todos terão que fazer algum esforço [para reduzir as emissões], não serão apenas os ricos. Mas este esforço tem que ser distribuído de uma forma que possa ser aceito pela população. Se não abordarmos esta questão, vamos ter um movimento gigantesco de coletes amarelos em todos os lugares. E é um pouco isso o que temos”.

Para além da regulamentação destinada a limitar as emissões mais desnecessárias, Thomas Piketty sugere um “imposto progressivo sobre o carbono”, através do qual todos teriam uma permissão de livre emissões cobrindo as necessidades normais, mas as atividades que ultrapassassem esse limite – como voos frequentes de férias, casas grandes ou veículos grandes – seriam tributadas com aumentos maiores, de modo que as atividades mais poluentes fossem sujeitas a “uma enorme tributação”.

Ele acredita que esta abordagem seria popular. Atualmente, muitas pessoas menos abastadas estão preocupadas com o fato de serem elas que suportarão o peso das medidas de redução das emissões. “Muitas pessoas, e os grupos socioeconômicos mais desfavorecidos, sentem que é tudo contra eles e que eles vão pagar por todos, especialmente as pessoas das zonas rurais. Essa é uma grande parte da dificuldade política que temos atualmente”, afirmou. “Temos que tentar fazer tudo o que pudermos para convencer esses grupos de que as pessoas no topo estão pagando sua parte justa. Temos que começar no topo, [com] as pessoas que andam de jato privado”.

A crise climática é frequentemente vista como uma oposição entre os países desenvolvidos, o chamado norte global, e os países em desenvolvimento, no sul global. Mas as pessoas pobres dos países ricos correm o risco de serem seduzidas por políticos nacionalistas ou populistas que se opõem à ação climática.

Thomas Piketty argumenta que essas pessoas precisam ter certeza de que seus interesses também estão sendo considerados. “Se quisermos escapar deste tipo de sentimento nacionalista, de país contra país, temos que desenvolver uma nova forma de solidariedade de classe que vá além do Estado-nação”, afirma. “Temos que convencer a classe média e os grupos com rendas mais baixas do Norte [global] de que, ao obrigar os grupos mais ricos a contribuir muito mais e a reduzir seu estilo de vida, estaremos ajudando a resolver o problema do Sul [global], mas isso pode ao mesmo tempo resolver alguns problemas do Norte”.

Sem essas reformas, disse Thomas Piketty, “teremos uma grande catástrofe climática”, uma vez que as políticas atuais não estão funcionando.

Fiona Harvey é jornalista.

Menos China e mais EUA no GPS da economia, por Marcos Vasconcellos.

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Parece um bom momento para repensar a ‘diversificação geográfica’ do seu dinheiro

Marcos Vasconcellos, Jornalista, assessor de investimentos e fundador do Monitor do Mercado

Folha de São Paulo, 04/12/2023

Todo o mundo se acostumou com uma China cujo PIB (Produto Interno Bruto) cresceu mais de 6% anualmente desde 1991. Até 2015, aliás, eram mais de 7% ao ano. Agora, é hora de recalcular a rota da economia mundial pensando que o termo “crescimento chinês” pode não ser mais a mesma hipérbole de antes.

Os analistas do Goldman Sachs, gigante global dos investimentos, apontaram na semana passada que trabalham com a perspectiva de que a China se estabilize com um crescimento anual de 4%. O que não seria pouco para outros players.

De 2010 até hoje, o Brasil só cresceu mais de 4% duas vezes (2010 e 2021). Os Estados Unidos, só uma vez (2021).

O setor imobiliário é grande pilar no aquecimento da economia chines, mas uma crise imobiliária gigantesca (o caso da Evergrande foi a ponta do iceberg) detonou o sistema financeiro.

O governo comunista —centralizador, por definição— usa o seu controle para tentar aquecer o mercado. O gigante asiático possui cidades-fantasma, criadas para inflar a demanda da construção civil, mas sem que haja gente interessada em morar nelas (vale a pena gastar uns minutos no YouTube, aliás, para conhecer as impressionantes construções abandonadas).

No mercado primário —o de lançamentos—, o governo chinês está acostumado a controlar desde a fixação de preços de terras até o controle das vendas das incorporadoras.

O governo não tem tanto poder, entretanto, sobre o chamado mercado secundário, ou seja, quando a transação é feita entre pessoas. E agora o país trabalha para conter cerca de US$ 8,4 trilhões em dívidas pendentes de hipotecas e de incorporadoras.

Enquanto eles descobrem como lidar com o novo problema, a economia local segue travada, e os preços das commodities, como aço e petróleo, sofrem. Neste ano, o preço do petróleo tipo Brent já caiu mais de 7,5%. O aço longo é vendido, hoje, por 85% do valor de janeiro.

Mas o dinheiro segue as leis da física e não pode simplesmente desaparecer. Ele muda de mãos. Os dados da EPFR, empresa que monitora o fluxo do dinheiro em fundos por todo o mundo, mostram que os fundos transnacionais chegaram à marca de US$ 70 bilhões em ativos nos EUA, em novembro, enquanto na China, depois de terem esbarrado nos US$ 20 bilhões em maio, hoje estão perto de zero.

O crescimento do PIB dos EUA acima do chamado consenso de mercado explica em parte esse movimento, enquanto a China ainda tenta achar o passo para o novo ritmo da música.

A Bolsa brasileira segue com a representatividade econômica de uma gota nesse oceano financeiro, mas, a depender do quanto a sua carteira de investimentos depende da exportação para a China, parece um bom momento para repensar a “diversificação geográfica” do seu dinheiro.

Imprensa desinforma ao fazer lobby pela desoneração da folha, por Marcos Mendes.

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Reportagens ocultam que jornais, rádios e TVs são beneficiários da política

Marcos Mendes, Pesquisador associado do Insper, é organizador do livro ‘Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil’

Folha de São Paulo, 02/12/2023

É correto o veto presidencial ao projeto de lei que prorroga a desoneração da folha de pagamento. Já tratei do tema na coluna de 27/11/2021. Joel Pinheiro da Fonseca e Bernardo Guimarães também o fizeram em suas colunas desta semana.

A política é cara e ineficaz, como mostraram diversos estudos com rigor estatístico. Eles apontam baixo poder da política para criar empregos e, quando constatam algum impacto positivo, mostram que o custo fiscal por emprego gerado é mais que o dobro do salário. O ganho fica mesmo é com a empresa beneficiada. Daí o forte lobby pelas seguidas renovações. A intenção inicial era compensar a redução da tributação da folha por elevação de outros tributos. Mas isso nunca ocorreu e o subsídio embutido e o custo fiscal sempre foram altos.

A desoneração começou como uma tentativa (canhestra) de compensar o chamado “custo Brasil”, que tirava competitividade da indústria exportadora. Hoje, contudo, boa parte das empresas beneficiadas está no setor de serviços não exportador. Ao terem incentivos para contratar mais, elas tornam a mão de obra mais escassa e cara para a indústria exportadora, piorando a situação desta e revertendo a intenção inicial da política.

A desoneração atua na direção contrária do que se está tentando fazer na Reforma Tributária, pois substitui uma tributação sobre um valor agregado na produção (a folha de pagamento) por uma sobre o faturamento, que é cumulativa. Com isso, gera distorções de preços e ineficiência econômica.

Também sabota a Reforma Tributária no quesito simplicidade e transparência. Há empresas que têm
produtos dentro e fora do regime de desoneração e têm que recolher conforme duas bases de incidência distintas, o que resulta em judicialização e maior custo para pagar e cobrar impostos.

Não obstante o insucesso, há forte apoio da imprensa à renovação da desoneração. As “empresas
jornalísticas e de radiodifusão sonora e dos sons e imagens” são beneficiárias diretas, como expresso no art. 8º da lei 12.546/2011. Por isso, em qualquer reportagem sobre o tema, deveria haver um disclaimer sobre o interesse financeiro que têm na renovação.

O que se vê, no entanto, são reportagens panfletárias, que preferem divulgar os números
organizados pelos lobbies, como “400 mil postos podem ser fechados no setor [de call centers] em dois anos” (O Globo, 25/11/23), e silenciar sobre estudos sérios. Centrais sindicais, outras obviamente interessadas na renovação, são citadas como opiniões técnicas e isentas.

Diversos veículos usam, com frequência, o bordão de que a política é voltada para “os 17 setores que mais empregam no país”. Parece até estratégia de marketing previamente combinada. Não há esforço jornalístico de chegar se isso é correto e, se o for, se faz sentido subsidiar setores por seu grau de empregabilidade sem analisar custo-benefício e custo de oportunidade na aplicação dos recursos públicos.

Vale citar, a título de exemplo, os dois pesos e duas medidas adotados pelo jornal O Estado de
S. Paulo em seus editoriais (que também se verificam em organizações como Globo, Record e Bandeirantes). Quando trata do privilégio dos outros, a linguagem é dura, como no caso das exceções à Reforma Tributária: “É de lamentar que, para aprovar um novo marco jurídico absolutamente benéfico para o país […], tenha sido necessário oferecer tantas benesses e privilégios […] Trata-se do mais habitual funcionamento do Estado brasileiro, que é continuamente capturado por interesses de grupos politicamente organizados” (18/11/23).

Ao analisar o veto à desoneração, a linguagem é outra: “A medida tem sido fundamental para
sustentar o nível de emprego dos setores de mão de obra intensiva. O interesse público da proposta é reconhecido até mesmo pelas centrais sindicais […] Atribuir à desoneração da folha a responsabilidade por mais um rombo nas contas públicas tampouco é minimamente crível” (25/11/23).

Registro que esta Folha tem feito cobertura menos enviesada, ainda que, ao tratar da matéria,
não faça o necessário esclarecimento quanto ao seu interesse financeiro direto.

Encontros de Jesus

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A sociedade contemporânea apresenta um grande desenvolvimento tecnológico em todas as áreas e setores, com impactos generalizados para todos os indivíduos e comunidades, gerando facilidades, novas oportunidades de negócios e novos espaços de reflexões sociais e religiosas. Nesta sociedade, percebemos o crescimento das religiões de origens protestantes, fragilizações de outras correntes religiosas, como novas formas de cultos possíveis em decorrência do desenvolvimento do mundo digital, com novos canais de comunicação e aproximação dos indivíduos e as comunidades, vivemos num momento de grandes transformações planetárias, reflexões e descobertas que só estão disponíveis para aqueles que se debruçam nos estudos, nas reflexões e nas discussões democráticas, saudáveis e progressistas.

Nesta sociedade, embora estejamos destacando o crescimento das tecnologias e as mudanças nos instrumentos de comunicação, as pessoas se apresentam com grandes dificuldades de conversação e dos diálogos, muitos indivíduos se afastam das conversas saudáveis e preferem comportamentos de cancelamento, atacando a reputação e criando climas degradantes e repulsivos. Neste cenário, gostaria de refletir sobre a passagem de Jesus Cristo, ocorrida a mais de dois mil anos, e cujas repercussões são gigantescas para a sociedade mundial, sendo responsável pela divisão do mundo em duas eras, antes e depois de Cristo.

Nesta passagem, gostaria de salientar os inúmeros momentos de conversações desenvolvidas por Jesus de Nazaré, uma passagem de instrução, de reflexão, de estudo e de transformação, um momento imprescindível para a vivência em comunidade e como forma de compreensão dos grandes desafios da sociedade, lembrando ainda, que mesmo ocorrido há mais de 2000 anos, as conversas de Jesus devem servir como um instrumento de reflexão individual e coletiva, uma forma de compreender as verdades que existem, que sabemos existir e que habita nos nossos corações mas, muitas vezes, nos esquecemos por completo e até mesmo, fugimos desta realidade e preferimos viver cultivando ilusões e ignorâncias nas vivências cotidianas.

Neste período de mais de dois mil anos Jesus de Nazaré pode ser visto como um exemplo de conversação, de respeito e de transformações pessoal e individual, nestas conversas o Mestre conversou com variadas pessoas, onde podemos destacar os encontros com Zaquel, José de Arimatéia, Maria de Magdala, o senador Publius Lêntulus, Nicodemos, dentre inúmeros outros, sendo que as conversações foram responsáveis por grandes mudanças sociais e comportamentais.

Todos estes encontros foram destacados na literatura religiosa como uma forma de compreensão das grandes inquietações que existem nos corações dos seres humanos, as desesperanças, os medos e as tristezas que residem nos corações dos indivíduos.

Nesta conversa, gostaria de destacar o encontro de Jesus com Nicodemos, mas quem foi Nicodemos e porque seu encontro do Jesus de Nazaré foi importante e relatado no Evangelho de João, sendo estudado por muitos cristãos como forma de compreender a importância das vivências do Mestre, seus ensinos e suas reflexões, uma verdadeira aula para alentar os medos que existem na alma de todos os seres humanos.

Antes de conversarmos sobre o encontro com Jesus de Nazaré, vamos destacar que Nicodemos era um grande intelectual, um membro do Sinédrio, visto como uma personalidade respeitada pela comunidade, dotado de grande capacidade intelectual, contatos poderosos e, possivelmente, dono de um patrimônio respeitado na sociedade da época. Poucas eram as informações pessoais existentes sobre Nicodemos, mas sabendo que era visto como um grande intelectual e respeitado na época, qual o interesse de Nicodemos de se encontrar com Jesus de Nazaré, um simples e humilde carpinteiro, distante socialmente da condição de vida e da posição do membro do Sinédrio?

O encontro de Jesus e Nicodemos ocorreu à noite e lá estavam presentes dois discípulos do mestre, André e Tiago, que ouviram a conversa, observaram as falas do membro do sinédrio e perceberam quais foram as respostas de Jesus, os exemplos didáticos e os estímulos crescentes de reflexão que sempre caracterizaram as conversas com o mestre. A pergunta mais evidente de Nicodemos era como saber encontrar os caminhos para chegar ao reino de Deus, quais as atitudes e comportamentos eram fundamentais para que os indivíduos entrassem no reino divino, será que existiria uma senha, se houvesse, qual seria?

Nicodemos questiona Jesus como se faz para nascer de novo, como seria possível um homem velho nascer de novo, seria possível retornar ao ventre de sua mãe e, posteriormente, retornar a vida material? O mestre sorriu e destacou que a importância de nascer de novo era uma expressão simbólica e que todos precisamos nascer de novo para compreendermos os caminhos para a chegada no reino de Deus, onde podemos destacar que a expressão nascer de novo era vista como a reencarnação, ninguém consegue encontrar o reino de Deus sem nascer de novo, de renascer, onde encontramos uma grande diferença entre os mundos material e os mundos espiritual. Neste momento Nicodemos se encontra perdido, não conseguindo compreender os pensamentos do mestre de Nazaré e, desta forma, Jesus nos mostra que muitos ensinamentos eram muito difíceis de compreender, mesmo dialogando com um homem versado e conhecido como um doutor das leis, mesmo assim, esse doutor não conseguiu compreender os nuances das reflexões do Mestre de Nazaré, para muitos um simples carpinteiro e, na verdade, era o homem mais elevado e desenvolvido que pisou no planeta Terra.

Neste encontro, percebemos que todos os indivíduos apresentam dúvidas sobre algo, alguma preocupação, alguns receios na vida em sociedade, os sentimentos e os valores que abraçamos, ou seja, somos todos indivíduos cheios de medos, dificuldades e preocupações cotidianas, deste episódio, percebemos que somos todos seres imperfeitos e cheios de dúvidas e questionamentos. O encontro nos traz elementos para que nos conheçamos intimamente, essa conversa nos mostra que, mesmo sendo detentores de conhecimentos, somos sempre pessoas humanas e estamos sempre em construção, vivemos muitos anos para compreendermos os anseios que trazemos intimamente.

Depois das conversas do mestre Jesus e o integrante do Sinédrio, Nicodemos, percebemos que os discípulos estavam curiosos para questionar o mestre de Nazaré, um deles indagou se todos nascem iguais como pessoas apresentam dificuldades e outros apresentam apenas facilidades, uns dotados de grande genialidade e outros dotados de pouca capacidade intelectual, desta forma como acreditar a justiça de Deus?

Essas perguntas nos levam à grandes reflexões e o mestre nos mostra que se imaginarmos que todos somos filhos de um único pai, Deus, e todo pai ama seus filhos, o todo poderoso criou todos iguais mas alguns aproveitam as oportunidades e crescem de forma acelerada, aprendendo com os erros e criando novas trajetórias para sua caminhada, enquanto outros rechaçam a evolução, enveredam para caminhos equivocados e, desta forma, colhem obstáculos crescentes. Neste cenário, uns nascem mais afeitos aos sentimentos divinos, trabalham no caminho do Amor enquanto outros se comprazem com sentimentos negativos e desta forma, colhem dificuldades elevadas que servem como instrumentos para sua reparação emocional e espiritual, o nascer de novo é um exercício fundamental para o crescimento e o desenvolvimento dos seres humanos.

Na conversa com os discípulos, Jesus nos mostra que a verdadeira lei da sociedade é a lei do amor, que supera a lei da justiça, neste momento Tiago mostra a lei de Moisés, que destaca lei de olho por olho e dente por dente, neste momento o Mestre nos mostra que essa lei é frágil pois todos cometemos erros e equívocos, e quando cometemos erros e equívocos devemos ser punido exemplarmente, se matamos devemos ser mostos como a lei de então? Se isso for verdade, todas as pessoas deveriam ser punidas fortemente, não deixando que as pessoas se retratem pelos seus erros e seus equívocos.

O Mestre Jesus nos propõem uma lei maior, uma Lei de Amor, pois todos nás seres humanos somos irmãos uns dos outros e, como somos irmãos e fazemos parte da mesma família, devemos nos auxiliar uns aos outros como forma de retratarmos as faltas cometidas anteriormente. Numa família, todos os indivíduos devem auxiliar uns aos outros, quem comete equívocos deve ser auxiliado por todos os membros desta família, criando os elementos necessários para que todos se retratem e desta forma consigamos progredir emocionalmente, espiritualmente e socialmente, lembrando que é da Lei que todos nós estamos aqui, encarnados no mundo material como forma de progresso constante.

Na concepção criada e estimulada pelo Mestre Jesus, as reflexões propostas impactavam os pensamentos da época, os dogmas da sociedade e os valores dos grupos sociais e econômicos daquele período histórico, trazendo novos instrumentos para analisar as questões sociais, reduzindo os conflitos e estimulando uma sociedade mais pacífica e participativa.

O encontro de Jesus com Nicodemos nos leva à grandes reflexões, todos os indivíduos gostariam de se encontrar com o Mestre de Nazaré, diante disso, vamos pensar um pouquinho neste encontro e nesta reflexão gostaria de perguntar: qual seria a pergunta que você gostaria de fazer a Jesus de Nazaré?

Ary Ramos da Silva Júnior, Bacharel em Ciências Econômicas e Administração, Especialista em Economia Criativa, Mestre e Doutor em Sociologia e Professor Universitário.

P.S: Este artigo foi escrito pelo autor como uma forma de complementação da palestra proferida na Associação Espírita Allan Kardec, no dia 19 de novembro de 2023, disponível neste site www.aryramos.pro.br ou diretamente no link https://www.youtube.com/watch?v=bLaQGMlluEs