A imperfeição humana, a reencarnação e a evolução espiritual

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Na sociedade contemporânea, muitas são as dúvidas que surgem na cabeça das pessoas, muitos se indagam sobre os sentidos da existência, outros questionam da existência de Deus, muitas são as indagações e todas elas tem suas respostas, cabe ao ser humano buscar responder estas indagações, umas encontramos nas reflexões filosóficas, outras estão escondidas nos escaninhos das religiões, enquanto outras estão nos mananciais da ciência, o Espiritismo compila todas estas indagações e nos leva a viajar por mares, muitas vezes, antes navegados, desde que tenhamos curiosidade, dedicação e queiramos aprender.

A Doutrina Espírita destaca que como seres imperfeitos estamos sempre vivendo nos dois lados da vida, alterando vivências nos mundos material e imaterial, nestas excursões aprendemos e evoluímos para atingirmos um estágio maior de desenvolvimento espiritual, quando nossas viagens são reduzidas e passamos a vivenciar novas experiências ruma a um progresso cada vez maior, esta viagem depende de cada ser humano, uns a fazem de uma forma mais rápida enquanto outros demoram um bocado mais nestas andanças, mas todos vamos conseguir atravessar com êxito esta caminhada.

A descoberta da vida espiritual é uma contribuição imensa do Espiritismo, com ela nos foi dado a conhecer a existência de outros mundos, como nos mostrou a física quântica, com seus mundos convivendo simultaneamente, estamos muito próximos destes mundos, mas ao mesmo tempo estamos deverás distantes. Nestas andanças da ciência e do pensamento científico a Doutrina dos Espíritos nos descortina uma nova vida, onde os valores se transformam e passamos a acreditar na imortalidade da alma e nas vivências em outras épocas e lugares, com sensações, medos e percepções diferentes.

Somos seres imensamente imperfeitos e interesseiros, pensamos muito mais em nossos prazeres e em satisfazer nossas vontades do que no coletivo, invejamos outras pessoas que acreditamos ser profissional de sucesso ou exitosa no relacionamento, almejamos valores de terceiros e desejamos coisas que não são nossas, não que queiramos extrair diretamente de outrem, mas desejamos que este produto, esta mercadoria ou até mesmo esta pessoa, esteja ao nosso lado no cotidiano. Num mundo muito centrado no eu, estamos sempre desejando algo de alguém, observamos seu sucesso e não percebemos seus esforços, adoraríamos ter seus recursos financeiros e desdenhamos da grande carga de trabalho e dedicação, queremos o que vemos e nos é aparente, mas esquecemos daquilo que está escondido, seus esforços, estudos e dedicações, desta forma nos tornamos seres infelizes e cada vez mais interesseiros e imediatistas.

A Doutrina dos Espíritos nos concede um grande manancial para construir uma nova experiência no corpo material, não podemos mais alegar ignorância como fizemos durante muitos séculos, a literatura disponível é vasta e de grande valor espiritual, desde romances passando por dissertações, desde contos passando por biografias, o acervo é variado e de grande valor moral, cabe a cada indivíduo se debruçar nestes conhecimentos e utilizá-los para sedimentar nossa caminhada, afinal estamos cheios de caminhos pedregosos e esburacados, o espiritismo nos abre um novo mundo e uma nova realidade, dando-nos novas experiências e valores mais consistentes.

Através de nossas imperfeições atraímos obsessores constantemente ao nosso lado, através de nossas fragilidades morais atraímos energias deletérias a todos os momentos, nos esquecemos que podemos buscar o equilíbrio e compreender as razões dos progressos dos seres humanos, desde que entendamos que todas as grandes conquistas exigem esforços e dedicações intensas e entregas verdadeiras, sem elas nossas conquistas são cada vez mais temporárias, frágeis e centradas em um reduzido mérito.

Assistimos a televisão e vemos todos os dias nas mais variadas mídias digitais o crescimento acelerado da violência, da corrupção e de crimes dos mais violentos possíveis, nos assustamos com a sociedade e perdemos nossa confiança nos seres humanos e nos esquecemos que vivemos num mundo atrasado, marcado por provas e expiações, onde estamos aqui para sublimar todos os desajustes que acumulamos em vidas e em momentos anteriores, sem superar tais dificuldades não conseguiremos encontrar uma felicidade mais intensa e verdadeira que está reservada para cada indivíduo, desde que passemos a procurar nos locais corretos, não nos prazeres da matéria, mas nos valores do espírito.

As reencarnações anteriores nos servem de baliza para nosso crescimento atual, quando acumulamos valores mais consistentes, valores espirituais, marcados por bons sentimentos e atos mais consistentes, somos assistidos por espíritos mais evoluídos e nos aproximamos de energias mais salutares que nos ajudam em nosso progresso, somos inspirados e aceitamos a inspiração dos espíritos superiores e rumamos a um desenvolvimento espiritual. Quando acumulamos valores mais materializados e deixamos os valores do espírito de lado, atrasamos nosso progresso espiritual e não sentimos as inspirações dos bons espíritos, mas daqueles que vibram no mesmo diapasão, com isso, retardamos nosso progresso e acrescentamos mais equívocos para outras vivências no mundo material.

Somos o que nós nos deixamos fazer conosco nas mais variadas encarnações que vivenciamos, nesta viagem passamos pelas mais variadas experiências, encarnamos em corpos femininos e depois em corpos masculinos e vice-versa, fomos ricos e pobres, passamos por experiências variadas, sentimos as dores do abandono e do desajuste material, vivemos em culturas de opressão e experimentamos momentos de liberdade, deixamos de lado nossos valores éticos e exercitamos nossos valores morais, tudo isso nos auxiliou a moldar nossos valores mais íntimos, somos hoje um misto de todas estas experiências no mundo material, a reencarnação é uma grande dádiva de Deus e em ela temos muita dificuldade de compreender a justiça divina, sem a reencarnação construímos um mundo baseado numa falsa meritocracia.

A evolução humana é demorada e exige grande dedicação, a razão existe no mundo a uns quarenta mil anos, como nos mostrou o espírito André Luiz, neste período reencarnamos entre 800 e mil vezes, nestas experiências acumulamos progressos em várias áreas, passamos a dominar novos conhecimentos e novas culturas, línguas e vivências. Neste emaranhado de encarnações nos tornamos únicos e individuais, mas criados e mantidos por um Deus maior, de amor, de misericórdia e de solidariedade, nestas experiências percebemos que somos seres humanos e para evoluir precisamos estar sempre próximos, um auxiliando o outro, com isso progredimos e impulsionamos o progresso de nossos semelhantes.

O médium mineiro Francisco Cândido Xavier, analisando a chamada transição planetária, destacou que o Planeta Terra se tornará um mundo de regeneração somente a partir de 2057, ou seja, depois de duzentos anos da codificação espírita. Neste momento vivemos um período de grandes inquietações, as transformações são intensas, rápidas e aceleradas, gerando desesperança e muito medo, neste momento percebemos que nosso planeta está recebendo entidades inferiores, agressivas e que se comprazem com o mal, com a dor e com a violência. Estas entidades estão saindo das catacumbas do umbral, são espíritos que não mais queriam reencarnar, são entidades que viveram durante muitos séculos em condições de indignidade e foram, compulsoriamente, escaladas para retornar ao mundo material, estão tendo mais uma chance de se libertar destes sentimentos degradados e se resistirem e continuarem cultivando intimamente estes valores serão degradados para mundos inferiores, estão tendo suas últimas chances de se libertar deste mal e desta ignorância que cultivaram durante séculos, o mundo não mais pode esperar por estas entidades para continuar sua trajetória de progresso e de desenvolvimento.

Muitas doutrinas religiosas não acreditam na reencarnação, o próprio catolicismo a aboliu de suas fileiras no século V, algumas correntes passaram a acreditar no dia do juízo final, noutros no sono eterno, acreditam que a vida é única e não retornamos mais a este mundo, o espiritismo rechaça fortemente estes valores e destaca a reencarnação como o instrumento mais consistente para entendermos a justiça divina, sem a reencarnação não conseguiríamos compreender as dores do mundo, as desigualdades crescentes, as doenças em curso em crianças em tenra idade, os pecados originais e os assassinatos sanguinários e violentos, as propensões e as inspirações do bem e do mal, sem reencarnação não conseguiríamos compreender os verdadeiros significados da vida.

Evoluímos dos dois lados da vida, na obra Memórias de um suicida, de Yvonne do Amaral Pereira, nos deparamos com a história do grande escritor português Camilo Cândido Botelho, na obra percebemos como o escritor posterga o retorno ao mundo material, permanecendo no mundo espiritual, por mais de quarenta anos, neste período Camilo se dedicou imensamente ao estudo, lendo, fazendo cursos, conversando com os sábios da espiritualidade, aprendendo sempre e, com isso, angariou as forças necessárias para seu retorno ao mundo material. O escritor sabia que para progredir espiritualmente precisava retornar a matéria, seus equívocos foram inúmeros e apenas com a experiência de uma nova encarnação poderia começar a reconstruir seu equilíbrio, embora tenha aprendido que o equilíbrio para o suicida demora muitos anos, segundo lhe informaram mais de duzentos anos.

Noutra obra de relevo, também nos deparamos com experiências de crescimento do espírito no mundo espiritual, na obra Missionários da Luz, de Francisco Cândido Xavier ditado pelo espírito de André Luiz, nos deparamos com a história de Segismundo, nela percebemos como o trabalho consciente e responsável pode auxiliar no progresso e no desenvolvimento do espírito, embora marcado por graves desequilíbrios e desajustes, o melhoramento de Segismundo foi verdadeiro e suas obras foram tão grandiosas que atraiu auxílio de espíritos de escol, como Bezerra de Menezes e o instrutor Alexandre, somente o trabalho remove de nossos escombros os mais severos equívocos e dificuldades, fazendo com que consigamos evoluir e adotar a máxima atribuído a Chico Xavier: Embora nenhum de nós possamos refazer os erros do passado, todos podemos começar novamente e fazer um novo final.

Perseguições invisíveis, agressividades e inimigos espirituais

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Vivemos em uma sociedade de grandes extremos, num mundo materializado onde o dinheiro e a posição social são instrumentos de classificação dos seres humanos, todos vivem num constante embate para a sobrevivência. O ambiente descrito parece comum a muitas pessoas, o que muitos não sabem é que este confronto não se dá apenas no mundo material, os embates entre os dois polos da vida são constantes e motivam grandes reflexões entre os indivíduos, estamos sendo testados constantemente e devemos nos preparar para não sermos conduzidos pelos inimigos espirituais desencarnados, que são responsáveis por estimular muitos confrontos e impulsionar mágoas e ressentimentos dos dois lados da vida.

O trabalho no bem sempre nos equilibra e nos abre espaço para o crescimento e para o desenvolvimento espiritual, mesmo sendo algo que nos faz muito bem e nos conforta, os espíritos ora inferiores atuam no sentido de desequilibrar e gerar constrangimentos para estes colaboradores da Doutrina Espírita, buscando com isso desestabilizá-los e criar maiores desajustes e constrangimentos, afastando-os das obras edificantes e mantendo-os na escuridão da ignorância, por vingança de disputas anteriores ou por prazer em vê-los desequilibrados e constrangidos.

A Doutrina Espírita nos mostra que estamos sendo testados todos os momentos por irmãos desencarnados, alguns desafetos declarados estão motivando sentimentos menores como forma de incrementar confrontos e estimular uma violência gratuita, gerando constrangimentos e desequilíbrios que, em muitos casos, se perpetuam por muitos séculos, gerando rancores, ressentimentos e desafetos em todos os planos da vida, em algumas obras de vulto da Doutrina Espírita percebemos perseguições que duram mais de duzentos anos, criando um enorme rastro de violência, lágrimas e destruições.

Nos grupos mediúnicos encontramos um exemplo claro destes desafetos, irmãos desencarnados que, por ora, se comprazem com o bem, usam de todos os artifícios e artimanhas para impedir os médiuns, os passistas e os doutrinadores de participar dos trabalhos, isto porque sabem que o trabalho em curso tende a dificultar a atuação destes irmãos no desajuste de seus desafetos. Como conhecem o pensamento espírita ou suas ferramentas mais imediatas, usam seus conhecimentos para afastar os trabalhadores da jornada do bem, adotam posturas desprezíveis, se utilizam de atitudes e comportamentos mesquinhos e usam os piores recursos para evitar os medianeiros de trabalharem no bem e no auxílio daqueles irmãos que sofrem em desespero e em desalinho com os ideais superiores de amor, de paz e de solidariedade.

Estes irmãos que vibram num diapasão inferior, que se comprazem com o mal e se mobilizam para impedir o progresso, conhecem a força e os sentimentos superiores dos discípulos de Jesus, reconhecem na Doutrina Espírita conceitos consistentes para melhorar a conduta dos seres humanos e, com isso, usam de todos os instrumentos que possuem para impedir a adesão de seus perseguidos em suas fileiras, temendo que as portas abertas do desequilíbrio sejam fechadas e a influência espiritual que possuem seja encerrada por completo.

Muitas pessoas acreditam que ser médium é um privilégio concedido a poucas pessoas, o que a maioria desconhece é que todos somos médiuns, como nos diz Allan Kardec em O Livro dos Médiuns: “Toda pessoa que sente a influência dos Espíritos, em qualquer grau de intensidade, é médium. Essa faculdade é inerente ao homem. Por isso mesmo não constitui privilégio e são raras as pessoas que não a possuem pelo menos em estado rudimentar. Pode-se dizer, pois, que todos são mais ou menos médiuns. Usualmente, porém, essa qualificação se aplica somente aos que possuem uma faculdade mediúnica bem caracterizada, que se traduz por efeitos patentes de certa intensidade, o que depende de uma organização mais ou menos sensitiva”. A mediunidade é algo inerente a todos os seres humanos, a diferença é a intensidade e as características desta mediunidade, uns são psicofônicos, outros psicógrafos, outros doutrinadores, outros oradores, alguns de efeitos físicos, dentre outros tipos…

A mediunidade auxilia no progresso dos indivíduos, deve ser vista como um instrumento para o crescimento espiritual e coletivo da humanidade, os médiuns apresentam uma grande sensibilidade e, com isso, devem auxiliar aqueles que necessitam de uma orientação espiritual, motivando-os ao estudo e a reflexão sistemáticas como forma de compreender o verdadeiro e real significado da vida, estimulando os indivíduos a cultivarem mais valores espirituais e menos valores materiais, como estamos vendo na sociedade contemporânea, onde as pessoas estão se perdendo no materialismo e no imediatismo e deixando de lado valores morais e espirituais, estes sim os verdadeiros valores da vida e do ser humano.

O médium atrai muitas energias negativas e necessita de vigilância constante, isto porque em muitos momentos acaba atraindo espíritos desequilibrados e muitas entidades que desconhecem sua verdadeira situação, irmãos desencarnados que desconhecesse a existência de vida pós-morte e se encontram perdidos, algo muito mais comum do que as pessoas imaginam. A mediunidade para ser bem desenvolvida precisa de estudo, cabe as pessoas dotadas desta sensibilidade uma busca constante por conhecimento, a leitura da obra de Allan Kardec é imprescindível, o pentateuco espírita (O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Céu e o Inferno, A Gênese e O Evangelho segundo o Espiritismo) serve como uma bússola para a compreensão das realidades da vida.

Encontramos muitos espíritos que se comprazem com o mal, se desdobrando para evitar os trabalhos dos médiuns encarnados, entidades que sentem prazer no mal e no desequilíbrio se unem para gerar transtornos e constrangimentos para os médiuns que, segundo eles, ousam trabalhar para difundir os ideais trazidos para humanidade por Jesus Cristo. Estes irmãos se utilizam de sua invisibilidade para criar dificuldades e desviar estes trabalhos, estimulando caminhos alternativos e afastando-os das obras do bem, sentem prazer com as quedas e trabalham incessantemente para que as casas espíritas sejam fechadas e os ideais da Doutrina dos Espíritos sejam colocados de lado ou esquecidos.

Muitas pessoas sentem este ataque das entidades inferiores quando começam a frequentar a casa espírita, estes irmãos se organizam para que se atrasem aos trabalhos, estimulam seus melindres mais íntimos e buscam criar constrangimentos no cotidiano para que se afastem do trabalho, temem que as atividades no bem transformem estes irmãos e estes passem a ter controle e autonomia sobre suas vidas e suas escolhas mais íntimas e pessoais.

Os médiuns que se encorajam a trabalhar para o bem e para o crescimento do amor e da solidariedade, percebem que, com isso, se transformam em alvos dos irmãos que vibram no diapasão dos desajustes, sendo por eles perseguidos constantemente, onde são estudados intimamente para perceber seus desequilíbrios e, num segundo momento, atuar diretamente para inviabilizar seu trabalho, afastando-os das atividades do bem e transformando-os em motivos de escárnio e de desventuras. Na sociedade contemporânea encontramos inúmeros casos de médiuns dotados de grandes capacidades mediúnicas que se deixam levar por sentimentos menos dignos que trazem intimamente, estes sentimentos estão em suas entranhas mais íntimas e os espíritos inferiores buscam nestas entranhas estimular para que estes desequilíbrios gerem constrangimentos maiores para o médium e que, com isso, atinja a doutrina e fragilize seus ideais mais sinceros de amor e de solidariedade.

Nas reuniões mediúnicas encontramos espíritos inferiores agressivos, que ameaçam os trabalhadores da casa, se acreditam dotados de um poder sobrenatural, ofendendo e querendo agredir fisicamente, mas são contidos pelos mentores da casa, estes irmãos insatisfeitos com sua condição ameaçam até mesmo os familiares dos médiuns, seus filhos e parentes mais próximos, mostrando-nos, com isso, como a atuação do médium na casa espírita deve vir acompanhada de seus familiares, criando um conjunto de energias salutares para evitar a influência das entidades inferiores que se comprazem com o mal, o rancor e o ressentimento.

Neste embate constante entre forças dos dois lados da vida, é importante destacar, que os trabalhadores da seara do bem estão sempre muito bem protegidos pelos seus guias e simpatizantes, que se utilizam das forças do bem para proteger e perpetuar os trabalhos para que os valores do Cristo sejam eternos e sempre vencedores. Numa situação de embates constantes, cabem aos médiuns trabalhadores da seara do bem, a perseverança e o trabalho constante, além disso, um forte controle sobre seus pensamentos e o cultivo de hábitos simples e saudáveis, visando á fragilização dos irmãos que ora se comprazem com o mal e o fortalecimento dos ideais propostos e estimulados pelos prepostos do Cristo.

Quando estamos em momentos de invigilância, fragilizados e descuidados, abrimos nosso campo mental para a atração destas entidades inferiores, oferecendo campo as mentes desequilibradas que se acercarão de nós e, encontrando desguarnecidas as nossas defesas, terão possibilidades concretas de conseguir o nosso afastamento e de se regozijarem com a nossa queda. Como disse o espírito Emmanuel, mentor espiritual de Francisco Cândido Xavier, quando foram apresentados, e o primeiro lhe mostrou as credenciais necessárias para o trabalho sob as hostes de Jesus Cristo, enfatizando que para este trabalho eram necessários “Disciplina, disciplina e disciplina”.

            Os obsessores se utilizam de métodos conhecidos pelos espíritas, mas mesmo assim, muitos sucumbem a sua atuação e se rendem ao trabalho de desagregação do trabalho espiritual, dentre os métodos podemos destacar a ideia do comodismo para afastar as pessoas das reuniões, gerando argumentos tais como “as reuniões são boas, mas hoje não vou porque trabalhei muito”, “eu já produzi muito nas reuniões, por isso faltar hoje não faz mal” ou “eu sou muito assíduo, todo mundo falta menos eu”, todos estes argumentos são estimulados pelos espíritos inferiores para que os trabalhadores se afastem dos trabalhos, faltando numa semana e depois se ausentando na outra, quando vai ver o trabalhador acaba abandonando as atividades, alegrando os obsessores e deixando de trabalhar seu instrumento mediúnico, gerando constrangimentos individuais e coletivos.

Os perseguidores espirituais são astutos e inteligentes, se utilizam de sua capacidade reflexiva para fragilizar os trabalhadores do bem, estudam suas limitações e incutem em suas mentes pensamentos de perseguição, incrementando seus melindres e disseminando a desconfiança, com o intuito de fragilizar o trabalho e reverter uma luz que hora se acende para o esclarecimento, o equilíbrio e o fortalecimento dos ideais da espiritualidade maior.

Os espíritos esclarecidos não cansam de nos estimular para o bem, todos os momentos possíveis estão tentando nos alertar, reiterando a cada dia os apelos à nossa reforma íntima. Como nos diz Suely Caldas Schubert, na obra Obsessão e Desobsessão, “A maioria de nós ainda somos bastante teóricos, sabendo de cor e salteado páginas, citações, livros, mas pouco conseguindo vivenciar os ensinamentos adquiridos”.

O trabalho mediúnico desenvolvido com os verdadeiros ideais de Jesus Cristo nos auxilia no desenvolvimento e no crescimento espirituais, este instrumento não nos foi dado para que guardemos numa gaveta e olhemos para a janela e enxerguemos as dores alheias, na verdade são instrumentos de progresso e crescimento da humanidade, o amor e o saber devem andar juntos e de forma concomitante. Como nos disse o médium mineiro Francisco Cândido Xavier: “Quem sabe pode muito, mas quem ama pode mais”.

  As raízes do sofrimento humano

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Vivemos em uma sociedade marcada por muitos medos, dores e sofrimentos, os espíritos superiores nos mostram, constantemente, como estas dores estão crescendo e os seres humanos estão, cada vez mais, perdidos e atordoados, gerando um mundo marcado por ambiente degradantes, caracterizados por energias densas e desagradáveis, levando pessoas a cultivarem ideias de suicídio, incrementando a depressão, a ansiedade e a desesperança. Neste mundo de transformações aceleradas, o medo está dominando os corações e a esperança de um futuro melhor está diminuindo rapidamente.

Nesta sociedade centrada na concorrência e na competição, os indivíduos estão preocupados com sua sobrevivência cotidiana, se entregam ao trabalho e transformam suas vidas em uma constante busca por dinheiro e retornos monetários, mergulhando em um trabalho cada vez mais agressivo, que toma grande parte da vida das pessoas, restringindo os seres humanos a um verdadeiro sobreviver via trabalho, emprego, qualificação e capacitação constantes, deixando valores mais consistentes de lado, como família, amores e religião.

São inúmeras as preocupações para o indivíduo do século XXI, que o ser humano está deixando de lado seus valores mais consistentes, muitos destes valores vem sendo construídos pela coletividade a alguns séculos, datam do período conhecido como Iluminismo, como tolerância, liberdade, respeito e companheirismo, com isso, estamos vivendo uma sociedade onde as pessoas estão amedrontadas, o trabalho está gerando traumas intensos, os relacionamentos estão gerando frustrações e as famílias não mais conseguem suportar os dramas humanos, neste mundo de competição o dinheiro ganha relevância, promete satisfação, alegrias incomensuráveis e entrega desolação, solidão e frustrações.

Neste turbilhão de informações e tecnologias que surgem todos os dias, estamos ficando cada vez mais individualistas, estamos sempre nos deixando levar pelo imediatismo e pelos prazeres do agora, com isso, estamos perdendo a capacidade de colaborar e de cooperar, como nos diz o historiador israelense Yuval Harari: “Nós humanos somos os únicos mamíferos que conseguem cooperar em grandes quantidades. Coloque 10 mil chipanzés em um estádio e você tem o caos total”.

A Doutrina dos Espíritos nos mostra, que vivemos numa sociedade onde nos encontramos todos os momentos com entidades espirituais, irmãos que passaram do mundo material para o mundo espiritual, estes espíritos nos influenciam muito mais do que imaginamos, muitos pensamentos que cultivamos e acreditamos serem nossos, na verdade são inspirações que nos são trazidas por irmãos de outros planos da vida. Num momento como o que estamos vivendo, marcados por grandes inquietações, conflitos generalizados, medos e desesperanças, além de uma época de grande degradação do meio ambiente, as energias que circundam o Planeta Terra tendem a ser negativas e degradantes, com isso, cultivar bons pensamentos, boas leituras e estimular sentimentos saudáveis nos auxiliam e nos servem como uma vacina para os males da contemporaneidade.

Nesta atual situação da sociedade mundial, muitos irmãos do mundo espiritual, espíritos abnegados que se esforçam para que as ideias de Jesus Cristo sejam difundidas e possam contribuir para o crescimento espiritual da sociedade, estão preocupados e receosos do crescimento deste negativismo e desesperança. Estas entidades acreditam, que o mundo contemporâneo está passando por momentos de fortes transformações, mesmo percebendo o crescimento de constrangimentos na coletividade, estes acreditam que são momentos passageiros de uma mudança estrutural, onde os ganhos futuros serão maiores e mais consistentes para o planeta, mas para que isto se efetive, faz-se necessário que o ser humano compreenda a situação que passa a humanidade, um momento de transição e reequilíbrio, onde os valores devem passar por grandes transformações, a tecnologia está mudando o ser humano, mas os valores espirituais devem prevalecer, muitos dos desequilíbrios e dos sofrimentos humanos estão centrados na ausência de Deus, a tecnologia e os valores monetários e materiais estão levando os indivíduos a se afastarem do essencial, dos valores mais consistentes que nos foram dados pelo Criador.

Os sofrimentos estão atrelados aos excessos, tudo que é excessivo nos prende e nos limita em nossas potencialidades. Na sociedade contemporânea os prazeres materiais são dominantes, somos direcionados e estimulados por programas de computadores e algoritmos que nos conhecem muito mais das nossas vidas do que nós mesmos. Evitamos o famoso conheça-se a ti mesmo porque este conhecer nos leva a uma reflexão que pode nos assustar, neste autoconhecimento podemos nos preocupar com as descobertas, levando-nos a comportamentos assustadores que podem nos afastar dos padrões de normalidade de uma sociedade que atribui valores aos indivíduos que mais acumulam recursos financeiros.

Os sofrimentos humanos são fruto de nossas escolhas e de nossas trajetórias, antigamente podíamos alegar ignorância e desconhecimento, na atualidade este desconhecimento é algo que não podemos mais aceitar, os conhecimentos estão em todos os lugares, nas telas dos computadores, nas mais variadas mídias digitais e nos templos religiosos e nas casas espíritas, precisamos apenas aceitar nossas escolhas e entender que somos na atualidade aquilo que fizemos de nossa vida em momentos anteriores e que seremos no futuro aquilo que plantarmos no momento atual, quem planta degradação, orgulho e ressentimento, em momento algum colherá tolerância e solidariedade.

Nas reuniões mediúnicas, as entidades elevadas nos mostram os desajustes dos seres humanos, pedem oração e conduta serena, nos orientam em nossas escolhas e nos mostram as degradações do mundo, as lutas fratricidas e as ambições que cegam os seres humanos e os aproximam dos animais mais cruéis e desumanos da sociedade, estas imagens são reais e verdadeiras e nos influenciam muito mais do que imaginamos em nosso cotidiano.

Pesquisas recentes feitas no Brasil nos mostram que, para 78% da população, o trabalho ou a falta dele são responsáveis por doença e sofrimento, o trabalho que deveria ser fonte de regozijo e crescimento pessoal, passou a ser um grande gerador de desajuste e desequilíbrio, a carga excessiva, as cobranças crescentes, as metas impossíveis de atingir, os baixos salários, os medos de demissão e as grosserias dos gestores, todas estas questões somadas estão contribuindo para que o cenário profissional se transforme num grande gerador de mágoas e degradação.

Neste cenário de tantas transformações estruturais, os indivíduos estão esquecendo os ensinamentos deixados pelo Mestre de Nazaré, todas as suas mensagens estão sendo lidas e estão emocionando os indivíduos mas, ao mesmo tempo, não estão gerando as transformações que o mundo requer, as pessoas leem, mas não compreendem, as pessoas frequentam os cultos religiosos, mas não deixam seus ensinamentos adentrar seus corações, as pessoas conversam sobre assuntos engrandecedores, mas se negam a sua transformação pessoal, as resistências dos seres humanos são imensas e, com isso, perpetuam as lágrimas, muitas delas escondidas, e os rancores e ressentimentos, energias que corroem e maltratam as pessoas e geram sentimentos inferiores que se apoderam dos mais incautos e imediatistas.

Muitos indivíduos acreditam que suas dificuldades são oriundas de outras existências, aceitam seus equívocos e limitações e acreditam que não vão conseguir, pelo menos nesta encarnação, encontrar um outro caminho e deixar para trás os transtornos identificados. Alguns acreditam na reencarnação, se dizem adeptos da Doutrina dos Espíritos e acreditam que podem deixar seus dramas para uma outra oportunidade de retorno ao corpo físico, o grande problema deste raciocínio é que, com a redução das famílias no mundo contemporâneo, muitos espíritos teriam que aguardar uma nova oportunidade, coisa que nem sempre acontecerá facilmente, neste ínterim o espírito ao se conscientizar do equívoco cometido se arrependerá de não ter encarado seus problemas mais diretamente.

Seguindo este pensamento, muitas pessoas atribuem suas dificuldades a outras vidas e outras experiências físicas, acreditam que muitas de seus dramas, conflitos ou ressentimentos são originários de outras vivências, com isso se esquecem que a maior parte dos nossos desequilíbrios são construídos nesta vida material e devem ser resolvidos agora, evitando um retorno com as mesmas marcas que nos constrangem na atualidade. Muitos rancores acumulados em relacionamentos tóxicos, muitos conflitos familiares, muitos ressentimentos em amizades degradantes e muitos dramas pessoais são aumentados e acabam gerando problemas muito maiores, levando muitas pessoas a transtornos variados, atraindo uma gleba de entidades espirituais que vibram no mesmo diapasão, estes irmãos acabam aumentando os seus dramas e transformando pequenos contratempos em desequilíbrios acentuados que são levados por muitas encarnações, prendendo ambos os espíritos num espiral de desajustes e ressentimentos.

A preocupação dos espíritos superiores com o Planeta Terra é intensa e verdadeira, estas entidades percorrem todos os cantos do globo terrestre e percebem os dramas individuais e coletivos aumentarem de forma exponencial, países em crises constantes, irmãos se agredindo, famílias sendo destruídas com requintes de crueldade, governos conspirando contra sua população, indivíduos gananciosos planejando novos saques e pilhagens materiais, neste ambiente marcado por desequilíbrios individuais e coletivos, deslealdade e desavenças, onde as energias dominantes são deverás degradantes, os irmãos que ora se comprazem com o mal, o rancor e o ressentimento se locupletam fortemente e percebem que seus caminhos de degradação estão abertos, influenciando os irmãos mais incautos e desprotegidos, transformando-os em verdadeiras marionetes, seres humanos manipuláveis e controlados, cujas energias são fragilizadas e seus sentimentos ignorados, uma obsessão que se transforma rapidamente em possessão, aumentando os dramas pessoais e coletivos da humanidade.

Vivemos um momento de grandes inquietações, um momento de transição e grandes transformações, todas as estruturas estão sendo destruídas e reconstruídas, neste momento muitos dos dramas individuais e constrangimentos coletivos estão vindo a tona e perturbando os seres humanos, que num gesto tresloucado se afastam de Deus e das filosofias saudáveis e buscam crenças e religiões mais materializadas, muitas delas cheias de rituais, muitas destas buscas servem para uma convenção social e não se transformando em um espaço de reflexão e crescimento espirituais, com isso, percebemos um ser humano cada vez mais perdido e insatisfeito, com seus dramas íntimos aumentados e suas esperanças reduzidas, está na hora deste ser que se diz racional se voltar para suas origens espirituais, buscando Deus e construindo em locais sólidos e consistentes, deixando de lado valores transitórios e cultivando os verdadeiros valores espirituais, está na hora do reencontro do indivíduo com seu Deus, este sim tem potencial de elevação, equilíbrio e desenvolvimento moral e espiritual. Sem este reencontro, o ser humano continuará buscando as origens do seu sofrimento em outras pessoas e se desviará de compreender que a verdadeira origem de seus males e de seus sofrimentos estão em suas decisões equivocadas e em suas ambições desmesuradas e desequilibradas.

“O diagnóstico de Guedes sobre o Estado não se sustenta”, segundo Oreiro.

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IHU – 11/11/2019

 O Plano mais Brasil, um novo pacote econômico enviado pelo governo ao Congresso Nacional na semana passada, que inclui três Propostas de Emenda Constitucional – PECs – a PEC do Pacto Federativo, a PEC dos Fundos Públicos e a PEC Emergencial –, é fundamentado na ideia geral de que “para recuperar o crescimento da economia brasileira de forma mais sustentável, tem que diminuir o tamanho do Estado”, diz o economista José Luis Oreiro à IHU On-Line, na entrevista a seguir, concedida por telefone. Segundo ele, com este pacote o governo diz à sociedade que “é possível reduzir o volume de serviços que o Estado brasileiro presta à população”.

Para o economista, um exemplo concreto de que o governo quer reduzir a participação do Estado nos investimentos sociais se manifesta nas propostas de desindexação, desvinculação e desobrigação dos gastos sociais. “No fundo, Guedes quer acabar com a distinção entre despesa obrigatória e despesa discricionária desindexar as despesas públicas, porque muitas delas são indexadas à avaliação da inflação, como era o caso do salário mínimo”, afirma. Com uma possível desindexação do salário mínimo à inflação, argumenta, “corre-se o risco de ter uma situação na qual uma parte significativa dos benefícios previdenciários e de assistência social no Brasil não seja corrigida nem mesmo pela inflação. Isso, obviamente, vai aumentar a desigualdade de renda e a pobreza”.

Apesar de o governo argumentar que a PEC do Pacto Federativo possibilitará maior flexibilização aos gestores dos entes federativos em como administrar os recursos com saúde e educação, o economista pontua que “deixar isso a critério do político de plantão” não é “correto”. De outro lado, ele admite a possibilidade de “discutir se as atuais alíquotas para saúde e educação são as adequadas. “O Brasil está passando por um processo de envelhecimento, e quando a população envelhece, a proporção de velhos aumenta e a proporção de jovens diminui. Desse modo, é razoável que em algum momento tenha que se ajustar a vinculação de gastos em saúde e educação a fim de reduzir a alíquota para a educação e aumentar para a saúde, porque basicamente quem tem problema de saúde são os velhos e quem precisa de educação são os jovens. Mas se, de fato, estamos vivendo uma transição demográfica em que o percentual de jovens vai diminuir nos próximos 20 anos, então é razoável que se ajustem os percentuais de receitas aplicados à saúde e à educação”, pondera.

Entre os poucos pontos positivos do pacote econômico, Oreiro cita a proposta da PEC dos Fundos Públicos de usar o dinheiro de alguns fundos para abater a dívida pública. “Existem 220 bilhões de reais parados em 281 fundos públicos no Brasil. Seria interessante fazer um mapeamento desses fundos e ver quantos de fato não têm razão de ser e podem ser extintos para usar o dinheiro para abater a dívida pública. Essa é uma ideia bastante razoável”, destaca.

José Luís Oreiro possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, mestrado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio e doutorado em Economia da Indústria e da Tecnologia pela UFRJ. Atualmente é professor adjunto do Departamento de Economia da Universidade de Brasília.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – O pacote econômico apresentado pelo ministro Paulo Guedes inclui três PECs – PEC do Pacto Federativo, PEC dos Fundos Públicos e PEC Emergencial – e é considerado a maior reforma dos últimos 30 anos. Quais são as diretrizes, linhas gerais, que fundamentam o pacote econômico do governo?

José Luis Oreiro – O fundamento, ou seja, o que está na cabeça do Paulo Guedes é que, para recuperar o crescimento da economia brasileira de forma mais sustentável, tem que diminuir o tamanho do Estado. Esse é o fundamento mais geral e ele já vinha falando isso há muitos anos em artigos que escrevia no jornal O Globo. Para ele, o modelo social-democrata adotado no Brasil durante os governos FHC e Lula havia levado o país a uma armadilha de baixo crescimento e, portanto, só seria possível voltar a ter um crescimento elevado se retirasse o Estado. Esse fundamento mais geral se desdobra em algumas outras hipóteses.

Na argumentação do Guedes está implícita uma visão muito antiga em economia, que foi descartada pelo Keynes em 1936, quando ele escreveu “A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda”, que se chama a visão do Tesouro. Essa era a visão do Tesouro inglês no final da década de 1920 e início da década de 1930 sobre a possibilidade de usar o investimento público para tirar a economia britânica da grande depressão de 1929. Segundo a visão do Tesouro, toda vez que o governo aumentasse o seu investimento, isso iria reduzir na mesma magnitude e instantaneamente o investimento privado. Então, teria um efeito de deslocamento que faria com que, quando o governo aumentasse o investimento público, o investimento privado incidiria na mesma magnitude. Guedes tem este modelo na cabeça: ele acha que para aumentar o investimento privado, tem que reduzir o gasto público e é isso que está embasando, em termos mais gerais, a proposta dele.

IHU On-Line – O diagnóstico dele é correto ou não para enfrentar a atual situação econômica do país?

José Luis Oreiro – É completamente equivocado e ultrapassado. Primeiro, porque essa visão do Tesouro mostrou que, a não ser em casos excepcionais em que a economia está operando com pleno emprego da força de trabalho, o efeito de deslocamento, se ele existe, não é completo. O mesmo ocorre quando a economia está operando muito abaixo do pleno emprego, como é o caso da economia brasileira agora, que está operando com um hiato do produto de 5% – ou seja, o PIB está 5% abaixo do potencial. Temos um desemprego em sentido amplo, que envolve não só os que não estão trabalhando, mas aqueles que deixaram de procurar trabalho porque já desistiram e as pessoas que gostariam de trabalhar mais horas – isso representa aproximadamente 25% da força de trabalho. O Brasil está operando muito abaixo da força de trabalho e tem todo um espaço para estimular a economia por intermédio de investimento público. Esse diagnóstico de que o crescimento da economia é baixo porque o Estado está inchado, que é o argumento do Guedes, não se sustenta.

Numa das transparências (slides) da apresentação dele, que se chama “máquina que gasta muito”, ele fez uma conta de que em 2018 o governo brasileiro, nas suas três esferas, estaria gastando 49,2% do PIB. Mas essa conta está errada. O economista Sérgio Gobetti do Ipea, já mostrou que nessa conta existe um erro de dupla contagem por conta dos funcionários inativos da União, que são contabilizados duas vezes.

Outro erro é que adiciona os saques do FGTS como se fossem despesa pública e, além disso, considera os juros brutos e não os juros líquidos da dívida pública, pois o governo tem um determinado volume de dinheiro em caixa que também recebe juros. Então, ao serem feitas essas correções, a despesa cai para 41% do PIB, ou seja, um número muito menor do que aquele que o Paulo Guedes está mostrando. A justificativa que o Guedes apresenta para o seu plano emergencial é feita em cima de dados incorretos, ou seja, é aquilo que podemos chamar de contabilidade criativa.

IHU On-Line – As PECs propostas pelo governo indicam, de fato, uma redução da atuação do Estado? Pode nos dar alguns exemplos de como a proposta de redução do Estado se manifesta nessas propostas?

José Luis Oreiro – O primeiro exemplo são os “três Ds”: desindexaçãodesvinculação e desobrigação. No fundo, Guedes quer acabar com a distinção entre despesa obrigatória e despesa discricionária e desindexar as despesas públicas, porque muitas delas são indexadas à avaliação da inflação, como era o caso do salário mínimo – está na Constituição que ele tem que ser reajustado pelo menos pela inflação e existiu uma regra nos governos Lula e Dilma em que ele era reajustado segundo a inflação do ano anterior mais o crescimento do PIB de dois anos antes. O salário mínimo, por sua vez, indexa as despesas previdenciárias, ou seja, nenhum benefício previdenciário pode ser menor do que o salário mínimo. Então, ao desindexar o salário mínimo – e esse é um exemplo concreto do que pode acontecer caso a PEC seja aprovada, o que acho pouco provável –, corre-se o risco de ter uma situação na qual uma parte significativa dos benefícios previdenciários e de assistência social no Brasil não seja corrigida nem mesmo pela inflação. Isso, obviamente, vai aumentar a desigualdade de renda e a pobreza.

desvinculação é retirar a obrigatoriedade dos entes federativos de aplicarem até “x”% das suas receitas em saúde e educação. Isso também é algo que vai no sentido de reduzir o tamanho do Estado. No fundo, o que essas PECs estão querendo fazer é reduzir a dívida pública, dando calote não nos credores, mas em parte da sociedade, porque as PECs preveem, entre outras coisas, uma redução de até 25% do salário dos servidores públicos, permitem a desindexação de benefícios previdenciários e de assistência social à inflação. No fundo, é um pacote desenhado para atender aos interesses dos rentistas do Brasil. O governo vai sacrificar uma parte expressiva da população para garantir o pagamento de juros e das amortizações da dívida pública.

IHU On-Line – Especificamente sobre a fusão dos gastos obrigatórios com saúde e educação, tanto o governo quanto aqueles que são favoráveis à mudança afirmam que ela vai permitir uma maior flexibilidade para que os gestores possam utilizar esses recursos de acordo com as necessidades de cada estado ou município. Quais são suas ponderações sobre esse argumento?

José Luis Oreiro – Existe uma razão de ser dessas vinculações: por pior que sejam os serviços de educação e saúde no Brasil, eles são universais. Essa foi a maneira encontrada para transformar essas políticas em políticas de Estado e para não depender do político de plantão do momento. Até acho que é possível discutir se as alíquotas de saúde e educação são as adequadas. Dou um exemplo: o Brasil está passando por um processo de envelhecimento, e quando a população envelhece, a proporção de velhos aumenta e a proporção de jovens diminui. Desse modo, é razoável que em algum momento tenha que se ajustar a vinculação de gastos em saúde e educação a fim de reduzir a alíquota para a educação e aumentar para a saúde, porque basicamente quem tem problema de saúde são os velhos e quem precisa de educação são os jovens. Mas se, de fato, estamos vivendo uma transição demográfica em que o percentual de jovens vai diminuir nos próximos 20 anos, então é razoável que se ajustem os percentuais de receitas aplicados à saúde e à educação. Agora, deixar isso a critério do político de plantão, não acho correto.

IHU On-Line – Outro ponto que tem sido defendido pelo governo e por aqueles que são favoráveis ao pacote econômico é que ele permitirá o equilíbrio fiscal. Do ponto de vista fiscal, o pacote se sustenta ou não?

José Luis Oreiro – Do ponto de vista fiscal, estão adotando mais do mesmo. A ideia implícita de ajuste fiscal que vem desde o Joaquim Levy, passando pelo governo Temer e agora pelo governo Bolsonaro é que, para crescer, primeiro tem que cortar gastos. Primeiro, o Levy cortou pesadamente os gastos em investimentos e com isso aprofundou a recessão de 2014. Em 2016, o governo colocou o Teto dos Gastos que todo mundo sabia que era insustentável por conta dos gastos previdenciários que ainda vão crescer durante um tempo a 3% ao ano em termos reais. Em algum momento, isso levaria não só à necessidade da reforma da previdência, que acabou acontecendo, mas também à discussão sobre os gastos obrigatórios, particularmente os gastos com o funcionalismo público. Então, o que a PEC vai fazer é aprofundar esse modelo de ajuste fiscal, o qual vai aprofundar a crise, porque quando se cortam gastos se gera uma redução do PIB e isso ocasiona uma redução da arrecadação tributária. É como dar um tiro no próprio pé. Este modelo está equivocado.

Ajuste pela receita

Deveríamos pensar num ajuste fiscal que viesse pelo lado da receita: cobrar impostos dos mais ricos, particularmente, impostos de lucros e dividendos distribuídos, fazer uma reforma tributária que diminuísse o peso dos impostos indiretos e aumentasse o peso dos impostos diretos e sobre propriedade. No Brasil, os impostos sobre propriedade arrecadados pelos municípios são muito baixos. Em Brasília, onde estou morando, pago mais de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA do que de Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU, o que é um absurdo, porque o imóvel vale seis, sete vezes mais do que o valor do automóvel. Então, tem um espaço para municípios arrecadarem mais, aumentando o IPTU e o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR. Essa é a discussão que está sendo feita na Europa. Enquanto lá se discutem políticas via reformas tributárias para diminuir a desigualdade por meio da distribuição de renda, aqui estamos querendo desvincular gastos com saúde e educação, cortar os salários do funcionalismo público, como se o percentual do PIB no Brasil gasto com funcionalismo público fosse muito alto; não é.

Chile, por exemplo, gasta como proporção do PIB mais do que o Brasil: 4,7% do PIB, enquanto no Brasil é 4,5%. Nos EUA são gastos 10% do PIB com funcionalismo público. Então, existe um mito de que há um descontrole das contas públicas porque se gasta com funcionalismo público. Isso não é verdade. O descontrole das contas públicas se deu basicamente por causa da queda de receita tributária decorrente da crise de 2014 e 2016 e das desonerações feitas pela dona Dilma em 2012 e 2013.

IHU On-Line – Algum ponto do pacote pode ser positivo para o país?

José Luis Oreiro – Talvez a proposta dos fundos seja interessante, porque tem muito dinheiro parado em fundos, que não estão sendo utilizados. Outra coisa que achei interessante no pacote é o controle das isenções fiscais e subsídios. Não sou contra a desoneração tributária, mas isso tem que ser feito de forma muito criteriosa com base na análise de custo benefício, coisa que não foi feita, diga-se de passagem.

Sobre a PEC dos fundos públicos, segundo a apresentação do ministro, existem 220 bilhões de reais parados em 281 fundos públicos no Brasil. Seria interessante fazer um mapeamento desses fundos e ver quantos de fato não têm razão de ser e podem ser extintos para usar o dinheiro para abater a dívida pública. Essa é uma ideia bastante razoável. Mas aí não se trata de passar a régua e acabar com todos os fundos; tem que olhar caso a caso.

IHU On-Line – Tem algum outro ponto das PECs que precisaria ser reconsiderado, na sua avaliação?

José Luis Oreiro – A ideia de fazer um ajuste emergencial cortando salário dos servidores e serviços é uma maluquice do ponto de vista econômico e social. Do ponto de vista econômico, porque torna a política fiscal ainda mais pró-cíclica. Uma política fiscal pró-cíclica é aquela que vai na mesma direção do ciclo econômico: quando a economia entra em recessão, o governo arrecada menos e então ele pode reduzir os gastos com o funcionalismo em até 25%, o que vai reforçar a queda do produto em função da queda de demanda. Esse é um argumento econômico.

O argumento social é que se o governo vai reduzir o salário do servidor público, reduzindo jornada de trabalho, então o que ele vai fazer, por exemplo, com os professores? Vai reduzir a jornada de trabalho dos professores e eles vão dar menos aulas? Se é assim, então vai ter que haver menos alunos. Vai reduzir a jornada de trabalho dos médicos? Se reduzir a jornada dos médicos, terá que haver menos atendimentos médicos para a população. Vai reduzir a jornada de trabalho dos militares? O que vai se fazer com o Exército? As Forças Armadas deveriam ser, em termos dos servidores da União, aproximadamente 40% dos servidores. O governo vai reduzir em até 25% os salários dos militares, juízes, promotores? No fundo, o governo está dizendo que pode reduzir os serviços que o Estado presta à população. É isto que está nesta PEC: a ideia de que é possível reduzir o volume de serviços que o Estado brasileiro presta à população. Isso não faz o menor sentido.

 

 

O fim do Neoliberalismo e o nascimento da História, por Joseph Stiglitz.

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O declínio simultâneo da confiança no neoliberalismo e na democracia não é coincidência ou uma mera correlação. O neoliberalismo prejudica a democracia há 40 anos.

Jornal GGN

NOVA IORQUE – No final da Guerra Fria, o cientista político Francis Fukuyama escreveu um famoso ensaio chamado “The End of History?”. Ele argumentou que a queda do comunismo eliminaria o último obstáculo que separava o mundo inteiro do seu destino de democracia liberal e economia de mercado. Muita gente concordou.

Hoje, à medida que enfrentamos uma retirada da ordem global liberal baseada em regras, com governantes autocráticos e demagogos à frente de países que contêm bem mais da metade da população do mundo, a ideia de Fukuyama parece peculiar e ingénua. Mas reforçou a doutrina económica neoliberal que prevaleceu nos últimos 40 anos.

A credibilidade da fé do neoliberalismo em mercados desenfreados como sendo o caminho mais seguro para a prosperidade partilhada está na unidade dos cuidados intensivos nos dias de hoje. E com razão. O declínio simultâneo da confiança no neoliberalismo e na democracia não é coincidência ou uma mera correlação. O neoliberalismo prejudica a democracia há 40 anos.

A forma de globalização prescrita pelo neoliberalismo deixou indivíduos e sociedades inteiras incapazes de controlar uma parte importante de seu próprio destino, tal como Dani Rodrik da Universidade de Harvard explicou de forma tão clara e tal como afirmo nos meus recentes livros Globalization and Its Discontents Revisited People, Power, and Profits. Os efeitos da liberalização do mercado de capitais foram particularmente odiosos: se o principal candidato à presidência num mercado emergente “perdesse a graça” em Wall Street, os bancos retirariam o seu dinheiro do país. Os eleitores enfrentavam então uma escolha dolorosa: ceder a Wall Street ou enfrentar uma grave crise financeira. Era como se Wall Street tivesse mais poder político do que os cidadãos do país.

Mesmo nos países ricos, era dito aos cidadãos comuns: “Vocês não podem defender as políticas que desejam” – fosse ela a proteção social adequada, os salários decentes, a tributação progressiva ou um sistema financeiro bem regulamentado – “porque o país perderá competitividade, os empregos desaparecerão e vocês sofrerão”.

Tanto nos países ricos como nos pobres, as elites prometeram que as políticas neoliberais levariam a um crescimento económico mais rápido e que os benefícios iriam ser repartidos para que todos, inclusive os mais pobres, ficassem em melhor situação. Para se chegar a esse patamar, os trabalhadores teriam, contudo, de aceitar salários mais baixos e todos os cidadãos teriam de aceitar cortes em importantes programas governamentais.

As elites alegaram que as suas promessas eram baseadas em modelos económicos científicos e na “investigação com base em provas”. Bem, após 40 anos, os números estão aí: o crescimento diminuiu e os frutos desse crescimento foram na sua esmagadora maioria para um punhado que está no topo. À medida que os salários estagnavam e o mercado de ações subia, o rendimento e a riqueza espalhavam-se para os mais ricos, em vez de se espalharem para os mais pobres.

Como é que a restrição salarial – para alcançar ou manter a competitividade – e a redução dos programas governamentais podem resultar em padrões de vida mais elevados? Os cidadãos comuns sentiram como se lhes tivessem vendido uma lista de artigos. Estavam certos em sentirem-se enganados.

Agora estamos a enfrentar as consequências políticas deste grande artifício: desconfiança das elites, da “ciência” económica em que se baseava o neoliberalismo e do sistema político corrompido pelo dinheiro que tornou tudo isso possível.

A verdade é que, apesar do nome, a era do neoliberalismo estava longe de ser liberal. Impôs uma ortodoxia intelectual cujos guardiães eram totalmente intolerantes à dissidência. Os economistas com perspetivas heterodoxas eram tratados como hereges a ser evitados ou, na melhor das hipóteses, desviados para algumas instituições isoladas. O neoliberalismo continha poucas semelhanças com a “sociedade aberta” que Karl Popper defendia. Tal como George Soros enfatizou, Popper reconheceu que a nossa sociedade é um sistema complexo e em constante evolução, no qual quanto mais aprendemos, mais o nosso conhecimento muda o comportamento do sistema.

Em nenhum lugar essa intolerância foi maior do que na macroeconomia, onde os modelos predominantes descartaram a possibilidade de uma crise como a que vivemos em 2008. Quando o impossível aconteceu, foi tratado como se fosse uma inundação em 500 anos – um fenómeno insólito que nenhum modelo poderia ter previsto. Ainda hoje, os defensores dessas teorias recusam-se a aceitar que a sua crença nos mercados autorregulados e a sua rejeição de externalidades como inexistentes ou sem importância levaram à desregulamentação que foi essencial para alimentar a crise. A teoria continua a sobreviver, com tentativas ptolomaicas de ajustá-las aos factos, o que atesta a realidade de que as más ideias, uma vez estabelecidas, geralmente têm uma morte lenta.

Se a crise financeira de 2008 não conseguiu fazer-nos perceber que os mercados sem restrições não funcionam, a crise climática certamente deveria conseguir: o neoliberalismo acabará literalmente com a nossa civilização. Mas também está claro que os demagogos que querem que viremos as costas à ciência e à tolerância só pioram as coisas.

O único caminho a seguir, o único para salvar o nosso planeta e a nossa civilização, é um renascimento da história. Temos de revitalizar o Século das Luzes e reafirmar o nosso compromisso de horar os seus valores de liberdade, respeito pelo conhecimento e democracia.

Joseph E. Stiglitz, University Professor at Columbia University.

Racionalidade econômica, Liberalismo e Reformas do Estado Nacional  

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Muito se discute na sociedade brasileira as medidas que estão sendo propostas pelo governo com o intuito de tirar a economia da letargia e iniciar um novo ciclo de crescimento econômico, deixando para trás um período de caos e degradação da estrutura produtiva, marcado pelo incremento do desemprego, redução na renda e no salário agregados e uma piora considerável nos indicadores macroeconômicos, como juros, inflação e investimentos.

Nesta discussão encontramos uma miríade imensa de visões e pensamentos econômicos se alternando com o intuito de defender ou de criticar as medidas e as propostas que embalam o atual governo, muitas opiniões estão baseadas em um achismo que nos parece estrutural, onde os liberais defendem uma redução sistemática do Estado como forma de encontrarmos o crescimento da economia e, de outro lado, os grupos de economistas e pensadores da heterodoxia, ou algo parecido com o pensamento descrito como de esquerda, onde este último detona as medidas e destaca sua ineficiência, um embate infantil e muito mais ideológico e partidário do que científico e racionalizado.

Neste debate marcado por muita desinformação e desconhecimento, encontramos equívocos de ambos os lados, uns acreditando que os grandes e estruturais problemas nacionais não serão resolvidos sem uma participação ativa do Estado Nacional, enquanto de outro lado, encontramos teóricos acreditando que o mercado será o grande condutor da economia, o responsável pelos investimentos e pela condução da sociedade, visões antagônicas baseadas em ideologias e pouco centrada em racionalidade econômica e em experiências práticas, isto porque ambos os modelos não passam de experiências teóricas e experimentais, nenhuma delas existe no mundo real, este sim baseado em grandes organizações que dominam o mercado e controlam os governos nacionais, muitas vezes fragilizando-os e colocando em xeque o sistema democrático.

Os grupos à esquerda querem nos fazer crer, que os desequilíbrios econômicos recentes foram inteiramente gerados pelos governos posteriores, julgam ser os donos da verdade, os grandes defensores da população brasileira mais humilde e terem as formas para melhorar as condições e os indicadores macroeconômicos e os desequilíbrios sociais e políticos, mais Estado e incremento nos investimentos governamentais, sem estas medidas o país tende a chafurdar na lama da degradação econômica.

Depois de um período de forte crescimento econômico e grandes investimentos nos chamados campeões nacionais, a herança deixada por governos descritos como de esquerda são bastante controversos em toda região, crescimento econômico acelerado num primeiro momento com fortes repasses para todos os grupos sociais, gerando um grande contingente de ganhadores, euforia e uma suposta exuberância, numa equação que, claramente, não se sustentaria num período de tempo maior, obrigando os governos a escolhas complexas que impactariam sobre a popularidade, levando muitos governantes a optarem por políticas populistas com repasses financeiros elevados e endividamento num futuro próximo. Os grupos de esquerda brasileiros se esquecem facilmente de que, na crise atual vivida pela sociedade brasileira o DNA esquerdista se faz presente de forma evidente, foram políticas públicas generalizadas para os grupos mais vulneráveis e políticas de isenção fiscal para os mais aquinhoados que levaram o país a esta degradação econômica, nos momentos de abundância os gastos foram excessivos e a prudência, fundamental na gestão pública e na iniciativa privada, foram deixadas de lado, com isso, o endividamento público cresceu e a atividade econômica se degradou, levando o país a uma recessão sem precedentes em décadas recentes, com mais de 28 milhões de trabalhadores desempregados, subempregados e na informalidade, além de uma quebradeira generalizada em empresas privadas, desde micro, pequenas, médias e grandes conglomerados.

De outro lado encontramos governos imbuídos de pensamentos descritos como liberais, defendem firmemente políticas de abertura econômica, menos intervencionismo estatal, privatização e uma forte desregulamentação do sistema produtivo, reduzindo benefícios trabalhistas e estimulando um empreendedorismo que nunca fez parte do ideário social brasileiro, nesta visão o Estado é o grande responsável pelo caos econômico e a suposta esquerda é comparada a um comunismo que nunca se instalou com ênfase da sociedade brasileira, discurso confuso, elitista e altamente ideologizado.

Neste embate poucos estão preocupados com os reais problemas da sociedade brasileira, restringem a discussão a questões apenas de ordem econômica, nos discursos defendem que primeiro precisamos arrumar os indicadores destruídos pelos governos de esquerda e depois vamos criar as bases para um crescimento sólido e consistente, elevando a economia brasileira a um novo patamar com investimentos externos crescentes e Bolsas de Valores batendo recordes de exuberância, enquanto isto o lado real da economia, o lado do emprego e da sobrevivência vai ficando para segundo plano, afinal a prioridade é a economia.

Reduzir o tamanho do Estado é uma necessidade urgente e imediata, olhar para os indicadores de solidez fiscal é fundamental, aumentar a produtividade da economia é condição sine qua non para alcançarmos um melhor patamar nesta economia globalizada, altamente oligopolizada, dominada pelas finanças e centrada em novas tecnologias disruptivas e revolucionárias, onde os menos adaptados tendem a se frustrar em um futuro imediato, sem emprego, sem Estado e sem perspectivas. Neste ambiente de conflitos econômicos e desafios crescentes, os grupos políticos precisam se conscientizar, que todos os países que conseguiram se tornar desenvolvidos e deixar para trás a armadilha da renda média o fizeram com uma forte e consistente parceria entre os governos de plantão e os setores empresariais e de mercado, o desenvolvimento é fruto desta união destes agentes econômicos e produtivos, superar esta dicotomia é urgente e extremamente necessário para retomarmos os rumos que perdemos desde as crises externas dos anos oitenta.

Neste momento estamos tomando contato com reformas importantes para a retomada do crescimento econômico, depois da exitosa Reforma da Previdência, outras medidas urgentes estão entrando na pauta do governo, dentre elas destacamos as reformas Tributária, Administrativa e do Estado Nacional, todas elas essenciais para reencontrarmos o crescimento econômico, sem elas a bancarrota total estará cada dia mais próxima e seus impactos serão mais ameaçadores, com fortes tendências de sublevação social, como estamos visualizando em várias regiões do mundo, desde os vizinhos Chile, Bolívia e Peru, até sociedades consideradas mais desenvolvidas, como Hong Kong e Barcelona.

Reformar o Estado Nacional é um dos maiores desafios dos governos, neste momento o Ministro da Economia, Paulo Guedes, enviou para apreciação dos congressistas, algumas medidas que se forem adotadas tendem a revolucionar os órgão públicas, desde transformações efetivas no funcionalismo público, com flexibilização da estabilidade até redução de salário em momentos de crise econômica, além de medidas concretas para reduzir o número excessivo de municípios no país, muitos deles criados em momentos de euforia financeira, com pouco ou nenhuma sustentação econômica e produtiva, transformando-os em mais espaço para gastos públicos exagerados e poucos resultados efetivos para a população, degradando ainda mais os serviços prestados por este ente federativo.

Muitas destas propostas são vistas como importantes e imprescindíveis para estimular a solidez fiscal do Estado Brasileiro, embora muitas delas sejam vistas como ambiciosas, acreditamos que estas só seriam propostas por governos mais sintonizados com o pensamento da direita, isto porque afetam diretamente grupos políticos fortemente atrelados ao pensamento da esquerda, embora ambiciosas estas medidas são importantes e devem suscitar o debate sobre qual país queremos e imaginamos para um futuro imediato.

Em um ambiente de grandes instabilidades, fazem-se necessário a adoção de inúmeras medidas de impacto, dentre elas, destacamos uma forte reversão de muitas isenções fiscais e tributárias, calculadas em mais de 330 bilhões de reais, que beneficiam grandes grupos organizados que extraem do Estado Nacional altas somas de recursos públicos para suas próprias benesses, levando o governo a fortes desequilíbrios em suas contas, com isso, os serviços públicos se degradam rapidamente e os mais prejudicados são as classes menos favorecidas que mais utilizam os serviços públicos. Mudar esta equação insana não deve ser uma tarefa para um ou outro grupo político, mas para todos aqueles que pensam a sociedade brasileira e vislumbram um futuro mais consistente, com serviços públicos melhores, mais eficientes e contas públicas equilibradas.

Vivemos em um país dual, com realidades contraditórias e crescentes, de um lado estamos discutindo sobre os desafios da Quarta Revolução Industrial, estimulando as start-up, propondo práticas educativas empreendedoras e inovadoras, debatendo sobre desafios dos recursos humanos, da inteligência artificial, da internet das coisas e da qualificação para o século XXI e, ao mesmo tempo, nos encontramos um país marcado por um contingente de 100 milhões de casa sem saneamento básico, onde crianças e jovens crescem com esgoto a céu aberto, sujeito a doenças primárias e alimentação precária, vivemos em duas ou mais sociedade, uma no século atual enquanto outra se rasteja nas trevas da degradação, da marginalidade e na corrupção generalizadas.

As transformações da sociedade mundial estão num ritmo muito acelerado, os governos devem adotar políticas efetivas e atuam mais na regulação, consolidando as instituições e capacitando a mão de obra, fortalecendo as empresas nacionais e investindo recursos em pesquisa, ciência e tecnologia, todas estas ações devem ser concatenadas com a iniciativa privada visando uma melhora na produtividade da economia e uma maior empregabilidade dos trabalhadores nacionais, deixando de lado o Estado gigante, lento e ineficiente, marcado pelo excesso de atribuições econômicas e caracterizado por serviços públicos de péssima qualidade, a economia do século XXI se caracteriza pelo conhecimento e pela inovação, estamos muito atrasados mas temos, internamente, as energias necessárias para nos consolidarmos como um dos eixos deste sistema global de inovações e conhecimento, desde que nos libertemos de uma visão medíocre e patrimonialista que está na raiz da sociedade brasileira. A Reforma do Estado é fundamental e deve ser feita de uma forma efetiva e abrangente, mas não podemos deixar que os esforços destas reformas recaiam apenas sobre os trabalhadores das classes sociais mais aviltadas e degradadas, a reforma deve ser feita e todos os grupos sociais, tantos os mais aquinhoados e a classe média, devem dar seu quinhão de contribuição para a melhoria do Estado e para o desenvolvimento inclusivo e estruturado da sociedade brasileira.

Privacidade, Sigilo, Intimidade, Laços Humanos – e Outras Perdas Colaterais da Modernidade Líquida – Zygmunt Bauman

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Alain Ehrenberg, analista particularmente inspirado da ainda curta – mas já dramática – história do indivíduo moderno, tentou apontar a data de nascimento da revolução cultural do modernismo tardio (ao menos de sua ramificação francesa) que deu origem ao mundo da modernidade líquida que ainda habitamos, elaboramos e reformulamos dia após dia.

Ehrenberg escolheu uma tarde outonal de quarta-feira nos anos 1980, quando uma certa Vivienne, uma “mulher francesa comum”, declarou em um programa de entrevistas na televisão, diante de alguns milhões de espectadores, que seu marido Michel sofria de ejaculação precoce, razão pela qual ela jamais havia experimentado um orgasmo durante toda a sua vida de casada.

O que havia de tão revolucionário no pronunciamento de Vivienne que justificasse a escolha de Ehrenberg?

Dois aspectos reciprocamente interligados: primeiro, algo quintessencialmente, até etimologicamente privado era tornado público – ou seja, era dito diante de todos que desejassem ouvir, ou ouvissem por acaso.

Segundo, a arena pública, ou seja, um espaço aberto de acesso não controlado, foi utilizado para discutir e dar vazão a um assunto de relevância, pertinência e emoção inteiramente privadas.

Juntas, essas duas reviravoltas legitimaram o uso público de uma linguagem desenvolvida para conversas privadas e mantidas entre um número restrito de pessoas selecionadas.

Mais precisamente, essas duas novidades interconectadas deram início à mobilização em público – para o consumo e uso de audiências públicas – de um vocabulário desenvolvido a fim de narrar experiências subjetivas e vivenciadas em privado (Erlebnisse, em oposição a Erfahrungen).

Conforme os anos se passaram, no entanto, ficou claro que o verdadeiro significado daquele evento havia sido a obliteração dá até então sacramentada divisão entre as esferas “pública” e “privada” da vida humana corpórea e espiritual.

Ao observamos o episódio em retrospecto, com todas as vantagens que a perspectiva nos proporciona, é possível dizer que a aparição de Vivienne diante de milhões de homens e mulheres franceses colados às telas de suas televisões também introduziu aos espectadores – e, através deles, todos os seus entes queridos e estimados e, por fim, o resto de nós – em uma sociedade confessional.

Trata-se de um tipo de sociedade até então inaudito e inconcebível, em que microfones foram instalados dentro de confessionários, cofres eponímicos e depositários dos segredos mais secretos, do tipo de segredos que só seriam revelados a Deus ou a seus mensageiros terrenos e plenipotenciários.

É uma sociedade em que alto-falantes conectados a esses microfones foram colocados em praças públicas, locais antes voltados para a vazão e ostentação de questões do comum, de interesses, preocupações e urgências compartilhados.

E assim a origem da sociedade confessional foi o momento do triunfo final da privacidade, que havia sido a invenção primordial da modernidade – mas também o início de sua queda vertiginosa a partir do ápice de sua glória.

A hora de sua vitória (pois é isso que foi) pírrica: a privacidade invadiu, conquistou e colonizou o âmbito público às custas da perda de sua autonomia – seu traço definidor, e também seu privilégio mais estimado e ferrenhamente defendido.

Mas, para melhor compreendermos as reviravoltas atuais desse enredo, vamos começar do começo.

O que é “privado”? Qualquer coisa que pertença ao âmbito da “privacidade”.

Para descobrir o que se entende por “privacidade” em nossos dias, contudo, vamos visitar a Wikipedia, site conhecido por buscar e registrar de forma ágil e diligente o que a sabedoria popular acredita/aceita que seja a verdade a respeito de uma questão, seja essa verdade qual for, e por atualizar suas descobertas dia sim, dia não, seguindo assim a uma curta distância seus alvos, conhecidos por correrem mais depressa até mesmo do que os seus perseguidores mais dedicados.

Como era possível ler na versão de língua inglesa da Wikipedia em 14 de julho de 2010, a privacidade é a capacidade de um indivíduo ou de um grupo de isolarem a si próprios ou informações a seu respeito e, assim, revelarem-se de forma seletiva… Às vezes, a privacidade é associada ao anonimato, o desejo de passar desapercebido ou sem ser identificado no âmbito público.

Quando algo é privado para uma pessoa, isso geralmente significa que há algo dentro delas considerado especial por natureza, ou sensível do ponto de vista pessoal… A privacidade pode ser vista como um aspecto da segurança, em que a interação entre os interesses de um grupo e de outro se tornam especialmente claros.

E o que é, por outro lado, a “arena pública”? Um espaço com acesso livre para qualquer um que nele deseje ingressar.

Tudo o que pode ser ouvido ou visto em uma “arena pública” pode, por princípio, ser ouvido ou visto por qualquer pessoa. Levando em conta que (para citarmos novamente a Wikipedia) “o grau em que se expõem informações privadas depende de como o público receberá essa informação, algo que varia conforme o local e ao longo do tempo”, manter um pensamento, um evento ou um ato privado ou torná-los público são, por óbvio, ações tão contraditórias quanto – em razão do limite móvel que os separa e conecta – interdependentes.

Os âmbitos do “público” e do “privado” tendem a estar sempre em pé de guerra, assim como as leis e normas de decência que se vinculam dentro desses âmbitos. Para cada um desses dois âmbitos, o ato de se autodefinir e autoafirmar é executado em oposição ao outro âmbito.

De regra, os campos semânticos dessas duas noções não estão separados por limites que permitam ou incentivem o tráfego de duas mãos, e sim por linhas de frente – de preferência, intransponíveis e fortificadas de ambos os lados da fronteira, a fim de deter os invasores e vira-casacas que costumam se instalar junto às barricadas, mas, sobretudo, os desertores que tentam fugir do seu próprio lado.

Mas, de regra, mesmo antes que seja declarada uma guerra e que ações belicosas tenham lugar (ou no caos em que há uma trégua), essas fronteiras toleram apenas um tráfego seletivo, pois o tráfego livre desafiaria a própria noção de linha divisória, assim tornada redundante.

O controle e o direito a decidir quem ou o que tem permissão para ultrapassar essa linha e de quem ou o que está destinado a ficar apenas de um lado, assim como o direito de decidir que itens de informação têm a prerrogativa de permanecerem privados e quais são autorizados, induzidos ou obrigados a se tornarem públicos é, de regra, alvo de disputa ferrenha.

Durante a maior parte da era moderna, temia-se e esperava-se que o ataque à atual fronteira entre público e privado e, ainda mais importante, a revogação unívoca e a mudança arbitrária das regras existentes para o trânsito na fronteira viessem exclusivamente do lado “público”.

Havia uma forte desconfiança de que as instituições públicas pretendiam invadir e conquistar a esfera do privado e subjugá-la, assim reduzindo severamente o âmbito do livre-arbítrio individual ou de grupo, privando indivíduos ou grupos humanos de abrigo e, por consequência, da segurança pessoal ou grupal.

Os demônios mais sinistros e atormentadores que assombraram a “modernidade sólida” foram retratados por George Orwell de forma sucinta, mas ainda assim vívida, através de sua imagem recorrente da bota que pisoteia um rosto humano.

De forma algo inconsistente, mas não infundada, suspeitava-se que as instituições públicas tinham propósitos insidiosos, ou que malignamente erguiam barricadas para impedir que muitas preocupações privadas tivessem acesso à ágora ou a outros locais de livre circulação de informações – locais onde era possível negociar a transplantação de problemas particulares ao nível das questões públicas.

Por óbvio, o histórico igualmente abominável de duas variações do totalitarismo típicas do século XX, semelhantes em sua ganância e crueldade (que, como se quisessem somar ao desespero a falta de perspectivas, pareciam ter exaurido entre elas todo o espectro das escolhas imagináveis.

Enquanto uma dessas variantes reivindicava o legado do Iluminismo e de seu projeto moderno, a outra vituperava esse ato fundacional da modernidade como um triste equívoco, ou mesmo um crime, rejeitando o projeto moderno por considerá-lo uma receita para o desastre), conferiram veracidade a essas suspeitas, e também uma justificativa para a ansiedade que delas emanava.

A esperança de satisfazer as demandas de autoafirmação individual e construção comunitária e, ao mesmo tempo, desarticular o conflito entre a autonomia e o pertencimento foi investida em tempos recentes nas tecnologias de ponta conhecidas por facilitarem de forma espantosa o contato e a comunicação entre humanos.

Por outro lado, a frustração da esperança investida nesse processo vem ganhando força e se difundindo.

Para terem uma chance de sequer serem notadas, as mensagens eletrônicas tendem a ser abreviadas e simplificadas de modo a entregar todo o seu conteúdo antes que a atenção seja interrompida e se desloque para outro lugar – necessidade que as torna completamente inadequadas para a transmissão de ideias profundas, que exigem reflexão e contemplação para que sejam absorvidas.

A tendência de abreviar e simplificar mensagens, de torná-las cada vez mais superficiais e, assim, ainda mais favoráveis à deriva, marcou desde o início a breve mas tempestuosa história da Rede Mundial de Computadores.

Partimos de cartas elaboradas e atenciosas para os e-mails, e deles às ainda mais abreviadas e simplificadas mensagens de celular, até enfim chegarmos aos “tweets” que não admitem mais que 140 caracteres [1].

Se aplicarmos o princípio darwinista de “sobrevivência do mais apto” ao mundo eletrônico, a informação com maior chance de capturar a atenção humana seria aquela mais breve, mais superficial e menos carregada de sentidos: frases ao invés de argumentos elaborados, palavras avulsas ao invés de frases, fragmentos de gravações sonoras ao invés de palavras.

O preço que todos pagamos por termos mais informação “disponível” é o encolhimento do significado de seu conteúdo; o preço de sua pronta-entrega é a redução radical de sua significância.

A outra ambivalência endêmica à nova tecnologia da informação, intimamente interligada à anterior, é a imensa facilidade de se construir comunidades, que vem em conjunto com a facilidade igualmente imensa de desmantelá-las.

Usuários do Facebook se gabam de estabelecerem quinhentas “novas amizades” em um dia – mais do que consegui ao longo de uma vida de oitenta e cinco anos. Mas isso não revela que, quando falamos de “amigos”, temos em mente tipos bem diferentes de relação?

Diferentemente da formação para o qual o termo “comunidade” (ou, se assim quisermos, qualquer outro conceito que se refira ao lado público da existência humana, a “totalidade” das associações humanas) foi originalmente cunhado, as “comunidades” da Internet não são pensadas para durar, e muito menos para se equipararem à sua duração no tempo.

É fácil se juntar a elas, mas também é fácil deixá-las ou abandoná-las no exato instante em que a atenção, as simpatias e antipatias e os humores e modismos se bandearem para outro lado, ou no momento em que o tédio gerado por “mais do mesmo, sempre o mesmo” vier à tona e fizer com que o estado atual das coisas pareça monótono e pouco apetitoso, como cedo ou tarde há de acontecer sempre em uma vida e em um mundo bombardeados o tempo todo por ofertas novas (e cada vez mais tentadoras e sedutoras).

As comunidades da Internet (recentemente denominadas de forma mais precisa como “redes de contato”) são construídas e dissolvidas, ampliadas ou reduzidas pelas ações múltiplas oriundas de decisões/impulsos individuais de “se conectar” e “se desconectar”.

Elas são, portanto, eminentemente intercambiáveis, frágeis e irremediavelmente meióticas. É por esse exato motivo que muitas pessoas criadas no cenário líquido-moderno atual comemoram sua chegada e preferem-nas às comunidades “à moda antiga”, lembradas por monitorarem a conduta diária de seus membros e mantê-los em rédeas curtas, combatendo qualquer sinal de deslealdade ou até mesmo contravenções ínfimas, e fazendo com que mudar de ideia ou deixar essa comunidade tivesse um custo exorbitante ou fosse mesmo impossível.

É justamente seu estado perpétuo de transitoriedade, sua assumida natureza temporária, porque sempre provisória, sua não exigência de qualquer compromisso de longo prazo (e muito menos de caráter incondicional) ou de lealdade única e disciplina rígida que as tornam tão atraentes para muitas pessoas.

Em resumo: podemos deduzir que, para fazer da liberdade individual algo genuíno, devemos fortalecer – e não enfraquecer – os laços de solidariedade inter-humana.

O comprometimento de longo prazo gerado por uma solidariedade sólida pode ser visto como uma espécie de bênção, mas o mesmo vale para a ausência de comprometimento que torna a solidariedade desinibida e pouco confiável.

A privacidade e o público coexistem em uma relação repleta de som e fúria.

Ainda assim, se os dois não estiverem presentes, a proximidade humana se torna tão inconcebível quanto a água sem a presença simultânea do hidrogênio e do oxigênio.

Cada um desses parceiros precisa do outro para atingir sua inteireza; nesse tipo de coexistência, os atritos de uma guerra seria o suicídio de ambos.

Hoje, como no passado e no futuro, o autocuidado e o cuidado pelo outro apontam para a mesma direção e recomendam a mesma estratégia e a mesma filosofia de vida. Por isso, é improvável que a busca por uma trégua – ou o som e a fúria – chegue ao fim.

[1] Hoje, diferentemente do que ocorria à época em que este artigo foi escrito, a rede social Twitter permite até 280 caracteres por mensagem. (N.T.)

“Há uma crise de confiança nos políticos e nas empresas” diz Eric Ries

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Revista Época Negócios – 31 de Outubro de 2019.

Para o criador da teoria da startup enxuta, quem vai mudar essa situação é uma nova geração de empreendedores que se preocupam com a inclusão, a sustentabilidade e o futuro da humanidade.

Considerado um dos maiores gurus do empreendedorismo, Eric Ries se tornou uma lenda ao criar a teoria da Lean Startup, ou Startup Enxuta, em 2011. É dele a regra sagrada seguida por 10 em cada 10 empreendedores: crie um produto minimamente viável, teste, mude, teste de novo, até chegar em um produto inovador e, ao mesmo tempo, capaz de conquistar o mercado. E, quando tiver conseguido, faça tudo de novo.

A metodologia foi explicada generosamente pelo autor no best-seller A Startup Enxuta, que vendeu mais de 1 milhão de cópias em todo o mundo. Mais recentemente, em 2017, Ries repetiu a dose com O Estilo Startup, onde defende que todas as empresas devem adotar a mentalidade de uma startup. “Pense como uma startup ou morra” é um de seus mantras – segundo ele, essa é a única maneira de sobreviver em um mundo cheio de incertezas.

De volta ao Brasil – ele esteve aqui pela primeira vez em 2015 – para uma palestra no HSM Expo 2019 (no dia 4 de novembro), Eric falou com exclusividade à Época NEGÓCIOS. “Minha lembrança mais marcante do Brasil é a energia dos empreendedores que conheci. Mais tarde, também me encontrei com vários brasileiros que moram no Vale do Silício. São sempre eles que mais me procuram depois dos eventos”, diz. Confira a seguir os principais trechos da conversa.

Faz dois anos que você lançou O Estilo Startup. Na época, dizia que, para sobreviver às incertezas, era preciso pensar como uma startup. Tenho a impressão de que o mundo ficou ainda mais maluco de lá para cá.
Sim, eu acho que você tem razão (risos). Com todos os conflitos políticos e comerciais acontecendo no mundo hoje, a incerteza nunca foi tão forte. O que eu percebo nesse momento é que existe uma enorme crise de confiança. As pessoas não confiam mais nos políticos, e boa parte delas desconfiam também das grandes empresas. Quer dizer, houve um tempo em que as pessoas colocavam suas esperanças nas grandes companhias de tecnologia. Acreditava-se que elas estavam fazendo coisas importantes, que iriam mudar o mundo. Mas essa sensação também já ficou para trás.

Apesar de tudo isso, estou otimista em relação ao futuro. Em meio ao caos, você vê dezenas de startups surgindo, e essas empresas têm um jeito diferente de pensar. Elas estão preocupadas com o longo prazo, com o futuro da humanidade, com o que é preciso fazer para deixar a sociedade mais inclusiva e sustentável. Seu propósito é muito forte, então não vão cometer os mesmos erros que seus antecessores. Então eu acredito que essa nova geração vai mudar esse cenário, e as pessoas vão voltar a acreditar nas empresas, e em seu poder para melhorar as coisas.

No cenário atual, você ainda defende que as grandes companhias pensem e ajam como uma startup?
Acho que nunca foi tão importante pensar como uma startup. Mas, desde que lancei o livro, vejo muitas companhias tentando fazer a mudança e fracassando. Algumas delas até acreditam que estão no caminho certo, mas não chegaram nem perto. Recentemente, conversei com o CEO de uma grande empresa, e ele estava orgulhoso, dizendo que havia ensinado a teoria da Startup Enxuta para 6 mil funcionários. Perguntei o quanto isso representava em termos de porcentagem, e ele respondeu que era 10% dos funcionários. Bom, isso é muito pouco. Eles nunca vão conseguir mudar desse jeito. Para grandes corporações, pode levar anos e anos até que realmente consigam fazer a transformação.

Já conversei com vários CEOs sobre as dificuldades em adotar novas metodologias, como lean startup ou agile. A maioria me diz que o mais difícil é transformar a cultura da empresa. Você concorda?
Essa também é a minha experiência. Mudar a cultura corporativa é sempre a parte mais difícil. Você não pode eliminar de uma hora para outra algo que vem sendo acumulado ao longo dos anos, e está gravado na mente de todos os funcionários. Não basta chegar para eles e dizer: “Agora, mude!”. Não funciona assim. É um processo longo, difícil e doloroso. E a maioria das companhias não está realmente disposta a passar por isso. E, mesmo quando estão dispostas, é realmente difícil. Mesmo que estejam fazendo tudo certo, pode levar alguns anos para chegar lá. Mas eu acredito que a nova geração de empreendedores vai fazer as coisas diferentes desde o começo. E é por isso que, no caso delas, vai dar certo.

Se você tivesse que dizer a um CEO qual a mudança mais importante para implantar na companhia, o que diria?
O mais importante é aprender a organizar em pequenos times autônomos. Comece com um time, que combine diferentes tipos de talentos e expertises. E daí deixe eles à vontade para experimentarem novas ideias, produtos ou serviços para a empresa. Juntos, eles chegarão a um protótipo que possa ser testado no mercado. E vão poder testar esse produto com muito mais rapidez do que a empresa faria. Nesse momento, você vai perceber como uma startup funciona, e como o processo é mais ágil e eficiente. Então esse é um bom começo.

Outro ponto importante é mudar a mentalidade da empresa. O problema é que são muitos participantes: você tem que transformar as mentes de funcionários, gerentes, fornecedores e investidores. No caso dos investidores, costuma ser muito difícil. Eles não entendem por que vão ter que esperar mais pelo retorno do seu investimento, que é o que acontece para quem adota o Estilo Startup. Eles não querem saber isso. Se a empresa tiver recursos próprios para inovar, pode tentar contornar esse problema. Mas, se quiser inovar continuamente, vai ter que trabalhar com investidores, não tem jeito.

Você já disse que o corporate venture mata as startups. Ainda acredita nisso? Ou há casos em que esse tipo de parceria funciona?
Eu acredito que o corporate venture é muito ruim para as startups, sim. É uma pena que tanta gente ainda insista nesse modelo. Eu diria para os CEOs que esse é o jeito mais preguiçoso de tentar inovar: pedindo a alguém de fora que tenha as ideias, ou então criando programas para encontrar quem já está inovando. Até que um CEO crie uma startup dentro da própria empresa, até que tenha essa referência, ele não vai entender como funciona uma startup. E, sem saber disso, não vai conseguir organizar um bom programa de startups. Não vai saber o que está procurando, nem como achar. A mudança tem que partir de dentro da empresa.

Seu empreendimento mais recente é a Long-Term Stock Exchange, uma nova bolsa de valores para o mercado americano. A proposta da LTSE foi aprovada em maio pela Comissão de Valores Mobiliários dos EUA. Quais são os próximos passos?
Ainda há mais algumas fases a percorrer, mas queremos começar a atuar no final deste ano. Eu acredito que as pessoas estão subestimando o impacto que essa iniciativa pode ter. Nossa ideia é criar um novo tipo de bolsa de valores, uma plataforma que recompense investimentos e estratégias de negócios com foco no longo prazo [pelas regras do LTSE, quanto mais tempo ficar com suas ações, mais poder de voto os acionistas terão]. Dessa maneira, as empresas não precisaram buscar o retorno imediato, e terão mais incentivo para inovar.

 

O Brasil não tem pobres, apenas empreendedores que precisam de tempo

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Esther Solano – Carta Capital – Outubro 2019

No neoliberalismo, o sucesso e o fracasso são despolitizados. Tudo se resume ao mérito ou culpa do indivíduo

Saía de casa para visitar, com meus alunos, o Centro de Memória Sindical em São Paulo, quando se atravessou a vida com seus paradoxos. No primeiro semáforo depois de sair de casa, um homem vendia cinco panos por 10 reais, caminhando entre os carros. O vendedor devia ter uns 50 anos, visivelmente empobrecido, visivelmente cansado e visivelmente triste. Ainda mais triste que o olhar do homem que vendia panos eram as palavras escritas num cartaz que ele levantava com uma mão: “Sou empreendedor, só preciso de tempo”. Senti um nó na garganta e no estômago quando li essas palavras, por causa da violência tão monstruosa que elas escondiam. Ele, cujo negócio se resumia a cinco panos por 10 reais, não era pobre, era empreendedor.

O neoliberalismo, ainda mais em um país periférico como o Brasil, aniquila. Isso sabemos muito bem. Mas aniquila com maestria, com um virtuosismo de cair o queixo. A racionalidade neoliberal penetra as mentes, adentra-se pelos corações até invadir tudo. A racionalidade neoliberal constrói-se em uma lógica perversa do sujeito do desempenho, o empreendedor de si mesmo, o homem batalhador. Como consequência, a vida despolitiza-se. A conquista é produto unicamente de nosso trabalho e de nosso esforço. Ao longo destes anos, nas minhas entrevistas com conservadores brasileiros de classes populares ouvi coisas do tipo “eu ganhei Minha Casa Minha Vida, mas não que tenha casa agora pelo programa ou pelo PT. Eu teria conseguido do mesmo jeito, porque eu me esforço muito e eu merecia”. Ou “meu filho conseguiu entrar na universidade pelo Fies, mas isso não teve nada a ver com o Fies, realmente foi ele que trabalhou duro e estudou muito”. Eu mereci porque trabalhei.

Meu mérito, minha conquista. Meu fracasso, minha culpa. A culpa também é produto da lógica do neoliberalismo. O sucesso despolitiza-se, mas o fracasso também. Lembro-me da entrevista de uma mulher adolescente, digamos que de nome Bárbara, negra e periférica, que iria votar em Jair Bolsonaro e repetia, convicta, o discurso da meritocracia. Ela me disse “eu vou prestar o vestibular, e não tem essa de que eu tenho menos oportunidades que os jovens brancos de classe média. Isso é mimimi, racismo reverso. Vou estudar muito e se eu não conseguir será minha culpa, será porque eu não sou boa o suficiente para estudar”.

Bárbara, mulher negra periférica, me disse, com calma e contundência, que racismo, pobreza e machismo, no Brasil, são “vitimismo”. Penso com frequência nela. Não sei se ela entrou na faculdade. Se não, com certeza ela sente que o fracasso foi culpa dela, mas, calma, o neoliberalismo também tem resposta para isso, basta combater a dor com remédios. Você não é um vencedor, é um fracassado, sente culpa, mas, tranquilo, não pense demais, não se insubordine, não se inquiete, pelo amor de Deus não vá protestar na rua nem caia na loucura de arranjar um movimento social, sindicato ou partido, tome remédio. O adoecimento mental, resultado do modelo da sociabilidade meritocrática, resolve-se não com política ou luta, mas com pílula. “Patologizar” a vida é a saída.

João Doria soube muito bem jogar esse jogo na sua campanha eleitoral para a prefeitura de São Paulo, em 2016. Ele era o João Trabalhador, que acordava cedo e, suando a camisa, conseguiu se transformar no Doria empresário. Querer é poder. Você é foda, você é um vencedor, basta ter vontade e correr atrás. Todo mundo pode ser um empresário de sucesso. Do neoliberalismo ao coaching, outra ferramenta feroz de controle e violência. Entrem numa livraria e folheiem as obras de autoajuda e coaching nas prateleiras. Parece que você tem a obrigação de estar sempre feliz e de ser um campeão. Tristeza ou derrota não aparecem no vocabulário. Eu sinto arrepios com esses livros e sempre lembro da Bárbara. A partir de hoje lembrarei também do homem que vendia panos. Ele não era pobre, era empreendedor.

 

Sofrimentos cotidianos, provas e expiações na visão espírita

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O sofrimento acomete a sociedade mundial desde os primórdios da humanidade, somos sempre vitimados por dificuldades, dores e provações e estamos envoltos por problemas dos mais variados tipos, não importando a classe social, grau de instrução e o gênero, somos todos passíveis de sofrimentos, de quedas e de dificuldades, afinal estamos num mundo imperfeito, com pessoas imperfeitas e cheio de contradições.

A Doutrina Espírita nos traz uma visão nova sobre a questão do sofrimento humano, vivemos num mundo de provas e de expiações e neste mundo somos muito atraídos pelo sofrimento e pelas dores do cotidiano. Na questão 931 de O livro dos Espíritos, Allan Kardec pergunta ao Espírito da Verdade: Por que são mais numerosas, na sociedade, as classes sofredoras do que as felizes? E recebe a seguinte resposta: “Nenhuma é perfeitamente feliz e o que julgais ser a felicidade muitas vezes oculta pungentes aflições. O sofrimento está por toda parte. Entretanto, para responder ao teu pensamento, direi que as classes a que chamas sofredoras são mais numerosas, por ser a Terra lugar de expiação. Quando a houver transformado em morada do bem e de Espíritos bons, o homem deixará de ser infeliz aí e ela lhe será o paraíso terrestre”.

A Doutrina Espírita nos mostra claramente que os momentos de alegrias e de dificuldades se alternam na vida dos seres humanos, nenhum destes são totalmente felizes, alternamos momentos de felicidades, de alegrias e sorrisos sinceros com momentos de decepções, dores e dificuldades. As alegrias eternas ainda não pertencem ao mundo atual, mas num futuro próximo poderemos vivenciá-la, desde que entendamos a realidade da vida e passemos a trabalhar intimamente visando um progresso e uma evolução constantes, para isso devemos viver em concomitância com as Leis divinas.

Num mundo marcado pelo crescimento das tecnologias, as redes sociais ganharam espaço e relevância nesta sociedade e passou a moldar comportamentos e atitudes, muitos indivíduos colocam fotos nas redes destacando sorrisos e alegrias, muitas delas artificiais e momentâneas, criando para outrem a ilusão de uma felicidade inexistente, atraem com isso olhares de inveja e de cobiça, em muitos casos, de rancor e de ressentimento de pessoas invejosas e infelizes, que ambicionam e invejam a felicidade alheia, incapazes de construir para si uma felicidade verdadeira, sólida e consistente.

Muitas pessoas ricas e profissionalmente de destaque, indivíduos que conseguiram acumular um patrimônio vultuoso, com recursos para viagens e passeios paradisíacos, detentoras de famílias estruturadas, muitas vezes se queixam de sofrimentos, de dores emocionais e de vazios espirituais e existenciais, são indivíduos que possuem tudo para serem considerados felizes, mas se declaram depressivos e excessivamente melancólicos, males modernos que acometem a sociedade mundial e vitima milhões de pessoas no mundo. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), mais de 350 milhões de indivíduos sofrem de depressão no mundo, a chamado moléstia da alma e, da forma como a sociedade global está caminhando, muitos outros serão afetados por esta doença, cujas dores são imensas e exigem tratamentos médicos e espirituais.

O sofrimento, como nos disse o Espírito da Verdade, está por todos os lados e afeta todas as pessoas, independe de classes sociais, etnias e preferências sexuais, isto acontece porque somos passageiros de uma sociedade caracterizada como de provas e de expiações, onde as felicidades são passageiras e os amores materiais são temporários e inconsistentes, numa sociedade marcada pelas contradições e os indivíduos pelas incertezas e instabilidades crescentes. O Espiritismo nos mostra ainda, que os sofrimentos humanos estão inscritos no subconsciente de cada indivíduo, todos sabemos os motivos de nossas infelicidades e de nossas dores, a explicação está dentro de cada pessoa, no interior de cada indivíduo, mas para podermos acessar estas dores necessitamos refletir sobre nossos comportamentos, refletir sobre nossas vidas e sentimentos mais íntimos e, numa sociedade como a nossa, termos tempos para nossas reflexões é um dos maiores desafios da sociedade e do cidadão da contemporaneidade.

Numa sociedade marcada pelas provas e pelas expiações, faz-se necessário que entendamos as raízes das dificuldades do mundo, mesmo vivendo neste momento histórico e caminhando para um mundo novo, como nos mostra os escritos de Transição Planetária, ainda chafurdamos na lama e na pobreza de um mundo onde os odores estão atrelados ao ressentimento, a inveja e ao egoísmo, sentimentos fortes e dominantes que ainda não nos conduz a um crescimento mais sólido e consistente, como o espiritismo nos mostra com clareza e maestria.

No mundo de provações, nos mostra Joanna D Angelis no livro Plenitude, psicografia de Divaldo Pereira Franco, os sofrimentos são vistos como instrumentos de educação e de progresso espiritual, quando conseguimos vencer as dificuldades damos um passo consistente para um progredir fundamental para nosso desenvolvimento espiritual, ambicionados por todos os espíritos encarnados no mundo material. As expiações servem para que nos reeduquemos enquanto espíritos, ao passar por estas experiências dolorosos conseguimos melhorar nossos comportamentos e, em muitos casos, voltamos para um momento anterior, quando cometemos equívocos e degradamos nossos passos para o progresso, como um suicida que ao se entregar aos deslizes do suicídio engendra dores imensas em seu caminhar, para estes, as expiações servem para reconstruir o caminho perdido anteriormente.

As dores das provações, segundo os bons espíritos são agressivas e violentas, mas são suportadas pelo indivíduo, são dores que lhe acometem o corpo físico ou os vazios do espírito, mas que, com força de vontade, perseverança e fé em Deus são suportados e superados. As expiações são mais severas e agressivas, muitas vezes aparecem como dores morais ou deficiências e limitações físicas que impõem aos indivíduos grandes dificuldades, obrigando-o a uma grande força de vontade para superar este momento de dores, lágrimas e intensas desesperanças.

Nas provações os espíritos que estão reencarnando podem participar dos planejamentos para a reencarnação ou são representados por espíritos amigos ou protetores espirituais que trabalham com o objetivo de auxiliar para que a reencarnação atinja seus mais auspiciosos êxitos e o irmão em prova consiga crescer espiritualmente e se desenvolver moralmente, angariando novos e consistentes valores. Nos sofrimentos de expiação percebemos uma outra realidade, estes irmãos são obrigados a aceitar o que lhe é imposto pelo plano superior, estes indivíduos ao reencarnar tendem a passar por uma situação que lhe é imposta pela espiritualidade como forma de se reeducar e construir novos espaços de consolidação espiritual.

As expiações são muito mais severas para o espírito, neste processo ele perde a condição de escolha e tudo lhe é imposto, obrigando-o a aceitar e buscar trabalhar para que seu espírito consiga se reeducar das agruras e dos desequilíbrios anteriores, fruto da imperícia do espírito que, mesmo cometendo equívocos severos não está sendo condenado ao degredo eterno, isto não existe nas Leis de Deus, mas o espírito precisa se reeducar para trilhar novos momentos de crescimento espiritual e de desenvolvimento moral.

No livro Memórias de um suicida, psicografia de Yvonne do Amaral Pereira, Camilo Cândido Botelho e seus amigos descobrem na vivência no Instituto Maria de Nazaré, que suas próximas encarnações seriam marcadas por dores acerbas, nesta situação muitos deles não poderiam escolher quais seriam suas limitações físicas ou emocionais, numa próxima vida. Todos sabiam das limitações que seriam obrigados a conviver, mas nenhum deles poderia influir nas escolhas e nas imposições da espiritualidade maior, imposições estas com um único objetivo, o de levar estes indivíduos novamente ao caminho do progresso, caminho este por eles abandonados no momento do suicídio.

No livro Ação e Reação, ditado pelo espírito de André Luiz e psicografado pelo médium mineiro Francisco Cândido Xavier, nos deparamos com as experiências de vida de Adelino Correia, hoje um espírita consciente e devotado ao estudo e as atividades doutrinárias, cuja história nos mostra equívocos e dificuldades em vidas anteriores quando como Martin mandou matar seu pai para casar com sua madrasta. O crime se efetivou, mas a perseguição sofrida foi tão intensa que Martin nunca conseguiu ser feliz no casamento, as lembranças do ato insano e a perseguição de seu pai desencarnado o levaram a loucura e, posteriormente, no mundo espiritual passou a sofrer as agruras de suas atividades na matéria, mas trabalhou incansavelmente para se melhorar e conseguir progressos e avanços espirituais. No retorno ao corpo físico Martin reencarna como Adelino Correa e traz no corpo físico as marcas de um eczema agressivo, como conseguiu algum avanço no mundo espiritual os espíritos superiores o auxiliam para que o eczema se concentrasse apenas em uma parte de seu corpo material, isto porque anteriormente esta doença cobriria todo seu corpo físico.

O livro nos mostra como muitas de nossas atitudes pode reduzir nossas dores, Adelino Correia como trabalhador dedicado e imensamente caridoso, onde auxiliou muitos enfermos e crianças abandonadas, dentre elas algumas que, em vidas anteriores os auxiliaram em seus desatinos e, principalmente, aquele que foi seu genitor, tendo com isso, méritos suficientes para ter suas dificuldades reduzidas e seu amparo cada vez maior e mais consistente. O livro Ação e Reação nos mostra que em todas as ações que engendramos na vida somos impactados por uma reação, quando nossas ações são positivas e edificantes recebemos da própria espiritualidade maior, reações saudáveis, equilibradas e positivas, com isso, a Doutrina dos Espíritos nos mostra que os chamados carmas são conceitos imprecisos, acreditar que estamos condenados numa encarnação nos parece muito equivocado, temos sim as dificuldades, mas se agirmos de forma concernente as Leis de Deus os nossos “carmas” serão, com certeza, reduzidos e minimizados pelos espíritos de luz.

No estudo dos sofrimentos humanos, encontramos na literatura espírita muitas obras de vulto, nelas descobrimos que nos momentos de dores e dificuldades, muitas pessoas se colocam como vítimas, bradam contra Deus e acreditam não ter escolhido passar por aquelas situações de sofrimentos. A Doutrina nos mostra que, se não escolhemos nos foi imposto, aí percebemos ser uma expiação, o que é muito pior e preocupante, agora, na imensa maioria dos casos, foram os encarnados que pediram, melhor, suplicaram por aquelas provações como forma de educação e posterior progresso espiritual.

Os sofrimentos e as dificuldades da vida sempre existiram e sempre existirão para os seres humanos, a forma como a encaramos estas dificuldades é de fundamental importância para que consigamos extrair delas, instrumentos de progresso e de aprendizado, para que construamos um mundo íntimo mais consistente e vinculado aos mais nobres sentimentos e valores emanados pelo Cristo, este sim os valores eternos da vida.