A pandemia está gerando grandes transformações na sociedade mundial, deixando claro as deficiências das nações desenvolvidas, mostrando fraturas sociais elevadas, desigualdades obscuras, elevada concentração de renda, fragilidades institucionais, pobrezas generalizadas, conflitos sociais crescentes e a necessidade de construirmos uma nova agenda econômica.
Neste ambiente de instabilidades e incertezas, percebemos a chegada de novas variantes do vírus, com impactos variados para a economia global, exigindo a construção de estratégias conjuntas para combater esse inimigo externo. Não podemos aceitar que numa região do mundo, grande parte da população esteja vacinada e, numa outra, poucos indivíduos estejam imunizados. Neste cenário, as desigualdades se mostram mais nítidas e colocam em risco toda a comunidade global, podendo surgir variações do vírus, mais letais, mais preocupantes e mais assustadoras.
Neste ambiente, percebemos o surgimento de novos ventos econômicos nos países desenvolvidos, com impactos generalizados para toda a comunidade internacional. Instituições multilaterais que sempre pregaram a contração de gastos públicos, a redução das intervenções estatais e as desestatizações, estão defendendo novos preceitos econômicos, incentivando os gastos públicos e novas formas de intervenções públicas na economia, uma verdadeira revolução no pensamento econômico.
A pandemia está gerando novos consensos nos países desenvolvidos, a Europa está injetando trilhões de euros para estimular suas estruturas produtivas, alavancando os investimentos em ciência e tecnologia e retomando proteção de setores considerados estratégicos para o futuro da Europa. Nos Estados Unidos, vistos por muitos como um dos centros do liberalismo econômico, o Estado Nacional está despejando trilhões de dólares na economia para investimentos em variadas áreas, desde gastos em infraestrutura, segurança, educação, ciência, tecnologia, pesquisas científicas, dentre outras, visando recuperar o terreno perdido pela concorrência dos países asiáticos que passaram a dominar setores estratégicos e ganharam espaços de empresas norte-americana, gerando conflitos e ressentimentos geopolíticos.
Os ventos intervencionistas cresceram rapidamente nos países asiáticos e contribuíram para reconfigurar as economias da região, auxiliando na transformação das estruturas produtivas, passando de países importadores de tecnologias e exportadores de produtos de baixo valor agregado e, na atualidade, a região se tornou exportadora de produtos de alta tecnologia, com fortes investimentos em ciência e tecnologia, liderança em setores estratégicos, investimentos sólidos em educação que garantiram espaços na economia internacional, gerando constrangimentos com as economias ocidentais e conflitos abertos pela busca da hegemonia global.
Neste momento, percebemos que um dos setores mais estratégicos da economia do século XXI é aquela vinculada à indústria dos chamados semicondutores, ou popularmente chamada indústria dos chips, cuja liderança é exercida pelos Estados Unidos e seguida por países asiáticos, como Taiwan, China e Coréia do Sul. Estes países investem trilhões de dólares liderados pelos seus Estados Nacionais para ganhar a concorrência nestes setores de alta tecnologia, são investimentos de altíssimo risco e grandes incertezas, demandam riscos que prescindem dos investimentos governamentais.
Depois que os investimentos forem maturados, as incertezas e os riscos forem reduzidos, as empresas privadas passam a fazer novos investimentos, angariando novos lucros e retornos crescentes e, desde então, passam a esquecer a centralidade e a importância do Estado.
Neste ambiente, percebemos conflitos crescentes entre os Estados Nacionais para defenderem suas estruturas produtivas, a geração de novos empregos qualificados, fortalecendo suas vendas externas/internas e maiores retornos para sua sociedade, gerando riqueza e bem-estar social. O enriquecimento das nações só foi possível graças a uma estratégia conjunta entre Estados e Mercados na reconfiguração da estrutura produtiva, enquanto isso, no Brasil, o governo está fechando a Ceitec, a única empresa brasileira produtora de chips na América Latina. Que pena, aqui os ventos externos demoram para chegar!
Ary Ramos da Silva Júnior, Economista, Administrador, Mestre, Doutor em Sociologia e professor universitário. Artigo publicado no Jornal Diário da Região, Caderno Economia, 05/01/2022.