As políticas públicas são instrumentos fundamentais para melhorarmos os indicadores econômicos, sociais e políticos, garantindo a sobrevivência digna para todos os cidadãos, aumentando as oportunidades de trabalho e de desenvolvimento e contribuindo para que possamos sonhar com um futuro melhor, mais decente e com oportunidades crescentes, mesmo percebendo que vivemos numa sociedade que cultiva as incertezas, as instabilidades e as volatilidades.
Neste cenário, no final dos anos oitenta, surge na sociedade brasileira um projeto ambicioso e dotado de grande potencial humanístico, neste momento nasce o Sistema Único de Saúde (SUS), centrado em princípios como a equidade, a universalidade, a integralidade, a descentralização e o controle social. Esta política pública tem como princípio basilar a universalização do acesso às ações e serviços de saúde, garantindo que todos os cidadãos tenham direito a serviços de saúde, sem privilégios ou exclusões e sejam atendidos conforme suas necessidades, de forma resolutiva, considerando-se ainda as necessidades coletivas. O surgimento do SUS pode ser visto como um marco fundamental de civilidade e de humanismo, afinal, fomos o primeiro e único país do mundo, com mais de 100 milhões de pessoas, que garantiu saúde universal para todos os seus concidadãos.
A criação do Sistema Único de Saúde (SUS) fez com que a saúde se transformasse num direito de todos os cidadãos, exigindo da sociedade a criação de instrumentos financeiros para financiar esta política pública, extraindo impostos da coletividade visando garantir que este direito fundamental seja uma prioridade nacional, universalizando os serviços de saúde, melhorando os indicadores sanitários e para o incremento da produtividade da mão de obra.
Antes do surgimento do SUS, apenas pessoas com vínculos formais de trabalho (carteira assinada) ou que estavam vinculados à previdência social poderiam dispor dos serviços públicos de saúde. As demais pessoas deveriam pagar pelos serviços privados ou contariam com a assistência médica de instituições filantrópicas, que não conseguiam atender o grande contingente de pessoas nesta condição, com isso, as condições sanitárias eram sofríveis e preocupantes.
A criação do SUS deve ser vista como uma medida ousada e visionária, desde então o sistema carece de recursos financeiros para garantir que os princípios criados nesta política pública sejam efetivados, com isso, percebemos as dificuldades de subfinanciamento e as deficiências de gestão de recursos, gerando críticas e descontentamento de uma parcela significativa da comunidade, mesmo sabendo que poucos cidadãos conhecem a importância e a centralidade desta política pública para melhorar os indicadores sociais e as condições de sobrevivência da população.
Vivemos um momento de grandes desafios, marcados pela pós-pandemia, por deficiências sanitárias que remontam a séculos, o incremento de doenças infecciosas, como a tuberculose, a sífilis e a varíola, aliadas ao envelhecimento da população nacional, o câncer e as doenças cardiovasculares, além de transtornos mentais, psicológicos e emocionais, além das demandas geradas pela pandemia, com isso, percebemos que estamos vivendo um momento de grandes reflexões sobre o modelo de saúde pública e um momento de fazermos escolhas fundamentais que exijam uma nova estrutura tributária, novas formas de gestão e de financiamento para fortalecermos o bem-estar da população.
O Sistema Único de Saúde (SUS) deve ser visto como uma política pública exitosa e de grande potencial humanístico, mas ao mesmo tempo retrata uma sociedade bipolar e fortemente desigual, marcada por grandes avanços científicos e tecnológicos na área da saúde e, ao mesmo tempo, centrada no atraso, no desperdício, na ganância e nas deficiências do saneamento básico. O Sistema Único de Saúde é um retrato verdadeiro do Brasil.
Ary Ramos da Silva Júnior, Bacharel em Ciências Econômicas e Administração, Especialista em Economia Comportamental, Mestre, Doutor em Sociologia e professor universitário. Artigo publicado no jornal Diário da Região, Caderno Economia, 21/09/2022.