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Morte por desespero

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Vivemos momentos de grandes inquietações na sociedade internacional, modelos econômicos perdem espaço no cenário global, transformações frenéticas no mundo do trabalho, um sólido e consistente desenvolvimento tecnológico que traz grandes ganhos de produtividade da economia mundial e, ao mesmo tempo, percebemos o incremento de guerras crescentes em todas as regiões do mundo, levando especialistas a afirmarem que estamos nos aproximando de um conflito militar, com grande potencial destrutivo da sociedade internacional.

Nesta sociedade, percebemos problemas prementes de desigualdades variadas e crescentes em todas as nações do mundo, países que eram vistos pelo sólido ambiente de bem-estar social e um forte desenvolvimento econômico, baixa desigualdade e variadas oportunidades para todos os grupos sociais, estão sentindo na pele o crescimento das desigualdades, com o incremento da pobreza, da violência e da desesperança, deixando características mais evidentes da comunidade internacional.

Em pleno século XXI, numa sociedade global altamente tecnológica, integrada e interdependente, percebemos novas formas de morte, onde os indivíduos estão perdendo a vida por desespero, uma situação que aparece fortemente nos Estados Unidos da América, como destacou o renomado economista e ganhador do Prêmio Nobel de Economia, Angus Deaton. Segundo o autor, estamos vivendo as mortes por desespero, motivados pelo consumo crescente de overdoses de opiáceos, depressão, suicídio, mortes associadas ao álcool… que vitimam mais de 150 mil pessoas ao ano. Segundo Deaton, no livro Mortes por desespero e o futuro do capitalismo retrata, neste sentido, a queda do sonho americano, o fracasso do capitalismo americano em proporcionar bem-estar a muitos.

Percebemos, desde os anos 1980, o crescimento da desigualdade da renda na maior economia mundial. Os Estados Unidos se transformaram na maior economia do mundo depois do pós-segunda guerra mundial, seus números de crescimento econômico e a melhora substancial das condições de vida da população eram palpáveis, sua democracia era vista como um exemplo a ser seguido por todas as regiões do globo, suas empresas eram as mais pujantes e seu sistema produtivo era o mais eficiente mas, nos últimos anos, essa locomotiva perdeu sua força, a renda se concentrou de forma acelerada, o 0,1% da população concentra mais de 20% da riqueza nacional, o 1% mais alto controla mais de 40% e a metade da população estadunidense tem um ativo líquido negativo, o que significa que as dívidas superam os ativos, neste cenário, percebemos uma estagnação da renda dos trabalhadores no período neoliberal, estimulando raivas, rancores, violências e ressentimentos. De um mundo de oportunidades, riquezas e pujança econômica e produtiva estamos vislumbrando uma estagnação e o incremento da desesperança, tudo isso contribui para o crescimento das chamadas mortes de desesperos.

Neste cenário, a expectativa de vida nos EUA, que vinha aumentando de forma sistemática ao longo do século XX, estagnou e, em seguida, caiu nos últimos anos, queda de 78,9 anos para 78,6 anos entre 2014 e 2016, um fenômeno descrito como uma especificidade norte-americano, uma sociedade marcada pela competição, pelo individualismo, pelo imediatismo e cujo foco fundamental está sempre no lucro, no culto das armas e do ganho monetário. Neste ambiente de grandes transformações estruturais da geopolítica global, precisamos construir as nossas aspirações, deixando de lado tutelas externas e construir nossa história, respeitando nossa trajetória e consolidando valores esquecidos da sociedade contemporânea.

Ary Ramos da Silva Júnior, Bacharel em Ciências Econômicas e Administração, Mestre, Doutor em Sociologia e professor universitário.

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