Oração e socorro no mundo espiritual

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A sociedade vem passando por momentos de grandes instabilidades e incertezas em decorrência da pandemia, cujos impactos diretos e indiretos estão levando ao óbito milhares de pessoas nas mais variadas regiões e países. Neste momento, as perspectivas de morte estão mais próximas para as pessoas, levando as pessoas ao medo, desesperanças e desequilíbrios, gerando desajustes emocionais, espirituais e psicológicos.

A morte sempre foi um dos maiores tabus para os indivíduos, com a pandemia que crassa a sociedade mundial, as pessoas passam a expor suas preocupações, seus maiores desequilíbrios e suas dificuldades mais íntimas, gerando ambientes pesados, marcados pelas instabilidades espirituais, abrindo espaços para desagregações familiares, emotivas, afetivas e sentimentais no cotidiano.

Com a pandemia percebemos rachaduras emocionais enormes, as pessoas estão mostrando suas carências psicológicas e suas desesperanças, com isso, desnudando os desequilíbrios financeiros, os medos das incertezas do futuro, os receios da violência e as esperanças perdidas, incrementando as depressões e as ansiedades que, nos momentos de desesperos crescentes, gerando incrementos de suicídios e mutilações físicas e emocionais.

A crise sanitária está gerando um aprofundamento da recessão e do desemprego, gerando uma grande leva de trabalhadores sem emprego e, principalmente, sem esperanças. O futuro que sempre foi percebido com expectativas positivas, afinal sempre fomos percebidos, pela comunidade internacional, como o país do futuro, estamos acordando de uma realidade assustadora, óbitos vitimados pela pandemia em ascensão, crise econômica e depressão, ansiedade e, em muitos casos, aumento substancial de suicídio.

Neste momento, os relatos enviados do mundo espiritual nos assustam, a quantidade de indivíduos vitimados pelo coronavírus é tão elevado que os trabalhadores do mundo espiritual não conseguem atender a todos os desencarnados, levando os socorristas no mundo espiritual a estimularem aos desencarnados ao sono, estimulando-os a dormirem, levando-os a uma soneca reparadora. Os espíritos do bem atuam na proteção dos desencarnados, transmitindo energias no momento do descanso, evitando os desequilíbrios emocionais e espirituais daqueles que chegaram “inesperadamente”, dando mostras claras de degradações emocionais e fragilidades espirituais. A atuação destes espíritos socorristas do mundo espiritual é fundamental para o reequilíbrio dos desencarnados, sem estes, os indivíduos estariam sujeitos a grandes desequilíbrios.

A pandemia está gerando impactos para todos as regiões, desde o mundo material até o mundo espiritual. Neste momento, a atuação dos espíritos socorristas é fundamental, como nos foi mostrado no clássico livro Nosso Lar, psicografia de Francisco Cândido Xavier e ditado pelo espírito André Luiz, onde se descreve a atuação dos espíritos na chegada dos irmãos no mundo dos espíritos, as dificuldades, os medos, os remorsos e as preocupações dos dois lados do mundo.

Neste instante de grandes transformações geradas pela pandemia em curso na sociedade, percebemos que os indivíduos estão sendo estimulados, pela espiritualidade maior, a rever conceitos arraigados, conceitos e comportamentos das pessoas individualmente ou nas atuações coletivas, levando-os a repensar os seus conceitos, suas atitudes e suas formas de atuação. A pandemia, para muitos, era é um castigo enviado pelos deuses como forma de depurar a sociedade. Esta reflexão nos parece muito limitada, a pandemia é fruto das escolhas dos seres humanos, das ambições materiais, os imediatismos reinantes e a constante busca pelos prazeres da matéria. Neste momento, a pandemia nos deixa claro que, somos muito menores do que muitos acreditamos, somos muitos limitados na compreensão das ideias que comandam a sociedade, num momento que somos levados a rever conceitos que se concentram na concorrência e deve ser substituído pelos conceitos de cooperação, mais cooperação e menos competição.

Neste momento precisamos nos preparar para as mudanças que estão em curso na sociedade global, não as alterações individuais como as coletivas, não esquecendo a importância da oração, da caridade e da comunhão com a espiritualidade maior, lembrando dos ensinamentos trazidos pela literatura espiritual, onde destacamos uma conversa entre Chico Xavier com seu mentor espiritual Emmanuel:
“Certa vez Chico Xavier em desdobramento, numa visita ao Plano Espiritual com Emmanuel, viu milhões de bolinhas coloridas, nas mais diversas cores subindo e perguntou a Emmanuel:
– O que é esta maravilha Emmanuel?
– São as Vibrações de Amor de milhões de encarnados que estão realizando Preces e Vibrando
Amor por todos os necessitados.

Chico responde:
– Sempre pensei que as vibrações viessem do Plano Espiritual para os encarnados!
Emmanuel: – Não Chico, onde houver alguém ligado em preces, manda pra cá as vibrações de Amor que são armazenadas em jarros especiais para beneficiarem aos irmãos necessitados que chegam ao Plano Maior em difíceis condições, e também são direcionadas aos nossos irmãos encarnados que passam por provações”.

O mundo passa por momentos de apreensão e desesperança, neste momento e em todos os momentos da sociedade, percebemos a importância e a centralidade da oração, como nos mostra a conversa acima entre Chico Xavier e o mentor Emmanuel, a oração é um verdadeiro bálsamo de fortalecimento de todos instantes da vida dos seres humanos, um momento de agradecimento, de humildade, de reflexão e fortalecimento para superarmos os embates cotidianos, nos capacitando para superar a pandemia, a desesperança e do desânimo, lembrando que como nos diz o ditado popular, depois da tempestade vem a bonança.

Pós-pandemia é melhor momento para atacar desigualdade, diz economista de Oxford

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Para Diego Sánchez-Ancochea, países devem buscar políticas redistributivas mais ambiciosas e avançar em reformas tributárias

DOUGLAS GAVRAS – FOLHA DE SÃO PAULO, 15/07/2021

A recuperação dos países após a debacle causada pela pandemia do novo coronavírus tem ocorrido de maneira desigual ao redor do mundo e já há estudos mostrando que um dos efeitos da crise sanitária é o aumento da concentração de renda em diferentes países.

Uma reportagem recente da Folha, baseada em um levantamento anual do banco Credit Suisse, apontou que o 1% no topo da pirâmide brasileira aumentou sua renda durante a pandemia e já concentra mais da metade dos recursos do país. Na comparação com outros países, o Brasil só concentrava menos renda que a Rússia.

Para Diego Sánchez-Ancochea, que é chefe do Departamento de Desenvolvimento Internacional da Universidade de Oxford (Reino Unido), no entanto, as medidas econômicas que precisam ser adotadas para a recuperação global podem ser uma oportunidade única para atacar a desigualdade e mesmo países com um histórico de péssima distribuição de renda e endividamento elevado, como o Brasil, não devem adiar o combate ao problema.

O economista espanhol avalia que todos os países podem buscar mais espaço para desenvolver políticas redistributivas mais ambiciosas e avançar com reformas fiscais que permitam aumentar a arrecadação.
“Em países da América Latina, como o Brasil, a tímida recuperação ainda não foi acompanhada por uma melhora significativa no mercado de trabalho formal”, diz Sánchez-Ancochea, autor de “The Costs of inequality in Latin American”: Lessons and Warnings for the Rest of the World (Os custos da desigualdade na América Latina: lições e advertências para o resto do mundo), livro em que discute o aumento da desigualdade nos países ricos e como as políticas adotadas por eles tornaram-se cada vez mais semelhantes às da América Latina.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

A pandemia acabou ajudando a concentrar renda em vários países, entre eles o Brasil. Os ricos conseguem ficar ainda mais ricos mesmo em momentos trágicos? Na verdade, a pandemia parece ter aumentado a concentração de renda e riqueza nos mais ricos por diferentes razões. Em primeiro lugar, esses grupos são proprietários (ou pelo menos têm investimentos) em grandes empresas que, em geral, se adaptaram melhor às políticas de distanciamento social. Além disso, em muitos países, eles se beneficiaram do apoio do Estado por meio de vários incentivos e ajuda fiscal. Em segundo lugar, no último ano, os índices do mercado de ações aumentaram exponencialmente (especialmente nos Estados Unidos), ajudando a acelerar a concentração da riqueza. Além disso, aprendemos que profissionais e outros setores de alta renda podem se adaptar e até se beneficiar da economia digital e do trabalho remoto, algo que muitos outros trabalhadores não têm condições de fazer.

Os países mais pobres e endividados terão ainda mais dificuldade em reduzir a desigualdade após a pandemia? Acredito que sim. De fato, para muitos países de baixa renda será ainda mais difícil adotar programas sociais que favoreçam uma redistribuição progressiva da renda. Eles simplesmente não têm a capacidade que países como os Estados Unidos têm de tomar empréstimos e criar programas nesse sentido. No entanto, também é importante reconhecer que todos os países podem buscar mais espaço para desenvolver políticas redistributivas mais ambiciosas.

O Brasil começa a discutir uma proposta de reforma tributária que também mexe no Imposto de Renda de pessoas físicas e fala de tributação de dividendos. O momento é favorável para fazer esse tipo de discussão? Sim. Na verdade, creio que este é o melhor momento de tentar avançar com reformas fiscais que permitam aumentar a arrecadação e fazê-lo, sobretudo, com o imposto de renda das pessoas físicas e até a formulação de novos impostos sobre o patrimônio.

O Brasil teve um bom desempenho em termos de PIB (Produto Interno Bruto) no início deste ano, mas a maioria da população ainda não sente essa melhora. O que estamos fazendo de errado? Devemos estar cientes de que a pandemia ainda não acabou e muitas famílias continuam sofrendo suas consequências. No último ano, diversos pequenos negócios tiveram de fechar as portas e muitas famílias gastaram todas as suas economias para se manter durante a pandemia.

Além disso, em muitos países da América Latina, como o Brasil, a tímida recuperação ainda não foi acompanhada por uma melhora significativa no mercado de trabalho formal.

Como reverter essa situação, para alcançarmos uma recuperação menos desigual? Acho que é o momento de pensar em como aumentar a arrecadação tributária no longo prazo, como dar continuidade às políticas de transferência que foram adotadas em 2020, (mas não tiveram a continuidade que alguns de nós esperávamos, e também buscar caminhos para impulsionar o mercado de trabalho.

Como fazer para que uma família que saiu da pobreza pode manter o padrão de vida melhor e não perder o que conquistou? Essa é uma questão fundamental! Da mesma forma que agora está sendo discutido nos Estados Unidos, precisamos desenvolver um novo modelo econômico focado na proteção da ampla classe média e na redução da pobreza.

Para isso, é importante, por um lado, desenvolver políticas macroeconômicas anticíclicas que ajudem a estabilizar a economia. Quanto mais brandas forem as crises econômicas, melhor para os grupos mais vulneráveis.

Em segundo lugar, precisamos de políticas sociais que protejam os indivíduos de choques (por exemplo, por meio de transferências de renda) e, ao mesmo tempo, permitam que melhorem seu nível educacional. Lá no futuro será importante aprofundar a educação pré-escolar. Por último, é importante apoiar o setor de trabalhadores informais e tentar aumentar o emprego de carteira assinada, um dos grandes sucessos da primeira década dos anos 2000 no Brasil e em outras partes da América Latina.

Essas medidas ficaram mais difíceis de serem implementadas após a pandemia? Claro, estou ciente de que esta é uma agenda muito ambiciosa e que não será adotada da noite para o dia. Mas, esperançosamente, é a aspiração de todos os governos e pode progredir pouco a pouco nessa direção. Caso contrário, enfrentaremos mais instabilidade política e social na região.

O atual governo brasileiro foi eleito com discurso neoliberal. Essa receita da Escola de Chicago ainda faz sentido no mundo hoje? Acho que há um consenso crescente de que a receita neoliberal não é a solução para promover o desenvolvimento. Todos os países mais bem-sucedidos foram vitoriosos devido à sua capacidade de desenvolver uma economia mista, com uma relação mais construtiva entre os setores público e privado.

Se pensarmos na posição recente do FMI [Fundo Monetário Internacional] ou do Banco Mundial ou nas propostas da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico] ou do governo Biden, nos EUA, vemos que cada vez mais atores estão propondo políticas de Estado mais ativas em áreas como política industrial, política social e política redistributiva. O grande desafio do desenvolvimento não é reduzir o papel do Estado, mas ter um Estado mais eficiente, ativo e com uma relação mais construtiva com o setor privado.

O mundo tende a se preocupar em reduzir a desigualdade após a pandemia ou esse é um desejo irreal? No plano internacional, sem dúvida, acredito que mais atenção será dada à desigualdade como um problema com graves custos sociais, econômicos e políticos, como mostrei em meu recente livro The Costs of Inequality in Latin America [Os Custos da Desigualdade na América Latina]. Porém, no que cabe a cada país, tudo dependerá da capacidade das sociedades de gerar novos consensos sociais e novas alianças pró-redistributivas. O problema é que, se isso não acontecer, as chances de aumentar o descontentamento e a polarização social são muito grandes.

RAIO-X
Diego Sánchez-Ancochea, 46
Nasceu em Madri, na Espanha. É economista, tendo estudado na Universidade Complutense de Madri, na New School for Social Research (em Nova York) e Universidade de Oxford, no Reino Unido, onde é chefe do Departamento de Desenvolvimento Internacional. É autor de “The Costs of Inequality in Latin America” (Os Custos da Desigualdade na América Latina).

Apagão da mão de obra

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Neste momento de pandemia, marcados por grandes instabilidades econômicas, crise sanitária e constantes desequilíbrios políticos, percebemos que a recuperação da economia, fundamental para o retorno do sistema produtivo, tende a prescindir de mão de obra capacitada para alavancar a economia e retomar os investimentos produtivos, sem capital humano especializado as dificuldades da retomada tendem a se limitar a poucos setores, gerando espaços de crescimento com pouco emprego, aprofundando as gigantescas desigualdades sociais.

A sociedade precisa criar instrumentos para estimular os setores educacionais para formar mão de obra capacitada, qualificando os trabalhadores e construindo ambientes de ensino e aprendizagem, num ambiente de constantes transformações, de forte concorrência, de informações crescentes, prescindindo de um sistema educacional consolidado, profissionais capacitados e empresas em condições de formar cidadãos críticos, metodologias modernas e fortemente competitivas.

A pandemia está acelerando os desafios para a sociedade, todos os setores estão sentindo os impactos deste fenômeno, exigindo atitudes organizadas e concatenadas, onde o planejamento e as estratégias são fundamentais, exigindo dos setores púbico e privado, instrumentos efetivos e imediatos para que o país consiga pensar os momentos pós-pandemia e adotar políticas planejadas. Dentre os setores mais estratégicos na economia contemporânea, não devemos relegar os setores educacionais, criando instrumentos de financiamentos, coordenação entre os setores e a construção de metodologias que motivem os estudantes e os profissionais, fomentando o dinamismo dos espíritos empreendedores, elementos centrais neste momento de incertezas e instabilidades generalizadas.

Os índices de desemprego são preocupantes, estamos falando em mais de 20 milhões de desempregados e desalentados, cujos impactos sociais e econômicos são elevados e degradantes, com estes números, percebemos que o potencial de geração de riqueza é elevado, mas subocupado, gerando desperdício elevado para a sociedade. Uma grande contradição brasileira, estamos vivendo desemprego e subempregado crescentes e, ao mesmo tempo, carência de mão de obra capacitada, profissionais qualificados para compreender os desafios do mundo contemporâneo.

O mundo do trabalho está passando por um período de reconfiguração, marcados pela automação, pela inteligência artificial e pela quarta revolução industrial. Estes trabalhadores estão em falta na sociedade brasileira, diante disso, os grupos econômicos e políticos precisam criar instrumentos de capacitação do capital humano, para isso, faz-se necessário a junção de todas as forças ativas da sociedade, unindo universidades públicas e privadas, centros de pesquisas, o sistema S (Senai, Senac, Sebrae, dentre outros), secretarias de educação, ministério da educação, dentre outros. O esforço deve ser costurado visando auxiliar na recuperação da economia, motivando a melhora do ambiente dos países desenvolvidos, estimulando investimentos, gerando empregos e dinamizando os setores produtivos.

Sem crescimento econômico, baixa confiança dos setores produtivos, percebemos a fuga de cérebro, profissionais altamente capacitados estão deixando o país em busca de oportunidades de trabalho e desenvolvimento profissional, desta forma, sem planejamento e organização dos setores educacionais, o país rifa o futuro e deixa de angariar novos espaços de crescimento econômico, deixando, mais uma vez, oportunidade de surfar neste ambiente externo favorável que se avizinha.

Vivemos um momento preocupante, anteriormente éramos vistos com um futuro respeitável e admirado pela comunidade internacional, atualmente estamos se degradando a olhos vistos, neste momento de degradação, muitos jovens e adolescentes estão buscando novas paradas, deixando famílias em busca de novos horizontes, de novas oportunidades profissionais, ascensão social e melhores condições de vida. Vivemos na era da informação e do conhecimento, neste momento o ativo mais importante da sociedade contemporânea é o capital humano, sem melhorarmos a formação dos cidadãos seremos relegados ao subdesenvolvimento e a dependência eterna.

Ary Ramos da Silva Júnior, Economista, Mestre, Doutor em Sociologia/Unesp e professor universitário. Artigo publicado no Jornal Diário da Região, Caderno Economia, 14/07/2021.

Economia global tem rachaduras após a covid-19

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O crescimento está voltando rapidamente em todo o mundo após a pandemia, mas há problemas abaixo da superfície

The Economist, O Estado de S. Paulo – 11 de julho de 2021

A pandemia provocou uma terrível recessão econômica, mas, agora, um estranho e empolgante boom econômico ocorre a todo vapor. O preço do petróleo disparou e restaurantes e empresas de transporte estão tendo de lutar e agradar para recrutar funcionários. Enquanto empresas listadas sinalizam que os lucros atingirão recordes neste ano, os mercados de ações estão em alta. Um índice produzido pela JPMorgan Chase e IHS Markit sugere que o crescimento global está em seu ponto mais alto desde os grandiosos dias de 2006.

Qualquer saída da covid-19 é motivo de comemoração. Mas a economia em expansão de hoje também é uma fonte de ansiedade, porque três rachaduras estão abaixo da superfície. Juntas, elas determinarão quem prosperará e se a recuperação mais incomum de que se tem lembrança conseguirá ser mantida.

A primeira divide os vacinados dos não vacinados. Apenas aqueles países que estão recebendo vacinas em seus braços serão capazes de controlar a covid-19. Essa é a condição para que lojas, bares e escritórios reabram permanentemente, e os consumidores e trabalhadores tenham confiança para sair de casa. Mas apenas uma a cada quatro pessoas no mundo tomou a primeira dose de vacina e apenas uma a cada oito está completamente imunizada. Mesmo nos Estados Unidos alguns Estados com poucas pessoas são vulneráveis à infecciosa variante Delta do vírus.

A segunda está entre a oferta e a demanda. A escassez de microchips interrompeu a fabricação de eletrônicos e carros justamente quando os consumidores mais os queriam. O custo do envio de mercadorias da China para os portos da costa oeste dos EUA quadruplicou em relação ao seu nível antes da pandemia.

E mesmo à medida que esses gargalos são desbloqueados, as economias recém-abertas criarão novos desequilíbrios. Em alguns países, as pessoas parecem mais dispostas a sair para tomar algo do que para trabalhar atrás do balcão, causando uma escassez estrutural de mão de obra no setor de serviços. Os preços das casas dispararam, sugerindo que os aluguéis também começarão a subir em breve. Isso poderia sustentar a inflação e intensificar a sensação de que a habitação está cara demais.

A última rachadura é em relação à retirada de incentivos. Em algum momento, as intervenções estatais que começaram no ano passado devem ser revertidas. Os bancos centrais do mundo rico compraram ativos no valor de mais de US$ 10 trilhões desde o início da pandemia e estão nervosamente considerando como se libertar sem causar desespero nos mercados de capitais por um aperto rápido demais. A China, cuja economia não encolheu em 2020, dá um sinal do que está por vir: o país apertou a política de crédito neste ano, desacelerando seu crescimento.

Enquanto isso, os esquemas de ajuda emergencial do governo, como complementos de seguros-desemprego e moratórias de despejo estão começando a expirar. É improvável que as famílias recebam uma nova injeção de incentivos em 2022. Os déficits se contrairão em vez de expandir, puxando para baixo o crescimento. Até agora, as economias têm evitado em grande parte uma onda de falências, mas ninguém sabe quão bem as empresas vão lidar com isso quando os empréstimos
de emergência vencerem e os trabalhadores não forem mais capazes de ficar de licença às custas dos contribuintes.

Você talvez ache que um evento tão extremo como uma pandemia, combinado com a resposta sem precedentes do governo a ele, em algum momento, desencadearia uma reação econômica global igualmente extrema. Os pessimistas se preocupam com um retorno à inflação ao estilo dos anos 1970, ou um colapso financeiro, ou que a energia subjacente do capitalismo seja drenada por esmolas do Estado. Tais resultados apocalípticos são possíveis, mas não são prováveis.

Em vez disso, uma maneira melhor de pensar a respeito do prognóstico incomum é examinar como as três linhas interagem de modo diferente em diferentes economias.

Comece com os Estados Unidos. Com vacinas abundantes e enormes incentivos, o país corre o maior risco de superaquecimento. Nos últimos meses, a inflação alcançou níveis não vistos desde o início dos anos 1980. Seu mercado de trabalho está sob pressão à medida que a atividade econômica muda. Mesmo depois de um crescimento de 850 mil novas vagas de emprego em junho e levando em consideração as vagas em abundância, o número de pessoas trabalhando com lazer e hotelaria é 12% menor do que antes da pandemia. Os trabalhadores estão relutantes em retornar ao setor, o que fez com que os salários aumentassem.

O pagamento por hora está quase 8% maior do que em fevereiro de 2020. Talvez eles voltem quando os benefícios do seguro-desemprego de emergência expirarem em setembro. Mas os países sem tais esquemas de ajuda, como a Austrália, também estão vendo uma escassez de mão de obra. As atitudes em relação ao trabalho podem estar mudando na base do espectro de renda, entre garçons e faxineiros, não apenas entre os profissionais com grandes salários que sonham com iates e anos sabáticos.

Os países de renda baixa e média estão em uma situação difícil. Eles deveriam estar se beneficiando pelo aumento da demanda global por commodities e bens industriais, mas estão passando por dificuldades. A Indonésia, lutando contra outra onda de covid-19, está transferindo oxigênio da indústria para os hospitais. Em 2021, prevê-se que os países mais pobres, que estão desesperadamente com escassez de vacinas, crescerão mais lentamente que os países ricos, pela terceira vez apenas em 25 anos.

Mesmo com a covid-19 enfraquecendo suas recuperações, os mercados emergentes enfrentam a possibilidade de taxas de juros mais altas no Fed. Isso tende a pressionar para baixo suas moedas à medida que os investidores compram dólares, aumentando o risco de instabilidade financeira. Seus bancos centrais não podem se dar ao luxo de ignorar a inflação temporária ou importada. Brasil, México e Rússia aumentaram as taxas de juros recentemente, e mais lugares podem fazer o mesmo. A combinação de vacinação tarde demais e aperto cedo demais será dolorosa.

O ciclo econômico tem sido frenético, deixando a recessão para trás em apenas um ano. Talvez no verão do Hemisfério Norte de 2022 a maioria das pessoas esteja vacinada, os negócios tenham se adaptado aos novos padrões de demanda e os incentivos estejam sendo relaxados de maneira organizada. Nesse estranho boom, entretanto, cuidado com as rachaduras.

TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

A OCDE e os desafios da educação brasileira, por Claudia Costin

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Relatório enfatiza as profundas desigualdades educacionais que vivemos

Claudia Costin Diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais, da FGV, e ex-diretora de educação do Banco Mundial.

Folha de São Paulo, 08/07/2021

Foi lançado, há poucos dias, um relatório da OCDE, em parceria com o Todos pela Educação e o Sonho Grande, sobre os desafios atuais da educação brasileira. Com o título “A Educação no Brasil, uma Perspectiva Internacional”, o texto analisa o contexto geral da educação brasileira no período imediatamente anterior à pandemia, os impactos do prolongado fechamento das escolas e a resposta educacional à Covid, finalizando com algumas recomendações para assegurar uma aprendizagem de qualidade para todos.

Ao apresentar as características da educação brasileira, o texto chama atenção para o incrível avanço no acesso à escola que o Brasil viveu desde a Constituição de 1988, o que permitiu ao país ampliar a escolaridade média de sua população e, portanto, melhorar a qualificação da sua força de trabalho, o que é vital para o momento que vive a economia mundial.

Para isso, melhorias no financiamento da educação foram essenciais e foi importante, mais recentemente, torná-lo permanente e mais redistributivo. Mas não é suficiente estar na escola e ali permanecer por mais anos. É fundamental garantir que crianças e jovens aprendam o que é relevante em cada etapa de escolaridade e desenvolvam competências não só para o trabalho, mas para a vida em sociedade. E aí o problema ganha uma dimensão muito maior.
Vivemos uma crise de aprendizagem, com a maioria dos alunos com grandes dificuldades para ler e interpretar textos um pouco mais sofisticados, o que demanda um repertório cultural mais amplo, raciocinar matematicamente ou pensar cientificamente.

O relatório enfatiza as profundas desigualdades educacionais que vivemos, expressas não só em exames internacionais, como o Pisa, como no próprio acesso a diferentes etapas de escolaridade e na permanência em instituições escolares. São os que mais precisam do efeito escola e os que têm menos apoio para assegurar a tão necessária aprendizagem que acabam abandonando os estudos.

Da mesma maneira, a pandemia e sua inadequada gestão afetaram mais a aprendizagem e a permanência justamente dos mais vulneráveis, que não contam com conectividade, equipamentos e presença de adultos para organizar o ambiente de estudo dos pequenos. Mesmo com todo empenho de professores para oferecer outros meios de aprendizagem, as perdas decorrentes do fechamento das escolas foram imensas.

As saídas? A OCDE aponta dez, e destaco aqui algumas: proteger os gastos em educação, apoiar os mais pobres desde cedo, oferecer reforço escolar sólido e tornar a carreira docente altamente qualificada e atrativa, melhorando as práticas de ensino.

Vergonha nacional

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Estamos vivendo um momento de grandes instabilidades, além da crise sanitária e da crise econômica, o país está sentindo as bases de outra crise, a política. As revelações da CPI da Covid estão mostrando os equívocos da gestão do Executivo.

Neste ambiente, as taxas de câmbio começam a assombrar a sociedade e impactando sobre os indicadores econômicos, afastando a recuperação da economia em V, uma mentira difundida pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes.

Neste ambiente, os dados vergonhosos divulgados pela Receita Federal nos trazem novos elementos importantes para a discussão, onde vinte mil cidadãos que auferiram mais de R$ 230 bilhões de renda no ano passado deixaram de pagar tributos, ou seja, estes indivíduos não pagaram nada de imposto de renda.

Diante disso, percebemos muitos indivíduos equivocados defendem o “excesso” de pagamentos de tributos no país, na verdade esta narrativa é errada, quem realmente paga imposto no Brasil? Os dados são precisos e necessitamos incrementar as discussões de como financiar os gastos excessivos gerados pela pandemia.

Muitos empresários rechaçam os incrementos da tributação, defendendo que serão afetados pelo aumento dos tributos, um equívoco generalizado. Esses grupos que se acreditam ser classe alta, na verdade são verdadeiros indivíduos de classe média, defendem uma bandeira que não é sua, são verdadeiros iludidos e alienados, precisam estudar e refletir sobre as bases da desigualdade do país, que tem na questão tributária desigual, uma das causas da concentração de renda.

Os grandes donos do capital são aqueles que auferem bilhões e bilhões de reais, estes sim seriam os verdadeiros que deveriam ser tributados, como forma de justiça fiscal e instrumento de diminuir o fosso entre os grupos sociais, sem eles não seremos elevados a patamares mais altos de civilização… Reflitamos.

Ary Ramos da Silva Júnior, Economista, Mestre, Doutor em Sociologia e professor universitário.

A grande mentira, por Antônio Prata.

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O sistema imunológico da democracia foi minado por ela mesma

Antonio Prata Escritor e roteirista, autor de “Nu, de Botas”.

Folha de São Paulo, 03;07/2021

Na revista piauí de junho, Roberto Andrés discute o ousado pontapé inicial do governo Biden. O presidente americano irá injetar trilhões de dólares na economia, estendendo o cobertor do bem-estar social e investindo pesado para reduzir emissões de carbono. O cavalo de pau foi dado, entre outras razões, pela constatação de que o trumpismo e demais arroubos antidemocráticos mundo afora só foram possíveis pois o discurso das democracias liberais estava fazendo água havia tempo.

Como as pessoas podem acreditar que a terra é plana? Como podem acreditar que a vacina vai instalar um chip em seus corpos? Como puderam acreditar nas mentiras do Trump e seguem acreditando nas do Bolsonaro, do Qanon, do Olavo de Carvalho? Bem, tanto nos EUA quanto no Brasil essas pessoas passaram décadas crendo numa mentira não menos gigante: que as democracias liberais, este nosso mundo com eleições, Netflix, cartão de crédito, Peppa Pig, politicamente correto, cross-fit, Carteira de Trabalho, McFlurry, habeas corpus, Fuvest e afins iria melhorar suas vidas, garantir seus direitos básicos e introduzi-las numa sociedade justa, onde todos teriam as mesmas oportunidades. Balela.

No longevo reinado de quase meio seculo do neoliberalismo, enquanto o estado do bem-estar social ia sendo desmantelado mundo afora, a distância entre o 1% e os 99% crescia. As pessoas se sentiram enganadas –e foram. (Sobre este processo, vale ler “A consciência de um liberal”, do Paul Krugman, e os contos “O cobrador”, do Rubem Fonseca, e “O espremedor de culhões”, do Bukowski).

Não adianta virem os Stevens Pinkers da vida mostrar que o capitalismo melhorou as condições dos pobres nos últimos 250 anos. O motoboy que se arrisca todo dia sob sol e chuva pra levar refeições valendo metade do seu salário não quer saber dos últimos 250 anos, quer saber do mês seguinte. Quer ter um trabalho que curta e seja bem pago, quer ser olhado com desejo pela moça bonita do Shopping Higienópolis e não com desconfiança pelos frequentadores e seguranças. Quer ser admirado pelos filhos e comer sua picanha com cerveja no domingo.

As pessoas não são burras. O motoboy olha pela fresta da porta na casa chique e sabe que é o mais próximo que vai chegar daquela sala, embora o discurso reinante seja o de que se ele se esforçar bastante, prosperará. Se isso não é fake news, não sei o que é.

O bolsonarismo e o trumpismo são infecções oportunistas: alastraram-se porque o sistema imunológico da democracia foi minado por ela mesma. Essa picaretagem de prometer aos pobres propaganda de margarina e entregar gás lacrimogêneo aguenta só até certo ponto. Quando a mentira cai de madura, a dissonância cognitiva deixa na cabeça dos desiludidos um rombo pelo qual entra todo o tipo de terraplanismo.

Não vamos vencer o fascismo fazendo jogral com artistas no Facebook nem escrevendo colunas argumentando que a democracia é a melhor forma de governo –tenho lugar de fala, de jogral e de coluna neste assunto. A melhor saída, a única eficaz e justa, é construirmos uma democracia que seja radicalmente inclusiva. Do contrário, na hora de escolher entre ser engambelado pela conversa pra boi dormir ou se tornar gado no estouro da boiada, as pessoas seguirão optando pelo segundo. Ou o Brasil paga o que deve à maioria dos brasileiros ou em breve não serão de polegares e indicadores as armas apontadas pela turba enfurecida. Pensando melhor: já não são.

Tempestade perfeita

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Numa sociedade marcada por tantas instabilidades, onde as tecnologias ganham espaços crescentes, onde a pandemia ainda gera grandes destruições, onde a concorrência cresce de forma acelerada, onde as transformações no mundo do trabalho crescem rapidamente, gerando desempregos e subempregos, neste mundo de tantas iniquidades, sentimos mais uma outra crise, vivemos num momento de novas instabilidades, novos conflitos políticos, percebemos, literalmente que estamos sem rumo, sem perspectivas e os presságios são ruins e preocupantes.

Neste ambiente, as previsões otimistas são limitadas e centradas nas crenças dos financistas, os bons números da Bolsa de Valores e do mercado financeiro contrastam com os quase 15 milhões de desempregados, onde a fome cresce de forma acelerada, investigações políticas, promessas de melhoras sem lastro e credibilidade. Estamos vivendo uma verdadeira tempestade perfeita, criamos fantasmas, inimigos imaginários, os confrontos se espalham pelas redes sociais e, neste ambiente, o mundo civilizado se recupera, suas economias mostram sinal de melhora e a população começa a enxergar novos movimentos de crescimento econômico. Neste ambiente, estamos aguardando horizontes positivos, mas ao mesmo tempo enxergamos apenas bizarrices, xingamentos, grosserias e contradições crescentes.

A pandemia está em curso, neste ambiente percebemos cenário de algum crescimento econômico, motivado pela economia global, alguns países estão se mostrando mais resilientes, motivados pelas intervenções econômicas agressivas, investimentos em infraestrutura e fortes recursos em ciência e tecnologia, impulsionando o consumo interno e impactando aos países em desenvolvimento. O Brasil está sentindo o estímulo adotado pelos países desenvolvidos, como exportadores de produtos primários, a economia senti as demandas externas, aumentando as vendas externas e melhorando as contas internas, atraindo moeda forte e valorizando a moeda nacional. Estes movimentos positivos devem ser vistos como um momento de adotar políticas efetivas para melhorar os indicadores econômicos e a adoção de políticas públicas para reduzir os desequilíbrios sociais, melhorando o ambiente interno e contribuindo para a construção de um cenário marcado por credibilidade e confiança, fundamentais para aumentar o investimento produtivo e estimular novos empreendimentos.

Os desafios da sociedade brasileira são imensos, estamos convivendo com crises conjuntas com impactos desastrosos para a sociedade, gerando mais desemprego e crescimento das falências e desestruturação dos setores econômicos e produtivos. Neste ambiente, percebemos a importância do direcionamento do Estado, como ator central nas políticas públicas, mas num ambiente de instabilidades crescentes, faz-se necessário a atuação conjunta com os mercados, construindo novos espaços de confiança mútua, sem credibilidade os agentes econômicos não investem no crescimento econômico de forma sólida, consistente e duradouro.

Neste ambiente, vivemos um momento de união de todos os atores sociais, as dificuldades crescem pelo ambiente de conflagração crescente que percebemos na sociedade nacional, mostrando que os agentes econômicos se voltam para seus interesses imediatos e particulares, sem pensar na coletividade e esquecendo do planejamento estratégico, instrumentos fundamentais para a construção de uma nação.

As dificuldades existentes na sociedade brasileira mostram as fragilidades da construção política, neste cenário os agentes políticos e econômicos precisam refletir sobre os resultados conseguidos, esta análise deve ser feita de forma racional e abrangente, percebendo os equívocos e reconstruindo espaços e caminhos mais consistentes.

Vivemos num ambiente de tempestade perfeita, muitos desafios estão acontecendo ao mesmo tempo, a pandemia matou mais de quinhentos mil brasileiros, a crise econômica está gerando desagregação de comunidades inteiras e as crises políticas podem levar o país ao caos generalizado, levando o país a um retrocesso enorme e exigindo das gerações futuras desafios sobre humanos, evitemos esta destruição, pois a história será implacável.

Ary Ramos da Silva Júnior, Economista, Mestre, Doutor em Sociologia e professor universitário. Artigo publicado no Jornal Diário da Região, Caderno Economia, 07/07/2021.

‘20 mil recebem R$ 230 bi sem pagar Imposto de Renda’, diz secretário especial da Receita

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José Tostes rebate as críticas ao projeto que estabelece a volta da taxação sobre dividendos de empresas

Entrevista com José Tostes, secretário especial da Receita Federal

Adriana Fernandes e Idiana Tomazelli, O Estado de S. Paulo – 03/07/2021

BRASÍLIA – Diante da acusação de empresários de que a reforma do Imposto de Renda apresentada pelo governo elevaria a carga tributária, o secretário especial da Receita Federal, José Tostes, afirma que não se pode misturar a tributação de empresas com a de pessoas físicas e cita uma distorção na isenção de lucros e dividendos.

“Temos aqui apenas 20.858 pessoas, numa população de 210 milhões, que receberam R$ 230 bilhões sem pagar imposto”, afirma. Essas pessoas pagaram só 1,8% de todo o rendimento que receberam, argumenta Tostes.

Confira os principais trechos da entrevista:

A carga tributária do Brasil está em torno de 31%. A maior crítica é de que a Receita colocou muita gordura na proposta para aumentar a arrecadação.

Não concordamos com essa avaliação. Fizemos uma proposta para ter equilíbrio entre medidas que aumentam e que reduzem a arrecadação. Esses argumentos de que haverá aumento, precisamos avaliar de que forma estão sendo calculados. O não aumento da carga tributária é um princípio que o ministro Paulo Guedes colocou no início do seu trabalho.

A carga não aumenta?
De fato, a carga tributária não aumentou. Se essas medidas agora possibilitarem algum aumento de carga, não será por conta delas em si, porque, como nós estamos vendo, está havendo um aumento de arrecadação este ano que poderá ser utilizado para reduzir incidências tributárias no próximo ano. Estamos com resultados bastante auspiciosos de arrecadação este ano, e que não têm nada a ver com o aumento de impostos, de alíquotas ou alterações nas regras tributárias.

O sr. falou que não tem como saber como está sendo feita a conta do aumento de carga. A Receita também divulgou apenas parcialmente os números. Eles serão detalhados?
Sim. Estamos preparando uma nota exaustivamente detalhada, inclusive quanto a parâmetros, quanto às variáveis, quanto à metodologia utilizada. Veja que, por exemplo, a alíquota da pessoa jurídica está sendo reduzida para 29%, e está sendo extinta a isenção do Imposto de Renda incidente sobre a distribuição dos dividendos, com uma alíquota de 20%. Muitos comentários que revelam a preocupação com o aumento de carga tributária somando as duas alíquotas.

Completamente errado esse cálculo. Não posso somar os 29% da pessoa jurídica com os 20% da distribuição dos dividendos. São tributos que incidem sobre contribuintes distintos, pessoa jurídica e pessoa física.

Mesmo assim, fica em 43%, o que os críticos acham alto.

Exatamente a mediana dos países da OCDE. É 43,75%. E aí você vai ver: os 29% que incidem sobre o lucro da pessoa jurídica estão um pouco acima da média da OCDE, e os 20% na distribuição de dividendos estão bem abaixo.

O sr. pode dizer onde está o caráter distributivo da proposta?
As empresas estão tendo uma redução de impostos, de 34% para 29%. Isso é uma brutal redução de alíquota que incide sobre o setor produtivo. O que está sendo criado, como nova incidência, é sobre uma renda de pessoa física, sócio de pessoa jurídica, que é isento até hoje e vai passar a ser tributado em 20%, o que absolutamente não é novidade na maioria dos países. O Brasil antes de 1995 tinha exatamente este modelo de tributar a pessoa jurídica e tributar também a distribuição na pessoa física. Em 1995, optou por tributar só na jurídica e isentar a pessoa física.

Agora, estamos avaliando voltar à situação anterior, usada hoje na maioria dos países.
Há uma confusão entre empresa e pessoa física?
Claro. Se a pessoa jurídica obtiver um lucro, vai pagar pela proposta 29%. Se reinvestir no próprio negócio os seus lucros, se capitalizar, se expandir em termos de investimentos com o seu próprio lucro, a tributação acabou aí. Só vai haver a incidência dos 20% se este lucro for distribuído como rendimento à pessoa física do sócio. Se ela reinvestir o lucro no próprio negócio, na expansão empresarial, na geração de empregos, não vai haver tributação dos 20%. Então, é uma medida que estimula o reinvestimento na própria empresa.

Quem hoje recebe na pessoa física esses lucros e dividendos e por que há essa grita diante da proposta de tributação?
Os que recebem acima de 320 salários mínimos (mais de R$ 352 mil por mês). São 20.858, que recebem de rendimentos isentos R$ 230,81 bilhões. Não preciso dizer muito mais para identificar quem vai deixar de ser isento e vai pagar imposto a partir de agora. E mais ainda: se você somar os rendimentos tributáveis dessas 20.858 pessoas, que são apenas R$ 18 milhões tributados como salário e como rendimentos de trabalho, e os R$ 230 bilhões como dividendos e rendimentos isentos, essas 20.858 pessoas terminam por ter uma alíquota média de imposto de 1,8%. Ou seja, considerando todos os rendimentos que receberam, o imposto que elas pagaram representa 1,8%. Vamos mostrar os números e ver de fato quem vai ser afetado com esta medida. Nós temos aqui apenas 20.858 pessoas, numa população de 210 milhões, que receberam R$ 230 bilhões sem pagar imposto. Isentos de acordo com a legislação atual, não tem nada de ilegal aqui.

E o caso de contribuintes que detêm ações de empresas, estão na faixa até R$ 20 mil por mês, mas não terão isenção porque o incentivo só valerá para micro e pequenas empresas?

Esse público existe, mas sem dúvida é muito reduzido em relação ao conjunto. É um tema que estamos discutindo, e podemos fazer ajustes para aperfeiçoar a proposta.

Não há a preocupação de o projeto ficar uma “emenda pior do que o soneto”, como aconteceu com a MP da Eletrobrás?
Estamos já em interação com o Congresso. É claro que isso ainda vai ter desdobramentos na votação a partir das emendas que forem apresentadas, existe naturalmente a possibilidade de o texto ser alterado. Mas estamos na expectativa de que os princípios gerais e as regras mais importantes do projeto possam ter a aprovação no Congresso.

‘Apagão de mão de obra pode se tornar uma deficiência crônica’, alerta economista Ricardo Henriques

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Especialista foi um dos criadores do Bolsa Família diz que a sociedade tem que eleger a educação como prioridade absoluta, uma ‘escolha que nunca fez’

Cássia Almeida – O Globo, 04/07/2021

Se a sociedade brasileira não der prioridade absoluta à educação, o Brasil vai patinar por muito tempo como um país de renda média, com desemprego estrutural maior, mesmo se houver crescimento da economia, alerta o superintendente do Instituto Unibanco, Ricardo Henriques, que foi um dos criadores do Bolsa Família.

Em entrevista ao GLOBO, ele alerta que ainda é possível recuperar o tempo perdido, mesmo com retrocesso que a pandemia provocou, deixando a educação “de joelhos”.

Aumentou a exigência de qualificação?
Reconfiguração do mundo do trabalho, automação, inteligência artificial e a quarta revolução industrial geram a necessidade de aumentar a qualidade da qualificação média da população no ensino básico e superior massivamente.

O risco é que o desemprego de longa duração se perpetue, e o apagão de mão de obra virar uma noite longa. Pode se tornar uma deficiência crônica de mão obra que esteja adaptada à sociedade contemporânea.

Como enfrentar esse apagão?
O ensino técnico precisa sair desse patamar de 2 milhões para 3, 4, 5 milhões, que é a meta do Plano Nacional de Educação para 2024. Não vamos conseguir cumprir essa meta. Podemos aproveitar a janela da reforma do ensino médio, de ter saído da armadilha gerada pelo conteudismo irrelevante que distanciou a formação daquilo que é necessário para sociedade contemporânea.

Por isso, jovens não viam sentido nesse ensino médio. O ensino técnico abre oportunidade real de dar conta das competências e habilidades necessárias ao mundo de hoje.

Quais habilidades?
O mundo está reduzindo demandas física e manual, indo cada vez mais para a cognitiva avançada, a tecnologia, a habilidade socioemocional. Caminhar para habilidades que não estão associadas a um campo específico, mas que são fundamentais: empatia, gestão de estresse, trabalho em grupo, criatividade, comunicação, negociação, que vão servir para qualquer configuração do mundo do trabalho.

E adquirir competência digital básica, tecnologia digital avançada, processamento de informações complexas, análise de dados, pesquisa cientifica, gestão de projetos.

Mas não avançamos na educação?
Os inegáveis avanços na educação nos últimos 30 anos não foram suficientes. Continuamos patinando como um país de renda média. E a pandemia deixou a educação de joelhos.

A sociedade precisa reconhecer esse desafio e dizer que a educação é prioridade absoluta. O Brasil nunca fez isso. Não será fácil e nem imediato. Esse novo mundo exige que a sociedade brasileira faça a escolha que nunca fez.

A educação de mais qualidade para poucos é suficiente para fazer o país crescer?
Até bem pouco tempo atrás, uma elite, um grupo pequeno com alta inserção no mundo tecnológico conseguia que o país se movesse como um todo.

Na atual situação, todos precisam ter altas expectativas de educação, a performance de alta qualidade precisa ser massificada. Para que o país se mova, integrada ao circuito contemporâneo, a grande maioria da população, principalmente os jovens, precisa ter qualificação de alta de qualidade.

Se não houver alta expectativa para todos desde a primeira infância, aumenta-se o potencial do ressentimento na sociedade. Altas expectativas inibem os espaços de ressentimento, aumentam a probabilidade de harmonia. É essa utopia que sociedade deveria perseguir.