Os consumidores estarão mais bem servidos por uma empresa pública ou privada?
Rodrigo Zeidan, Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.
Privatização é meio, não fim. No Brasil, a discussão sobre privatização é quase toda focada na “venda do patrimônio do Estado”. Ainda temos viúvas da Vale reclamando que vendemos a empresa por um valor muito baixo (mesmo que tenha sido um leilão aberto a qualquer grupo de investidores do mundo). Estado não tem como função ter patrimônio. A única coisa que deveria importar é: os consumidores estarão mais bem servidos por uma empresa pública ou privada? Nada mais.
Serviços públicos como água e esgoto, luz e telefonia são normalmente monopólios naturais. Em tais mercados, o ideal para a sociedade é que a entrada de novas empresas seja limitada ou impedida.
Por exemplo, não faz muito sentido que várias empresas possam oferecer redes de eletricidade em uma mesma área: teríamos sobreposição de redes de distribuição nas áreas mais ricas e falta de cabos nas regiões mais carentes. É por isso que tais serviços são regulados: o Estado leiloa o direito de explorar uma região com exclusividade desde que a empresa cumpra com algumas condições, como universalidade ou tetos de preços (ou metas de enterramento de fios).
Nada exemplifica melhor isso que a discussão sobre a privatização da Sabesp. Parte da oposição é sobre se os serviços de saneamento básico devem ser prestados por empresa concessionária sob controle acionário do Estado ou de terceiros. Mas isso é irrelevante. O que importa mesmo são os desenhos dos contratos e as formas de fiscalização das contrapartidas das empresas concessionárias.
Monopólios naturais são tão melhores para a sociedade quanto maior a qualidade da regulação. E esse foi nosso erro, como sociedade, nas últimas décadas. Criamos um arcabouço institucional decente com agências reguladores independentes, mas, ao longo do tempo, a qualidade destas foi caindo. Umas foram aparelhadas, outras capturadas pelas empresas reguladas, e só poucas continuam firme e forte trabalhando para que as empresas concessionárias cumpram seus deveres com a sociedade.
É possível que uma empresa puramente estatal entregue serviços de qualidade com preços baixos?
Sim. É também possível que o mesmo aconteça com empresas privadas, bem reguladas? Também. Mas, grosso modo, há também outras situações possíveis: empresas estatais ineficientes, que também investem menos que deveriam; e empresas privadas mal reguladas, resultando em serviços ineficientes, e, também, subinvestimento. No Brasil, muitas vezes escolhemos os dois piores modelos. Todavia, outra realidade é possível. Nós já privatizamos bem: as empresas de telefonia, em um primeiro momento, investiram sem parar na universalização de serviços, acabando com as filas por linhas de telefone, que eram patrimônio a ser lançado no Imposto de Renda.
No caso da Sabesp, a discussão não pode ser se seus controladores devem ser públicos ou privados.
Se a empresa investe pouco e entrega serviços ruins, o modelo deve ser modificado. Privatizar não é a única saída, mas pode funcionar (ganha um doce quem apresentar um plano de investimentos para a empresa com dinheiro público que tenha chance de ser eficiente dada a realidade da empresa hoje). A discussão deve ser: no processo de privatização, a regulação está sendo planejada de forma eficiente? É mais fácil fazer isso que colocar dinheiro público na empresa. Mas não é garantia de dar certo.
Mais uma vez, detalhes importam. Sempre.