Memórias de um suicida

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Uma das mais importantes obras da literatura espírita, o livro Memórias de um Suicida psicografado por Yvonne do Amaral Pereira e ditado pelo espírito do grande escritor português Camilo Castelo Branco, se destaca como um dos mais importantes do século XX, uma leitura fundamental.

 

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O fim de Eddy

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Um depoimento chocante sobre as dificuldades de um jovem homossexual de uma pequena cidade francesa, vítima de bullying, humilhado e maltratado na escola e perante sua própria família, uma leitura fundamental para compreendermos um pouco das dificuldades que as minorias passam numa sociedade doente e patologicamente comprometida.

 

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Curso de Ciências Econômicas – Unirp

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Novo curso da Unirp, Ciências Econômicas, sejam todos bem vindos!!

Pós Graduação Senac

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Excelente turma do Senac de pós graduação em Controladoria e Finanças.

Jessé Souza: É preciso explicar o Brasil desde o ano zero

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Entrevista para Amanda Massuela – Revista CULT – 19 de outubro de 2017.

O sociólogo Jessé Souza, autor de ‘A elite do atraso’, lançado pela editora Leya (Divulgação)

Em A elite do atraso – Da escravidão à Lava Jato, Jessé Souza quer fazer o que, em sua opinião, nenhum intelectual da esquerda jamais fez: explicar o Brasil desde o ano zero. Isso porque se ideias antigas nos legaram o tema da corrupção como grande problema nacional – conforme defende no livro -, só mesmo novas concepções sobre o país e seu povo poderiam explicar, de uma vez por todas, que as raízes da desigualdade brasileira não estão na herança de um Estado corrupto, mas na escravidão.

Para tanto, o sociólogo confronta uma das principais obras do pensamento social brasileiro, Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Holanda – responsável por utilizar pela primeira vez a ideia de patrimonialismo para definir a política nacional. Jessé compreende que o conceito – segundo o qual o Estado brasileiro seria uma extensão do “homem cordial” que não vê distinções entre público e privado – serve para legitimar interesses econômicos de uma elite que manda no mercado, este sim a real fonte de corrupção e poder.

Doutor em sociologia pela Universidade de Heidelberg (Alemanha) e professor da UFABC, Jessé Souza é autor de 27 livros, incluindo A ralé brasileira: quem é e como vive(2009), A tolice da inteligência brasileira (2015) e A radiografia do golpe (2016). Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) entre 2015 e 2016, coordenou pesquisas de amplitude nacional sobre classes e desigualdade social. Em entrevista à CULT, o sociólogo critica a existência de uma interpretação dominante sobre o Brasil e aponta os motivos pelos quais a sociedade brasileira em 2017 não passa de uma continuidade da sociedade escravocrata de 500 anos atrás.

No livro você afirma que Sérgio Buarque de Holanda inaugurou uma forma de pensar o brasileiro como negatividade que se estende ao Estado, visão que teria influenciado de Raymundo Faoro a Sergio Moro. Por que essa chave de leitura tem tanta força?

Essa ideia foi montada para defender interesses econômicos. Às vezes me espanto como não se percebeu isso antes. Quando a elite paulistana perde o poder político para Vargas em 1930 – e perde para um movimento de classe média, que estava se formando no país naquela época -, ela começa a organizar um poder ideológico para condicionar o poder político a atuar conforme as suas regras. Isso foi dito, articulado, pensado. Esse pessoal já tinha fazendas de café, as grandes indústrias em São Paulo, já tinha controle sobre a produção material e aí constroem as bases para o poder simbólico – e a sociedade moderna vive desse poder simbólico. Essa elite cria a Universidade de São Paulo, que vai formar professores de outras universidades e que vai produzir conceitos importantes para que essa elite, tirando onda de que está fazendo o bem, faça efetivamente todo mundo de imbecil para que seus interesses materiais e políticos sejam preservados.

Que conceitos são esses?

São duas ideias que nos fazem de imbecis. Uma delas é a do patrimonialismo, em que há uma distorção da fonte do poder social real,  como se o Estado fosse montado para roubar, vampirizar e fazer o mal – e como se nada acontecesse no mercado. Embora seja uma instância de poder importante, no capitalismo quem comanda o poder é o mercado. Há uma tradição inteira, 99 de 100 intelectuais até hoje professam esse tipo de coisa. Sérgio Buarque inaugura [esse pensamento no Brasil], depois Raymundo Faoro dá uma profundidade histórica e Fernando Henrique Cardoso transforma isso em teoria; o programa político do PSDB é todo retirado de Raízes do Brasil. Mas também influenciou a esquerda. Sérgio Buarque foi um dos fundadores do PT, fez todo mundo de imbecil, da direita à esquerda. E como a esquerda não tem uma concepção autônoma de como a sociedade funciona, de como o Estado funciona, ela chega ao poder com um plano econômico alternativo, mais inclusivo, e acha que as pessoas por alguma mágica vão perceber que aquilo é bom pra elas. A esquerda nunca fez o que a direita e a elite fizeram.

Por que a esquerda nunca articulou uma narrativa contrária a essa?

Porque foi incapaz. Porque não foi inteligente, porque se deixou imbecilizar. Porque o tema do patrimonialismo é tratado como crítica social: “Olha, estamos descobrindo quais são as mazelas brasileiras, um gene da corrupção de 800 anos que nos toma a todos”. Isso significa que o Estado [teoricamente] vampiriza e não deixa as forças “emancipadoras” do mercado agirem – como se o mercado, em algum lugar do mundo tivesse sido emancipador por si próprio. Os países campeões do liberalismo como Inglaterra e Estados Unidos têm uma estrutura de Estado extremamente forte, foram protecionistas – e depois dizem a outros países serem o que eles mesmos nunca foram. Isso deu esse charme – o “charminho crítico”, como eu chamo – a esse tipo de ideia como o patrimonialismo, que muitas vezes a esquerda comprou.

O segundo conceito chave, também inventado na Usp, foi o populismo, que torna suspeito e criminaliza tudo aquilo que vem das classes populares – inclusive qualquer liderança associada a elas, que são também estigmatizadas e suspeitas de estarem manipulando a tolice “inata” dessas classes. Eu estudei por décadas os muito pobres e eles são muito mais inteligentes do que a classe média. Eles veem a política como o jogo dos ricos em que todo mundo rouba enquanto a classe média se deixa engambelar por esse tipo de coisa. A classe média foi montada para ser idiotizada, é uma espécie de capataz da elite entre nós.

Na história do pensamento social brasileiro nenhum intelectual chegou perto de romper com essas duas ideias, na sua opinião?

Florestan Fernandes saiu um pouco disso porque estudou dilemas e conflitos de classe; Celso Furtado foi outro genial que percebeu coisas importantes que não têm nada a ver com esses esquemas. Mas esses caras não reconstruíram a história do Brasil como um todo. Foi essa a ambição que eu tive nesse livro porque eu percebi que, para atacar esse negócio e dar nele um nocaute, é preciso fazer o que eles [a elite] fizeram: explicar o Brasil desde o ano zero. O que foi, como foi, por que somos hoje o que somos e o que isso implica para o nosso futuro. Eu tentei fazer o que esses caras não fizeram, apesar de termos tido críticos que discutiram aspectos parciais de modo extremamente importante. Mas se não reconstruirmos o todo, as lacunas do que construímos apenas parcialmente serão invadidas pela teoria dominante, daí Florestan usar o patrimonialismo e essa bobagem toda.

Esse pessoal diz que nosso berço é Portugal e que de lá vem a nossa corrupção – uma coisa que me dá raiva de tão frágil, já que corrupção é um conceito moderno que implica a noção de soberania popular que é coisa de 200 anos. O nosso berço é a escravidão, que não existia em Portugal a não ser para os muito ricos. Não era fundante, era marginal, nunca foi mais de 5%, enquanto nós fomos montados nela. Essa teoria sobre o Brasil, que se põe como científica, no fundo não vale um centavo furado. É montada a partir de ilusões do senso comum, como se a tradição cultural fosse transmitida pelo sangue. São instituições concretas que nos moldam, é a forma da família, da escola que faz com que sejamos o que somos.

No livro você comenta que um dos principais problemas do Brasil é que aqui não houve nenhum tipo de reflexão acerca da escravidão. Quais são os efeitos práticos disso na sociedade brasileira, hoje?  

Literalmente tudo. Primeiro há a naturalização da miséria e do sofrimento alheio. Todas as sociedades já foram um dia escravocratas, apenas a Europa, no Ocidente, quebrou com a herança escravista do mundo antigo. Isso significa que embora a pessoa seja socialmente inferior a você, ela não será tratada como uma coisa, mas como um ser humano. E com as lutas sociais por igualdade, são produzidos processos coletivos de aprendizado na qual a dor e o sofrimento do outro podem ser revividos em cada um. Nós, por outro lado, mantivemos essa subhumanidade. Nós não nos importamos com a dor e com o sofrimento dos pobres, as evidências empíricas são claríssimas como a luz do sol, inegáveis para qualquer pessoa de boa vontade. A polícia mata pobres indiscriminadamente – e faz isso porque a classe média e a elite aplaudem. Houve recentemente essa coisa completamente absurda e bárbara das matanças nos presídios, e a classe média aplaudiu. São provas de que temos, como sociedade, ódio aos pobres. Isso veio da escravidão, em que havia uma distinção muito clara entre quem é gente e quem não é. Por isso, não nos importamos com o tipo de escola e de hospital que essa classe vai ter, por exemplo, o que é uma enorme burrice porque estamos criando inimigos, ressentimento. A Alemanha fez um esforço extraordinário para incorporar os 17 milhões que viviam na Alemanha Oriental, tornando seu mercado mais forte, mas aqui a gente simplesmente joga no lixo esse tipo de coisa porque nunca criticamos a nossa herança escravocrata, porque acreditamos nessa baboseira de herança portuguesa da corrupção. Raymundo Faoro tratava a existência de senhores de escravos como algo banal, quando na verdade o senhor de escravo deve estar no centro [da análise], já que todas as outras instituições vão se montar a partir daí. É uma continuidade absurda de 500 anos e nós somos cegos a isso.

Como essa continuidade aparece?

A família dos muito pobres repete há 500 anos a família dos escravos e eles ainda fazem o mesmo tipo de serviço que faziam antes, são escravos domésticos. Fazem parte de famílias desestruturadas, uma vez que na escravidão não se estimulava que o escravo tivesse família porque era preciso humilhá-lo, abatê-lo. Exatamente como acontece hoje. A escravidão só prospera com o ódio ao escravo e o Brasil de hoje é marcado por uma coisa central que só um cego não vê, o ódio ao pobre. A humilhação do pobre. O PT caiu não por causa da corrupção – que pode ter existido, é bom ver as provas -, mas porque tocou no grande pecado de ter diminuído um pouquinho a distância entre as classes. A distância desses 20% para os 80% é a pedra de toque para esse acordo de classes absurdo no Brasil.

O único país que se assemelha a nós no planeta é a África do Sul. Vivemos um apartheid aqui. Governos de esquerda caem, acontecem golpes de Estado toda vez que tentam diminuir essa distância entre as classes. Com isso você constrói dois planetas dentro de um mesmo país, é isso o que temos hoje. Como a classe média não pode transformar esse seu ódio ao pobre em mensagem política – porque isso seria canalhice e temos essa influência cristã -, ela utiliza o pretexto da corrupção já dado pelos nossos intelectuais no tema do patrimonialismo. Todas as elites estudaram em todas as universidades essa mesma bobagem, todo jornal repetiu e repete em pílulas essa mesma imbecilidade, fazendo com que as pessoas internalizem isso como uma verdade absoluta.

Você afirma no livro que a crise atual do Brasil é “também e principalmente uma crise de ideias”. Partindo disso, quanto dessa crise a gente pode colocar na conta da própria esquerda, já que ela nunca se mobilizou para produzir outra interpretação do Brasil?

Ela nunca se mobilizou, isso é uma fraqueza e eu acho que temos que mudar isso. Eu decidi transformar a minha vida nisso, por exemplo. Tem que começar em algum momento. Eu tive sorte porque morei muito tempo fora do Brasil e de algum modo peguei um olhar externo. Tem um grande filósofo que diz que o que propicia o conhecimento é o fato de você conhecer aquele lugar, mas estranhá-lo, ou todas as coisas viram naturais. E se tudo é natural você não interroga, não há dúvida.

Um estudo recente do Instituto Fórum Brasileiro de Segurança Pública e do Instituto Datafolha mostra que, numa escala de 0 a 10, a sociedade brasileira chega num índice de 8,1 na predileção por posições autoritárias, principalmente entre jovens de 16 a 24 anos. Como interpreta esse dado?

É de fácil explicação. A partir de 1980 há um partido que nasce de baixo para cima. Nunca havia existido isso entre nós, um partido que congrega trabalhadores rurais e urbanos – eu tenho muitas críticas ao PT, mas é inegável que ele foi uma inflexão importante nessa história da escravidão. E ele passa a representar uma demanda por igualdade nessa sociedade perversamente desigual. Quando você afirma que esse partido é uma organização criminosa – usando no fundo aquela ideia do populismo, de que tudo o que vem das classes populares é estigmatizado – você está afirmando que a igualdade não é um fim, mas um mero meio, uma estratégia de assalto ao Estado. Ora, para onde vai a raiva justa dos 80% dos excluídos se ela não pode ser expressa de modo político e racional? Vai ser expressa de modo pré-político, ou seja, violência pura. A Globo e a Lava Jato criaram Jair Bolsonaro, só o cego ou o mal intencionado não vê. Esse namoro com o autoritarismo tem a ver com o ataque midiático, esse conluio entre Rede Globo e Lava Jato, e eu espero que esse pessoal pague por isso um dia.

No limite, essa chave de leitura inaugurada por Sérgio Buarque serve para justificar golpes de Estado e a Lava Jato, por exemplo?

Sim, a Lava Jato não tem nada a ver com acabar com a roubalheira. Até porque a roubalheira aumentou, isso é visível agora que temos no governo uma turma da pesada. É claro que a corrupção dos políticos existe, mas é uma gota no oceano. Esses caras são meros lacaios do mercado, os office-boy, é o que o nosso presidente é. Se você disser que o sistema inteiro é corrupto e que ele foi montado assim para que o mercado pudesse comprá-lo, aí você estaria esclarecendo alguma coisa, mas quando se diz que apenas um partido, aquele das classes populares, rouba, isso é uma mentira e um crime.

Vê saídas para essa tendência autoritária observada na sociedade brasileira?

Não tem nenhum outro modo, os seres humanos precisam ter ideias, sem ideias não dá para ir a lugar algum. É claro que isso tudo pode ficar ainda pior, a gente pode chegar a formas fascistas, mas o que a elite quer é dinheiro, se for por uma ditadura militar, se for matando gente, não tem nenhuma importância. Fato é que nesse instante de crise estamos com as vísceras à mostra e isso é uma oportunidade de vermos a podridão desse esquema que foi montado por essa elite usando e imbecilizando não só a classe média, e retirando a possibilidade de levarmos a vida de modo reflexivo. O que esse pessoal nos tirou foi a possibilidade de aprendizado da sociedade brasileira baseado na reflexão. E isso é impagável.

 

“É preciso ampliar e demonstrar, de forma clara, a relevância do tema Educação Financeira.”

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MARCELO BARBOSA, PRESIDENTE DA CVM por Ronnie Nogueira – RI

O advogado Marcelo Santos Barbosa foi nomeado em 25/08/2017, por decreto do presidente Michel Temer, para cumprir mandato de 5 anos à frente da presidência da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Tendo tomado posse em 06/09/2017, seu mandato vai até 14 de julho de 2022.

Marcelo Barbosa é bacharel em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e mestre em Direito (LL.M) pela Universidade Columbia, em Nova Iorque, EUA. Sócio-fundador do Vieira, Rezende, Barbosa e Guerreiro Advogados, possui experiência relevante em operações societárias e de mercado de capitais, assessorando, desde a década de 1990, clientes em operações de private equity e fusões e aquisições.

Foi professor de Direito Comercial – Sociedades Anônimas da UERJ (2000-2001), e de Direito Societário no Programa de Educação Continuada da FGV-Rio (2007-2015). Desde 2016, também atua como professor de Casos Concretos de Direito Societário e Mercado de Capitais da FGV-Rio.

Barbosa foi presidente do Conselho Curador da Fundação Estudar e membro do Conselho Consultivo do Columbia Global Centers Latin America (Rio de Janeiro) e do Comitê de Aquisições e Fusões (CAF), bem como conselheiro Fiscal da Fundação Lemann. Também é autor de artigos sobre temas de Direito Societário e de Mercado de Capitais e palestrante em conferências no Brasil e no exterior.

Para realizar esta entrevista exclusiva com o “xerife” do mercado, solicitamos à destacados players do mercado – membros do Conselho Editorial da Revista RI e do Conselho do CODEMEC – Comitê de Divulgação do Mercado de Capitais – que formulassem perguntas, sobre suas áreas de atuação, dirigidas ao presidente da CVM. Acompanhe a entrevista.

RONNIE NOGUEIRA: Como está evoluindo a execução do Plano Estratégico da CVM – apresentado em 2013 por seu antecessor Leonardo Pereira – que listava 15 objetivos a serem perseguidos pela autarquia até 2023? Quais desses objetivos, como as simplificações de procedimentos, estímulos aos investimentos e medidas de proteção aos aplicadores já foram colocados em prática? E, quais as iniciativas que deverão sair do papel no horizonte próximo?

Marcelo Barbosa: O Plano tem sido de grande valia para a condução das atividades da CVM, na medida em que fornece uma identificação de objetivos institucionais e permite estabelecer linhas a serem seguidas pela casa. No momento, temos seis projetos estratégicos em execução e que estão relacionados a algumas temáticas importantes: desde uma revisão do próprio Planejamento Estratégico, passando por questões como atividade sancionadora, tecnologia, capacitação, arrecadação e, mais recentemente, custo de observância no âmbito do perímetro regulatório da CVM. Além disso, 12 projetos estratégicos foram executados e concluídos e já geram resultados visíveis, tais como o aperfeiçoamento da capacidade da CVM de identificar indícios de crime de uso de informação privilegiada, a criação do Centro Educacional CVM/OCDE, o aprimoramento do regime sancionador da Autarquia, a reformulação do portal institucional como ferramenta de comunicação com a sociedade, entre outros. Projetos voltados ao público interno, como o desenvolvimento de programa de capacitação e meritocracia e reavaliações das estruturas física e organizacional também foram desenvolvidos.

Thomas Tosta de Sá: Quais são suas prioridades para o desenvolvimento do mercado de capitais – um dos mandatos da CVM – aproveitando a conjuntura de redução da inflação e da taxa de juros e a escassez de recursos do BNDES para continuar emprestando com juros subsidiados?

Marcelo Barbosa: Com taxas de juros menores, melhoram as condições para a expansão do ritmo do desenvolvimento do mercado de capitais. Temos trabalhado em frentes importantes para a consecução desse objetivo, como, por exemplo, a redução dos custos de observância e a inclusão financeira. O acesso das empresas ao mercado também precisa ser constante foco de nossa atenção, não apenas por meio do aumento do número de empresas listadas, mas, igualmente, pela expansão do mercado de dívida.

Geraldo Soares: Como a CVM pode contribuir para trazer uma gama maior de empresas ao mercado bursátil? Menor regulamentação, simplificação de processos, redução de custos, etc – que hoje representam fatores inibidores do desenvolvimento do mercado?

Marcelo Barbosa: Esta é uma pauta importante que vem sendo tratada em conjunto com vários segmentos de mercado. A discussão sobre flexibilidade nas regras pode sempre ser mantida, mas sem perder de vista os limites que são colocados pela necessidade de transparência e segurança dos diversos participantes envolvidos. Projetos de criação de mercados de acesso apresentam desafios importantes que precisam ser avaliados com cautela para que possam ser efetivos.

Mário Bandeira: Ouve-se muito falar que o quadro de funcionários da CVM está muito abaixo do que seria o ideal. Isto poderá causar transtornos no futuro? Qual a razão, e o que deve ser feito para resolver essa situação?

Marcelo Barbosa: Qualquer organização sofre com a escassez de pessoal. A Autarquia realiza um acompanhamento cuidadoso dessa questão, e temos mantido um diálogo construtivo com os Ministérios da Fazenda e do Planejamento. Para termos condições de lidar com nossas diversas atribuições da forma mais eficiente possível, mantemos permanente esforço de priorização de tarefas, como em toda organização.

Roberto Teixeira da Costa: Num mundo em transformação com tecnologias disruptivas, cada vez mais percebida no que convencionamos chamar de IV Revolução Industrial, como as Comissões de Valores estão se estruturando, e particularmente a CVM?

Marcelo Barbosa: A evolução tecnológica e a crescente utilização de tecnologia em benefício do mercado de capitais são acompanhadas pela CVM, inclusive por meio de grupos de trabalho internos. Nossa atuação no estímulo à adoção de novas tecnologias capazes de aperfeiçoar o mercado é conhecida. Temos em andamento o projeto estratégico CVMTech que possui, dentre seus objetivos, avaliar e, sempre que entender relevante, sugerir iniciativas que permitam reverter, para a CVM, os benefícios das novas tecnologias financeiras. Este projeto tem sido exitoso e nos propiciou um conhecimento bastante aprofundado das possibilidades do emprego da tecnologia no desempenho de nossas funções. Participamos de foros locais e internacionais e reconhecemos que a atividade de regulação não pode ser feita de forma a desconsiderar os avanços, sob pena de perder espaço para mercados mais adaptáveis. Tudo isso, obviamente, sem comprometer o princípio fundamental da segurança do investidor.

José Luiz Osório: Um fator importante para o desenvolvimento do mercado de capitais é a presença de gestoras de investimento independentes que além de competirem com as instituições financeiras atraindo poupança pública a taxas mais competitivas, são normalmente especializadas em classes de ativos ou com filosofia de investimento diferenciada o que as faz atrair um volume maior de capital estrangeiro e tendem a ser mais ativistas auxiliando a CVM no seu trabalho de controle e regulação do mercado. Neste sentido, quais medidas a CVM está tomando para reduzir os custos de constituição e manutenção de fundos, e de conformidade das gestoras independentes?

Marcelo Barbosa: Vejo que a CVM avançou quando, em 2015, editou a Instrução 558 (que regula o exercício profissional de administração de carteiras de valores mobiliários), alteradora da Instrução 306. As regras foram atualizadas, inclusive em pontos que impactavam custos. A criação de duas categorias de registro para os administradores de carteira de valores mobiliários (“administrador fiduciário” e “gestor de recursos”) permitiu maior clareza sobre os deveres de cada participante e maior proporcionalidade entre os custos de cumprimento da norma e os efetivos benefícios aos investidores. Em linha com o que abordei em respostas anteriores, a cultura de avaliação de custos de observância regulatória, que estamos internalizando na CVM, também pode gerar benefícios a este segmento. É possível prever avanços nesse campo graças às interações que temos tido com o mercado no âmbito do projeto de redução de custos de observância, o qual tem contado com ampla participação de agentes de mercado.

Caio Mesquita: Quais as medidas que a CVM estuda para, dentro do seu mandato, desenvolver o mercado de capitais no Brasil, popularizar e democratizar os investimentos para as pessoas físicas, hoje ainda tão concentradas na poupança e produtos bancários?

Marcelo Barbosa: É preciso ampliar e demonstrar, de forma clara, a relevância do tema Educação Financeira. Em nosso país, temos cerca de 660 mil investidores em renda variável. E o Brasil tem 28 milhões de CPFs. Há pessoas que poderiam investir diretamente em Bolsa, que poderiam investir por meio de fundos de investimento. E que não investem, talvez, por falta de um pouco mais de educação financeira. Em um cenário de redução de taxas de juros, estarão dadas as condições para a migração de mais investidores para a renda variável. Mas também é interessante entender o fenômeno. Esses números modestos de participação da população no mercado de capitais no Brasil possuem raízes em questões culturais, mais que econômicas. Historicamente, o brasileiro é educado a poupar, e não a investir. Ou seja, essa dimensão seria mais bem abordada por políticas públicas de orientação e de informação. Essa é uma pauta que entendo ser relevante desenvolvermos constantemente. E, bem sucedida, tende a gerar ganhos para todos os lados. A educação do investidor começa com informação, com esclarecimento. Esclarecido, o investidor entenderá melhor os riscos e poderá tomar decisões de forma consciente.

RONNIE NOGUEIRA: Considerando que hoje no Brasil, apenas um número irrisório de pessoas físicas investem na Bolsa, como o senhor avalia a necessidade e a importância de um amplo e permanente programa de educação voltado à criação de uma verdadeira Cultura de Investimento em Ações entre investidores individuais, e como a CVM vem contribuindo para isso?

Marcelo Barbosa: Reiterando a resposta anterior, especificamente com relação ao trabalho da CVM, a Autarquia possui uma série de programas diretamente voltados à educação financeira. São ações que abarcam a temática desde a infância, como palestras direcionadas a pais e filhos, eventos e concursos que buscam fomentar a participação de adolescentes, cursos para adultos nos mais variados segmentos (servidores públicos, mulheres, idosos, etc). Além disso, a CVM preside o Comitê de Investidores de Varejo (C8) da IOSCO. O C8 tem a finalidade de conduzir o trabalho da organização em educação financeira e de investidores, assessorando o Conselho da IOSCO em temas emergentes relacionados à proteção dos investidores de varejo, além de executar projetos nessa área.

RONNIE NOGUEIRA: Como a CVM tem agido para que os direitos dos acionistas minoritários sejam respeitados? Participantes do mercado têm afirmado que os tratamentos não-equitativos entre acionistas controladores e minoritários consistem em forte empecilho ao desenvolvimento do nosso mercado de capitais…

Marcelo Barbosa: É relevante deixar claro que essa discussão não deveria se dar em torno da proteção de um tipo de investidor ou de outro, mas, sim, do equilíbrio nas relações entre os vários atores. Adicionalmente, é fundamental a CVM manter o mercado esclarecido sobre os limites das condutas permitidas. Não é à toa que se costuma dizer que a informação tempestiva, correta e completa é o melhor instrumento de proteção. Mas, além disso, é importante que haja uma percepção generalizada de que condutas irregulares serão prontamente identificadas, e que a sanção virá em prazo curto e servirá de desincentivo forte o suficiente. Temos trabalhado para, cada vez mais, refletirmos, na prática, esse objetivo.

Luiz Guilherme Dias: A CVM é percebida por muitos agentes como “xerife do mercado”. Penso que onde há “xerife” há “bandido”. Em nosso mercado existem “bandidos”, mas são poucos, em geral, apanhados quando cometem seus crimes. Não seria o caso da CVM reforçar o propósito de desenvolver o mercado, melhorando a sua comunicação aos agentes e à sociedade?

Marcelo Barbosa: A proteção do mercado de capitais se dá com regulação e supervisão eficazes e com um processo sancionador estruturado para evitar que as irregularidades passem impunes. Nosso trabalho diário é o constante desenvolvimento do segmento. E comunicar, de forma clara e transparente, é fundamental, principalmente no atual momento, em que estamos lidando com situações novas. Nos últimos anos, a CVM desenvolveu ações pontuais com o intuito de ampliar sua comunicação. A reformulação do site institucional, tornando-o mais intuitivo para o usuário, é um exemplo. Outra ação, relativamente simples, e que gerou resultado positivo, foi a disponibilização, até o dia seguinte da reunião do Colegiado da Autarquia, de um resumo das decisões tomadas. Trata-se do Informativo do Colegiado. Com isso, de maneira rápida e acessível, uma síntese das decisões fica disponível ao público, atendendo à demanda do mercado por uma comunicação ainda mais ágil. Adicionalmente, tanto os membros do Colegiado quanto representantes de áreas técnicas compreendem a relevância da representatividade e o fato de estarem próximos ao regulado e à sociedade como um todo, seja por meio de audiências públicas ou a particulares, debates, encontros com investidores, eventos e congressos do setor.

Paulo Ângelo Carvalho de Souza: A sociedade brasileira e investidores do mundo inteiro ficaram atônitos com os diversos escândalos nos últimos anos que tangenciaram o mercado de capitais brasileiro, especialmente com empresas listadas na B3, como observado, em especial, com as repercussões da Lava-Jato e da derrocada das “Empresas X”. Embora o judiciário tenha reagido, ainda com poucas decisões definitivas, muitos consideram que a CVM não agiu com o devido rigor e presteza para punir os envolvidos, principalmente face as graves omissões observadas nos Conselhos de Administração e Conselhos Fiscais. Neste sentido, porque a CVM assistiu de forma tímida a todo o desenrolar destes casos sem uma manifestação ou posicionamento a respeito? Não dispõe a CVM de legislação adequada para garantir sua atuação nesses casos de notória gravidade, sem decoro e sem respeito à seriedade e segurança dos acionistas e investidores? Não seria o caso de avaliar uma atualização na legislação para garantir a independência da CVM? Apenas citando um caso emblemático, seguirá impune a atuação nociva dos membros do Conselho de Administração da Petrobras?

Marcelo Barbosa: Não me cabe comentar casos específicos, nem muito menos fazer avaliações sobre o desempenho de qualquer área ou integrante da CVM neste ou naquele caso. O que posso afirmar é que nossa atividade sancionadora é desempenhada com bastante cuidado e atenção, desde o início de cada processo com potencial sancionador. Os relatórios de atividade sancionadora que começamos a divulgar no final do ano passado nos permitem uma visão mais completa do volume de trabalho envolvido nessa atividade. É compreensível a demanda por respostas rápidas a casos de repercussão. Mas é preciso entender que não se constrói um mercado sólido sem que esteja claro aos seus participantes que o órgão regulador e fiscalizador observa, fielmente, o devido processo em sua atividade sancionadora.

Wilson Nigri: Podemos esperar alguma ação da CVM em defesa dos acionistas da Petrobrás no Brasil, para que haja isonomia com os reparos obtidos pelos portadores de ADRs da companhia nos Estados Unidos?

Marcelo Barbosa: A Autarquia não possui mandato legal para, por exemplo, determinar a indenização, compensação ou qualquer tipo de ressarcimento às pessoas lesadas por práticas irregulares no mercado de capitais. Eventuais pedidos de indenização devem ser perquiridos junto ao Judiciário, que é o Poder competente para esse tipo de demanda. Logicamente, a CVM pode manifestar a sua opinião em juízo sob a forma de amicus curiae, o que é feito por meio de sua Procuradoria Federal Especializada – PFE oferecendo provas ou juntando pareceres que auxiliem na decisão da Justiça. De qualquer forma, tendo em vista nosso objetivo de fomentar o desenvolvimento do mercado, participamos ativamente de discussões com o propósito de rever o arcabouço legal existente de forma a avaliar possíveis aperfeiçoamentos que podem fortalecer o aparato de proteção dos investidores em valores mobiliários negociados no Brasil.

Walter Mendes: Da experiência acumulada no cargo, você entende que o escopo de atuação da CVM é adequado? Ou precisamos de novas agências para regular nichos específicos de mercado, a exemplo do que acontece no exterior. Para ilustrar, devemos ter o mesmo órgão regulando mercados abertos e fechados, visto que os desafios são tão diferentes?

Marcelo Barbosa: Diversas são as soluções encontradas em cada país para estruturar a tutela de seus mercados. Acredito que a proposta adotada no Brasil é adequada e não demandaria maiores ajustes estruturais. Evidentemente, devemos estar atentos para aperfeiçoamentos que se tornem interessantes. No entanto, acredito que hoje podemos oferecer a tutela adequada com o desenho que temos.

Carlos Augusto Junqueira: Recentemente ouviu-se dizer que a CVM quer de alguma forma abrir mão da competência para regular CEPACs, incluído aí a fiscalização e acompanhamento da Operação Consorciada da Região do Porto do Rio, isso é verdade, existe alguma decisão nesse sentido?

Marcelo Barbosa: Em linha com o que foi decidido pelo Colegiado da CVM em 2003, quando ofertados publicamente, os CEPAC são caracterizados valores mobiliários e, portanto, sujeitos à regulamentação e fiscalização da autarquia.

Eduarda La Rocque: O senhor pretende regulamentar instrumentos inovadores como Endowment Funds, Fundos Socioambientais ou títulos de impacto social?

Marcelo Barbosa: Instrumentos inovadores, desde que estejam na esfera de competência da CVM, e, claro, possam auxiliar no desenvolvimento do mercado de capitais, são bem-vindos. Os endowments, ao menos da forma como têm sido adotados em boa parte das jurisdições, são estruturados fora do mercado, embora possam atuar como investidores como quaisquer outros.

Mauro Rodrigues da Cunha: Tendo em vista casos recentes e antigos, o senhor acredita que seja necessária uma regulamentação da atividade de avaliação de empresas para efeito de OPAs e reestrutruações societárias?

Marcelo Barbosa: Não apenas com relação a avaliações de empresas para efeito de OPAs e reestruturações societárias, a prática acaba trazendo experiências que põem à prova o arcabouço existente. Idealmente, quando possível, a melhor resposta é a interpretação da regra existente. Quando essa regra começa a mostrar repetidos sinais de insuficiência, cabe a reflexão sobre a necessidade de revisão. Estamos abertos para discutir com o mercado sugestões de melhoria da regulação a respeito dos temas relevantes, mas sempre tendo em vista o princípio que expliquei.

Geraldo Soares: O presidente da SEC afirmou que governança corporativa não se faz por indexação, bem como relevantes fundos de investimentos internacionais. Qual sua avaliação da discussão atual de exclusão das empresas que tenham classes de ações com direitos desiguais?

Marcelo Barbosa: A meu ver, essa discussão tem várias componentes que precisam ser exploradas. Uma delas é o potencial desequilíbrio e a necessidade de proteção de todos os acionistas. Outra é a possibilidade de se desenhar direitos de acionistas de formas atraentes para diferentes projetos empresariais. A primeira componente deve servir como limite razoável para a segunda, mas com plena ciência de que muitas vezes a melhor proteção é a informação, o esclarecimento.

Helio Garcia Jr.: Investimento em criptomoedas é assunto constante em rodas de economistas aqui e lá fora. Importantes órgãos internacionais têm reconhecido a sua importância: a SEC já deixou claro que as mesmas leis que regulam valores mobiliários se aplicam à estas moedas e as bolsas que as negociam; Adena Friedman, CEO da Nasdaq, reconheceu ser este mercado legítimo; grandes fundos internacionais têm conseguido autorização para negociar criptomoedas; e aqui, a própria intenção da CVM de preparar um parecer de orientação aos fundos de investimento, mostra um reconhecimento institucional para as moedas virtuais. Frente a este cenário o senhor poderia antecipar, pelo menos de forma geral, o que o mercado pode esperar deste parecer? Podemos esperar controles rígidos sobre os fundos?

Marcelo Barbosa: Essa é uma temática que tem afetado os mercados em todo o mundo e a CVM não apenas tem acompanhado de perto, como já tomou medidas concretas. Nós emitimos dois avisos em 2017 e um em março desse ano descrevendo os riscos associados a investimentos em moedas virtuais e aconselhando o público a considerar, cuidadosamente, esses riscos. Tal alerta também indicou que, embora nenhuma regulamentação específica tenha sido emitida, certas atividades que envolvem tais ativos podem cair dentro do nosso escopo de supervisão e execução. Além disso, no início de 2018, por meio de Ofício Circular, emitimos orientações específicas para administradores de fundos de investimento. Essa orientação, como já foi informado, se encontra em vias de ser atualizada. O assunto continua no nosso radar e novas comunicações serão feitas sempre que necessário.

RONNIE NOGUEIRA: Para finalizar, a Lei no. 4.728/65, promulgada em 14 de julho de 1965, marcou o início da disciplina no nosso mercado de capitais. O primeiro objetivo dessa Lei foi o de facilitar o acesso do público a informações sobre os títulos e valores mobiliários distribuídos no mercado e sobre as sociedades que os emitirem. Outro intuito relevante foi o de proteger os investidores contra emissões ilegais ou fraudulentas de títulos e valores mobiliários. Como o senhor avalia a evolução do nosso mercado ao longo desses pouco mais de 50 anos?

Marcelo Barbosa: É inegável que o Brasil de hoje é bem diferente de 50 anos atrás. E é nítido que o mercado está se preparando e se adequando à necessidade do investidor, face à atual realidade. Estamos falando de um país que vem se reconstruindo após uma crise que gerou impactou fortes na economia. Por outro lado, os atuais juros baixos, aliados ao fato de uma expectativa de vida mais longa da população – que tende a consumir mais – geram oportunidades reais de investimento. Por isso, é preciso que tanto as oportunidades quanto os produtos do mercado se apresentem de forma clara para estes investidores. Não menos importante, no decorrer desses anos, a CVM se consolidou como regulador de conduta. Temos hoje, a nosso favor e a favor dos investidores, uma área de regulação reconhecida internacionalmente, um processo sancionador que vem se apresentando cada vez mais célere e um contato bem próximo com os mais variados agentes. Há espaço para mais ações? Sempre há. E vamos continuar trabalhando para isso…

 

A pátria educadora em colapso

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O livro relata os seis meses que o filósofo, Renato Janine Ribeiro, esteve a frente do Ministério da Educação, no segundo governo Dilma Rousseff, um momento difícil marcado por instabilidades e incertezas crescentes, um depoimento importante de um intelectual de peso no Brasil contemporâneo, uma leitura central para todos que pensam os desafios da educação brasileira.

O delator

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Depois do livro Cocaína: A Rota Caipira, Allan de Abreu, acompanhado do jornalista Carlos Petrocilo, faz uma incursão na vida de J. Hawilla, o todo poderoso dona da Trafic Marketing Esportivo, em O Delator os autores trazem grandes revelações sobre o submundo do futebol brasileiro e mundial, destacando fatos da vida e da delação de um dos maiores empresários da região de São José do Rio Preto/SP, uma leitura imprescindível.

 

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Novo presidente será “síndico de uma massa falida”, diz cientista político

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Marco Aurélio Nogueira, cientista político e professor da Unesp – Entrevista Gabriela Fujita – UOL, 14/06/2018.

O brasileiro não foi treinado para o debate democrático, o novo presidente do país será “síndico de uma massa falida” e a corrupção vai ser um tema indigesto para os presidenciáveis. Estas são opiniões do professor Marco Aurélio Nogueira, doutor em ciência política pela USP (Universidade de São Paulo) e livre-docente da Unesp (Universidade Estadual Paulista), a respeito de como ele vê a corrida eleitoral a quatro meses do primeiro turno.

Nogueira acaba de endossar um manifesto que defende a união de partidos de centro para evitar o “pior”: que o pré-candidato Jair Bolsonaro (PSL) consiga chegar ao segundo turno. No começo de junho, siglas como PSDB, MDB, PPS, PV, PSD e PTB lançaram o documento, que recebeu o apoio do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). O grupo de lideranças avalia o pleito de 2018 como o “mais indecifrável de todo o período da redemocratização” e defende, por exemplo, “tolerância zero com o crime organizado” e a manutenção do programa Bolsa Família.

O professor Nogueira não é filiado a nenhum partido, mas diz que o cidadão comum deve se juntar às discussões que, na sua avaliação, acontecem apartadas: por um lado, no ambiente político, e por outro, no Facebook e na mesa de bar. E não importa de qual partido seja, o próximo presidente do Brasil vai encarar “uma baita encrenca” a partir de 2019. Confira na entrevista a seguir.

UOL – O novo presidente do Brasil vai assumir que país em 2019?

Marco Aurélio Nogueira – Uma baita encrenca… Vai ser uma espécie de síndico de uma massa falida. Essa é uma expressão dramática. Acho que o Brasil não está destinado a acabar ou a cair no precipício, nós ainda temos um pouco de gordura para queimar.

O Brasil é um país muito grande, tem recursos naturais expressivos, tanto o petróleo quanto no plano da capacidade de produção de alimentos. A diversidade cultural brasileira é um recurso interessante, porque ninguém pensa do mesmo jeito no Brasil, isso é uma vantagem. A gente tem um mercado consumidor muito grande, que, se bem abordado e administrado, serve de base para um crescimento econômico expressivo. Temos algumas reservas com as quais contar para não decretar a morte do país, mas tudo isso vai passar para 2019. Não tem como reduzir o desentendimento, reduzir a complexidade, eliminar a desigualdade, o problema da educação, da saúde, de agora até janeiro do ano que vem.

O Bolsonaro, se for eleito, é candidatíssimo a um novo impeachment. Não por qualquer pedalada fiscal, mas por qualquer outro motivo. O desentendimento que ele vai gerar poderá produzir um impeachment.

Seja quem for o eleito, se ele tomar as rédeas, vai organizar um governo de reconstrução do país. Como se a gente tivesse saído de uma guerra.

O próximo presidente vai ter que arrumar as várias partes do país que estão desarrumadas. O sistema político, o sistema eleitoral, ele está precisando, no mínimo, de uma nova demão de tinta. Temos partidos demais, a fragmentação parlamentar é muito grande, o que provoca uma dificuldade de funcionamento do presidencialismo, o tal presidencialismo de coalizão. Também vai ter que mexer aí. No que diz respeito às reformas que tenham impacto direto na sociedade, todas elas são reformas que produzirão dor e exigirão sacrifício. Se mexer na Previdência, é dor e sacrifício. Não há jeito de modificar o sistema previdenciário sem desagradar uma parte ou a totalidade da população.

E se o eleito não topar enfrentar isso tudo?

Se não topar enfrentar isso, vai ter que inventar alguma outra coisa para manter o caixa do Estado suficientemente municiado para poder fazer gastos. Vamos supor que o presidente chegue à conclusão de que não vai mexer na Previdência porque não quer desagradar a população. E se for verdade que a Previdência tem um déficit brutal? Estou falando “e se for verdade” porque o tamanho do déficit é um tema controvertido. E é mais controvertido ainda em que velocidade se ajusta a Previdência. Não vai se ajustar de hoje para amanhã, é uma coisa de 20 anos. Tem que ser aos poucos, tem que ter etapas, não pode sacrificar todo mundo.

E você tem aquelas áreas clássicas de incorporação financeira no Estado. Com a privatização, você pode vender algumas empresas, mas já não temos tantas empresas assim que podem ser vendidas para encher o cofre de dinheiro. A Petrobras, quem quer que seja o eleito, dificilmente vai privatizá-la. Você pode privatizar a Eletrobras, o Banco do Brasil, a Caixa Federal. Acho difícil que se mexa nisso, porque as resistências vão ser muito grandes. São ações impopulares, no sentido da população, e tem resistências porque cada uma dessas estatais tem sindicatos de trabalhadores ativos, fortes, que vão bloquear as coisas. Além do mais, algumas delas privatizadas não vão trazer tanto dinheiro assim.

Em uma eleição tão fragmentada como a de 2018, o comportamento do eleitor pode se tornar perigoso?

Vai ser muito difícil haver alguma mudança expressiva que altere a predisposição do eleitorado. Teria que acontecer alguma coisa [diferente], e eu não estou conseguindo ver isso acontecer. Um investimento político forte no plano da opinião pública para esclarecer a população, um dos motivos que me levaram a endossar o manifesto [de união dos partidos de centro]. Teria que haver um investimento forte em pedagogia cívica. O eleitorado pode derivar também para o voto nulo e o voto em branco. Se você tiver de um quarto para um terço [do total] de abstenções e votos nulos, é algo complicadíssimo.

Pode ser que, quando a campanha de fato começar, na TV, algo desse sentimento cívico possa ser feito. Que os candidatos mais equilibrados, em vez de ficarem falando mal dos outros, que eles falem com a população, façam uma conclamação a que se valorize a democracia eleitoral. Porque o ambiente está ruim, é um ambiente de mal-estar. As pessoas estão incomodadas, desinteressadas, um querendo pular no pescoço do outro, pouca tolerância e pouca paciência, e com um despreparo para o debate democrático muito grande. O brasileiro não foi treinado para o debate democrático, nós começamos há 30 anos.

Como os temas “Operação Lava Jato” e “corrupção” vão aparecer na campanha eleitoral?

A Lava Jato foi um complicador [nos últimos anos] porque, de certo modo, ela acuou os políticos e fez os políticos ficarem com muita raiva dela, todos eles. Em função disso, vai ser julgada pelos candidatos nestas eleições e também pela população. Dependendo de como forem os debates, ela poderá sair mais forte ou mais fraca, supondo que ela ainda continue, e acho que ela ainda tem gás para isso.

A Lava Jato pode ser julgada de duas maneiras na campanha: uma é dizer ‘somos contra a Lava Jato’; outra é dizer ‘nós somos a favor, mas achamos que ela precisa ser corrigida’

Os juízes facilitaram muito a identificação do político com o corrupto, como se tivessem lavado a criança e jogado a criança fora com a água suja. Acabaram criando uma animosidade entre a população e os políticos. E aí não está certo, porque não tem como tocar um país sem os políticos. É interessante a gente discutir isso. Será que é verdade que todos os políticos não valem nada?

E a “corrupção”?

Eu espero que ela entre em uma posição central, mas não acredito que entre. A rigor, a única candidata que teria disposição para fazer isso é a Marina Silva (Rede). Pode ser que ela ponha esse tema, mas os outros vão sentar em cima. Por vários motivos, sendo o principal deles que todos os outros têm o rabo preso. Talvez o Ciro Gomes (PDT) não tenha, não sei. Talvez você tenha esses dois candidatos insistindo no tema da corrupção, mas os outros abafando. Vai ser um tema indigesto para a maior parte deles. Mesmo a esquerda pura, com Guilherme Boulos (PSOL) e Manuela D’Ávila (PCdoB), não vai ter tanta vontade de apresentar o assunto, porque eles consideram que a colocação da corrupção no centro da agenda tira do foco a questão da desigualdade social, que é a principal para eles.

Os anti-Bolsonaro são agora os novos anti-Lula?

Não acho que a dinâmica anti-Bolsonaro substitui a dinâmica anti-Lula. O que pode estar acontecendo na cabeça de muita gente é uma transferência da frustração ou da raiva contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o Bolsonaro. Os eleitores, na falta de outras opções que apareçam como mais autênticas, vão para o Bolsonaro. “Esse aí é contra a esquerda”, por exemplo. “O Bolsonaro diz que é ficha limpa”, outro exemplo. Tem um certo tipo de sedução que as pessoas podem estar sentindo por uma figura que é o negativo do lulismo.

E em relação aos candidatos? Aqueles que antes batiam em Lula e no PT mudaram de foco após sua prisão?

Se Lula fosse candidato, Ciro Gomes não bateria nele, por exemplo, mas ele tem que bater no Bolsonaro. Assim como a Marina não faria uma campanha para desconstruir o Lula, mas ela tem agora que fazer uma campanha para desconstruir o Bolsonaro.

Não é só que o Bolsonaro ocupou o lugar do Lula, ele materializou um polo que não era muito expressivo na vida brasileira. Tirando a época da ditadura, de 1985 para cá, o Brasil nunca teve um candidato que viesse dessa forma pela direita.

Você tinha liberais, neoliberais, conservadores, mas eram todos “moços de família”, vamos dizer assim. O Bolsonaro é um “cara do boteco”, não é educado, chega chutando a mesa. E ele está chegando aos 20% [das intenções de voto], a luz vermelha de perigo está piscando. Todo mundo tem que bater nele para ver se consegue desconstruí-lo e roubar os eleitores prováveis que ele está conseguindo agregar.

(De acordo com a mais recente pesquisa Datafolha, em um cenário de disputa presidencial sem Lula, Bolsonaro mantém a liderança, com 19% da preferência de votos, sendo que 34% dos entrevistados afirmam ainda não ter candidato. Preso há dois meses, o ex-presidente petista obteve 30% das intenções de voto.)

Por que o senhor assinou o manifesto que defende a união de partidos de centro?

Porque eu acho que hoje, no Brasil, nós chegamos muito próximo daquilo que poderia se chamar de um abismo. O país está muito complicado, não é que antes estivesse melhor, mas ele piorou muito. E não é só porque faltam bons candidatos. Eu acho que o país está perto do abismo porque os problemas que nós enfrentamos em tudo, na economia, na saúde, na educação, na habitação, na Previdência, na infraestrutura do país, na cultura geral, todos os problemas aumentaram de gravidade.

De 2013 para cá, temos um ciclo de cinco anos que expressa uma espécie de ruptura da sociedade com a política. Não estou dizendo que o agora é uma consequência de 2013, mas tem um ciclo aí, uma sucessão de fatos que foram se acumulando e produzindo uma sociedade que não se sente representada pela política e que está pondo para fora a sua desconfiança, a sua animosidade com os políticos, com os partidos, com os governos. Esse ciclo tem algumas marcações: as manifestações de 2013, a Lava Jato, as eleições de 2014, o impeachment de Dilma Rousseff (PT), o governo Temer (MDB) e a prisão de Lula. Todas essas coisas ajudaram a que o questionamento da política crescesse. Esses fatos foram ajudando a compor um cenário de muita polarização, algo inevitável na política, mas não ao nível a que a gente chegou.

Se você pegar o atual número de candidatos, como é que a população vai se posicionar com uma oferta de tantos concorrentes? Como é que ela vai descobrir o que o Geraldo Alckmin (PSDB) tem de diferente do Henrique Meirelles (MDB) ou do Rodrigo Maia (DEM) ou do Ciro Gomes etc.? Provavelmente ela vai acabar definindo sua posição de uma maneira passional: “ah, esse cara é mais bonito”, ou “esse cara é da igreja”, ou “esse cara é machão…”.

E por que fazer uma junção de siglas de centro?

A gravidade e a complicação da agenda não permitem que a gente ache que um candidato, por melhor que seja, vai conseguir atacar os problemas. Até porque presidente da República precisa de Congresso. Se você pegar os candidatos que estão despontando com mais fôlego, que são, até agora, Bolsonaro, Ciro Gomes e Marina, eles têm partidos muito fracos na formação do Congresso. Eles podem ser eleitos sem levar com eles uma base estruturada. Diferentemente do que o PT fez com a Dilma ou com o Lula, diferentemente do que o Fernando Henrique [Cardoso] tinha lá atrás, quando foi governante.

Nesses três últimos casos, mesmo com partidos estruturados, eles tiveram que negociar e formar maiorias circunstanciais, o que complicou o próprio governo deles: o Fernando Henrique se complicou com o problema da reeleição, o Lula teve o problema do mensalão e entregou tudo ao PMDB para conseguir formar uma maioria, e a Dilma foi mais radical ainda. Foi a extensão da base que ela formou no Congresso que acabou cortando o pescoço dela, com Michel Temer.

O Brasil tem mesmo um centro democrático?

Todo lugar tem. O que você não tem [no Brasil] é um centro democrático bem composto. Você tem o “centrão”, que é uma versão fisiológica da ideia de centro, juntando os pedaços e gente daqui e ali, que funciona mais pela barganha do que pela ideologia, não tem programa político. O programa é “eu me virar” ou “me sair bem”. Você tem filiações ideológicas na vida política de qualquer país: socialistas, comunistas, liberais, conservadores. Tem gente que se diz “liberal na economia e conservador nos costumes”. O que se pode agora no Brasil, em nome de uma redução de riscos, é aproximar essas ideologias de um denominador comum, de um ponto de equilíbrio. Por exemplo: eu sou liberal e você é socialista, mas nós concordamos que é preciso estabilizar as contas públicas, reformar a Previdência, melhorar a educação.

Seria uma forma de antecipar ou evitar aquela costumeira negociação entre partidos por apoio no final da campanha presidencial?

Seria isso, com certeza. Na verdade, a gente pode ter duas leituras. Uma é: vamos nos unir agora, vamos aumentar a convergência agora para evitar que os extremos ou os mais afoitos cheguem ao segundo turno.

Quem o senhor considera os “afoitos” na disputa eleitoral? Quem oferece esse “risco”?

O afoito, o inimigo público número 1, para mim, se chama Bolsonaro. Ele não tem preparo. Em cinco mandatos de deputado federal, o que ele fez? Ele não tem conhecimento técnico mínimo para tal. E aí alguém pode dizer que o Lula também não tinha. É verdade, o Lula também não tinha, mas não ficava falando essas loucuras que o Bolsonaro fala, de dar armas para as pessoas e tal. Eu não sou lulista, mas consigo colocar um do lado do outro e ver que um vai dar em confusão e o outro não. O Lula teve uma história no sindicalismo, era um negociador. Se, depois, meteu os pés pelas mãos, é outro departamento. Mas como liderança política ele tinha uma biografia que o qualificava. O Bolsonaro não tem.

A união entre partidos pode diminuir essa possível força de Bolsonaro?

É uma forma de reduzir o “risco Bolsonaro”, que é um dos riscos possíveis. O outro risco é o populista, que também é um objeto escorregadio. Você tem populistas de diferentes tipos, e o Bolsonaro é também populista. O populista é um político que superpõe às instituições o carisma dele, a força imagética dele, o talento que ele julga ter, o discurso que ele tem. Ele se vê como mais forte que as instituições e ele é pouco atento às questões do equilíbrio fiscal.

A esquerda brasileira poderia ou deveria seguir o modelo de unir seus partidos?

Se a esquerda tiver preocupação de constituir um polo competitivo em termos eleitorais, ela tem que se unir. Você tem Ciro, Marina, Manuela e Boulos, mas uma parte está mais perto do centro, que é a Marina, uma parte mais no extremo, que é o Boulos, um cara da luta, do enfrentamento, da mão na massa. A Manuela também, mas ela é de um partido de esquerda que é um pouco mais suave do que o PSOL, que faz política de uma outra maneira. O PCdoB vem de uma trajetória histórica que educou os comunistas a negociarem mais, a entrarem com mais facilidade na composição dos governos. O PT está sem candidato hoje, mas a gente teria que colocar um eventual candidato do PT nesse lote da esquerda. Eles todos poderão se abraçar por conveniências, mas tem diferenças ali.

Do ponto de vista de um cálculo para aumentar a competitividade da esquerda, o correto seria uma unidade, uma frente de esquerda, acho que seria mais produtivo. Mas há dificuldades ali, as mesmas que você tem para o centro democrático se juntar. O único que não enfrenta esse problema é o Bolsonaro. Ninguém vai se unir ao Bolsonaro, e ele não tem que resolver essa questão da unidade

 

A Quarta Revolução Industrial: oportunidades e desafios para o Brasil

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A sociedade mundial passa por momentos de excitação e grande apreensão em decorrências das inúmeras transformações que a estrutura produtiva e as cadeias globais de produção estão passando nas últimas décadas, gerando novas oportunidades de negócios e de emprego, além de muitas incertezas e instabilidades, levando o indivíduo a patologias físicas, sociais e emocionais, neste ambiente a depressão se tornou uma realidade para quase 5% da população mundial, a ansiedade, os transtornos, a obesidade e as síndromes se espalham por todas as regiões e colocam os profissionais da saúde desafios imensos e imediatos.

Inúmeras são as transformações em curso na sociedade, desde comportamentos sociais, medos urbanos, mudanças nos relacionamentos, questões de gêneros, lutas por poder e dominação, ou seja, são muitos e variados, muitos deles existem na sociedade desde os primórdios da humanidade e outros são novos e desafiadores, sentidos fortemente pelos indivíduos, mas pouco compreendidos em sua totalidade, dentre os desafios, gostaríamos de destacar alguns deles gerados pela Quarta Revolução Industrial em curso, seus impactos sobre as empresas, sobre os empregos, sobre os indivíduos e sobre toda a coletividade nacional e internacional, isto porque é importante que destaquemos que estes desafios são de toda a civilização mundial.

Nesta nova sociedade global, alguns dados nos impressionam e nos geram grandes preocupações, segundo a Lei de Moore, a cada dezoitos meses a capacidade de armazenamento dos chips dobram, um tablet tem a capacidade de processamento equivalente a 5 mil computadores de trinta anos atrás, o custo anual de armazenamento de 1GB de dados a 20 anos era de US$ 10 mil, hoje, de menos de US$ 0,03; um floco de grafeno de 1 µm custava em 2014 US$ 1.000, hoje os valores se reduziram imensamente, abrindo novos espaços para negócios e novas oportunidades de investimentos, com potencial revolucionário, semelhante ao do plástico e do silício.

Outro dado que nos chama muito a atenção neste novo momento da estrutura produtiva internacional é que, as grandes indústrias do mundo que dominaram a sociedade mundial desde o início do século XX, perderam espaço para as empresas de tecnologia, que hoje são as grandes responsáveis por grande parte destas mudanças. Em 1990, na cidade de Detroit, nos Estados Unidos, as três grandes montadoras apresentavam valor de mercado de US$ 36 bilhões, vendas de US$250 bilhões e 1,2 milhão de empregados; na atualidade, o grande polo de desenvolvimento norte americano é o Vale do Silício, onde as três maiores empresas possuem US$1,03 trilhão de valor de mercado, vendas de US$247 bilhões e 137 mil empregados, ou seja, estas mudanças estão alterando imensamente toda a estrutura de poder das empresas internacionais, destacando ainda que, de todas as grandes empresas de tecnologia do mundo, a grande maioria são as norte-americanas.

Neste percurso de grandes transformações econômicas, percebemos que as grandes transformações do mundo foram impulsionadas pelos desenvolvimentos tecnológicos, que trouxeram grandes ganhos para a comunidade internacional, mas suscitaram também grandes desafios de adaptação dos indivíduos, exigindo flexibilidades e agilidades que, na atualidade, são fenômenos normais e fundamentais, obrigando-nos a sairmos da zona de conforto e nos habilitarmos à busca pelo conhecimento, ao incremento do estudo e por habilidades que muitas vezes desconhecíamos que as possuíamos. A Primeira Revolução Industrial ocorre na Europa no século XVIII, onde a máquina a vapor, a tecelagem, a siderurgia, as ferrovias, os navios a vapor, além dos setores de bens de capitais, tudo isso impulsionou o processo de urbanização, o trabalho assalariado e contribuiu para o crescimento do mercado mundial.

A segunda grande transformação industrial ocorreu, também na Europa, no período entre 1870 e 1970, neste período, os setores mais dinâmicos deste processo foram: eletricidade, motores de explosão interna, telégrafo, telefonia, linha de montagem, surgem os embriões do que seria mais tarde o modelo Fordista de produção, baseado no consumo de massa, na especialização, no grande contingente de funcionários, na produção em série, etc.

O século XIX trouxe grandes mudanças nas estruturas produtivas, a especialização do trabalhador e os vultosos investimentos em Ciência, pesquisa e inovação, foram fundamentais para que o século ficassem na história da humanidade como um dos momentos mais dinâmicos e progressivos, não apenas no campo do desenvolvimento científico, mas também no campo das ideias, da filosofia e com isso, contribuíram para o surgimento de novas Ciências, tais como a Sociologia, que passa a investigar a relação entre os seres humanos, dos grupos sociais e da sociedade.

Nos anos 1970 surge uma nova estrutura científica e tecnológica que passa a impulsionar novas formas de organização social e política, este período ficou conhecido como Terceira Revolução Industrial, motivada pelo avanço das tecnologias ligadas à informática e as comunicações, surgindo desta união a rede mundial dos computadores, a internet, destacando ainda, semicondutores, mainframes, PCs, automatização da linha de montagem, Globalização, padronização de padrões de consumo, cadeias produtivas globais, etc.

Estas transformações impactaram imensamente sobre os indivíduos, o desenvolvimento da internet aproximou muito as pessoas, intensificou os relacionamentos, criando nichos e grupos específicos com comportamentos, hábitos e costumes diferenciados, gerando alterações nas estruturas sociais, famílias, escolas, religião e, com isso, trazendo novos desafios para as pessoas, comunidades e grupos sociais.

Se observarmos atentamente estas mudanças em curso na sociedade desde a primeira revolução industrial, vamos perceber que, de uma para outra, as mudanças são cada vez mais rápidas, intensas e aceleradas, com isso, os indivíduos não conseguem acompanhar tais mudanças e passam a se assustar com a velocidade e as instabilidades e incertezas das transformações, gerando patologias sociais e emocionais nos trabalhadores, principalmente naqueles dotados apenas de força física e material, com baixa qualificação, sem estudo e sem perspectivas maiores.

O século XXI está nos trazendo novas mudanças na estrutura produtiva, as cadeias globais de produção se espalham por todas as regiões do mundo, o comércio internacional movimenta mais de R$ 25 trilhões por ano, as economias estão cada vez mais integradas e interdependentes, a tecnologia desta nova revolução para muitos conhecida como Quarta Revolução Industrial ou Indústria 4.0, esta está alicerçada na onipresença da internet, na articulação de sistemas físicos e digitais, na computação quântica, na biotecnologia, na inteligência artificial, na internet das coisas, na internet nas nuvens, o resultado destas transformações ainda estão por ser estudados, mas as preocupações com seus impactos são intensos e preocupantes.

Esta Quarta Revolução Industrial é a responsável pelo surgimento de empresas e negócios revolucionários, onde destacamos Uber, AirBnB, WhatsApp, Wase, Netflix, todos estes empreendimentos seriam impossíveis de imaginar a uns 20 anos estão gerando grandes mudanças na sociedade, tudo isso só foi possível graças ao crescimento da internet e da facilidade das conexões, possível devido ao crescimento do mercados de smartphones, praticamente encontramos mais telefones celulares disponíveis do que pessoas no mundo contemporâneo.

Empresas como a Netflix estão alterando por completo um negócio que até então estava bastante acomodado, hoje as plataformas de streaming movimentam bilhões de dólares e exigem que seus concorrentes se transformem, ou melhor, que se reinventem completamente, não o fazendo serão engolidos pela tecnologia avassaladora que movimenta o mercado.

O Uber, aplicativos que liga carros particulares a pessoas que buscam se movimentar nos centros urbanos, vem criando graves constrangimentos para os motoristas de táxi e com governos e prefeituras, uns porque estão perdendo seu monopólio de transporte de pedestre e o outro porque, por esta nova plataforma, os governos perdem controle dos impostos e perdem arrecadação de tributos, inviabilizando muitos agentes públicos.

Devemos salientar ainda, que não se trata apenas de  mudar o “o quê“ e o “como” fazemos as coisas, mas também de definir “quem” somos, ou seja, o mundo digital que estamos mergulhados ou melhor, que estamos mergulhando, exige que os negócios, as empresas, as pessoas e a sociedade de uma forma geral, passe a perceber quem cada um é efetivamente na sociedade, isto passa a ser fundamental para o êxito de todo e qualquer negócio e empreendimento.

Quando analisamos detalhadamente estas transformações, destacamos que elas se sustentam em três grandes vetores por trás da Quarta Revolução Industrial: tecnologias físicas (veículos autônomos, impressão em 3D, robótica avançada, novos materiais e nanotecnologias), tecnologias digitais (inteligência artificial, internet das coisas, Blockchain, Bitcoin, Big Data, economia sob demanda e ampliação da capacidade de armazenamento de dados) e biotecnologias (sequenciamento genético, biomimetismo, ciência do cérebro, Biologia sintética por meio de manipulação do DNA, combinação de edição de genes e impressoras 3D).

A junção de todas estas tecnologia juntas está transformando a sociedade internacional, a pesquisa científica está transformando o século XXI no século da Biologia, inúmeras são as mudanças e os avanços que estão sendo liderados por esta área do conhecimento, desde o sequenciamento genético que, num futuro não muito distante, irá prever doenças e indicar tratamentos específicos individuais, as novas tecnologias de impressão 3D está dando, ao homem, a esperança de impressão de órgãos humanos, ou seja, com isso, o corpo humano poderá ser consertado como se faz na atualidade com os automóveis que, quando apresentam problemas, suas peças são substituídas por outras novas, uma transformação que os mais otimistas e adeptos da tecnologia jamais imaginou que seria possível.

No mundo dos negócios os impactos são variados, muitos mercados até então deveras protegido, estão se abrindo a uma competição global, onde empresas estrangeiras estão entrando, trazendo sua experiência e obrigando as locais a se adaptarem, melhorando a produtividade, reduzindo custos e otimizando processos, além disso, estão investindo cada vez mais em pesquisas nas áreas de marketing para descobrir e se antecipar as demandas e gostos dos consumidores que passam a exigir cada vez mais das empresas, obrigando os gestores a constantes treinamentos e qualificação e os trabalhadores a constantes mudanças, agilidades e flexibilidades.

Neste ambiente de constantes transformações, faz-se necessário, que os trabalhadores se qualifiquem cada vez mais, os diplomas, cursos, extensões, treinamentos estão em moda na sociedade, a qualificação é a mola para se adaptar aos novos modelos de organização dos mercados, aprender e desaprender são habilidades exigidas, proatividade, trabalho em grupo, resiliência, flexibilidade, equilíbrio emocional e uma constante capacidade de se reinventar são centrais nesta sociedade, além de uma alta dose de liderança e empreendedorismo.

Faz-se importante destacar, do ponto de vista político, que o Estado Nacional perde força constantemente, sua capacidade de tributação e controle interno se reduzem e, com isso, a contemporaneidade coloca em xeque a perpetuação deste agente central para a organização social, política e institucional, exigindo que a própria sociedade construa novos instrumentos de organização e estruturação dos agentes econômicos e sociais, este nos parece um dos maiores desafios do Estado nesta nova sociedade.

Dentro deste ambiente citado e analisado acima, como se encontra a sociedade brasileira, diante de tantas transformações? Será que estamos preparados para o mundo do trabalho que se está desenhando?  São inúmeras as perguntas que nos levam a reflexão e nos levam também ao medo, a insegurança e a instabilidades crescentes e ameaçadoras.

No caso brasileiro, percebemos que não mais contamos com o chamado bônus demográfico, estamos nos tornando um país de idosos, assim como os países desenvolvidos, o grande problema é que, enquanto os países europeus enriqueceram antes de  envelhecer o Brasil está envelhecendo sem ficar sem se desenvolver, ou seja, estamos ainda sendo chamado de países em desenvolvimento, uma nomenclatura que se alterou constantemente nos últimos cinquenta anos e, neste período, ainda continuamos subdesenvolvidos.

Com relação a mão de obra brasileira, encontramos aí um outro grande gargalo, nossa força de trabalho apresenta baixíssima produtividade, isto acontece e se perpetua porque ainda não resolvemos problemas centrais na nossa sociedade, temos uma estrutura tributária arcaica e regressiva, que pune os empreendedores e glorificam aqueles que sobrevivem através das benesses do Estado Nacional, sem reverter esta inconsistência, dificilmente vamos atingir o local que a população brasileira espera, um país digno, decente, sem pobreza e com grandes perspectivas de sucesso para as próximas gerações.

O mundo da Quarta Revolução Industrial nos impõe grandes desafios, o jeitinho brasileiro se mostrou ineficiente e limitado, o mundo não mais vai esperar o país acordar de berço esplêndido, estamos nos momentos de acordar para as duras realidades da vida, ou as encaramos de perto ou nos condenamos a ser o eterno país do futuro, um futuro cada vez mais distante e inalcançável.

Não conseguiremos alcançar os padrões dos países desenvolvidos enquanto não investirmos maciçamente na construção de cidadãos conscientes e responsáveis, se continuarmos produzindo em escala consumidores com baixos salários e sem visão política crítica e imediatista, o país continuará condenado a ser governado por governantes míopes dos  interesses coletivos e imensamente concentrado em seus interesses imediatos, estimulando o individualismo e se locupletando dos recursos amoedados da população.

O desenvolvimento tecnológico deve ser visto como um grande instrumento de diminuição das desigualdades sociais e políticas, depois de dominar a natureza e se utilizar dela para sua sobrevivência, o homem contemporâneo precisa desenvolver novas habilidades para construir uma sociedade global cada vez mais consistente, onde os frutos da riqueza social sejam distribuídos por todos e não fiquem concentrados nas mãos de uma pequena classe de privilegiados que, nos dias atuais, nem olham pela janela de suas casas e residências porque estas estão cercadas de grades, muros e câmeras por todos os lados e, principalmente, porque quando olham pelas janelas se deparam com a pobreza, a miséria e a indigência de seres humanos que estão reduzidos a uma condição de inferioridade e exclusão social.

Como destacou Franklin D. Roosevelt: “O teste de nosso progresso não é se agregamos mais à abundância daqueles que têm muito, mas se fornecemos o suficiente para aqueles que têm pouco”. Se analisarmos bem as palavras acima, vamos perceber que estamos muito distantes desta realidade, estamos acrescentando mais e mais aos que tem muito e deixando de lado aqueles que pouco possuem, a tecnologia deve contribuir para o incremento da felicidade humana e não tornar os seres humanos escravos da tecnologia e do lucro desenfreado, só assim vamos construir uma felicidade verdadeira alicerçado na solidez dos valores universais de ética, moral e prosperidade.

Grupo de Estudo – Sociedade em transformação: os impactos da     Tecnologia sobre o trabalhador, o emprego e o mundo do trabalho. Faculdade de Tecnologia de Catanduva – FatCat.

Coordenação Professor Dr. Ary Ramos da Silva Júnior