Política industrial não pode ser guiada por populismo, por Rodrigo Zeidan.

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No Brasil, diretrizes para indústria só servem para transferir renda dos pobres para acionistas de grandes empresas

Rodrigo Zeidan Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

Folha de São Paulo, 27/11/2021

“O câmbio de equilíbrio da indústria deveria ser de mais de R$ 10”, disse Ciro Gomes no evento Brasil+China, em Pequim, em 2017, quando o dólar estava a R$ 3,31. Mas será que política industrial funciona mesmo? A resposta, como muitas vezes em ciências econômicas, é: depende.

Há evidências de que política industrial funciona em acelerar o desenvolvimento de um país (mas, sozinha, não serve de nada). Mas, no Brasil, é um desastre, servindo somente para transferir renda dos mais pobres para o bolso dos acionistas das grandes empresas do país. Quando um empresário ouve um político prometer incentivo à sua indústria, liga para seu corretor para reservar mais um apartamento em Miami.

São três as condições para que política industrial contribua para a sociedade: que a proteção à indústria seja bem desenhada, que os setores escolhidos sejam dinamicamente competitivos e que o apoio seja temporário. Grande parte da política industrial brasileira nos últimos 60 anos falha nos três critérios.
Grosso modo, há três opções para o desenho de política industrial: fechar o mercado interno, através de altas tarifas de importação, subsidiar produtores locais (de preferência com subsídios diretos) e fazer ambos ao mesmo tempo.

Já sabemos há décadas qual a melhor dessas opções: subsidiar a produção local, mas sem limitar importações. A razão para isso é simples: como consumidores locais têm a opção de comprar produtos importados pelo mesmo preço que no resto do mundo, os produtores locais necessariamente precisariam criar produtos competitivos com o dinheiro recebido pelo Estado. Além disso, subsídios diretos são gastos orçamentários. Se o Estado vai tirar dinheiro da sociedade para botar na mão de poucas empresas, que o faça de forma transparente.

Caso não haja recursos para esses subsídios, a melhor escolha é a proteção tarifária, mas sem subsídios do Estado.

Com importações limitadas ou zeradas por altas tarifas, empresas nacionais competiriam pelo mercado interno. A pior opção, de longe, é a combinação de subsídios e proteção à competição internacional: as empresas locais se lambuzam com recursos públicos e entregam produtos ruins.

É surpresa para alguém que nossa política industrial tenha sido a última e pior opção? E, para colocar a cereja no bolo, empresários nacionais usam parte dos recursos desviados dos mais pobres para fazer lobby e convencer a população de que essa excrescência de status quo beneficia a sociedade. À esquerda e à direita, temos políticos que defendem os “interesses nacionais” (das construtoras americanas na Flórida).

Em relação à escolha dos setores a receber recursos públicos, o ideal é que sejam exportadores ou com potencial para isso. No Brasil, fazemos o inverso: tentamos substituir importações com produtos locais, o que é muito mais arriscado e não cria uma forma transparente de medir o sucesso da política, que seria o valor exportado pelo setor.

O que acontece? Lobby recorrente dos empresários para “proteger empregos” (das empreiteiras nos Estados Unidos).

A China protegeu a indústria automobilística nos anos 1950, assim como a República Democrática do Congo. Senegal colocou parte significativa do PIB em montadoras de caminhão nos anos 1960, e a Zâmbia o fez nos anos seguintes.

Esses países abandonaram isso.

Se for para fazer política industrial (essa é outra discussão), é para fazer direito. E no Brasil? Vamos aprender quando?

Ary Ramos
Ary Ramos
Doutor em Sociologia (Unesp)

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