“Neoliberalismo e Corrupção: ajustes neoliberais e aumento da corrupção”

Compartilhe

 “Neoliberalismo e Corrupção: ajustes neoliberais e aumento da corrupção – Análise dos ajustes neoliberais no Brasil de Fernando Collor (1990-1992) e no México de Carlos Salinas (1988-1992)” – Novas Edições Acadêmicas, 2019.

Por Ary Ramos da Silva Júnior

A presente obra editada pela Novas Edições Acadêmicas, faz parte da tese de doutorado defendida pelo autor em Sociologia, na Faculdade de Ciências e Letras (FCL), da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Araraquara, defendida em maio de 2006. O trabalho teve por objetivo comparar dois países latino-americanos que viviam momentos intensos de adoção de políticas neoliberais, naquele momento os ventos do chamado Consenso de Washington, reunião feita na capital norte-americana com a presença de economistas, cientistas políticos, intelectuais, presidentes, ministros de Estado e empresários, todos defensores das ideias e dos princípios neoliberais que clamavam por abertura econômica, desregulamentações, privatizações, desestatizações e redução sistemática do papel do Estado na sociedade latino-americana, estas políticas eram defendidas como a forma mais efetiva e imediata de levar estas economias para o tão almejado desenvolvimento econômico, ambicionado por todas as economias.

Nos anos 1980, as ideias neoliberais se espalharam pelo mundo de forma acelerada, levando para todos aos países em desenvolvimento, a adoção de políticas baseadas em redução do papel dos Estados na economia, sendo substituídos pelos mercados, vistos nesta ideologia como os grandes gestores do progresso e do crescimento dos países, a América Latina foi invadida por estas ideias, deste as iniciadas no Chile a partir de 1973, depois da queda do presidente eleito Salvador Allende e da ascensão de Augusto Pinochet, responsável pela adoção de políticas fortemente neoliberais, somadas a um governo autoritário e repressor, com milhares de mortos, desaparecidos, torturados e violentados.

Estas políticas se espalharam por toda a região e passaram a ser adotadas pela grande maioria dos países, desde a Argentina, Colômbia, Equador, Paraguai, Venezuela, Uruguai, Bolívia, Peru, México em 1988 com Carlos Salinas de Gortari e, o Brasil, a partir de 1990 com a ascensão do presidente Fernando Collor de Mello, neste momento estes países passam sentir na pele a adoção de novas políticas e a construção de um novo modelo, baseado nos mercados, onde os Estados passavam a ocupar um papel secundário.

O livro faz uma reflexão sobre o pensamento neoliberal, destacando a força dos grandes agentes econômicos na difusão desta ideologia e na tentativa de impor aos países da região e países em desenvolvimento de outras regiões as ideias liberalizantes. Segundo este pensamento, o atraso econômico destes países estava atrelado ao crescimento excessivo do Estado, que inicialmente foi o grande fomentador dos investimentos que culminaram na construção de alguma estrutura industrial, sem esta atuação estatal, dificilmente estes países conseguiriam construir algum modelo industrial, isto porque a industrialização dos países periféricos era mal vista pelos países industrializados, que estavam receosos de que surgissem mais concorrentes para sua economia.

No México, os avanços neoliberais foram mais intensos do que no Brasil, embora ambos tivessem uma histórica econômica bastante parecida, o gigante do norte estava muito próximo dos Estados Unidos, e sofriam destes uma influencia bastante agressiva, ainda mais quando o país assinou a entrada no Tratado de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA), assinado em 1992.

O México adotou inúmeras medidas liberalizantes, abriu sua economia, privatizou empresas estatais, retirou muitas estruturas microeconômicas reguladoras e assinaram outros acordos comerciais relevantes com outros países e regiões, se transformando em uma economia fortemente dependente dos Estados Unidos, a relação comercial entre eles aumentou de forma acelerada, levando a uma intensa dependência de seu vizinho do norte, responsável pela importação de mais de 80% de suas vendas externas, com isso, toda crise que afetasse os norte-americanos afetariam diretamente os mexicanos.

Devemos destacar ainda, que neste momento a sociedade mexicana descobriu uma relação bastante incestuosa entre grupos econômicos e agentes políticos, uma situação existente á algum tempo, mas apenas desbaratada neste período. A relação entre as medidas liberalizantes e a corrupção se mostrou mais evidente neste momento, com a saída de cena do Estado através da venda de empresas para a iniciativa privada, os grupos privados deixaram á mostra as mazelas políticas e as relações incestuosas entre Estado e Mercado, a corrupção se mostrava presente na sociedade mexicana á muitos anos, com desperdício de bilhões de recursos, enriquecimento de grupos privados e degradação social e política.

A relação entre medidas neoliberais e a corrupção se mostrou mais evidente em toda a região, a compra de empresas estatais, os lobbies para a desregulação e a desregulamentação de alguns setores econômicos, o poder financeiro dos grandes conglomerados econômicos e monetários, todas estas medidas levaram estas instituições a corromper o Estado Nacional e seus representantes, em troca ganhavam licitação, leilões e adquiriam empresas públicas, muitas delas verdadeiros monopólios, transformando estes monopólios públicos em verdadeiros monopólios privados, dotados de grande poder e capacidade de controle e dominação na sociedade.

O governo Carlos Salinas de Gortari deu prosseguimento a um incremento da dependência dos Estados Unidos, consolidando um modelo econômico baseada nas chamadas maquiladoras que se transformaram num amplo instrumento de atração de empresas para produção e posterior venda aos parceiros do norte, nesta trajetória os mexicanos se consolidam como meros montadores de mercadorias, onde o incremento de valor agregado inexiste e os ganhos são reduzidos, se limitando a poucos empregos com salários reduzidos e baixa especialização.

O Brasil, também analisado na obra, também passou por situações semelhantes, as medidas liberalizantes adotadas internamente geraram graves constrangimentos para a estrutura industrial, aumentando a competição interna e levando muitos grupos econômicos e financeiros á bancarrota, inclusive setores tradicionais e importantes na história econômica nacional. O grande responsável por esta abertura foi o presidente eleito em 1990, Fernando Collor de Mello, responsável por uma abertura econômica extremamente agressiva, cujos impactos sociais foram desestabilizadores, com incremento da pobreza, da violência e da marginalidade.

Depois de décadas de proteção, a indústria nacional perde os subsídios e as medidas protecionistas são retiradas, como foram medidas adotadas muito rapidamente a liberalização teve impactos econômicos generalizados, aumentando as falências de negócios nacionais, muitas empresas nacionais foram vendidas para grupos estrangeiros, gerando uma forte e acelerada desnacionalização. Estas políticas transformaram o cenário nacional e abriram espaço para produtos mais eficientes e de qualidade superior, a entrada destes produtos levou muitas empresas privadas nacionais a falência, gerando uma forte desindustrialização e perda de relevância deste setor na economia nacional.

As políticas neoliberais serviam a grupos estrangeiros fortes e consolidados, que viam nesta política uma forma de entrar no mercado dos países latino-americano, aumentando sua presença na região, ganhando novos mercados e ganhando musculatura financeira para a concorrência, este movimento foi incentivado pelos países desenvolvidos, pelos grandes conglomerados internacionais e por muitos teóricos associados aos países desenvolvidos, que viam nesta política um estímulo aos investimentos internacionais.

O Brasil adotou muitas destas políticas, a abertura econômica estimulou a entrada de empresas estrangeiras, as privatizações trouxeram investimentos e reestruturação destas empresas, aumento do desemprego e uma contração da renda agregada. As medidas liberalizantes geraram alguns benefícios, mas aumentou a degradação social, o desemprego e a exclusão social, com isso, a sociedade passou a perceber as dificuldades e os entraves na construção de um país mais produtivo, eficiente e com melhores recursos humanos numa sociedade em constantes transformações.

Políticas neoliberais e corrupção apresentam grande correlação, analisando as bases do capitalismo brasileiro, percebemos que o Estado apresenta um poder fundamental na sociedade, as empresas estatais sempre foram responsáveis por investimentos centrais na sociedade, a desestatização fragilizaria os grupos políticos dependentes destas nomeações, que passaram a exigir contrapartidas em troca do apoio ás teses privatizantes, incrementando as negociatas, os compadrios e a corrupção, deixando a mostra como se organiza a sociedade brasileira em benefício daqueles que desperdiçam os recursos públicos, gastando-os de forma ineficiente e faturando com os superfaturamentos e com os aditivos.

No Brasil os casos de corrupção eram frequentes, o presidente Fernando Collor perdeu o cargo com suspeita de corrupção, a implantação de medidas liberalizantes mostrou como os agentes políticos negociavam o dinheiro público e transformavam as negociações políticas, que devem ser saudáveis e necessárias, em um verdadeiro balcão de negócios em prol de interesses especiais organizados e estruturados financeiro e politicamente.

Embora o período analisado no livro compreenda o governo Fernando Collor, os casos de corrupção e malversação dos recursos públicos estão sempre estampando capas de jornais e revistas, gerando apreensão da população e contribuindo para difundir a tese de que todos os políticos são iguais e que a política deve ser descrita como a ciência do roubar e do enganar a população, um engano clamoroso. A política é um instrumento de organização social e de melhoria nas condições de vida da população, os excessos acontecem e devem ser corrigidos e evitados.

A corrupção no período Fernando Collor cresceu de forma acelerada, gerando movimentos intensos na população, levando milhares de pessoas às ruas e criando um movimento intenso e bem-sucedido de repúdio a todas as denúncias de corrupção. Neste período acreditávamos que as manchetes de revistas e jornais não mais retratariam casos tão flagrantes de corrupção, lendo engano, vendo em perspectivas o país passou por mais dois grandes momentos de denúncias de corrupção, o primeiro em 2005/2006 com as investigações do chamado Mensalão e, mais recentemente, os movimentos iniciados com as investigações que ficaram conhecidas como Operação Lava Jato, deste momento percebemos que os movimentos de controle e governança devem ser perseguidos com afinco e determinação, pois estes marginais devem ser combatidos para que a sociedade encontre seu caminho de progresso e desenvolvimento, visando reverter toda esta dívida social criada e mantida desde tempos coloniais e que afeta uma parcela considerável da sociedade brasileira e mexicana.

Atualmente o mundo conta com algumas instituições que se debruçam sobre estudos e pesquisas para investigar o tamanho da corrupção global, os dados são assustadores e envolvem trilhões de dólares, das instituições destacamos a Transparência Internacional, cujas pesquisas são conduzidas em todas as regiões do mundo e suas conclusões nos levam a questionar muitos valores envoltos no chamado capitalismo internacional.

Ao estudar estes dois grandes países da região e perceber que, tanto Brasil quanto o México, apresentam histórico de forte intervenção do Estado na economia e uma cultura baseada em regimes autoritários, descobrimos que o atraso destas sociedades quando comparadas com outros países desenvolvidos está num crescente desperdício dos recursos públicos e no incremento da corrupção, ambas extraindo recursos volumosos destes países, algo em torno de 5% do produto interno bruto, recursos estes necessários e fundamentais para diminuir os abismos existentes entre os grupos sociais, onde uma parcela considerável desta população vive em condições deploráveis e degradantes.

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

Leia mais

Mais Posts

×

Olá!

Entre no grupo de WhatsApp!

× WhatsApp!