“Deus não morreu. Ele tornou-se Dinheiro”, entrevista com Giorgio Agamben.

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“O capitalismo é uma religião, e a mais feroz, implacável e irracional religião que jamais existiu, porque não conhece nem redenção nem trégua. Ela celebra um culto ininterrupto cuja liturgia é o trabalho e cujo objeto é o dinheiro”, afirma Giorgio Agamben, em entrevista concedida a Peppe Salvà e publicada por Ragusa News 16-08-2012.

Giorgio Agamben é um dos maiores filósofos vivos. Amigo de Pasolini e de Heidegger, foi definido pelo Times e pelo Le Monde como uma das dez mais importantes cabeças pensantes do mundo. Pelo segundo ano consecutivo ele transcorreu um longo período de férias em Scicli, na Sicília, Itália, onde concedeu a entrevista.

Segundo ele, “a nova ordem do poder mundial funda-se sobre um modelo de governabilidade que se define como democrática, mas que nada tem a ver com o que este termo significava em Atenas”. Assim, “a tarefa que nos espera consiste em pensar integralmente, de cabo a cabo, aquilo que até agora havíamos definido com a expressão, de resto pouco clara em si mesma, “vida política”, afima Agamben.

A tradução é de Selvino  J. Assmann, professor de Filosofia do Departamento de Filosofia da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC [e tradutor de três das quatro obras de Agamben publicadas pela Boitempo], para o site do Instituto Humanitas Unisinos.

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O governo Monti invoca a crise e o estado de necessidade, e parece ser a única saída tanto da catástrofe financeira quanto das formas indecentes que o poder havia assumido na Itália. A convocação de Monti era a única saída, ou poderia, pelo contrário, servir de pretexto para impor uma séria limitação às liberdades democráticas?

“Crise” e “economia” atualmente não são usadas como conceitos, mas como palavras de ordem, que servem para impor e para fazer com que se aceitem medidas e restrições que as pessoas não têm motivo algum para aceitar. “Crise” hoje em dia significa simplesmente “você deve obedecer!”. Creio que seja evidente para todos que a chamada “crise” já dura decênios e nada mais é senão o modo normal como funciona o capitalismo em nosso tempo. E se trata de um funcionamento que nada tem de racional.

Para entendermos o que está acontecendo, é preciso tomar ao pé da letra a ideia de Walter Benjamin, segundo o qual o capitalismo é, realmente, uma religião, e a mais feroz, implacável e irracional religião que jamais existiu, porque não conhece nem redenção nem trégua. Ela celebra um culto ininterrupto cuja liturgia é o trabalho e cujo objeto é o dinheiro.  Deus não morreu, ele se tornou Dinheiro.  O Banco – com os seus cinzentos funcionários e especialistas – assumiu o lugar da Igreja e dos seus padres e, governando o crédito (até mesmo o crédito dos Estados, que docilmente abdicaram de sua soberania), manipula e gere a fé – a escassa, incerta confiança – que o nosso tempo ainda traz consigo. Além disso, o fato de o capitalismo ser hoje uma religião, nada o mostra melhor do que o titulo de um grande jornal nacional (italiano) de alguns dias atrás: “salvar o euro a qualquer preço”. Isso mesmo, “salvar” é um termo religioso, mas o que significa “a qualquer preço”? Até ao preço de “sacrificar” vidas humanas? Só numa perspectiva religiosa (ou melhor, pseudo-religiosa) podem ser feitas afirmações tão evidentemente absurdas e desumanas.

A crise econômica que ameaça levar consigo parte dos Estados europeus pode ser vista como condição de crise de toda a modernidade?

A crise atravessada pela Europa não é apenas um problema econômico, como se gostaria que fosse vista, mas é antes de mais nada uma crise da relação com o passado. O conhecimento do passado é o único caminho de acesso ao presente. É procurando compreender o presente que os seres humanos – pelo menos nós, europeus – são obrigados a interrogar o passado.  Eu disse “nós, europeus”, pois me parece que, se admitirmos que a palavra “Europa” tenha um sentido, ele, como hoje aparece como evidente, não pode ser nem político, nem religioso e menos ainda econômico, mas talvez consista nisso, no fato de que o homem europeu – à diferença, por exemplo, dos asiáticos e dos americanos, para quem a história e o passado têm um significado completamente diferente – pode ter acesso à sua verdade unicamente através de um confronto com o passado, unicamente fazendo as contas com a sua história.

O passado não é, pois, apenas um patrimônio de bens e de tradições, de memórias e de saberes, mas também e sobretudo um componente antropológico essencial do homem europeu, que só pode ter acesso ao presente olhando, de cada vez, para o que ele foi. Daí nasce a relação especial que os países europeus (a Itália, ou melhor, a Sicília, sob este ponto de vista é exemplar) têm com relação às suas cidades, às suas obras de arte, à sua paisagem: não se trata de conservar bens mais ou menos preciosos, entretanto exteriores e disponíveis; trata-se, isso sim, da própria realidade da Europa, da sua indisponível sobrevivência. Neste sentido, ao destruírem, com o cimento, com as autopistas e a Alta Velocidade, a paisagem italiana, os especuladores não nos privam apenas de um bem, mas destroem a nossa própria identidade. A própria expressão “bens culturais” é enganadora, pois sugere que se trata de bens entre outros bens, que podem ser desfrutados economicamente e talvez vendidos, como se fosse possível liquidar e por à venda a própria identidade.

Há muitos anos, um filósofo que também era um alto funcionário da Europa nascente, Alexandre Kojève, afirmava que o homo sapiens havia chegado ao fim de sua história e já não tinha nada diante de si a não ser duas possibilidades: o acesso a uma animalidade pós-histórica (encarnado pela american way of life) ou o esnobismo (encarnado pelos japoneses, que continuavam a celebrar as suas cerimônias do chá, esvaziadas, porém, de qualquer significado histórico). Entre uma América do Norte integralmente re-animalizada e um Japão que só se mantém humano ao preço de renunciar a todo conteúdo histórico, a Europa poderia oferecer a alternativa de uma cultura que continua sendo humana e vital, mesmo depois do fim da história, porque é capaz de confrontar-se com a sua própria história na sua totalidade e capaz de alcançar, a partir deste confronto, uma nova vida.

A sua obra mais conhecida, Homo Sacer, pergunta pela relação entre poder político e vida nua, e evidencia as dificuldades presentes nos dois termos. Qual é o ponto de mediação possível entre os dois pólos?

Minhas investigações mostraram que o poder soberano se fundamenta, desde a sua origem, na separação entre vida nua (a vida biológica, que, na Grécia, encontrava seu lugar na casa) e vida politicamente qualificada (que tinha seu lugar na cidade). A vida nua foi excluída da política e, ao mesmo tempo, foi incluída e capturada através da sua exclusão. Neste sentido, a vida nua é o fundamento negativo do poder. Tal separação atinge sua forma extrema na biopolítica moderna, na qual o cuidado e a decisão sobre a vida nua se tornam aquilo que está em jogo na política. O que aconteceu nos estados totalitários do século XX reside no fato de que é o poder (também na forma da ciência) que decide, em última análise, sobre o que é uma vida humana e sobre o que ela não é. Contra isso, se trata de pensar numa política das formas de vida, a saber, de uma vida que nunca seja separável da sua forma, que jamais seja vida nua.

O mal-estar, para usar um eufemismo, com que o ser humano comum se põe frente ao mundo da política tem a ver especificamente com a  condição italiana ou é de algum modo inevitável?

Acredito que atualmente estamos frente a um fenômeno novo que vai além do desencanto e da desconfiança recíproca entre os cidadãos e o poder e tem a ver com o planeta inteiro. O que está acontecendo é uma transformação radical das categorias com que estávamos acostumados a pensar a política. A nova ordem do poder mundial funda-se sobre um modelo de governamentalidade que se define como democrática, mas que nada tem a ver com o que este termo significava em Atenas. E que este modelo seja, do ponto de vista do poder, mais econômico e funcional é provado pelo fato de que foi adotado também por aqueles regimes que até poucos anos atrás eram ditaduras. É mais simples manipular a opinião das pessoas através da mídia e da televisão do que dever impor em cada oportunidade as próprias decisões com a violência. As formas da política por nós conhecidas – o Estado nacional, a soberania, a participação democrática, os partidos políticos, o direito internacional – já chegaram ao fim da sua história. Elas continuam vivas como formas vazias, mas a política tem hoje a forma de uma “economia”, a saber, de um governo das coisas e dos seres humanos. A tarefa que nos espera consiste, portanto, em pensar integralmente, de cabo a cabo, aquilo que até agora havíamos definido com a expressão, de resto pouco clara em si mesma, “vida política”.

O estado de exceção, que o senhor vinculou ao conceito de soberania, hoje em dia parece assumir o caráter de normalidade, mas os cidadãos ficam perdidos perante a incerteza na qual vivem cotidianamente. É possível atenuar esta sensação?

Vivemos há decênios num estado de exceção que se tornou regra, exatamente assim como acontece na economia em que a crise se tornou a condição normal. O estado de exceção – que deveria sempre ser limitado no tempo – é, pelo contrário, o modelo normal de governo, e isso precisamente nos estados que se dizem democráticos. Poucos sabem que as normas introduzidas, em matéria de segurança, depois do 11 de setembro (na Itália já se havia começado a partir dos anos de chumbo) são piores do que aquelas que vigoravam sob o fascismo. E os crimes contra a humanidade cometidos durante o nazismo foram possibilitados exatamente pelo fato de Hitler, logo depois que assumiu o poder, ter proclamado um estado de exceção que nunca foi revogado. E certamente ele não dispunha das possibilidades de controle (dados biométricos, videocâmeras, celulares, cartões de crédito) próprias dos estados contemporâneos. Poder-se-ia afirmar hoje que o Estado considera todo cidadão um terrorista virtual. Isso não pode senão piorar e tornar impossível aquela participação na política que deveria definir a democracia. Uma cidade cujas praças e cujas estradas são controladas por videocâmeras não é mais um lugar público: é uma prisão.

A grande autoridade que muitos atribuem a estudiosos que, como o senhor, investigam a natureza do poder político poderá trazer-nos esperanças de que, dizendo-o de forma banal, o futuro será melhor do que o presente?

Otimismo e pessimismo não são categorias úteis para pensar. Como escrevia Marx em carta a Ruge: “a situação desesperada da época em que vivo me enche de esperança”.

Podemos fazer-lhe uma pergunta sobre a aula que o senhor deu em Scicli? Houve quem lesse a conclusão que se refere a Piero Guccione como se fosse uma homenagem devida a uma amizade enraizada no tempo, enquanto outros viram nela uma indicação de como sair do xeque-mate no qual a arte contemporânea está envolvida.

Trata-se de uma homenagem a Piero Guccione e a Scicli, pequena cidade em que moram alguns dos mais importantes pintores vivos. A situação da arte hoje em dia é talvez o lugar exemplar para compreendermos a crise na relação com o passado, de que acabamos de falar. O único lugar em que o passado pode viver é o presente, e se o presente não sente mais o próprio passado como vivo, o museu e a arte, que daquele passado é a figura eminente, se tornam lugares problemáticos. Em uma sociedade que já não sabe o que fazer do seu passado, a arte se encontra premida entre a Cila do museu e a Caribdis da mercantilização. E muitas vezes, como acontece nos templos do absurdo que são os museus de arte contemporânea, as duas coisas coincidem.

Duchamp talvez tenha sido o primeiro a dar-se conta do beco sem saída em que a arte se meteu. O que faz Duchamp quando inventa o ready-made? Ele toma um objeto de uso qualquer, por exemplo, um vaso sanitário, e, introduzindo-o num museu, o força a apresentar-se como obra de arte. Naturalmente – a não ser o breve instante que dura o efeito do estranhamento e da surpresa – na realidade nada alcança aqui a presença: nem a obra, pois se trata de um  objeto de uso qualquer, produzido industrialmente, nem a operação artística, porque não há de forma alguma uma poiesis, produção – e nem sequer o artista, porque aquele que assina com um irônico nome falso o vaso sanitário não age como artista, mas, se muito, como filósofo ou crítico, ou, conforme gostava de dizer Duchamp, como “alguém que respira”, um simples ser vivo.

Em todo caso, certamente ele não queria produzir uma obra de arte, mas desobstruir o caminhar da arte, fechada entre o museu e a mercantilização.  Vocês sabem: o que de fato aconteceu é que um conluio, infelizmente ainda ativo, de hábeis especuladores e de “vivos” transformou o ready-made em obra de arte. E a chamada arte contemporânea nada mais faz do que repetir o gesto de Duchamp, enchendo com não-obras e performances em museus, que são meros organismos do mercado, destinados a acelerar a circulação de mercadorias, que, assim como o dinheiro, já alcançaram o estado de liquidez e querem ainda valer como obras. Esta é a contradição da arte contemporânea: abolir a obra e ao mesmo tempo estipular seu preço.

Sobre o autor

Giorgio Agamben nasceu em Roma em 1942. É um dos principais intelectuais de sua geração, autor de muitos livros e responsável pela edição italiana das obras de Walter Benjamin. Deu cursos em várias universidades europeias e norte-americanas, recusando-se a prosseguir lecionando na New York University em protesto à política de segurança dos Estados Unidos. Foi diretor de programa no Collège International de Philosophie de Paris. Mais recentemente ministrou aulas de Iconologia no Istituto Universitario di Architettura di Venezia (Iuav), afastando-se da carreira docente no final de 2009. Sua obra, influenciada por Michel Foucault e Hannah Arendt, centra-se nas relações entre filosofia, literatura, poesia e, fundamentalmente, política. Entre seus principais livros destacam-se Homo sacer (2005), Estado de Exceção (2005), Profanações (2007), O que resta de Auschwitz (2008) e O reino e a glória (2011) os quatro últimos publicados no Brasil pela Boitempo Editora. 

A grande divergência, por Rodrigo Zeidan

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Estamos no meio de um processo de retrocesso como na década de 1930

As eleições no Reino Unido e na Argélia, o novo acordo comercial entre EUA, México e Canadá, o quase abandono da Organização Mundial do Comércio e a nova lei para cidadania na Índia são parte de um movimento de desglobalização. O Brasil, um país já isolado, vai ter que se contentar com migalhas, como vender carne para a China.

As sociedades estão dispostas a pagar um alto preço pelo isolamento e pela maior autonomia de decisão sobre migração e comércio. No Reino Unido, o brexit já tem afetado a economia, e as coisas devem piorar.

Mais de 60% das empresas britânicas colocam a saída da União Europeia como um dos três maiores riscos para os negócios. O brexit deve custar pelo menos 2% do PIB por ano até 2023.

Estimativas indicam que cada família vai perder £ 870 (cerca de R$ 4.700) por ano, permanentemente. As coisas ainda podem piorar, dependendo de quão atabalhoado seja o brexit.

O outro resultado relevante da eleição britânica é o fato de que o Partido Nacional Escocês (SNP, em inglês) levou praticamente toda a Escócia. Não deve demorar para nova votação para independência (no referendo de 2014, 55% votaram por manter a Escócia no Reino Unido).
Na Argélia, os cinco candidatos eram ex-membros do governo, em uma eleição de fachada na qual, inicialmente, o presidente pretendia concorrer ao quinto mandato. Isolado o país estava e continuará.

O acordo EUA-Canadá-México (USCMA, em inglês) substitui o Nafta com raro apoio dos dois partidos americanos. O USCMA é uma versão bem aguada do Nafta e acaba com o livre-comércio na região.

Na Índia, o isolacionismo vem alienar mais de 200 milhões de muçulmanos. Uma nova lei de imigração torna praticamente impossível que refugiados muçulmanos (e também ateus e judeus) consigam cidadania indiana.

O governo de Narendra Modi tem uma trajetória similar ao atual governo brasileiro.

Assumiu prometendo reformas, mas concentrou a maior parte dos seus esforços numa agenda ultranacionalista de costumes. Resultado? A economia desacelera fortemente.

Globalmente, os organismos multilaterais estão definhando. Na quarta-feira (11), o painel de juízes da OMC parou de funcionar, já que os mandatos venceram e os Estados Unidos bloqueiam novas nomeações. Simplesmente não há mais quem analise disputas comerciais entre países por árbitros razoavelmente lentos. O protecionismo comercial não vai ser mais punido.

O isolacionismo não afeta somente comércio, mas também investimentos. Há sinais claros de que as cadeias de suprimento globais estão se reorganizando e encolhendo.

Em 2018, foram 60.500 os projetos de investimento de empresas estrangeiras na China.

Em 2019, esse número não deve passar de 40 mil (no acumulado do ano até setembro, eram pouco mais de 30 mil).

Os investimentos chineses nos Estados Unidos e no mundo também se contraíram, com previsão de queda de mais de 30% para este ano. E isso depois de esses investimentos, somente nos EUA, terem despencado mais de 80% em 2018.

O que vale para a China vale para o resto do mundo. Investimentos estão sendo adiados, e a incerteza torna mais difícil qualquer recuperação, seja chinesa, indiana ou brasileira.

Estamos no meio de um processo de retrocesso como na década de 1930, com a onda protecionista varrendo o sistema global. Esperemos que desta vez não acabe em tragédia. De qualquer forma, a onda nacionalista pode ser temporária, mas os efeitos serão sentidos por muito tempo.

Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

 

Economia Brasileira, lenta recuperação e mudanças estruturais

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Depois de um período de forte degradação econômica, marcado por uma recessão que gerou mais de 13 milhões de desempregados e um contingente de quase 40 milhões de pessoas na indignidade, onde além dos desempregados somamos os subempregados e os desalentados, a economia brasileira dá sinais, ainda medíocres e inconsistentes, de recuperação econômica, gerando de um lado os ventos ufanistas daqueles que querem acreditar que encontramos os caminhos concretos do crescimento e logo estaremos nos destacando no cenário internacional, rumo ao tão almejado desenvolvimento econômico.

Neste período de crise econômica, as condições sociais pioraram consideravelmente, comprometendo todas as melhoras que tivemos no período 2003/2013, quando o país conseguiu a façanha de crescer e incluir mais pessoas dentro do sistema econômico, gerando mais emprego e melhorando as perspectivas do país, dando a grupos, até então excluídos ou marginalizados, algumas perspectivas de sonhar com um futuro melhor, estes sonhos acabaram se transformando em um verdadeiro pesadelo na atualidade, comprometendo conquistas importantes e gerando fortes preocupações políticas e econômicas, que passaram a colocar em xeque a nossa frágil democracia, como estamos vendo acontecer em outros países e regiões da comunidade internacional.

A economia brasileira vivenciou um momento de grande crise econômica e constrangimentos sociais, a recessão degradou grande parte das conquistas anteriores e gerou forte descontentamento na sociedade, depois de quedas no produto interno bruto de 3,9% em 2015 e de 3,6% em 2016, a economia apresentou algum espasmo de crescimento no período 2017/2018, onde crescemos baixíssimos 1,1 e 1,2%, números estes insuficientes para melhorar as condições econômicas e abrir novas oportunidades de investimentos e geração de empregos. Na atualidade estamos percebendo alguns sinais de melhorias, embora tímidas e limitadas, estamos percebendo que o crescimento de 2020 deve chegar na casa dos 2%, número ainda baixo para resolver os graves desajustes econômicos, mas depois de anos de baixíssimo crescimento, até mesmo estes números estão sendo comemorados pela elite econômica nacional.

A dureza do período 2014/2016 pode ser compreendida como um período de grandes equívocos na condução da política econômica, marcado por desonerações exageradas, por políticas de controle de preços em setores como os combustíveis e energia elétrica, além de queda nos juros sem se atentar para os indicadores macroeconômicos, tudo isso culminou numa situação de insolvência generalizada na estrutura produtiva, descontrole nos gastos governamentais e uma grande confusão na condução na política monetária, cujas intervenções foram vistas pela sociedade como desastrosas e seus resultados extremamente negativos para a economia brasileira.

A partir de 2016, as bases da política econômica se alteraram imensamente, neste momento o governo passou a diminuir as intervenções estatais, deixou que os preços dos serviços controlados pelo Estado se acomodassem em um patamar maior, levando a inflação a um incremento que obrigou o governo federal a adoção de medidas fortes para reduzir as atividades econômicas e combatesse a inflação que crescia de forma acelerada, gerando desconfortos crescentes para o governo. A opção pela austeridade nos gastos públicos era descrita pelo governo como uma forma de reestruturar as finanças do setor público e colocar as despesas em ordem, evitando, com isso, o descontrole fiscal e financeiro que permeava a economia brasileira a algumas décadas e as autoridades via nesta oportunidade um momento exato e propício para que o ajuste fiscal, sempre postergado, fosse feito de forma rápida, generalizada e agressiva, evitando que o Estado Nacional continuasse a pagar juros elevados para financiar suas despesas e conseguisse recursos para o tão esperado e desejado investimento público.

A recuperação, ora em curso, deve ser vista com entusiasmo reduzido, isto porque estamos num momento muito particular da economia brasileira, percebemos e nos alegramos com a retomada, todos almejam que a economia volte ao tão acalentado crescimento econômico, visando algo maior e mais consistente, parecido com um sustentável desenvolvimento econômico. Nestes anos percebemos que a desindustrialização crassa a economia brasileira, os indicadores nos mostram que passamos por um processo perigoso de desindustrialização, nosso setor industrial vem perdendo participação no produto interno bruto, estes dados deveriam acender uma luz na sociedade, mostrando-a que nenhum país conseguiu se aventurar no desenvolvimento econômico sem, antes, construir uma estrutura industrial de relevo, diversificada e dotada de tecnologias, máquinas e equipamentos altamente sofisticados.

Embora tenhamos grande vocação agrícola, tema este que sempre esteve presente nos espaços de discussões política e econômica, como no grande debate materializado por dois expoentes da sociedade brasileira, Eugênio Gudin, economista  liberal e defensor da vocação agrícola nacional e Roberto Simonsen, grande industrial paulista, idealizador da FIESP e defensor ardoroso do desenvolvimento de uma base industrial de destaque, que colocasse a sociedade brasileira na condição de destaque no cenário internacional. Neste momento, o Brasil começava a trilhar caminhos sólidos e consistentes para reverter sua condição de país subdesenvolvido, o debate auxiliou na construção de bases concretas para a indústria nacional e o sonho, da época, de que o apoio a indústria traria ganhos incomensuráveis para a sociedade brasileira e nos levaria ao panteão dos países desenvolvidos, deixando para trás anos de colonização e exploração.

Depois desta discussão e da vitória dos industrializantes, a economia começou a galgar espaços de industrialização, marcadas por um projeto fortemente intervencionista, centrado no Estado nacional, nas políticas industriais ativas e nacionalistas, o país conseguiu construir uma base industrial de destaque, nos destacando entre as maiores economias do mundo e nos colocando como o país que mais cresceu no período 1900/1980, onde saímos de uma condição de fragilização econômica, centrada no meio rural e fortemente dependente do trabalho desqualificado, para uma economia industrializada, numa sociedade urbana e marcada por trabalhadores em crescente qualificação, com isso, éramos descritos como um país em ascensão no cenário internacional e com potencial econômico que gerava grandes ciúmes em países desenvolvidos e naqueles que caminhavam na estrada do desenvolvimento.

Depois dos anos 1980, o Brasil perdeu o rumo do crescimento econômico, nossos indicadores pioraram de forma acelerada, nossa indústria perdeu força e nossas questões sociais se agravaram fortemente, entramos num período de reestruturação e a agenda econômica se tornou a mais relevante para definir os rumos futuros do país, para voltar a crescer e fazer com que os ventos do desenvolvimento voltassem, eram necessários que debelássemos a inflação que crescia de forma avassaladora e controlássemos o endividamento externo, cujo potencial de degradação era bastante acelerado. Os anos 90 foram responsáveis pela estabilização econômica, políticas de estabilização foram implementadas para que nossos indicadores voltassem a valores aceitáveis na economia internacional, estes indicadores demoraram a cair para números civilizados, na atualidade podemos considerá-los mais parecido com os que encontramos internacionalmente, hoje a inflação está na casa dos 4% ao ano, uma grande conquista para um país que, em épocas anteriores, registrou números próximos de 80% ano mês ou mais de 2000% ao ano.

A recuperação econômica, ora em curso, nos parece consistente, embora devemos destacar ainda, que além da desindustrialização, estamos bastante preocupados com a qualidade da economia que vai emergir desta crise, estamos vendo claramente uma forte degradação do emprego, estamos gerando novas ocupações em situação bastante precária, com proteção social reduzida e com grande parte da força de trabalhando na informalidade, culminando em empregos piores e grande degradação para a classe trabalhadora.

Estamos criando empregos em setores com baixa produtividade, tais como a construção civil, serviços não sofisticados em geral (lojas, restaurantes, cabeleireiros, serviços médicos, call centers, telecom, etc..), além de serviços de transportes (motoristas de ônibus, caminhões e taxis), entre outros. A produtividade destes empregos gerados na economia brasileira é bastante reduzida e muito parecida com estes empregos em países como os Estados Unidos, Europa e Ásia. Nas comparações internacionais, percebemos que o grande diferencial de produtividade entre as economias está justamente no setor de bens transacionáveis, especialmente nos empregos industriais, justamente aqueles empregos que não estamos gerando na atualidade, longe dos chamados serviços não sofisticados.

Os empregos gerados devem ser descritos como de baixa complexidade econômica, neles estamos pagando salários reduzidos e deixando de incorporar novas tecnologias, de agregar valores aos produtos vendidos e, quando necessitamos dos produtos de alto valor agregado, temos que recorrer aos grandes conglomerados globais, sediados em países que conseguiram desenvolver um parque industrial de altíssima complexidade econômica, com isso, nos tornamos importadores de tecnologias, máquinas, equipamentos e pesquisas científicas e nos especializamos em exportar produtos agrícolas, as chamadas commodities. Estamos retornando ao debate descrito acima que, embora bastante relevante, nos mostra um final diferente dos anos 1930/1940, neste novo debate da contemporaneidade, os vencedores tendem a ser os defensores da especialização nos produtos primários, como sempre desejaram os economistas liberais.

O setor agrícola brasileiro passa por um amplo processo de desenvolvimento, a agricultura nacional está ganhando espaço no mercado global, trazendo ganhos financeiros consideráveis, o grande problema é que setor agrícola tradable, que já foi intensivo em mão de obra, encontra-se inteiramente mecanizado, diante disso, percebemos que o que sobra para a formação de capital fixo são migalhas. Embora devemos ter orgulho do setor agrícola nacional, devemos compreender, que nenhum país conseguiu alçar espaços consistentes de desenvolvimento econômico dependendo do setor agrícola, ainda mais quando percebemos que as grandes tecnologias utilizadas na agricultura nacional são importadas e são produzidas por grandes conglomerados internacionais, sediados em países desenvolvidos que possuem um setor industrial sólido e desenvolvido, baseado em altos investimentos tecnológicos, em máquinas sofisticadas e em equipamentos de grande complexidade, exigindo mão de obra altamente qualificada e dotada de uma educação de destaque internacional, que os colocam nas melhores posições nos principais indicadores de educação da sociedade internacional.

Não existe atalho ao desenvolvimento econômico das nações, todos que conseguiram construir uma sociedade mais desenvolvida, se utilizaram do Estado como agente planejador, investidor e regulador, além de um mercado centrado na concorrência e em instituições sólidas e consistentes, onde a educação sempre recebeu os mais sólidos investimentos, onde as leis eram sempre claras e precisas, marcados por um ambiente de estabilidade política, onde as decisões se davam de forma ágil e rápidas e a interação entre Estado e Mercado visavam o bem comum da coletividade, neste cenário todos os agentes econômicos e sociais sabiam exatamente sua importância dentro da construção de um ambiente propício ao investimento produtivo e a uma melhora das condições sociais.

Em pleno século XXI, o país precisa rever questões centrais em sua inserção na economia internacional, sem indústria relevante e com trabalho precário, baseado em aplicativos, com baixos salários e condições degradantes, estamos nos condenando a uma posição de indignidade e de subalternidade aos grandes conglomerados internacionais, estes sim os verdadeiros donos do mundo, controladores dos recursos financeiros, das grandes mídias, dos grandes bancos, dos complexos industriais e das mentes de todos os indivíduos, o futuro que se desenha é preocupante e assustador, com isso, os movimentos sociais e as reivindicações dos trabalhadores, que crescem em todas as regiões do mundo, desde os países mais miseráveis até os desenvolvidos  tendem a aumentar e a se intensificar, pois estes movimentos retratam as angústias das pessoas e os medos mais íntimos e secretos que todos carregamos dentro de nossas intimidades.

Descontentamento e insatisfação social na sociedade global

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Depois da crise financeira que afetou a economia internacional em 2008, a sociedade vem passando por aumento das instabilidades, dos medos e dos descontentamentos, levando população as ruas, movimentos separatistas, conflitos étnicos e divergências políticas crescentes, criando instabilidades e incertezas generalizadas em todos os rincões do globo.

Nestes movimentos encontramos reivindicações generalizadas, desde movimentos reivindicando mais espaço de participação democrática, passando por movimentos defendendo políticas públicas mais específicas para o combate a pobreza e a desigualdade, movimentos reivindicando o impeachment de governantes até movimentos com bandeiras mais conservadoras, em defesa da família e dos bons costumes, o mundo se encontra em um momento de grandes reflexões, todos reivindicam um novo modelo de sociedade, mais oportunidades, mais democracia e uma melhor perspectiva para um futuro próximo, onde a tecnologia e os progressos científicos e tecnológicos sejam empregados para melhorar as condições de todos os indivíduos e não se restrinja a um grupo social ou a um conjunto de afortunados e bem nascidos.

Nestas movimentações que se espalham por todas as regiões do mundo, encontramos de tudo, desde movimentos mais pacíficos e tolerantes até grupos mais agressivos e violentos, que acreditam que apenas com o uso da força vão conseguir demonstrar para a sociedade seus anseios e suas mais íntimas angústias. São movimentos que denotam uma angústia global da sociedade, atingindo desde países ricos e desenvolvidos, como países pobres e também países que se encontram em ascensão econômica, sendo descrito por muitos, como uma economia com potencial elevado de desenvolvimento.

Para que compreendamos estes movimentos precisamos deixar claro, que a ciência econômica se encontra em um momento de grande inquietação, não conseguindo dar as respostas demandadas pela sociedade, sendo vista mais como um instrumento de dominação e de legitimação dos interesses dos donos do capital, que dominam ainda a ciência, a tecnologia, as finanças e os grandes conglomerados, do que como um instrumento político de organização e de combate ao subdesenvolvimento econômico e da escassez, como era de seu interesse em seus mais íntimos primórdios de existência. Neste novo momento, a economia está se negando a visualizar as evidências em curso na sociedade, os movimentos da economia monetária e financeira se sobrepondo a produção e o desenvolvimento se colocando cada vez mais distante da sociedade, onde apenas poucos estão usufruindo das benesses do desenvolvimento econômico.

Nesta discrepância que vivemos de riqueza, de prosperidade e de oportunidade na sociedade global, as pessoas estão cada vez mais desgostosas com a situação que vivem, indivíduos trabalhando em condições degradantes, sendo que muitos indivíduos estão sem nenhum trabalho, o crescimento de uma tecnologia que reduz as oportunidades de emprego para uma parcela considerável da sociedade, o enfraquecimento dos sindicatos, dos partidos e dos movimentos dos trabalhadores, embora muitos acreditem que estes eram muito corporativistas, dificilmente encontramos sindicatos, sejam patronais ou de trabalhadores, que não possuem perfis corporativistas, vivemos num momento de  grandes perdas para as classes trabalhadores e neste momento o lema deve ser, união e resistência, pois o drama pode aumentar de forma exponencial.

Só para que tenhamos uma mínima ideia do descalabro que vivemos na contemporaneidade, 82% de toda a riqueza criada no ano de 2018 ficou concentrada nas mãos de apenas 1% da população mundial, ou seja, apenas 70 milhões de pessoas embolsaram mais de 80% da riqueza global, enquanto as outras 99% ou 6,93 bilhões de pessoas do mundo, dividiram apenas 18% da riqueza gerada pela economia internacional, estes números ajudam a compreender alguns dos motivos das reivindicações dos indivíduos nos mais variados países do mundo.

Nestes movimentos, muitos se tornam guerras e conflitos abertos, como estamos vendo no Chile, um país que poucos imaginavam que seria acometido com reivindicações assim, afinal, desde o governo autoritário de Augusto Pinochet, as condições econômicas estão melhorando de forma acelerada, como defendem os apoiadores do general, que para implementar estas medidas liberais, milhares de pessoas foram mortas ou desapareceram e nunca mais foram encontradas. Na atualidade, percebemos que a situação real dos chilenos não é tão agradável como o discurso oficial quer demonstrar, os ventos do liberalismo econômico implementado pelos Chicago Boys não foram tão auspiciosos, mesmo com inflação sob controle e indicadores macroeconômicos positivos, a população se encontra em situação de desalento e de desesperança, os serviços públicos foram privatizados, as universidades foram todas repassadas a iniciativa privada e todos que possuem condições podem acessar estes serviços, desde que possuam recursos para pagar ou condições para angariar créditos financeiros para usufruir destes benefícios, o que percebemos é que os descontentamentos cresceram, os endividados aumentaram e a insatisfação cresce de forma acelerada, tudo isso culminou na situação degradante que estamos vivenciando.

Encontramos movimentos em países desenvolvidos, a França depois de ser acossada pelo movimento dos coletes amarelos, o país se encontra em um momento de grandes reivindicações contra a proposta de reforma da Previdência defendida pelo presidente Emmanuel Macron. Nestes movimentos, encontramos milhares de cidadãos franceses indo para as ruas e rechaçando a reforma proposta pelo governo, percebemos ainda, que todas estas medidas que estão sendo apresentadas pelo governo francês, estiveram presentes na pauta de inúmeros países, em decorrência do envelhecimento da população e das transformações no emprego e nos modelos de trabalho da contemporaneidade, embora estas justificativas sejam corretas, elas não nos mostra os grandes ganhadores destas reformas, o sistema financeiro e as finanças internacionais, todos os grupos dotados dos grandes recursos globais, que controlam os grandes conglomerados e mantem grande influência sobre os governos, controlando indicações em setores estratégicos, desde os altos cargos da equipe econômica, até os responsáveis pela política monetária, todos oriundos dos grandes bancos nacionais e estrangeiros.

Os conflitos em curso em Hong Kong também estão chamando a atenção da comunidade internacional, são manifestações que confrontam diretamente o governo chinês e reivindicam maior abertura política, maior transparência e uma maior autonomia com relação ao poderio autoritário da China. Embora seja um movimento forte e consistente, destoa dos movimentos citados anteriormente, tanto no Chile quanto na França, pois estão sendo motivados por direitos imateriais, ao contrário dos movimentos dos outros países, que podem ser descritos como um medo maior do rumo que sua respectiva sociedade está tomando, os chilenos estão denunciando ao mundo uma condição de degradação, onde uma parcela menor está usufruindo dos benesses deste capitalismo globalizado, enquanto uma parcela considerável da população vive em condições de degradação e sem perspectivas de melhoras no médio prazo. No caso da França, percebemos um movimento de resistência da população, que anteriormente vivia sob o manto de um Estado de Bem-Estar social que incluía e garantia uma condição econômica e social de destaque, mas agora percebe que todas as conquistas estão sendo deixadas de lado e as perspectivas são sombrias e perturbadoras.

Neste ambiente de inquietação na sociedade internacional, os cidadãos estão percebendo que os políticos não representam os anseios e os desejos da comunidade, que a política está carcomida com corrupção, desmandos e interesses privados e que os interesses da população estão cada vez mais distantes dos interesses dos donos do poder e, principalmente, dos donos do capital. Estes últimos dominam as questões financeiras, controlam os grandes conglomerados econômicos e produtivos e influenciam as escolhas da coletividade, são eles que dominam a ciência e a tecnologia e estão prestes a controlar as grandes empresas estatais, defendendo as privatizações de forma radical e unilateral, mostrando suas vantagens e escondendo seus malefícios, o exemplo chileno pode servir como um instrumento de reflexão, a retirada do Estado de países pobres com população tão dependentes e carentes dos serviços públicos pode ser um erro fatal, cujos constrangimentos não tardam a se materializar.

A sociedade começa a perceber a insustentabilidade deste sistema altamente tóxico, onde de um lado degradamos o meio ambiente, aumentamos as queimadas e ameaçamos terras demarcadas, de outro estimulamos o trabalho precário e degradante, com cargas excessivas e com jornadas que não mais poupam os domingos e feriados, tudo isso para produzir e aumentar os lucros dos grupos que mais ganham. Neste ambiente percebemos uma degradação dos laços sociais e uma forte fragilização das famílias, onde a carga de trabalho é tão excessiva que os filhos não mais se encontram com seus pais, onde os casais não mais tem tempo para ficar juntos, conversar e planejar suas existências, neste ambiente entregamos os rebentos para a escolha educar e transmitir conhecimentos, exigências excessivas para uma escola mal preparada, mas instrumentalizada e com recursos humanos ultrapassados, o resultado desta equação estamos vendo todos os dias na comunidade, professores ausentes das aulas por depressão, escolas violentas e degradadas, polícias agressivas e defasadas e uma comunidade amedrontada e indivíduos imaturos e despreparados para os embates da vida, tudo isso se materializa em ansiedades, depressões generalizadas e, nos extremos do mundo contemporâneo, em um crescimento acelerado e vertiginoso do suicídio, principalmente entre indivíduos entre 15 e 29 anos, que cansaram de sonhar, perderam as esperanças e encontram nas drogas a fuga de um mundo que não lhes garante oportunidades.

O mundo contemporâneo ressente de valores mais concretos, nos últimos anos estamos percebendo que os valores da sociedade estão dominados pelo poder do dinheiro e do capital, estes pensam a sociedade através da busca constante pelos rendimentos, pelos ganhos materiais e pelos prazeres do imediatismo, com isso, percebemos que o novo Deus da sociedade capitalista é o Dinheiro, por ele, pessoas rendem as maiores homenagens, concedendo-lhes os prêmios mais robustos e transformando-o em um grande mantra, nos valores do mundo contemporâneo, os valores baseados na ética e na moral coletiva são substituídos por valores dos indivíduos, vivemos e cultivamos o individualismo e depois reclamamos da competição excessiva e da solidão, vivemos em uma sociedade líquida, como nos mostrou o grande sociólogo polonês Zygmunt Baumman, com Amores Líquidos e Medos Líquidos, retratando a alma e as dores dos indivíduos na contemporaneidade. Estamos regredindo a passos largos, estamos perdendo como civilização e como seres humanos, deixando valores passageiros dominarem o comportamento social e nossa coesão como indivíduos, nossos sentimentos e emoções. Estamos nos deixando levar pelo imediatismo do consumo e os gozos dos prazeres insaciáveis do sexo e do dinheiro, para que tenhamos uma visão menos pessimista e introduzir um pouco de esperança em um mundo tão marcado pela desesperança, recorramos a história, esta nos mostra que, depois da tormenta, da tempestade e da degradação, o ser humano sempre busca a bonança, acreditemos nisso, sempre!

Graeber narra o declínio da Ciência Econômica

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David Graeber – Outras Palavras

Ela mantém-se aferrada aos dogmas – enquanto os problemas centrais ligados à produção e distribuição de riquezas mudaram. Contudo, tornou-se mais influente, ao se converter em ideologia do 1%. Que fazer: salvá-la ou destruí-la?

Há um sentimento crescente, entre aqueles que têm a responsabilidade de administrar grandes economias: o de que a disciplina de Economia não é mais adequada ao seu objetivo. Ela está começando a parecer uma ciência desenvolvida para resolver problemas que não existem mais.

Um bom exemplo é a obsessão pela inflação. Os economistas ainda ensinam aos alunos que o principal papel econômico do governo – muitos insistiriam que seu único papel econômico realmente adequado – é garantir a estabilidade de preços. Devemos estar constantemente vigilantes sobre os perigos da inflação. Para os governos, simplesmente imprimir dinheiro é, portanto, inerentemente pecaminoso. Se, no entanto, a inflação se mantiver muito baixa, por meio da ação coordenada do governo e dos banqueiros centrais, o mercado encontrará sua “taxa natural de desemprego” e os investidores, aproveitando os sinais claros de preços, serão capazes de garantir um crescimento saudável. Essas premissas vieram com o monetarismo da década de 1980, a idéia de que o governo deveria se restringir à administração do suprimento de dinheiro. Na década de 1990, passaram a ser aceitas como um senso comum tão elementar que praticamente todo debate político teve que partir de um reconhecimento ritual dos perigos dos gastos do governo. Continua a ser assim, apesar do fato de que, desde a recessão de 2008, os bancos centrais imprimiram dinheiro freneticamente na tentativa de criar inflação e obrigar os ricos a fazer algo útil com seu dinheiro, tendo fracassado retumbantemente em ambos os empreendimentos.

Agora vivemos em um universo econômico diferente do que vivíamos antes do crash. A queda do desemprego não eleva mais os salários. Imprimir dinheiro não causa inflação. No entanto, a linguagem do debate público e a suposta sabedoria transmitida nos livros econômicos permanecem quase inteiramente inalteradas.

Espera-se uma certa defasagem institucional. Hoje em dia, os economistas convencionais (orig.: mainstream) podem não ser particularmente bons em prever colisões financeiras, facilitar a prosperidade geral ou criar modelos para prevenir as mudanças climáticas. Mas quando se trata de se estabelecer em posições de autoridade intelectual, não afetadas por essas falhas, seu sucesso é incomparável. Alguém teria que olhar para a história das religiões para encontrar algo parecido. Até hoje, a economia continua a ser ensinada não como uma história de argumentos – não, como qualquer outra ciência social, como uma série de perspectivas teóricas muitas vezes conflitantes – mas como algo mais parecido com a física, a realização gradual de verdades matemáticas universais e intransponíveis. É claro que existem teorias “heterodoxas” da economia (institucionalista, marxista, feminista, “austríaca”, pós-keynesiana …), mas seus expoentes foram quase completamente excluídos do que são considerados departamentos “sérios”. Até mesmo rebeliões diretas de estudantes de economia (do movimento pós-autista na França até a economia do pós-colapso na Grã-Bretanha) foram incapazes de incluí-los no currículo básico.

Como resultado, os economistas heterodoxos continuam sendo tratados como quase malucos, apesar de frequentemente terem um histórico muito melhor de previsão de eventos econômicos do mundo real. Além disso, as suposições psicológicas básicas nas quais a economia convencional (neoclássica) baseia-se – apesar de há muito serem refutadas por psicólogos reais – colonizaram o restante da academia e tiveram um impacto profundo nas compreensões populares sobre o mundo.

Em nenhum lugar essa separação entre o debate público e a realidade econômica é mais dramática do que na Grã-Bretanha, e talvez por isso pareça ser o primeiro país em que algo está começando a quebrar. Na virada do século, foi o “novo” Partido Trabalhista, de centro-esquerda, que presidiu a bolha pré-colapso. A expulsão dos bastardos por parte dos eleitores trouxe uma série de governos conservadores, os quais logo descobriram que uma retórica de “austeridade” – a evocação churchilliana de sacrifício comum – caiu bem no público britânico. Garantiu ampla aceitação popular para políticas que reduziram o pouco que restava do estado social britânico e concentraram os recursos no andar de cima, junto aos ricos. “Não existe uma árvore mágica do dinheiro”, disse Theresa May durante a eleição de 2017 – praticamente a única linha memorável de uma das campanhas mais sem brilho da história britânica. A frase é repetida incessantemente na mídia, sempre que alguém pergunta por que o Reino Unido é o único país da Europa Ocidental que adota cobrança para a universidade ou se é realmente necessário ter tantas pessoas dormindo nas ruas.

O mais extraordinário da frase de May é que ela é falsa. Há muitas árvores mágicas de dinheiro na Grã-Bretanha, assim como em qualquer economia desenvolvida. Elas são chamados de “bancos”. Como o dinheiro moderno é simplesmente crédito, os bancos podem criar dinheiro literalmente do nada, simplesmente fazendo empréstimos. Quase todo o dinheiro que circula na Grã-Bretanha no momento é criado por bancos dessa maneira. O público não apenas não está ciente disso, mas uma pesquisa recente do grupo de pesquisa britânico Positive Money descobriu que 85% dos membros do Parlamento não tinham idéia de onde realmente vinha o dinheiro (a maioria parecia ter a impressão de que era produzido pela Casa da Moeda Real).

Os economistas, por razões óbvias, não podem ignorar completamente o papel dos bancos, mas passaram boa parte do século XX discutindo sobre o que realmente acontece quando alguém solicita um empréstimo. Uma escola insiste em que os bancos transferem os fundos existentes de suas reservas, outra afirma que eles produzem dinheiro novo, mas apenas com base em um efeito multiplicador (para que seu empréstimo de carro ainda possa ser visto como ancorado, em última análise no fundo de pensão de alguma avó aposentada). Somente uma minoria – principalmente economistas heterodoxos, pós-keynesianos e partidários da Teoria Monetária Moderna – defende o que é chamado de “teoria da criação de crédito do setor bancário”. Ou seja, a noção de que os banqueiros simplesmente acenam com uma varinha mágica e fazem o dinheiro aparecer, seguros e confiantes de que, mesmo que entreguem a um cliente um crédito de US$ 1 milhão, ao final das contas o destinatário o devolverá ao banco, para que, no sistema como um todo, os créditos e dívidas sejam cancelados. Em vez de os empréstimos serem baseados em depósitos, nessa visão, os próprios depósitos são o resultado de empréstimos

A única coisa que parecia nunca ocorrer a alguém era conseguir um emprego em um banco e descobrir o que realmente acontece quando alguém pede dinheiro emprestado. Em 2014, um economista alemão chamado Richard Werner fez exatamente isso e descobriu que, de fato, os agentes de crédito não verificam seus fundos, reservas ou qualquer outra coisa existente. Eles simplesmente criam dinheiro do nada, ou, como ele preferia dizer, da “poeira de fada”

Parece ter sido também naquele ano que elementos do notoriamente independente serviço público britânico decidiram que bastava. A questão da criação de dinheiro tornou-se um ponto crítico de discórdia. A grande maioria dos economistas do Reino Unido rejeitou a “austeridade”, por considerá-la contraproducente (o que, previsivelmente, quase não teve impacto no debate público). Mas, a partir de em certo momento, exigir que os tecnocratas encarregados de administrar o sistema baseiem todas as decisões políticas em suposições falsas sobre algo tão elementar quanto a natureza do dinheiro torna-se um pouco como exigir que os arquitetos continuem entendendo que a raiz quadrada de 47 é na verdade π. Os arquitetos sabem que os edifícios começarão a cair. Pessoas morreriam

Em pouco tempo, o Banco da Inglaterra (um banco central cujos economistas são mais livres para se expressar, uma vez que não fazem parte formalmente do governo) lançou um elaborado relatório oficial chamado “Criação de dinheiro na economia moderna”. Repleto de vídeos e animações, ele afirma o mesmo ponto: os livros didáticos de economia existentes, e particularmente a ortodoxia monetarista dominante, estão errados. Os economistas heterodoxos estão certos. Os bancos privados criam dinheiro. Os bancos centrais, como o Banco da Inglaterra, também criam dinheiro, mas os monetaristas estão completamente errados ao insistir que sua função adequada é controlar o suprimento de dinheiro. De fato, os bancos centrais não controlam de maneira alguma a oferta de moeda; sua principal função é definir a taxa de juros – determinar quanto os bancos privados podem cobrar pelo dinheiro que criam [no Brasil, nem isso – Nota de Outras Palavras]. Quase todo o debate público sobre esses assuntos é, portanto, baseado em premissas falsas. Por exemplo, se o que o Banco da Inglaterra estava dizendo era verdade, então os empréstimos tomados pelo governo não desviavam fundos do setor privado – eles criavam dinheiro inteiramente novo, que não existia antes.

Alguém poderia ter imaginado que tal admissão criaria uma espécie de respingo, e em certos círculos restritos, isso aconteceu. Os bancos centrais da Noruega, Suíça e Alemanha publicaram rapidamente documentos semelhantes. De volta ao Reino Unido, a resposta imediata da mídia foi simplesmente o silêncio. Segundo o meu conhecimento, o relatório do Banco da Inglaterra nunca foi mencionado em nenhum canal de notícias. Os colunistas de jornais continuaram a escrever como se o monetarismo estivesse evidentemente correto. Os políticos continuaram sendo questionados sobre onde encontrariam dinheiro para programas sociais. Era como se uma espécie de entente cordiale tivesse sido estabelecida, na qual os tecnocratas pudessem viver em um universo teórico, enquanto os políticos e os comentaristas de notícias continuariam a existir em outro, completamente diferente.

Ainda assim, há sinais de que esse arranjo é temporário. A Inglaterra – e o Banco da Inglaterra em particular – orgulha-se de ser o principal indicador das tendências econômicas globais. O próprio monetarismo começou sua respeitabilidade intelectual na década de 1970, depois de ter sido adotado por economistas do Banco da Inglaterra. A partir daí, foi finalmente adotado pelo regime insurgente de Thatcher, e somente depois por Ronald Reagan, nos Estados Unidos, e posteriormente exportado para quase todos os lugares.

É possível que um padrão semelhante esteja se reproduzindo hoje. Em 2015, um ano após o aparecimento do relatório do Banco da Inglaterra, o Partido Trabalhista pela primeira vez permitiu eleições abertas para sua liderança. Sua ala esquerda do partido, sob a liderança de Jeremy Corbyn e do agora ministro da Fazenda paralelo, John McDonnell, assumiu o controle. Na época, a esquerda trabalhista era considerada ainda mais extremista marginal do que a ala de Margareth Thatcher no Partido Conservador em 1975. Também é (apesar dos constantes esforços da mídia em retratá-los como socialistas não-reconstruídos da década de 1970) o único grande grupo político no Reino Unido aberto a novas ideias econômicas. Enquanto praticamente todo o establishment político passou dos últimos anos gritando, uns contra os outros, sobre o Brexit, o gabinete de McDonnell – e os grupos de apoio da juventude trabalhista – estão realizando workshops e tomando iniciativas políticas sobre tudo. Propõem desde uma semana de trabalho de quatro dias e renda básica universal a uma Revolução Industrial Verde e ao “Comunismo de Luxo Totalmente Automatizado”. Convidam economistas heterodoxos a participar de iniciativas de educação popular destinadas a transformar as concepções de como a economia realmente funciona. O corbynismo enfrentou oposição quase histérica de praticamente todos os setores do establishment político, mas seria imprudente ignorar a possibilidade de que algo histórico esteja acontecendo.

Um sinal de que algo historicamente novo realmente surgiu será se os estudiosos começarem a ler o passado sob uma nova luz. Consequentemente, um dos livros mais importantes a sair do Reino Unido nos últimos anos teria que ser Money and Government: The Past and Future of Economics, de Robert Skidelsky. Aparentemente é uma tentativa de responder à pergunta de por que a economia dominante tornou-se tão inútil nos anos imediatamente anteriores e posteriores à crise de 2008. Na verdade, trata-se de uma tentativa de recontar a história da disciplina econômica através da consideração das duas coisas – dinheiro e governo – sobre as quais a maioria dos economistas menos gosta de falar.

Skidelsky está bem posicionado para contar esta história. Ele personifica um tipo exclusivamente inglês: o gentil dissidente. Está tão firmemente instalado no establishment que nunca lhe ocorre que talvez não seja capaz de dizer o que exatamente ele próprio pensa. Suas opiniões são toleradas pelo resto do establishment precisamente por isso. Nascido na Mandchúria, treinado em Oxford, professor de Economia Política em Warwick, Skidelsky é mais conhecido como autor da biografia definitiva em três volumes de John Maynard Keynes. Nas últimas três décadas, esteve na Câmara dos Lordes como Barão de Tilton, afiliado em momentos diferentes a vários partidos políticos e, às vezes, a nenhum deles. Durante os primeiros anos do primeiro ministro Tony Blair, foi um conservador e até serviu como porta-voz da oposição em questões econômicas na câmara alta. Atualmente, é independente, alinhado com a esquerda do Partido Trabalhista. Em outras palavras, ele segue sua própria bandeira. Geralmente, é uma bandeira interessante. Nos últimos anos, Skidelsky aproveitou sua posição no corpo legislativo de elite do mundo para realizar uma série de seminários de alto nível sobre a reforma da disciplina econômica; este livro é, em certo sentido, o primeiro produto importante desses empreendimentos.

O que isso revela é uma guerra sem fim entre duas amplas perspectivas teóricas nas quais o mesmo lado sempre parece vencer – por razões que raramente têm algo a ver com sofisticação teórica ou maior poder preditivo. O cerne da discussão sempre parece recair sobre a natureza do dinheiro. O dinheiro é melhor concebido como uma mercadoria física, uma substância preciosa usada para facilitar as trocas, ou é melhor vê-lo principalmente como crédito, como método de contabilidade ou circulação – de qualquer forma, um arranjo social? Esta é uma disputa que vem ocorrendo de alguma forma há milhares de anos. O que chamamos de “dinheiro” é sempre uma mistura de ambos, e, como eu próprio observei em Debit (2011), o centro de gravidade entre os dois tende a mudar de um lado para o outro ao longo do tempo. Na Idade Média, as transações cotidianas na Eurásia eram tipicamente realizadas por meio de crédito, e supunha-se que o dinheiro era uma abstração. Foi a ascensão dos impérios europeus globais nos séculos XVI e XVII, e a correspondente inundação de ouro e prata saqueados das Américas, que realmente mudou as percepções. Historicamente, o sentimento de que ouro é dinheiro tende a marcar períodos de violência generalizada, escravidão em massa e exércitos predadores – para a maior parte do mundo era precisamente a experiência dos impérios espanhol, português, holandês, francês e britânico. Uma inovação teórica importante que essas novas teorias de dinheiro baseadas em barras de ouro permitiram foi, como observa Skidelsky, o que passou a ser chamado de Teoria Quantitativa da Moeda (geralmente referida nos livros didáticos – já que os economistas se deleitam infinitamente nas abreviações – como QTM).

O argumento da QTM foi apresentado pela primeira vez por um advogado francês chamado Jean Bodin, durante um debate sobre a causa da forte e desestabilizadora inflação de preços que se seguiu imediatamente à conquista ibérica das Américas. Bodin argumentou que a inflação era uma simples questão de oferta e demanda: o enorme influxo de ouro e prata das colônias espanholas estava barateando o valor do dinheiro na Europa. O princípio básico, sem dúvida, teria parecido uma questão de senso comum para qualquer pessoa com experiência em comércio na época, mas na verdade baseia-se em uma série de suposições falsas. Por um lado, a maior parte do ouro e da prata extraídos do México e do Peru não acabaram na Europa e certamente não foram cunhados como moeda. A maior parte foi transportada diretamente para a China e a Índia (para comprar especiarias, sedas, chitas e outros “luxos orientais”). Seus eventuais efeitos inflacionários locais foram baseada em vínculos especulativos de um tipo ou de outro. Quase sempre é assim, quando aplica-se a QTM: a lógica parece evidente, mas apenas se você deixar de fora a maioria dos fatores decisivos.

No caso da inflação de preços do século XVI, por exemplo, a partir do momento em que se considera crédito, acumulação e especulação — sem mencionar o aumento das taxas de atividade econômica, investimento em novas tecnologias e níveis salariais (que, por sua vez, têm muito a ver com o poder relativo de trabalhadores e empregadores, credores e devedores) – torna-se impossível dizer com certeza qual é o fator decisivo. É a oferta monetária que impulsiona os preços ou os preços que impulsionam a oferta monetária? Tecnicamente, isso se resume a uma escolha entre o que é chamado de teorias exógenas e endógenas do dinheiro. O dinheiro deveria ser tratado como um fator externo, como todos os dobrões espanhóis supostamente varrendo Antuérpia, Dublin e Gênova nos dias de Felipe II? Ou deveria ser imaginado, antes de tudo, como um produto da própria atividade econômica, extraído, cunhado e colocado em circulação – ou, mais frequentemente, criado como instrumentos de crédito, como empréstimos, a fim de atender a uma demanda – o que, é claro, significaria que as raízes da inflação estão em outro lugar?

Para ser franco: A QTM está obviamente errada. Dobrar a quantidade de ouro em um país não afetará o preço do queijo, se você der todo o ouro às pessoas ricas e elas o enterrarem em seus quintais, ou preferir usá-lo para fazer submarinos folheados a ouro [é por isso, aliás, que o quantitative easing (flexibilização quantitativa), a estratégia de comprar títulos públicos de longo prazo para colocar dinheiro em circulação, também não funcionou]. O que realmente importa é o gasto.

No entanto, desde a época de Jean Bodin até o presente, quase toda vez que houve um grande debate sobre políticas, os defensores da QTM venceram. Na Inglaterra, o padrão foi estabelecido em 1696, logo após a criação do Banco da Inglaterra, com uma discussão sobre inflação em tempo de guerra, entre o secretário do Tesouro William Lowndes, Sir Isaac Newton (então diretor da casa da moeda) e o filósofo John Locke. Newton concordara com o Tesouro, em que as moedas de prata tinham que ser desvalorizadas oficialmente para evitar um colapso deflacionário; Locke assumiu uma posição monetarista extrema, argumentando que o governo deveria se limitar a garantir o valor da propriedade (incluindo moedas) e que alterar seu valor confundiria os investidores e fraudaria os credores. Locke venceu. O resultado foi um colapso deflacionário. Um forte aperto no suprimento de dinheiro criou uma contração econômica abrupta, que tirou centenas de milhares de pessoas do trabalho e criou penúria em massa, tumultos e fome. O governo rapidamente moderou sua política (primeiro, permitindo que os bancos monetizassem as dívidas de guerra na forma de notas bancárias e, eventualmente, removendo completamente o padrão prata). Porém, na retórica oficial, a ideologia de Locke – favorável um governo reduzido, pró-credor e ortodoxa em relação ao papel da moeda – tornou-se o fundamento de todo o debate político.

Segundo Skidelsky, o padrão iria se repetir continuamente: em 1797, nas décadas de 1840, 1890 e, na transição entre as décadas de 1970-80, com a adoção do monetarismo por Thatcher e Reagan. Sempre ocorre a mesma sequência de eventos:
(1) O governo adota políticas monetárias ortodoxas (moeda exógena) como uma questão de princípio.

(2)Um desastre se segue.

(3) O governo abandona discretamente as políticas ortodoxas.

(4) A economia se recupera.

(5) A filosofia monetária ortodoxa, no entanto, torna-se senso comum universal ou, se já o era, consegue se fortalecer ainda mais.

Como foi possível justificar uma série tão notável de fracassos? Boa parte da culpa, segundo Skidelsky, pode ser atribuída ao filósofo escocês David Hume. Um dos primeiros defensores da QTM, Hume também foi o primeiro a introduzir a noção de que choques de curto prazo – como os produzidos por Locke – criariam benefícios a longo prazo se tivessem o efeito de liberar os poderes de autorregulação do mercado:

Desde Hume, os economistas distinguem entre os efeitos de curto e de longo prazo da mudança econômica, incluindo os efeitos de intervenções políticas. A distinção serviu para proteger a teoria do equilíbrio, permitindo que ela fosse enunciada de uma forma que levasse em conta a realidade. Em Economia, o curto prazo agora normalmente representa o período durante o qual um mercado (ou uma economia de mercado) se desvia temporariamente de sua posição de equilíbrio de longo prazo sob o impacto de algum “choque”, como um pêndulo temporariamente desalojado de uma posição de descanso. Esse modo de pensar sugere que os governos devem deixar que os mercados descubram suas posições de equilíbrio natural. As intervenções do governo para “corrigir” os desvios adicionarão apenas camadas extras de ilusão à original.

Existe uma falha lógica em qualquer teoria desse tipo: não há maneira possível de refutá-la. A premissa de que os mercados sempre se endireitam no final só pode ser testada se alguém tiver uma definição comum de quando será o “fim”. Mas para os economistas, essa definição acaba sendo “o tempo que leva para chegar a um ponto em que posso dizer que a economia voltou ao equilíbrio”. (Da mesma forma, é impossível demonstrar o erro de afirmações como “os bárbaros sempre vencem no final” ou “a verdade sempre prevalece”, pois na prática elas apenas querem dizer“ sempre que os bárbaros vencerem, ou que a verdade prevalecer, declararei a história terminada”).

Nesse ponto, todas as peças estavam no lugar: políticas de aperto monetário (que beneficiavam credores e ricos) podiam ser justificadas como “remédio severo” para apagar os sinais de preço, de modo que o mercado pudesse retornar a um estado saudável de equilíbrio de longo prazo. Ao descrever como tudo isso aconteceu, Skidelsky está nos fornecendo uma extensão digna de uma história que Karl Polanyi começou a traçar nos anos 1940: a história de como os mercados nacionais supostamente auto-regulados eram o produto de cuidadosa engenharia social. Parte disso envolvia a criação de políticas governamentais conscientemente projetadas para inspirar ressentimentos contra o “big government” (“Estado inchado”). Skidelsky escreve:

Uma inovação crucial foi o imposto de renda, cobrado pela primeira vez em 1814 e renovado pelo [primeiro-ministro Robert] Peel em 1842. Entre 1911 e 14, ele se tornou a principal fonte de receita do governo. O imposto de renda teve o duplo benefício de fornecer ao Estado britânico uma base de receita segura e alinhar os interesses dos eleitores ao governo barato, uma vez que apenas os contribuintes tiveram o direito ao voto…. “Probidade fiscal”, sob Gladstone, “tornou-se a nova moralidade”.

De fato, não há absolutamente nenhuma razão para um Estado moderno se financiar pela apropriação de uma proporção dos ganhos de cada cidadão. Existem muitas outras maneiras de fazer isso. Muitas – como impostos sobre terras, riquezas, comércio ou sobre o consumidor (qualquer um dos quais pode ser tornado mais ou menos progressivo) – são consideravelmente mais eficientes, além do que a criação de um aparato burocrático capaz de monitorar os assuntos pessoais dos cidadãos no grau exigido pelo sistema de imposto de renda e, em si, enormemente caro. Mas isso não leva ao ponto real: o imposto de renda deve ser intrusivo e irritante. Precisa produzir pelo menos certa sensação de injustiça. Como grande parte do liberalismo clássico (e do neoliberalismo contemporâneo), é um truque político engenhoso — uma expansão do Estado burocrático que também permite que seus líderes finjam advogar por um Estado mínimo.

A única exceção importante a esse padrão foram os meados do século XX, que passaram a ser lembrados como a era keynesiana. Foi um período em que as democracias capitalistas, apavoradas com a Revolução Russa e a perspectiva de rebelião em massa de suas próprias classes trabalhadoras, permitiram níveis sem precedentes de redistribuição – o que, por sua vez, levou à prosperidade material mais generalizada da história da humanidade. A história da revolução keynesiana da década de 1930 e a contra-revolução neoclássica da década de 1970 já foi contada inúmeras vezes, mas Skidelsky dá ao leitor uma nova sensação do conflito subjacente.

O próprio Keynes era um anticomunista convicto, mas em grande parte porque achava que o capitalismo era mais propenso a impulsionar o rápido avanço tecnológico, de modo a eliminar amplamente a necessidade de trabalho material. Ele desejava o pleno emprego não porque achava que o trabalho era bom, mas porque, em última análise, desejava acabar com o trabalho, imaginando uma sociedade em que a tecnologia tornaria obsoleto o trabalho humano. Em outras palavras, ele assumiu que o terreno estava sempre movendo-se sob os pés dos analistas; o objeto de qualquer ciência social era inerentemente instável. Max Weber, por razões semelhantes, argumentou que nunca seria possível aos cientistas sociais inventar algo remotamente parecido com as leis da física, porque no momento em que chegassem perto de reunir informações suficientes, a própria sociedade e aquilo que os analistas sentiam ser importante saber sobre ela, teria mudado tanto que as informações se tornariam irrelevantes. Os oponentes de Keynes, por outro lado, estavam determinados a enraizar seus argumentos em algo que consideravam como princípios universais.

É difícil para não especialistas ver o que realmente está em jogo aqui, porque o argumento passou a ser recontado como uma disputa técnica entre os papéis da micro e macroeconomia. Os keynesianos insistiram que o primeiro é apropriado para estudar o comportamento de famílias ou empresas individuais, que tentam ampliar sua vantagem no mercado; mas que, assim que se começa a olhar para as economias nacionais, está se mudando para um nível de complexidade totalmente diferente, onde diferentes tipos de leis se aplicam. Assim como é impossível entender os hábitos de acasalamento de um porco-espinho analisando todas as reações químicas em suas células, os padrões de comércio, investimento ou flutuações nas taxas de juros ou emprego não eram apenas o agregado de todas as microtransações que pareciam produzi-los. Os padrões tinham, como diriam os filósofos da ciência, “propriedades emergentes”. Obviamente, era necessário entender o nível micro (assim como era necessário entender a química que compunha o porco-espinho) para ter alguma chance de entender o nível macro. Mas isso não era, por si só, suficiente.

Os contra-revolucionários – começando com o antigo rival de Keynes, Friedrich Hayek e os vários luminares que se juntaram a ele na Sociedade Mont Pelerin – apostaram diretamente nessa noção de que as economias nacionais não são nada mais que a soma de suas partes. Politicamente, observa Skidelsky, isso se deveu a uma hostilidade à própria ideia de Estado (e, em um sentido mais amplo, a qualquer bem coletivo). As economias nacionais poderiam de fato ser reduzidas ao efeito agregado de milhões de decisões individuais e, portanto, todos os elementos da macroeconomia precisavam ser sistematicamente “micro-fundados”.

Uma razão pela qual essa posição era tão radical é a de que ela foi tomada exatamente no mesmo momento em que a própria microeconomia estava completando uma profunda transformação – que havia começado com a revolução marginalista do final do século XIX. Passava de uma técnica, para entender como aqueles que operavam o mercado tomam decisões, a uma filosofia geral da vida humana. Foi capaz de fazê-lo, de modo notável, propondo uma série de suposições que até os próprios economistas estavam felizes em admitir que não eram realmente verdadeiras. “Vamos supor”, diziam eles, “sujeitos puramente racionais, motivados exclusivamente pelo interesse próprio, que sabem exatamente o que querem, nunca mudam de ideia e têm acesso completo a todas as informações relevantes sobre preços”. Isso lhes permitiu fazer equações precisas sobre exatamente como se deveria esperar que os indivíduos agissem…

Certamente não há nada de errado em criar modelos simplificados. Pode-se argumentar que é assim que qualquer ciência dos assuntos humanos deve proceder. Mas uma ciência empírica passa a comparar esses modelos com o que as pessoas realmente fazem, para então ajustar seus modelos. Isso é precisamente o que os economistas não fizeram. Em vez disso, descobriram que, se alguém envolvesse esses modelos em fórmulas matemáticas completamente impenetráveis para os não iniciados, seria possível criar um universo no qual essas premissas nunca pudessem ser refutadas. (“Todos os atores estão envolvidos na maximização da utilidade. O que é utilidade? O que quer que seja que um ator pareça estar maximizando”). As equações matemáticas permitiram aos economistas afirmar de forma plausível que a disciplina deles era o único ramo da teoria social que avançara para algo como uma ciência preditiva (mesmo que a maioria de suas previsões bem-sucedidas fosse do comportamento de pessoas que haviam sido treinadas em teoria econômica).

Isso permitiu que o Homo economicus invadisse o restante da academia, de modo que, nas décadas de 1950 e 1960, quase todas as disciplinas acadêmicas no negócio de preparar jovens para posições de poder (ciência política, relações internacionais, etc.) haviam adotado alguma variante de “teoria da escolha racional” – em última análise, extraída da microeconomia. Nas décadas de 1980 e 1990, havia-se chegado a um ponto em que nem mesmo os chefes de fundações de arte ou organizações de caridade seriam considerados totalmente qualificados se não estivessem ao menos amplamente familiarizados com uma “ciência” dos assuntos humanos que partia da suposição de que os humanos eram fundamentalmente egoístas e gananciosos.

Essas eram, então, as “microfundações” às quais os reformadores neoclássicos exigiam que a macroeconomia retornasse. Aqui eles foram capazes de tirar proveito de certas fraquezas inegáveis nas formulações keynesianas. Acima de tudo sua incapacidade de explicar a estagflação da década de 1970, de afastar a superestrutura keynesiana restante, para retornar à mesma política de dinheiro duro e Estado enxuto que havia sido dominante no mundo do século XIX. O padrão tradicional se seguiu. O monetarismo não funcionou; no Reino Unido e depois nos EUA, essas políticas foram rapidamente abandonadas. Mas ideologicamente, a intervenção foi tão eficaz que, mesmo quando “novos keynesianos” como Joseph Stiglitz ou Paul Krugman voltaram a dominar o debate sobre macroeconomia, eles ainda se sentiam obrigados a manter as novas microfundações.

O problema, como Skidelsky enfatiza, é que, se suas suposições iniciais forem absurdas, multiplicá-las por mil vezes dificilmente as tornará menos absurdas. Ou, como diz, de maneira menos gentil, “premissas lunáticas levam a conclusões malucas”:

A hipótese do mercado eficiente (EMH), popularizada por Eugene Fama … é a aplicação das expectativas racionais aos mercados financeiros. A hipótese das expectativas racionais (REH) diz que os agentes utilizam de maneira ideal todas as informações disponíveis sobre a economia e a política instantaneamente para ajustar suas expectativas….

Assim, nas palavras de Fama, … “Em um mercado eficiente, a concorrência entre os muitos participantes inteligentes leva a uma situação em que … o preço real de um título será uma boa estimativa de seu valor intrínseco”. [Grifo de Skidelsky]

Em outras palavras, éramos obrigados a fingir que os mercados não poderiam, por definição, estar errados. Se, na década de 1980, o terreno em que o complexo Imperial em Tóquio foi construído, por exemplo, era mais valorizado do que a de todos os terrenos de Nova York, então isso teria que ser porque era o que realmente ele valia. Se houver desvios, eles são puramente aleatórios, “estocásticos” e, portanto, imprevisíveis, temporários e, em última análise, insignificantes. De qualquer forma, atores racionais irão rapidamente intervir para varrer quaisquer ações subvalorizadas. Skidelsky observa secamente:

Há um paradoxo aqui. Por um lado, a teoria diz que não há sentido em tentar lucrar com a especulação, porque as ações sempre são precificadas corretamente e seus movimentos não podem ser previstos. Mas, por outro lado, se os investidores não tentassem lucrar, o mercado não seria eficiente porque não haveria mecanismo de autocorreção.

Em segundo lugar, se as ações sempre tiverem preços corretos, bolhas e crises não poderão ser geradas pelo mercado….

Essa atitude entrou na política: “funcionários do governo, começando com Alan Greenspan, presidente do Federal Reserve, não estavam dispostos a estourar a bolha precisamente porque não estavam dispostos a sequer julgar que se tratava de uma bolha”. Isso impossibilitou a identificação de bolhas porque descartou-as a priori.

Se houver uma resposta para a famosa pergunta da rainha da Inglaterra, sobre por que ninguém previu a grande crise, será essa.

Neste ponto, chegamos ao círculo completo. Após um embaraço tão catastrófico, os economistas ortodoxos recorreram ao seu forte apelo – política acadêmica e poder institucional. No Reino Unido, um dos primeiros movimentos da nova coalizão entre Conservadores e Liberal-democratas, em 2010, foi reformar o sistema de ensino superior triplicando as mensalidades e instituindo um regime de empréstimos estudantis ao estilo norte-americano. O senso comum poderia sugerir que, se o sistema educacional estivesse funcionando com êxito (apesar de todos os seus pontos fracos, o sistema universitário britânico era considerado um dos melhores do mundo), enquanto o sistema financeiro estava operando tão mal que quase destruía a economia global, o mais sensato seria reformar o sistema financeiro para parecer um pouco mais com o sistema educacional, e não o contrário. Um esforço agressivo para fazer o oposto poderia ser apenas um movimento ideológico. Foi um ataque total à própria ideia de que o conhecimento poderia ser outra coisa senão um bem econômico.

Movimentos semelhantes foram feitos para solidificar o controle sobre a estrutura institucional. A BBC, outrora orgulhosamente independente, sob os Conservadores, passou a assemelhar-se cada vez mais a uma rede de radiodifusão estatal. Seus comentaristas políticos recitavam quase literalmente os últimos pontos de discussão do partido no poder – que, pelo menos economicamente, tinham como premissa as próprias teorias que acabavam de ser desacreditadas. O debate político simplesmente supunha que o “remédio” usual e a “probidade fiscal” gladstoniana eram a única solução. Ao mesmo tempo, o Banco da Inglaterra começou a imprimir dinheiro como louco, efetivamente entregando-o ao 1%, em uma tentativa malsucedida de desbaratar a inflação. Os resultados práticos foram, para dizer o mínimo, pouco inspiradores. Mesmo no auge da “recuperação”, no quinto país mais rico do mundo, algo como um cidadão britânico em cada doze experimentou fome, inclusive passando dias inteiros sem comida. Se uma “economia” deve ser definida como o meio pelo qual uma população humana se provê de suas necessidades materiais, a economia britânica é cada vez mais disfuncional. Esforços frenéticos por parte da classe política britânica para mudar de assunto (Brexit) dificilmente poderão durar para sempre. Em algum momento, os problemas reais terão que ser abordados.

A teoria econômica, tal como existe, assemelha-se cada vez mais a um galpão cheio de ferramentas quebradas. Isso não quer dizer que não haja informações úteis, mas fundamentalmente a disciplina existente é projetada para resolver os problemas de outro século. O problema de como determinar a distribuição ideal do trabalho e dos recursos, para criar altos níveis de crescimento econômico, simplesmente não é o mesmo problema que estamos enfrentando agora: isto é, como lidar com o aumento da produtividade tecnológica, a redução da demanda real de trabalho e o manejo eficaz dos trabalhos relacionando ao cuidado, sem também destruir a Terra. Isso exige uma ciência diferente. As “microfundações” da economia atual são precisamente o que está impedindo isso. Qualquer ciência nova e viável terá que recorrer ao conhecimento acumulado do feminismo, economia comportamental, psicologia e até antropologia para apresentar teorias baseadas em como as pessoas realmente se comportam, ou mais uma vez abraçar a noção de níveis emergentes de complexidade – ou, provavelmente, ambos.

Intelectualmente, isso não será fácil. Politicamente, será ainda mais difícil. Romper com o bloqueio da economia neoclássica nas principais instituições e seu domínio quase-teológico sobre a mídia – para não mencionar todas as maneiras sutis para definir nossas concepções de motivações humanas e os horizontes das possibilidades humanas – é uma perspectiva assustadora. Presumivelmente, algum tipo de choque seria necessário. O que é preciso? Outro colapso no estilo de 2008? Alguma mudança política radical em um grande governo, de repercussão mundial? Uma rebelião global da juventude? Seja como for, livros como este – e possivelmente este livro de Skidelsky – terão um papel crucial.

 Moral, ética e os valores da sociedade contemporânea

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            O poder cada vez maior do dinheiro, do capital e dos recursos monetários estão gerando grandes transformações no indivíduo, mudando hábitos, costumes e comportamentos, causando constrangimentos, medos e desesperanças, mas ao mesmo tempo, criando um grande laboratório para que se compreenda os seres humanos, seus valores e sua natureza.

Um dos grandes males da expansão do capitalismo na sociedade mundial é que, neste sistema, tudo pode ser comercializado, tudo se compra, tudo se vende, o local deste comércio é conhecido como mercado, que passa a ter um poder incomensurável, se parecendo mais como uma religião, como um grande Deus ou uma divindade, do que como um espaço de trocas e de satisfações pessoais, o mercado ganha um status sobrenatural e todos os indivíduos devem se adaptar a esta nova realidade, sob pena de ser condenado ao esquecimento eterno, ao purgatório do desemprego, a exclusão social e a desesperança com relação ao futuro.

Neste mundo baseado e estruturado na matéria, a Doutrina Espírita surge como um grande oásis de reflexão sobre a vida, a partir da Terceira Revelação os indivíduos passaram a perceber que o mundo não se restringe apenas a vivência material, somos espíritos imortais, nascemos e vivemos em vários corpos e em inúmeras oportunidades, nascemos várias vezes, fomos homens ou mulheres, ricos ou pobres, dotados de conhecimentos ou não, somos um misto de muitos indivíduos dentro de um mesmo espírito, vivemos várias vidas e trazemos todas elas dentro de nosso íntimo, com isso, começamos a compreender muitos dos desequilíbrios e desajustes que cultivamos intimamente e que não conseguiremos compreender em apenas uma única existência, por isso estamos em constantes momentos de vida, uns no mundo material e outras no mundo imaterial.

No mundo contemporâneo estamos sendo testados todos os momentos, o poder do dinheiro, do capital e do luxo é imenso, todos somos atraídos pelos seus encantos, pelo seu glamour e pela sua ostentação, tudo isso nos gera prazer e nos coloca em evidência e revive nossos mais mesquinhos desejos e vontades. Vivemos numa sociedade onde as pessoas são avaliadas pelo que possuem, pelos seus recursos monetários, pelas suas propriedades e pelos seus títulos, muitos conceituam-na como meritocracia, mas na verdade é uma sociedade centrada na exclusão e na exploração, o que muitos não querem enxergar, é que quem hoje explora amanhã pode ser o explorado.

A Doutrina Espírita nos mostra, claramente, que somos frutos de uma constante evolução, estamos sempre progredindo, uns acumulam mais conhecimento, outros se elevam moralmente, outros evoluem em seus desprendimentos, mas estamos evoluindo, esta é a lei criada por Deus. A evolução é estimulada pelas leis naturais, em alguns momentos acreditamos que tudo está perdido, que estamos regredindo e andando para trás, tudo não passa de uma visão limitada e enganosa, se não estamos evoluindo por nós mesmos, os amigos espirituais estimulam a evolução, inspirando ações, enviando espíritos mais evoluídos para nos direcionar e nos mostrando caminhos mais consistentes e solidificados, com isso, somos impelidos ao crescimento, mesmo sabendo que muitos se comprazem com a situação atual, para estes as dores, as doenças e os vazios existenciais, as dúvidas constantes e os medos servem como uma verdadeira alavanca que nos impulsiona para a reflexão, para a busca e para as novas descobertas que passam a dar mais sentido à vida e consistência para nossas ações e comportamentos.

Estas dores, embora causem fortes constrangimentos aos indivíduos, nos forçam para uma busca mais consciente da existência humana, muitas pessoas buscam as casas espíritas e os conhecimentos oriundos da Doutrina dos Espíritos para compreenderem questões íntimas e pessoais, tristezas, mágoas e ressentimentos acumulados. Quantos irmãos se veem em dores morais e em vazios existenciais e buscam compreender o porquê estão solitários, qual a raiz de sua solidão e qual o sentido de suas existências no mundo material. A maioria dos indivíduos vive por viver, acorda sem refletir, se alimenta por se alimentar, trabalha por trabalhar e não se questiona o significado de todas estas atividades cotidianas, estes indivíduos tendem, ao desencarnar, não compreenderem sua situação no mundo imaterial, vivendo na ignorância, no desconhecimento e na escuridão, são indivíduos que sempre viveram atrelados a matéria, aos valores do dinheiro e não se preocuparam com a grandeza da existência humana.

Na atual existência física precisamos estar conscientes de que somos seres deveras imperfeitos, todos cometemos equívocos variados, nossa trajetória de vidas passadas se mostra muito espinhosas, cometemos erros terríveis, agredimos, ultrajamos, vilipendiamos, caluniamos, muitos cometeram inúmeros crimes e assassinatos, além de termos, em muitas existências abandonamos pessoas que na atualidade estão ao nosso lado para o reajuste, afinal, não podemos nunca nos esquecer de que somos imperfeitos. Diante de tudo isso, devemos evitar os julgamentos, quando apontamos o dedo para outro indivíduo, quando menosprezamos aqueles que cometeram equívocos, quando nos colocamos como superiores de nossos colegas ou conhecidos, estamos nos esquecendo de nosso passado, de nossos crimes e de nossos desequilíbrios. Embora queiramos esconder este passado nos vãos de nosso subconsciente, ele está mais vivo do que imaginamos e sempre ressurgirá quando nos colocarmos como superiores e julgarmos nossos irmãos em queda, tenhamos misericórdia e oremos por estes irmãos, afinal, todos nós, com certeza, gostaríamos que os outros agissem desta forma conosco em nossas quedas e em nossos inúmeros deslizes.

Na contemporaneidade vivemos um discurso preocupante sobre valores morais e éticos, nos colocamos sempre do lado do bem e degradamos todos aqueles que agem de uma forma equivocada, muitas vezes os agredimos para mostrar nossa superioridade moral, alardeando os valores cristãos, mas no íntimo agimos sempre de acordo com nossos interesses e deixamos de lado os valores mais sólidos e consistentes, lembremos sempre dos ensinamentos de Jesus: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que por fora realmente parecem formosos, mas por dentro estão cheios de ossos e de toda imundície. Assim também vos exteriormente pareceis justos aos homens, mas por dentro estais cheios de hipocrisia e de iniquidade”.

Os julgamentos devem ser evitados a todos os momentos, a Doutrina Espírita nos mostra claramente que somos indivíduos, com muitas existências físicas, nestas vivências cometemos equívocos que, se tomássemos consciência na atualidade, estaríamos internados em hospitais psiquiátricos, nossos erros foram tremendos e estão dentro de nossa intimidade e a qualquer momento podemos acessar estes desequilíbrios e os resultados seriam desastrosos, levando-nos a desajustes emocionais severos. Sabendo destes ricos e pormenores da vida de cada um, o espiritismo nos mostra que, ao renascer no corpo material, passamos a esquecer momentaneamente este passado sombrio, ficam encastelados em nossos subconscientes para que, aos poucos, possamos compreender, digerir e expiar de forma consciente para que alcancemos o progresso espiritual e o tão almejado desenvolvimento espiritual.

Muitos irmãos nascem em famílias com graves desequilíbrios emocionais e espirituais, vivem em situações difíceis, passam por privações materiais e recebem em seu ventre crianças especiais, indivíduos dotados de grande inteligência, mas que se equivocaram em vidas anteriores e, na atualidade, nascem com deficiências físicas ou sensoriais, estão expiando seus erros pregressos, nasceram nestes lares e com estes familiares, porque estes, em algum momento de sua existência anterior contribuíram para agravar estes desajustes.

A Doutrina Espírita nos mostra claramente que não existe acaso, todos os nossos atos são computados no grande computador da vida, quando agimos bem e de forma carinhosa, quando somos caridosos e atenciosos com os indivíduos, recebemos da vida este mesmo carinho e esta mesma atenção, a vida nos retorna tudo aquilo que nós damos e, com isso, nosso caráter e nossos valores são elevados a uma categoria maior, denotando nossa evolução.

Numa das passagens mais interessantes do livro Nosso Lar, psicografia de Francisco Cândido Xavier e ditado pelo espírito do médico André Luiz, o autor espiritual nos mostra que poucas pessoas oraram para ele quando este se encontrava encarnado, sua mãe e uma senhora cujo marido tinha sido atendido algumas vezes de graça em seu consultório, como retribuição esta senhora orou por ele pedindo proteção e agradecendo as consultas, estas preces foram muito importantes no mundo físico e também no mundo espiritual, auxiliando em suas dificuldades e limitações. Neste episódio, o Espiritismo nos mostra como a prece é um instrumento fundamental para que consigamos nos equilibrar espiritualmente e serve como um instrumento de auxílio e proteção aos outros e de agradecimento a Deus, a oração mostra nossa humildade e disseca nossos sentimentos mais íntimos e pessoais.

Fujamos sempre de julgar os outros indivíduos, o que não queremos para nós não devemos fazer para as outras pessoas, se julgarmos nossos semelhantes estamos abrindo caminho para que sejamos julgados e neste julgamentos, com certeza, seremos condenados, afinal, precisamos compreender que estamos encarnados em um mundo de expiação e de prova, nascemos neste planeta porque somos atraídos pelas energias emanadas deste local, se são energias negativas e atrasadas, é porque ainda trazemos muito destas energias desequilibradas dentro de cada um de nós.

A melhor forma de progredirmos espiritualmente neste mundo marcado pelo atraso moral e pelos valores do dinheiro, é nos vigiarmos e mantermos sempre a disciplina, o comportamento reto e a vigilância de nossos pensamentos. Controlar os nossos sentimentos não é algo fácil e imediato, para que consigamos devemos entender que tudo deve ser visto como um grande processo, devemos exercitar estes sentimentos e pensamentos, devemos fazer caridade, devemos cultivar o hábito da oração, devemos compreender que a natureza não dá saltos, tudo acontece ao seu tempo, mas devemos nos dedicar, estudar, refletir e compreender que evoluímos paulatinamente nas várias oportunidades que a espiritualidade nos concede, entendamos tudo isso e, com certeza, viveremos melhor e seremos luzes para o progresso de todos que nos ladeiam, o progresso individual leva a comunidade a um progresso coletivo e o indivíduo a progredir para mundo melhores, onde a violência se reduz, a solidariedade aumenta e a proximidade com o progresso se faz mais evidente em cada ser humano.

Liberalismo e Conservadorismo no Brasil Contemporâneo

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Estamos vivendo um momento único de grande apreensão na sociedade brasileira, depois de cinco anos de crise econômica, incremento acelerado do desemprego, redução sistemática nos salários e na renda agregada, estamos retomando algum crescimento econômico, ainda muito lento e reduzido, mas a economia começa a dar sinais de retomada, gerando aplausos e comemorações de um lado e fortes preocupações do outro, com isso, estamos vivendo mais um dos inúmeros paradoxos da economia brasileira.

A agenda liberal parece estar sendo blindada pelos grandes grupos econômicos que defendem este governo, as medidas liberalizantes parecem ser o ideal a ser conquistado, privatizar empresas estatais, acelerar a abertura da economia, desregulamentar o sistema econômico, diminuir os custos do trabalho e facilitar os investimentos privados como forma de incrementar o empreendedorismo e a inovação. São medidas que estão sendo fortemente implementadas pelo governo federal, acreditando que, desta forma, a economia brasileira tende a encontrar o caminho para o crescimento econômico, para a redução das desigualdades sociais e para uma melhora no ambiente de negócio, atraindo recursos externos e dinamizando o desenvolvimento econômico do país.

São medidas ousadas, algumas delas nos parecem bastante necessárias e fundamentais para destravar a economia brasileira, que durante muitas décadas se viu envolta em discussões desnecessárias, onde o Estado ganhou um protagonismo exagerado, abrindo espaço para que grupos organizados parasitassem os escaninhos do poder em busca de subsídios excessivos, além de benefícios fiscais e orçamentários, contribuindo para a degradação dos serviços públicos e, ao mesmo tempo, mantendo elevados os serviços da dívida pública que os beneficiavam com retornos financeiros altos em detrimento da desestruturação do Estado Nacional. Uma reconfiguração deste Estado deve ser uma das prioridades da sociedade brasileira, como os governos ditos de esquerda não tiveram coragem de encarar esta missão, outros governos devem se candidatar a cumprir com estes objetivos, embora saibamos que neste momento as políticas a serem adotadas pelo governo devem beneficiar alguns grupos em detrimento de outros, os grandes empresários e o setor financeiro aparecem como ganhadores, enquanto os grupos mais vulneráveis da sociedade serão os grandes perdedores deste novo modelo, quem sobreviver poderá constatar, depois da euforia vamos nos encontrar com a realidade.

A agenda econômica está centrada na diminuição do papel do Estado, segundo integrantes do governo, devemos privatizar tudo, este seria o grande objetivo dos economistas liberais liderados pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes, com isso, reduziríamos a dívida pública e teríamos recursos para investimentos sociais, recuperando a capacidade de investimento do Estado atualmente em situação de insolvência e penúria fiscal, habilitando o governo a uma atuação mais efetiva na regulação, embora discreta dos mercados, deixando para os grupos econômicos o comando dos setores produtivos, reduzindo os incentivos fiscais e financeiros para os grupos industriais, além da redução do papel do BNDES e da diversificação dos mercados externos, aumentando os acordos comerciais e, se necessário, saindo do Mercosul, visto com desdém pelas lideranças que comandam a economia do país, estas medidas devem ser vistas como uma grande revolução para a economia brasileira, com medidas extremas e necessárias e outras marcadas pelo fanatismo e pelo excesso de pendor ideológico. Depois de um governo mais afeito aos pensamentos da esquerda, da intervenção e do Estado grande, estamos em um momento onde estamos colocando um governo mais sensível ao pensamento da direita, menos intervencionista e mais centrado na iniciativa privada.

Diminuir o papel do Estado é uma medida essencial e deve ser adotada com urgência, transferindo a atuação direta da produção para a regulação e melhorando os serviços públicos, racionalizando o uso do dinheiro público, dando transparência a todos os recursos investidos e criando a cultura, inexistente no Brasil, de avaliar todos os serviços e atividades prestadas pelos entes governamentais, analisando se os recursos estão trazendo os benefícios desejados e esperados pela sociedade. Sem avaliações positivas estes serviços devem ser substituídos ou melhorados de forma a gerar os benefícios para a comunidade de uma forma geral, sem viés ideológico nos programas e enfoque na eficiência das políticas, para isso, cabe ao governo e a sociedade civil se transformarem em agentes ativos na avaliação e no controle das políticas públicas.

A forte aproximação com ideias liberais pode trazer transtornos futuros para o governo, como estamos vendo em sociedades que fizeram ajustes duros, privatizaram todas as empresas e transferiram os serviços para grupos e conglomerados privados, esta visão pode conter um forte equívoco cujos impactos podem ser bastante negativos, vide o caso do Chile, de exemplo de políticas liberais e melhoria nos ambientes de negócio, até uma posição de agitação social e movimentos de rua sem controle, cujas reclamações envolvem os graves desequilíbrios gerados pelas políticas para os setores populares. A adoção de políticas visando diminuir os custos de contratação devem ser encaradas como positivas, mas estas medidas não devem culminar em mais desequilíbrios na Previdência Social ou no fundo de garantia, muito menos devem ser bancadas com descontos sobre o seguro desemprego de trabalhadores desempregados. Estes recursos devem ser extraídos de impostos mais efetivos sobre heranças e aplicações financeiras e, principalmente, sobre as isenções fiscais e tributárias que são concedidas para os grandes grupos econômicos nacionais, que de um lado criticam o governo e sua ineficiência de forma veemente enquanto do outro se utiliza de seu poder econômico e de seu forte lobby político para extrair da sociedade isenções fiscais e ganhos tributários elevados.

Encontramos muitas falas desprezíveis, deselegantes e desnecessárias e que poderiam ser evitadas para que se crie o ambiente salutar para atrair os grandes investimentos nacionais e internacionais, para que o país consiga construir uma recuperação econômica mais sólida e consistente, fugindo dos voos rasteiros e alçando novos horizontes. Nestas falas encontramos pensamentos preconceituosos, gestos tresloucados, comentários maldosos e opiniões precipitadas que interditam o debate, constrangem os contendores e espalham ventos de intolerância, violência e agressividades.

Percebemos também uma crescente falta de tato de integrantes do governo com postagens agressivas nas redes sociais, pessoas estimulando ódios e ressentimentos, debates eivados de violência e de intolerância, além de ofensas pessoais e palavras de baixo calão. Nestes debates encontramos discussões que servem apenas para criar um ambiente de constantes confrontos, estimulando grupos organizados e exércitos de difamação que trabalham exaustivamente para que os debates sejam interrompidos e todos que pensam de forma contrária sejam acusados de esquerdistas e comunistas, vendo nestas pessoas figuras deletérias, corruptas e que não comungam com o bem do país e o progresso do povo brasileiro, devendo portanto, ser aniquilados e trucidadas pelos agentes do bem e da ordem.

Estamos vendo o crescimento de uma agenda conservadora ultrapassada, grupos religiosos intolerantes e defensores de ideias retrógradas estão ganhando espaço dentro do Estado Nacional. Estamos vivenciando no Brasil contemporâneo discursos agressivos e contrários aos homossexuais, às lésbicas e aos gays, fomentamos discursos intolerantes com os grupos indígenas e suas terras demarcadas, preconceitos com negros e intolerâncias generalizadas, estamos regredindo em termos civilizatórios, estamos retomando pensamentos arcaicos e nos deixando levar pela obscuridade crescente que alimentamos durante muitos anos. Neste momento tudo é possível e aceitável, até mesmo aprovar o excludente de ilicitude e estimular as mortes, desde que elas ocorram nas favelas e nas comunidades pobres e miseráveis, como estamos vendo todos os dias.

Estamos vivendo a introdução de uma agenda conservadora agressiva e intolerante marcada por pitadas de liberalismo econômico, neste casamento por conveniência um dos lados deve se conscientizar de que a convivência será impossível. Para muitos o liberalismo pressupõe democracia, pluralidade e discussões democráticas, enquanto o conservadorismo que estamos presenciando se caracteriza por forte componente ideológico, radical e intolerante. Saímos de um pensamento ideologizado de esquerda e estamos rumando para um pensamento ideologizado de direita, no Brasil, podemos dizer, com certeza, que a direita se assumiu enquanto tal e saiu do armário, intensificando o conflito e aumentando os desafios políticos no caos contemporâneo.

Os valores liberais tendem a divergir rapidamente dos valores conservadores, criando espaços de dissensos ou se adaptando para garantir seus ganhos políticos imediatos. Os liberais acreditam ser defensores da democracia, mas aceitam regimes de exceção, como no governo de Augusto Pinochet, no Chile, desde que estes adotem políticas racionais, entendendo racionais como as políticas que atuam para liberar os mercados dos braços fortes dos Estados, incrementar as privatizações, garantindo aos atores privados novos horizontes de investimentos, espaços para jogatinas e desregulamentação financeira, mesmo que estes gerem degradação social, aumento da desigualdade e da exclusão social, afinal se acreditam melhores, pois são frutos da meritocracia, como se existisse meritocracia em uma sociedade marcada por exclusão social e pobrezas crescentes.

As políticas liberais estão seduzindo a elite econômica brasileira, grupos de classe média alta acreditam piamente que as medidas adotadas pelo ministério da Economia tendem a garantir forte crescimento econômico. Quando estas medidas começarem a fazer efeito e o Estado perder toda a capacidade de atuação, quando as barreiras protecionistas forem abolidas e quando os resultados econômicos não vierem da forma como muitos acreditam, o entusiasmo com o governo tende a arrefecer e as críticas tendem a aumentar, com sérios riscos de o sistema entrar em colapso e os tão temidos movimentos sociais poderão se tornar uma realidade, como estamos vendo em vários países do mundo e, principalmente, em países da América Latina, como Chile, Colômbia, Peru e Bolívia.

As medidas que estão em estudo pelo governo federal tendem a diminuir fortemente a proteção aos grupos nacionais, além de reduzir muitos repasses de recursos para políticas sociais, contingenciando recursos para saúde e educação, com isso, os conglomerados privados tendem a ganhar novos espaços nestas áreas. Na educação, recentemente, o ministro propôs que as próprias instituições particulares passassem a se regular, diminuindo a atuação do Ministério e garantindo maiores espaços para os grupos privados, com isso, teríamos no médio prazo poucos agentes dominando todo o setor educacional, que para atuar demitiriam todos os professores com mestrado e doutorado e contratariam especialistas e profissionais sem experiência, diminuindo custos, aumentando a quantidade de diplomados e garantindo mão de obra barata e teoricamente qualificada para as empresas de entrega, tais como Uber, com isso teríamos a chamada uberização da economia, empregos precários, salários reduzidos e ausência de proteção social.

Muitos grupos estão atuando fortemente nas redes sociais e defendendo as políticas liberalizantes, como se estas fossem trazer os ganhos imaginados pela população brasileira, muitos foram para as urnas e votaram no novo, acreditaram no discurso da racionalidade e da segurança, embora todos desejamos a melhora do país e o tão sonhado crescimento econômico, estamos num momento onde a distância dos países desenvolvidos tende a aumentar rapidamente, nunca estivemos tão distante deste mundo tão sonhado, que sabe que todos compreendamos que, ao invés de sonhar, estamos mesmo em um pesadelo, e pior, este pesadelo parece estar apenas no seu início.

 

 

 

 

 

Fundamentalismo de mercado pode ser calcanhar de Aquiles de Bolsonaro

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Laura Carvalho argumenta que, no Brasil, conservadorismo moralista se uniu à agenda da Faria Lima 

Folha de São Paulo, 01/12/2019.

Laura Carvalho

[RESUMO] A eleição do populismo autoritário de direita como rejeição ao establishment político uniu, no Brasil, a agenda do conservadorismo moralista ao fundamentalismo de mercado.

Ao cogitar um novo AI-5 como resposta a eventuais protestos contra seu ambicioso pacote de reformas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, desenhou para quem ainda se recusava a enxergar que o governo Bolsonaro não tem duas alas distintas: Estado mínimo na proteção social pede Estado máximo no encarceramento e na repressão, como bem alertou Loïc Wacquant em seu livro “As Prisões da Miséria” (Zahar).

No entanto, ainda que a associação íntima entre fundamentalismo de mercado e autoritarismo não seja nenhuma novidade para quem conhece o entusiasmo de Guedes e do próprio presidente Jair Bolsonaro pelo governo de Augusto Pinochet no Chile, essa agenda destoa de outros movimentos de extrema direita do mundo atual.

No caso da guerra comercial promovida por Donald Trump ou do brexit no Reino Unido, ficam muito claros a incompatibilidade com os princípios do liberalismo econômico e o contraste com a própria agenda de Guedes, que defende uma abertura comercial indiscriminada e unilateral no Brasil. Mas e o governo de Viktor Orbán na Hungria, que vem sendo fonte de um vasto repertório de ideias autoritárias adotadas pelo bolsonarismo como forma de interferir nos meios de comunicação e no Judiciário do país?

Em artigo publicado no jornal The New York Times em 16/10, intitulado “The case for populism” (a defesa do populismo), Maria Schmidt, historiadora e ex-assessora de Viktor Orbán, faz questão de distinguir a plataforma do primeiro-ministro húngaro e o que chama de “agenda econômica neoliberal de Bruxelas” imposta ao país nas décadas que sucederam o fim do comunismo.

“Entusiasmados em recuperar o controle de nosso destino e emergir da Cortina de Ferro, nós, húngaros, ingenuamente acreditamos que a Europa Ocidental fosse partilhar de nossa exaltação […] Em vez disso, nós fomos forçados a nos adaptar ao Ocidente”, escreve Schmidt.

Sobre os motivos da vitória de Orbán em 2010, afirma: “As elites políticas que preferiram manter o status quo durante a crise financeira de 2008 deixaram a classe média da Hungria, bem como a maior parte de seus cidadãos mais necessitados, totalmente desamparados”.

“Desde então, o sr. Orbán colocou os interesses da Hungria em primeiro lugar ao elaborar suas políticas econômicas […], impôs taxas especiais sobre empresas multinacionais e bancos para distribuir o peso da crise tão proporcionalmente quanto possível entre os agentes de mercado que a causaram (e lucraram a partir dela) e os cidadãos húngaros”, argumenta.

Voltando aos EUA, cabe ressaltar que, apesar de o governo Trump ter aprovado um grande plano de redução de impostos que beneficiou também os mais ricos, sua plataforma eleitoral de 2016 tinha explorado as relações próximas de sua oponente Hillary Clinton com doadores de Wall Street para dissociar-se não apenas do establishment político mas também do establishment econômico que, desde a década de 1980, produz desigualdades crescentes e crises financeiras ao redor do mundo.

Da mesma forma, no Reino Unido, o apoio de agentes do setor financeiro à permanência na União Europeia foi muito utilizado na campanha a favor do brexit para opor o interesse dos bancos ao da maioria.

Nesse contexto, e diante da importação pelo bolsonarismo de tantas outras táticas adotadas por essas plataformas políticas no que tange ao papel de redes sociais, fake news, anti-intelectualismo, guerra cultural e criminalização da política institucional, cabe perguntar: por que sua plataforma combinou o conservadorismo moral tão típico desses movimentos com o fundamentalismo de mercado da Faria Lima? E indo além: seria esse seu trunfo ou seu calcanhar de Aquiles?

São inúmeros —e pouquíssimo surpreendentes— os estudos empíricos atestando o papel de uma melhora ou piora na economia para o resultado de processos eleitorais ao redor do mundo.

Contudo, quando o tema é o atual fortalecimento da extrema direita, uma parte da literatura, que está bem representada pelos estudos de Pippa Norris, da Harvard Kennedy School, e Ronald Inglehart, da Universidade de Michigan, tem defendido a predominância do que chamam de “cultural backlash”— a expressão, título do livro que a dupla lançou neste ano, indica uma reação de setores conservadores ao progressismo cada vez maior da sociedade no campo dos valores.

A partir de dados amostrais individuais que englobam 31 países europeus, nos anos de 2002 a 2014, os autores chegam à conclusão de que valores culturais predizem melhor o voto em partidos populistas do que o que chamam “insegurança econômica”, medida por indicadores de desigualdade social, renda e emprego.

Ainda que não se possa estabelecer causalidade nesse tipo de exercício, tais evidências vêm servindo de contraponto à visão que atribui aos efeitos colaterais da globalização comercial e às desigualdades crescentes observadas nos países ricos desde os anos 1980 um papel central na explicação desses fenômenos.

Porém, como apontou o economista Dani Rodrik, da Harvard Kennedy School, no artigo “Populism and the economics of globalization” (populismo e a economia da globalização), de 2017, fatores culturais e econômicos podem não ser passíveis de separação: o mal-estar econômico e social gerado pela globalização comercial e pela imigração pode ter criado as bases para que políticos populistas explorassem uma divisão cultural da sociedade, atribuindo aos imigrantes e a outras minorias a responsabilidade pela deterioração da situação material experimentada por boa parte da população.

Essa hipótese parece obter sustentação em artigos recentes na literatura econômica, que encontraram evidências de que distritos ou regiões mais expostas à importação de produtos chineses são mais propensas a apoiar partidos de extrema direita nos EUA e Europa ocidental.

Só que, no caso brasileiro, ainda que produtos chineses também tenham contribuído para a perda de postos de trabalho, a globalização comercial e o crescimento acelerado da China também foram responsáveis por um superciclo de commodities nos anos 2000, que elevou substancialmente o preço de produtos que exportamos, como petróleo, soja e minério de ferro.

Como sabemos, esse cenário externo favorável viabilizou uma agenda que trouxe muitos ganhos para a base da pirâmide (ainda que sem reduzir a alta concentração de renda no topo) por meio de forte expansão de investimentos públicos, benefícios sociais e empregos formais em setores de serviços e construção civil.

O crescimento da arrecadação de impostos —devido ao crescimento da economia, ao boom de commodities e à formalização das relações de trabalho— permitiu que esse processo fosse compatível com uma redução da dívida pública em relação ao PIB.

Nesse sentido, as condições econômicas mais estruturais identificadas por parte da literatura como fundamentais para a emergência do populismo de direita nos EUA e na Europa não parecem ter vigorado da mesma forma no Brasil, onde a globalização comercial teve um efeito, no mínimo, ambíguo.

A American Economic Review —principal revista científica de economia— publicou em sua última edição de novembro um artigo que leva em conta um prazo mais curto, o do pós-crise de 2008.

Em “Did austerity cause brexit?” (a austeridade causou o brexit?), o autor, Thiemo Fetzer, professor da Universidade de Warwick, utiliza estimativas de incidência dos cortes feitos a partir de 2010 em dez programas sociais em todos os distritos do Reino Unido, além de dados individuais que documentam se o eleitor recebe algum benefício social e qual seu voto (ou intenção de voto) declarado.

Fetzer conclui que a redução nos programas sociais aumenta substancialmente a declaração de votos pró-brexit, bem como a concordância com afirmações do tipo “o governo não se importa [comigo]”.

Ainda carecemos de estudos como esse para estimar o papel da recessão de 2015-16 e do ajuste fiscal executado desde então para a eleição de Jair Bolsonaro. Mas é de se esperar que a frustração crescente da população com o alto desemprego e a perda de renda em meio a uma das crises mais profundas da nossa história tenha sido crucial também para o processo eleitoral.

Mesmo que a recessão tenha se originado pelo fim do boom das commodities e por erros de política econômica pré e pós-2014, a percepção em meio aos sucessivos escândalos da Operação Lava Jato passou a ser que a corrupção era também a causa da crise para a maior parte da população (67% segundo pesquisa do Datapopular realizada em 2015).

Nesse contexto, em vez de culpar imigrantes ou a invasão de produtos chineses pelo colapso da economia, como fez o populismo de direita nos países ricos, atribuiu-se a responsabilidade pela crise ao PT, à gastança desenfreada e ao Estado corrupto.

Em um primeiro momento, as falsas promessas de retomada centraram-se, portanto, no impeachment de Dilma Rousseff e em sua substituição por um governo supostamente comprometido com o corte de gastos públicos e a diminuição do papel do Estado na economia. A reforma trabalhista e a aprovação do teto de gastos trariam de volta os empregos e a confiança dos investidores.

Mas a campanha presidencial de 2018 acabou se dando após sucessivas frustrações nas projeções de crescimento, um consequente aprofundamento dos desequilíbrios fiscais e escândalos de corrupção envolvendo o governo Temer. A culpa já não era mais só do PT, era de todo o establishment político.

Assim, a combinação da agenda de conservadorismo moral com a de fundamentalismo de mercado, que marca o bolsonarismo, se encaixou como uma luva: livrar-se da corrupção e da crise econômica exigia livrar-se do próprio Estado em todos os seus papéis que não o de combate ao crime.

Passados dois anos e meio desde o início da mais lenta recuperação da nossa história —que nem sequer chegou à base da pirâmide—, já deveria estar claro que o aprofundamento da agenda centrada no corte de gastos públicos e na redução de encargos e obrigações trabalhistas não é capaz de nos tirar do quadro de estagnação desigual em que nos metemos.

Não à toa, o próprio governo já começou a recorrer à liberação de recursos do FGTS, ao barateamento do crédito habitacional via bancos públicos e à transferência de recursos do pré-sal para estados e municípios como tentativa de estimular a economia.

No entanto as restrições cada vez maiores impostas ao Orçamento pelo teto de gastos —e pelas novas medidas anunciadas pelo governo, caso aprovadas— devem causar um sucateamento ainda maior dos serviços públicos e um desmantelamento de redes de proteção social que já têm sido insuficientes para impedir o rápido aumento da pobreza no país.

Assim, Bolsonaro não deve contar, em 2022, com o baixo desemprego e o crescimento dos salários que atualmente contribuem, por exemplo, para aumentar a popularidade de Donald Trump nos EUA ou a de Viktor Orbán na Hungria.

Para fazer frente ao forte apelo do populismo político no atual cenário, Dani Rodrik também tem defendido a adoção do que chama de bom populismo econômico, ou seja, o retorno da justiça social para o centro de uma agenda antiestablishment de política econômica. É o que têm feito Elizabeth Warren e Bernie Sanders nas primárias do Partido Democrata americano.

Se o governo Bolsonaro não abrir mão de dobrar a aposta na agenda que vem excluindo a maioria dos brasileiros do crescimento econômico, talvez seja hora de o campo democrático dedicar-se a construir um plano alternativo, capaz de canalizar o acúmulo de frustrações da população para o enfrentamento de conflitos distributivos evitados até aqui pelo Executivo e pelo Congresso.

É claro que o ganha-ganha dos anos 2000 já não é possível em meio ao atual cenário de desaceleração global. Isso significa que a disponibilidade maior de recursos para saúde, educação, infraestrutura e proteção social dependerá da redução de benefícios tributários (como isenção de Imposto de Renda sobre dividendos, Simples, desonerações e deduções de despesas com saúde e educação privadas), da eliminação de remunerações do funcionalismo acima do teto constitucional e do aumento da alíquota de imposto sobre a renda e o patrimônio do 1% mais rico da população.

A boa notícia é que um programa como esse também poderia funcionar como um motor de retomada da economia, na medida em que redistribui renda de quem poupa uma fração elevada para quem consome quase tudo o que ganha.

A insegurança econômica da população, quando combinada ao fundamentalismo de mercado, pode tornar-se o calcanhar de Aquiles de Bolsonaro. As ultrajantes ameaças de edição de um novo AI-5 por parte de seu clã, temeroso de uma nova onda de protestos de rua, deixam isso bastante evidente.

Laura Carvalho professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, é autora de ‘Valsa Brasileira: Do Boom ao Caos Econômico’ (Todavia).

Novo capitalismo dará resposta a desafios ambientais e sociais, por Klaus Schwab.

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Grandes empresas deveriam compreender que elas são partes muito interessadas em nosso futuro comum

Folha de São Paulo, 30/11/2019.

Que tipo de capitalismo desejamos?  Essa pode ser a questão definitiva de nossa era. Se desejamos sustentar nosso sistema econômico para as gerações futuras, é preciso que a respondamos corretamente.

Em termos gerais, temos três modelos entre os quais escolher. O primeiro é o “capitalismo de acionistas”, adotado pela maior parte das grandes empresas ocidentais, que propõe que o objetivo de uma companhia deve ser a maximização dos lucros.

O segundo é o “capitalismo de Estado”, que confia ao governo a tarefa de estabelecer a direção da economia e ganhou proeminência em muitos países emergentes, entre os quais se destaca a China.

Mas, comparada a essas duas opções, a terceira é a que tem mais a recomendá-la. O capitalismo de “stakeholders” [partes interessadas], modelo que propus inicialmente meio século atrás, posiciona as empresas privadas como curadoras dos interesses sociais e claramente representa a melhor resposta aos atuais desafios sociais e ambientais.

O capitalismo de acionistas, o modelo hoje dominante, começou a ganhar terreno nos EUA na década de 1970 e expandiu sua influência em todo o mundo nas décadas seguintes. Sua ascensão não deixa de ter méritos. Durante seu período de maior influência, centenas de milhões prosperaram em todo o mundo, à medida que empresas abriam novo mercados e criavam novos empregos, em busca do lucro.

Mas essa não é toda a história. Os defensores do capitalismo de acionistas, entre os quais Milton Friedman e a Escola de Chicago, negligenciaram o fato de que uma empresa de capital aberto não é apenas uma entidade que busca lucros, mas também um organismo social. Somado às pressões do setor financeiro por resultados melhores em curto prazo, o foco obsessivo no lucro levou o capitalismo de acionistas a se desconectar mais e mais da economia real.

Muitos percebem que essa forma de capitalismo já não é sustentável. A questão é por que as atitudes quanto a ele só começaram a mudar agora.

Um provável motivo é o efeito “Greta Thunberg”. A jovem ativista sueca da causa do clima nos fez recordar que a adesão ao atual sistema econômico representa uma traição às futuras gerações, por sua falta de sustentabilidade ambiental.

Outro motivo (correlato) é que os membros da geração milênio e da geração Z já não querem trabalhar para, investir em, ou comprar de companhias cujos valores se limitem a pregar a maximização do valor para os acionistas.

E, por fim, executivos e investidores começaram a reconhecer que seu sucesso em longo prazo está estreitamente ligado ao de seus clientes, empregados e fornecedores.

O resultado é que o capitalismo de “stakeholders” vem ganhando terreno rapidamente. A mudança de direção era necessária havia muito tempo. Descrevi o conceito inicialmente em 1971, ao criar o Fórum Econômico Mundial com o objetivo de ajudar líderes empresariais e políticos a implementá-lo. Dois anos mais tarde, os participantes da reunião anual do fórum assinaram o “manifesto de Davos”, que descreve as responsabilidades dos dirigentes de uma empresa para com todas as partes interessadas.

Deveríamos aproveitar o momento para garantir que o capitalismo de “stakeholders” se mantenha como novo modelo dominante. Para esse fim, o Fórum Econômico Mundial está lançando um novo “Manifesto de Davos”, que diz que as empresas devem pagar seu justo quinhão de impostos, mostrar tolerância zero à corrupção, sustentar os direitos humanos em toda a extensão de suas cadeias mundiais de suprimento e defender a igualdade de condições para concorrência, especialmente na “economia de plataformas”.

Mas, para defender os princípios do capitalismo de “stakeholders”, as empresas precisarão de novos indicadores. Para começar, um novo indicador de “criação de valor compartilhado” deveria incluir metas “ecológicas, sociais e de governança” (ESG) como complemento aos indicadores financeiros padronizados. Felizmente, uma iniciativa para o desenvolvimento de um novo padrão que atenda essa necessidade já está em curso, com apoio das “quatro grandes” companhias de auditoria e liderada por Brian Moynihan, presidente do Conselho Internacional de Negócios e do Bank of America.

O segundo indicador que precisava ser reajustado se refere à remuneração dos executivos. Da década de 1970 para cá, a remuneração dos executivos disparou, em geral para “alinhar” a tomada de decisões pelos gestores aos interesses dos acionistas. No novo paradigma do capitalismo de “stakeholders”, os salários deveriam se alinhar, em lugar disso, com o novo indicador referente à criação de valor compartilhado em longo prazo.

Por fim, as grandes empresas deveriam compreender que elas são partes muito interessadas em nosso futuro comum. Elas deveriam trabalhar com outras partes interessadas a fim de melhorar a situação do mundo em que operam. Na verdade, esse deveria ser seu propósito definitivo.

Os líderes empresariais têm uma oportunidade incrível. Ao dar significado concreto ao capitalismo de “stakeholders”, podem ir além de suas obrigações legais e cumprir seu dever para com a sociedade. Eles têm a capacidade de aproximar o mundo da realização de metas compartilhadas, como as delineadas sob o Acordo de Paris quanto ao clima e na Agenda de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

Se eles realmente desejam deixar sua marca no planeta, não existe alternativa.

Riqueza e Pobreza na visão da Doutrina Espírita

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Vivemos em uma sociedade onde os contrastes crescem de forma acelerada e causam grandes constrangimentos para toda a sociedade, riquezas convivendo lado a lado com a pobreza, fama e anonimato, belezas e feiuras, saúde e doença, o mundo é um acumulado constante de contradições que nos impacta diretamente e convivemos com estas contradições como se estas fossem naturais e devessem ser aceitas por todos os indivíduos.

No mundo contemporâneo encontramos inúmeras contradições, mas gostaríamos de destacar aquelas vinculadas a convivência cotidiana de riquezas materiais, poder e luxo, convivendo ao lado de pobreza, miséria e degradação, nestas contradições percebemos como o nosso planeta ainda se ressente de estruturas morais mais sólidas, com tantas tecnologias, máquinas e equipamentos materiais, uma parcela considerável da população vive na indignidade, nos levando a questionar nossos valores éticos e morais.

Dados recentes divulgados pelo economista francês Thomas Piketty, autor do livro Capital no Século XXI, nos revela que 1% da população mundial possui mais de 25% de toda a renda mundial, com isso, percebemos uma casta de pessoas que vivem em condições altamente privilegiada, enquanto outros grupos vivem em condições precárias, passando provações da mais variadas, desde a ausência do alimento do cotidiano, até a ausência de esperanças e perspectivas, onde a desesperança, o medo e as incertezas ganham espaços crescentes na coletividade, afastando-os de Deus e os colocando num limiar muito tênue entre uma vida honesta e a marginalidade.

A Doutrina Espírita não critica a riqueza e a acumulação, embora acredite que estes valores afastam os seres humanos dos valores mais consistentes da vida, levando-o a adotar e a viver valores altamente materiais e a deixar de lado os valores espirituais. Neste momento onde a riqueza ganha força no coração dos seres humanos e a busca por valores monetários passa a se transformar na tônica geral dos indivíduos, tudo que é excessivo não se deve estimular na visão espírita, excesso de dinheiro, excesso de trabalho, excesso de consumo, excesso de gastos, todos são vistos como excessos materiais e devem ser evitados para que não contamine os valores mais sólidos dos indivíduos.

O dinheiro é positivo na sociedade, deve ser visto como um grande instrumento de geração de bem-estar social, auxilia na construção de um futuro digno para os indivíduos, melhora as condições alimentares da população e abre novas perspectivas para indivíduos que, muitas vezes, vivem em condições em que até mesmo o sonho não lhe é possível. Usar o dinheiro de forma correta e equilibrada é algo fundamental e deve ser estimulado, pena que em muitos casos as pessoas não mais controlam os recursos monetários, mas são por eles controlados como se fossem marionetes submetidas aos seus desejos mais íntimos.

Na questão de número 814 de O Livro dos Espíritos, Allan Kardec fez a seguinte pergunta ao Espírito da Verdade: Por que Deus a uns concedeu as riquezas e o poder, e a outros, a miséria? “Para experimentá-los de modos diferentes. Além disso, como sabeis, essas provas foram escolhidas pelos próprios Espíritos, que nelas, entretanto, sucumbem com frequência”.

Neste mundo marcado pelo poder e pela força da matéria, muitos indivíduos desprovidos de recursos financeiros se revoltam contra Deus, a maioria não se lembra que quando estavam no mundo espiritual, foram eles que escolheram a privação financeira como forma de conseguir êxito na nova encarnação. Tanto a prova da pobreza quanto a da riqueza são difíceis testes para o indivíduo. Enquanto a miséria pode provocar a revolta com a Providência Divina, a riqueza incita aos excessos de toda ordem, o culto aos valores materiais e o afastamento das promessas feitas anteriormente.

Dispondo de maiores recursos financeiros e meios para fazer o Bem, o rico não o fazendo, torna se egoísta, orgulhoso e insaciável, acumulando dívidas no retorno ao mundo espiritual. Deus experimenta o pobre pela resignação, quando este se rebela passa a acumular mais desequilíbrios espirituais. O rico é experimentado pelo emprego que dá aos seus bens e ao seu poder econômico e financeiro. Pelas facilidades que a riqueza e o poder proporcionam ao ser humano, muito espinhosa torna-se esta prova, pois normalmente incita-o em apegar se à matéria e o afasta da perfeição espiritual.

Muitos pobres não acreditam ou não o querem fazer, mas a prova da riqueza é mais difícil de ser superada com êxito do que a prova da privação. Entre os extremos da riqueza e da miséria, a grande maioria das criaturas transita nas reencarnações terrenas em estágios intermediários, sempre com vistas ao seu progresso espiritual.

Muitas famílias que acumularam grandes fortunas no decurso do tempo, com propriedades e recursos financeiros e monetários que garantiria a todos os seus membros viveram em ótimas condições durante muitas existências, tem sua fortuna degradada em poucos anos, quando vivenciam esta situação sempre encontram culpados, as gerações mais novas que depredaram o patrimônio, a má gestão dos administradores de plantão, as crises econômicas, as novas transformações na lógica produtiva da economia internacional, dentre outras desculpas para o disparate. A Doutrina dos Espíritos nos mostra, com clareza e determinação, que muitas destas fortunas e riquezas acumuladas somente o foram através de espoliação, exploração e violência, muitos patrimônios gigantescos foram se degradando em curto período de tempo, levando os herdeiros a insolvência e a revolta generalizada.

Seja qual for, portanto, as nossas possibilidades materiais, saibamos usufruir corretamente dos bens que o Senhor nos concede, na certeza de que a desigualdade das riquezas visa acima de tudo, ao nosso aprendizado espiritual e a exemplificação cristã. Se utilizarmos bem de tudo que nos é concedido, se tivermos temperança e responsabilidade com nossas posses, se compreendermos que tudo que existe na natureza e na sociedade cotidiana pertence a um Deus maior, misericordiosamente justo e bom, entenderemos que só nos pertence aquilo que nós conseguirmos acumular dentro de nossos corações e mentes, nossos sentimentos, nossos conhecimentos, nossos valores morais e éticos e nossos exemplos edificantes de vida. Os recursos monetários e financeiros são importantes e não devemos negar sua relevância, são instrumentos fundamentais para nosso progresso, mas devem ser vistos sempre como meios para que atinjamos o progresso de forma mais consistente e nunca deve ser visto como um fim em si mesmo, quando o enxergamos assim, estamos nos desvirtuando dos verdadeiros valores da vida, muito bem exemplificados pelo Mestre de Nazaré.

Na história da humanidade, quando impérios desmoronaram por completo, quantas dinastias foram dizimadas e quantos conglomerados foram a falência, nestes casos encontramos muitas situações em comum, muitos destes empreendimentos foram construídos através de degradação, de corrupção generalizada e de uma exploração colossal, gerando dramas, lágrimas e dores que culminaram em ressentimentos, mágoas e, no pior dos casos perseguições espirituais. Famílias inteiras se transformaram em “vítimas” e foram perseguidas por espíritos revoltados que se sentiram traídos, humilhados, explorados ou roubados materialmente e em sua mais íntima dignidade.

O dinheiro tem grande relevância na sociedade contemporânea, mas todos devemos nos precaver dos prazeres oriundos da posse excessiva das moedas, ela nos abre portas, nos traz facilidades e amores ilusórios, comprometendo nossos valores mais íntimos e pessoais. Além disso, num mundo marcado pela força do capital, o poder nos é dado de forma direta, com este em mãos muitos podem se deixar corromper ou degradar suas formas de pensar, levando-o a impor aos outros seus pensamentos e transformando estes indivíduos em verdadeiros ditadores, seres desprezíveis e autoritários, que se utilizam de seu poder para impor suas ideias e pensamentos, degradando a democracia. Estes irmãos ao chegarem no mundo dos espíritos depois de seus desencarnes, tendem a se arrepender de suas escolhas equivocadas e imediatistas, suas lembranças serão fortes e estarão vivas na mente e no espírito, se materializando em lágrimas, cobranças e num remorso intenso e degradante, levando o espírito ao desequilíbrio.

As leis de Deus são eternas e verdadeiras, estamos encarnados no melhor local para nossa evolução, nascemos na família correta e com as características e habilidades necessárias para nosso crescimento espiritual, quando nos rebelamos diante das dificuldades da vida e bradamos contra a justiça divina estamos cometendo um sério equívoco. Superar as adversidades e construir um futuro melhor é fundamental para nosso crescimento espiritual, tendo a consciência de que Deus está sempre conosco, nós é que, na maioria das vezes, nos equivocamos e escolhemos atalhos que nos causam constrangimentos futuros, muitos destes constrangimentos nos acompanham durante muitos anos ou séculos, gerando dores violentas, mágoas intensas e severos ressentimentos.

A riqueza e a pobreza que vivemos no mundo material deve ser encarada como uma etapa para nossa evolução, neste momento estamos sendo chamados pela justiça divina para prestar um testemunho individual, onde tomamos consciência de nossas quedas e pavimentamos um caminho mais seguro e consistente. Muitos irmãos dotados de grandes habilidades intelectuais e posses materiais viveram apenas buscando prazeres materiais, deixaram que seus talentos trouxessem benefícios apenas para si e deixaram de lado os irmãos sofredores e desamparados, distorceram os ideais de auxílio e crescimento conjunto e transformaram suas vidas em um eterno acumular recursos monetários, prazeres materiais e gozos sexuais, num mundo marcado pela pobreza moral e pela indigência espiritual.

Muitos destes irmãos retornaram à matéria em situações degradantes, alguns em regiões pobres e miseráveis, outros sem a capacidade intelectual que anteriormente os caracterizavam, tiveram encarnações de expiação e quando desencarnaram foram socorridos pelos bons espíritos e voltaram para o mundo espiritual de uma forma mais consciente, estes evoluíram e estão em franco progresso espiritual, enquanto outros sucumbiram ao desânimo e a desesperança, se revoltaram contra as leis divinas e postergaram seu progresso espiritual.

Num mundo centrado nas aparências materiais, a prova da riqueza nos parece mais interessante, ter recursos financeiros pode apresentar vantagens aparentes e atrair inúmeras entidades, mas ao mesmo tempo, pode nos afastar dos verdadeiros ideais da espiritualidade maior e comprometer ainda mais nossa realidade espiritual. Entendamos verdadeiramente os pressupostos da vida e compreendamos que, onde estivermos, devemos valorizar as coisas simples e verdadeiras da vida, muitos cultivam falas sofisticadas e passam a impressão de grandes conhecimentos, aparentemente tudo nos parece perfeito, mas internamente somos ainda muito pequenos e precisamos labutar muito em busca dos verdadeiros ideais da vida, nesta caminhada, a Doutrina Espírita pode nos auxiliar muito mais do que imaginamos, que iniciemos nossa jornada.

Ironias do pinochetismo brasileiro, por Roberto Simon

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Novo culto a Pinochet revela mais do que ignorância histórica – FSP – 23/11/2019

Depois de “o nazismo foi de esquerda”, a nova temporada na série de falsificações históricas do bolsonarismo tem o ditador chileno Augusto Pinochet como herói principal. O pinochetismo é outra ideologia que, depois de bem velhinha, veio morar no Brasil: a direita chilena hoje no poder, a começar pelo próprio presidente Sebastian Piñera tenta ao máximo se afastar do pesadelo dos anos Pinochet.

Não por acaso, quando Jair Bolsonaro atacou o pai da ex-presidente Michelle Bachelet, torturado e assassinado pela ditadura chilena, Piñera — recém chegado de Brasília, no auge da crise dos incêndios na Amazônia — foi forçado a ir à TV se distanciar do aliado brasileiro.

A ironia maior é que Pinochet representa a antítese de vários valores que o bolsonarismo diz representar.

Aos lavajatistas roxos, por exemplo, vale lembrar que Pinochet foi talvez o líder mais corrupto da história do Chile. Quem descobriu isso não foi Cuba, mas o Senado e o Departamento de Justiça dos EUA —o mesmo que ajudou o Ministério Público brasileiro a derrubar o cartel das empreiteiras, na era petista.

Quando os EUA apertaram o cerco contra lavagem de dinheiro, no pós-11 de setembro, encontraram milhões de dólares de Pinochet em um arquipélago global de contas secretas e offshores. A investigação acabou por destruir o Riggs Bank, de Washington, que ajudava o ditador a esconder a fortuna.

Aos saudosistas do regime militar brasileiro: seis meses após o golpe no Chile, Pinochet já havia se tornado uma figura tão tóxica que o novo presidente Ernesto Geisel, por meio do Itamaraty, pediu explicitamente que não viesse à sua posse, em Brasília. Ele veio mesmo assim, mas Geisel recusou convites insistentes para uma visita oficial ao Chile.

As repressões chilena e brasileira colaborariam —agentes da Dina, a polícia secreta chilena, chegaram a ser treinados no Brasil—, mas o país terminaria por boicotar os planos mais ambiciosos de Pinochet, sobretudo na Operação Condor.

Trumpistas brasileiros talvez se esqueceram de que Pinochet ordenou um atentado terrorista no coração de Washington, com o carro-bomba que matou o ex-ministro Orlando Letelier e dois cidadãos americanos. Aliás, Ronald Reagan, herói conservador, tinha péssimas relações com o ditador.

Os EUA ajudaram a destruir a democracia chilena, em 1973, mas também pressionaram pela saída de Pinochet, em 1990.

Quem defende pena de morte a traficante faria bem em saber que a Dina, sob ordens de Pinochet, tornou-se um cartel da cocaína aliado aos narcos colombianos. Segundo o chefe da agência, Manuel Contreras, uma de suas inovações foi a chamada “coca negra”, supostamente à prova de cães farejadores.

Chicago Boys (ou “Olders”) deveriam ver a nova literatura sobre história econômica do Chile. Resumo: Salvador Allende destruiu o país, mas o chamado “milagre chileno” é um mito e, sob a democracia, o Chile cresceu muito mais e acelerou a melhora de todos os indicadores sociais. Claro, isso foi possível porque a esquerda incorporou parte da agenda da direita —mas, pelas últimas notícias de Santiago, os custos desse programa foram gravemente subestimados.

E, mais ainda, como pode alguém que diz defender valores judaico-cristãos, a família e a castidade adular um regime que perseguiu líderes religiosos, desapareceu crianças e usou o estupro como arma?

Talvez o pinochetismo tupiniquim seja fruto da ignorância histórica, da política feita de memes e gritaria online —e espero que as informações acima tragam alguma luz. Mais provável, porém, é que Pinochet esteja sendo celebrado no Brasil de hoje justamente pelo que, de fato, foi: um assalto à democracia, ao Estado de direito, às liberdades e à condição humana.

Roberto Simon

É diretor sênior de política do Council of the Americas e mestre em políticas públicas pela Universidade Harvard e em relações internacionais pela Unesp.

A terra treme, por Mário Sérgio Conti

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Do Chile à Argélia, a rebelião se espalha; e Bolsonaro se arma – FSP 23/11/2019

É tanta revolta que, para não esquecer nenhuma, é bom botá-las em ordem alfabética. Em um mês, houve rebeliões na Argélia, Catalunha, Chile, Colômbia, Equador, Haiti, Hong Kong, Irã, Iraque e Líbano. Milhões e milhões de pessoas querem mudar de vida. Agora, e não depois.

Diferentes entre si, os motins têm traços insurrecionais pela duração (desde fevereiro, Argel fecha para protestos às sextas-feiras), pela abrangência (em Santiago, mais de um milhão de pessoas participaram de uma passeata) e pela coragem (centenas de mortos em Teerã e Bagdá).

Na regra, os levantes começaram com demandas particulares que logo se alastraram. Secundaristas pularam catracas do metrô para se insurgir contra o aumento das passagens —e em dez dias uma greve geral parou o Chile.

O governo libanês quis impor uma taxa para mensagens de WhatsApp — e 12 dias depois o primeiro ministro se demitiu. O reajuste da gasolina desencadeou quebra-quebras em Quito. A corrupção alimentou convulsões em Bagdá e Teerã.

As reivindicações foram atendidas e as praças não se aquietaram. A China voltou atrás na intenção de querer que o Partido Comunista julgasse os dissidentes de Hong Kong. Mas, como quando da renúncia do presidente argelino, a contestação só fez aumentar.

Com o quebra-quebra, governo chileno teve que convocar plebiscito sobre constituinte. No Líbano, a palavra de ordem passou a ser a unidade nacional, acima das divisões religiosas. O separatismo ganhou força na Catalunha e em Hong Kong.

É preciso aguardar os desdobramentos para avaliar a insurgência. Dá para dizer, contudo, que ela lembra as revoluções europeias de 1848 e tem algo da explosão do stalinismo, em 1989-1991. Parece um segundo momento da Primavera Árabe de 2011, só que agora em vários cantos do globo.

Embora o seu alcance geográfico seja muito maior, as explosões não pegaram em cheio os países centrais. Mas, também neles, algo fermenta: coletes amarelos na França; passeatas pró e contra o brexit na Inglaterra; a greve da GM nos Estados Unidos.

O que fermenta é a insatisfação com a política apodrecida. Com o status quo criado pela economia neoliberal. Com a ordem mundial sino-americana. Com a espoliação de milhões por um punhado de bilionários. O combustível da turbulência é a desigualdade social.

As multidões sabem o que repudiam. Mas apenas intuem o que querem: justiça, democracia, igualdade.

Os poderes constituídos têm horror a isso. Sua reação automática foi cair de pau na plebe rude.

A teocracia tirou a internet do ar no Irã e, segundo a Anistia Internacional, matou mais de cem. O exército encarcerou dezenas de dissidentes na Argélia, a começar pela médica Louisa Hanoune. A polícia chilena atirou na cabecinha e cegou dezenas de insatisfeitos.

As multidões cantam seus mutilados e mártires. E os bens de vida zelam para que os pés-rapados não se aposentem nunca, os desempregados sejam taxados e o agronegócio queime a Amazônia: é cultural, tá oquei?

Bolsonaro vem se armando para enfrentar eventuais revoltas. Pôs 2.500 militares em ministérios e cargos de chefia (Folha de 14/10). Moro quase dobrou o contingente verde-oliva no Ministério da Justiça; e toda a milicada trabalha fardada às quartas-feiras.

Agora, o presidente mandou ao Congresso um projeto de lei que isenta de punições policiais e militares que, em defesa da lei e da ordem, “cometem excessos”. Na prática, inocenta previamente soldados e meganhas que cegarem, aleijarem ou matarem quem protestar contra Bolsonaro.

Por fim, lançou a Aliança pelo Brasil. Seu manifesto de fundação fala em “ordem nova”, “degeneração moral” e de “livrar o país dos larápios, dos espertos, dos demagogos e dos traidores”. É explícito: não usa nunca a palavra democracia.

A Aliança não precisa disputar as próximas eleições, como admitiu. Seu objetivo implícito é juntar a banda podre das polícias, do Exército, das seitas, das milícias e de toda a corja lúmpen numa organização de combate — de luta ideológica e física, nas ruas.

Enquanto os bem-pensantes batem papo sobre 2022, e avaliam as chances de Huck e Haddad, Bolsonaro se prepara. Tem o apoio de empresários e de Guedes, de moralistas e de Moro, de generais e de Villas Bôas, de pastores e do bispo Macedo, do “império” e de Trump.

Continuará a provocar arruaças, a destruir direitos e a solapar as liberdades públicas. Se a revolta vier e tiver condições, Bolsonaro posará de salvador da pátria, de Bonaparte. Tentará um golpe.

Mario Sergio Conti

Jornalista, é autor de “Notícias do Planalto”.

A cegueira espiritual do homem contemporâneo

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             Os indivíduos vivem em constantes conflitos na sociedade contemporânea, estes conflitos são das mais variadas origens, de um lado percebemos desajustes internos, medos, traumas e desesperanças e, de outro, os desajustes externos, desemprego e pouca empregabilidade, relacionamentos fracassados, religiões materializadas e violências generalizadas, neste momento os seres humanos se encontram cegos, a cegueira humana impede e dificulta que os indivíduos enxerguem melhor as verdades e os valores mais sólidos da vida.

Numa sociedade que premia e valoriza os valores materiais, os indivíduos buscam de todas as formas aumentar seus recursos financeiros, se sujeitando aos mais variados trabalhos e atividades cotidianas, deixam sua ética de lado e adotam valores flexíveis, aceitando tarefas pouco éticas desde que a remuneração seja atraente e lhes garanta ganhos consideráveis, o poder material está criando uma nova sociedade, nesta os indivíduos poucos se preocupam com os valores espirituais e, sem eles, acabam vitimado pelas dores mais agressivas da alma humana, a depressão, a ansiedade, os transtornos mentais e, no limite, o suicídio, que na atualidade aumenta de forma acelerada, gerando rastros de rancores e ressentimentos.

A Doutrina Espírita, como a Terceira Revelação, vem com o intuito de nos mostrar a amplitude da vida e de nossas relações sociais e espirituais, segundo esta doutrina iluminadora, todos vivemos juntos e compartilhamos os mesmos locais, teorias que a física quântica vem nos mostrando com detalhes maiores. Nesta convivência, encontramos encarnados e desencarnados vivendo e sobrevivendo lado a lado, neste conviver passamos a compreender as realidades mais significativas da vida, que nos auxiliam na compreensão do mundo, abrindo nossos olhos e nos angariando instrumentos teóricos para nosso crescimento espiritual cotidiano.

A Doutrina Espírita acabou com a morte, um dos maiores medos e tabus da humanidade, mostrando-nos que a separação é temporária e bastante subjetiva, afinal nos encontramos próximos uns dos outros e nos reencontraremos lado a lado em algum momento de nossa caminhada, tomara que este encontro seja num local iluminado de paz e de progresso, onde possamos receber energias e sentimentos melhores, mais saudáveis e consistentes, onde possamos compreender melhor nossas potencialidades e nossas limitações, trabalhando estes últimos no intuito de angariar um crescimento mais sólido, auxiliando nosso progresso espiritual.

O grande escritor português José Saramago, ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em 1998, tem uma frase bastante interessante e ilustrativa, segundo o escritor português:  “A pior cegueira é a mental, que faz que não reconheçamos o que temos a frente”. A frase nos mostra claramente que somos cegos para muitas realidades da vida, mas quando nos cegamos mentalmente para os novos conhecimentos e para as novas descobertas da ciência, deixamos de compreender melhor os significados da vida, muitas vezes perpetuando nossos desequilíbrios. Muitos são os motivos que nos levam a manter nossa mente fechada, dentre eles podemos destacar o comodismo, a ignorância e a falta de conhecimentos, os medos de descobertas, dentre outros, variando de indivíduo para indivíduo.

Quantas pessoas vivem em uma grande redoma, onde se escondem de outras pessoas, se fecham e temem relacionamentos afetivos e sentimentais, se tornando indivíduos frios e calculistas e passam a olhar os indivíduos como verdadeiros adversários ou inimigos, se escondendo e se limitando a relacionamentos superficiais e transitórios. Neste cenário, estes indivíduos se cegam com relação as realidades da vida, vivem em um verdadeiro EU S/A, mergulhando em uma cegueira que os impossibilita de compreender suas dores mais íntimas, levando para outras experiências físicas, desequilíbrios maiores, medos e desesperanças crescentes.

Na Bíblia encontramos algumas histórias referentes a cegueira, num dos episódios conhecidos como o cego de Jericó e outro descrito como o cego de nascença, dois momentos que Jesus nos mostra sua superioridade moral, seus valores mais caros e sua importância para a transformação que todos os indivíduos, nos dois episódios as falas do Mestre de Nazaré estimulam os indivíduos a compreenderem seus respectivos potenciais, afinal a cura e a obstinação estavam nas mãos de cada um, desde que compreendessem suas potencialidades.

Somos cegos espirituais, algumas pessoas enxergam muitas das realidades da vida material, conhecem várias culturas e acumularam grande conhecimento, mas, ao mesmo tempo, desconhecem valores e sentimentos dos mais intensos, desconhecem sua realidade espiritual, se debruçam no trabalho material e percebem nele a satisfação de suas necessidades, o responsável por seus recursos monetários e desconhecem os valores do espírito. Mergulham no trabalho material, ficam horas e mais horas em seu emprego, deixando de lado corações sensíveis, postergando a compreensão dos mais consistentes valores da vida, a nossa miséria espiritual incrementa e eterniza sofrimentos que trazemos de outras oportunidades e vivências.

No livro Memórias de um suicida, de Yvonne do Amaral Pereira, conhecemos a história de Camilo Cândido Botelho, cuja cegueira material, originada de um tresloucado suicídio o auxiliou na descoberta de uma outra realidade desconhecida, a cegueira física lhe abriu caminho para compreender realidades que até então eram por eles desconhecidas. A cegueira espiritual, como nos mostra a obra, era intensa em todos aqueles que, como Camilo, eram conhecidos como intelectuais e conhecedores de ciência e da racionalidade, mas na verdade, eram cegos sobre as mais importantes da realidade, a realidade da vida.

A cegueira física é uma das maiores dificuldades e desafios pelas quais um indivíduo pode passar, sua incapacidade de enxergar pelas vias físicas o leva a desenvolver outras habilidades para construir sua sobrevivência cotidiana, uma limitação o leva a evoluir espiritualmente, contribuindo imensamente para o desenvolvimento do espírito, dando-lhe suportes muitas vezes inimagináveis para pessoas que apresentam seu aparelho visual considerado normal, nestes casos percebemos a superação do indivíduo, seu crescimento e seu desenvolvimento.

Como nos diz Divaldo Pereira Franco no livro Ilumina-te, ditado pelo espírito Joanna de Angelis, “a cegueira física é uma dificuldade pessoal dentro do esquema da Lei de Causa e Efeito, constituindo um drama interior doloroso, facultando a alguns Espíritos resignados a conquista da iluminação pessoal, não se lhe tornando, de forma alguma, razão de desgraça ou de infelicidade. Antes, pelo contrário, não são poucos aqueles que conseguem superá-la, trabalhando eficazmente em benefício próprio graças aos inestimáveis serviços que realiza”. Na obra, o autor destaca a figura extraordinária da americana Hellen Keller, que se tornou uma verdadeira missionária do bem, da sabedoria e do amor, embora os limites da visão, da audição e da fala.

Muitos indivíduos considerados normais, detentoras de uma ampla capacidade de enxergar os movimentos humanos, as cores e os objetos, podem ser descritos como cegos de realidades imateriais. Muitas destas pessoas vivem a reclamar, invejando a vida de outras pessoas, lastimando por dificuldades passageiras e colocando a culpa de suas desditas em terceiros, estes sim são os verdadeiros culpados pelos seus desequilíbrios e por suas quedas, com estas atitudes estão se condenando a viver uma vida medíocre, sem progresso intelectual, elevação espiritual e com graves sequelas éticas e morais.

A Doutrina dos Espíritos insiste em mostrar para os indivíduos uma realidade diferente, nos mostra a reencarnação como instrumento para compreender a justiça de Deus, nos mostra a inexistência da morte, a pluralidade das existências e nos ensina que não existe vítima, somos todos culpados e muito culpados, nestas vivências nos deparamos com crimes e violências, matamos, roubamos e fomos desonestos, apanhamos e revidamos, xingamos e fomos xingados, agredimos e fomos asperamente agredidos e ainda, muitas vezes, nos colocamos como vítimas e nos acreditamos verdadeiros. Muitas pessoas nos indagam sobre o porque das dificuldades, perguntam quais os motivos das aflições e querem respostas imediatas, acreditando que estes questionamentos devem ser respondidos por outras pessoas e se esquecem que as vivências são nossas, as dores são nossas, o passado é uma herança individual e as respostas para nossas aflições estão no nosso íntimo e para encontrar estas respostas devemos mergulhar em nossos sentimentos e desejos e, com isso, descobriremos nossas desditas. Neste mergulho interior, devemos destacar, que vamos descobrir coisas ainda escondidas e vamos nos deparar com sequelas de nossos gestos, de nossos atos e de nossas atitudes, se somos difíceis de compreensão na atualidade, imagina como éramos a alguns séculos anteriormente.

A cegueira espiritual nos leva a deixar de lado o enxergar com o coração, visualizamos apenas o aparente, o transitório, a beleza externa e superficial, adoramos os prazeres do sexo e mergulhamos numa busca incansável pelo corpo mais sarado, pelo abdômen mais sequinho, mostramos nossa beleza física e deixamos que ele se torne o cartão de visita de nossa realidade existencial, acreditamos nos poderes da matéria, vivemos na busca por este prazer e acreditamos que, ao morrer, ficaremos esperando um momento onde seremos julgados pelos nossos atos e realizações, para que consigamos a salvação nutrimos alguma compaixão com nossos semelhantes, fazemos alguma caridade e doamos um pouco do que ganhamos para os mais necessitados, neste instante acreditamos que seremos salvos e vamos acordar num local parecido com um paraíso, ledo engano.

Como nos mostra a vasta literatura espírita, a morte não existe, estamos com uma veste física e quando nos despedirmos do mundo material, passamos a usar outra veste material, quando desencarnamos e acordamos passamos pelo primeiro julgamento, onde vamos acordar? A resposta para esta indagação nos mostrará o que somos na intimidade, o que cultivamos no interior, se riquezas sólidas e verdadeiras que as traçam não comem ou se valores materiais que se esvaem com o transitar da vida material para a do espírito. A coleção A vida no mundo espiritual, composta de treze obras, psicografia de Francisco Cândido Xavier e ditada pelo espírito de André Luiz, nos leva a um mergulho no mundo dos espíritos, nesta coleção os autores nos mostram realidades da existência humana, falando sobre obsessões, reencarnações, medos, traumas e alegrias, o conhecimento presente na literatura espírita é uma grande benção de Deus para que consigamos deixar nossa ignorância de lado e passemos a cultivar pensamentos, hábitos e vontades mais consistentes.

Encontramos muitos indivíduos na atualidade clamando por provas quando o assunto é a realidade espiritual da vida, são cegos espirituais que sentem prazer em negar tudo quanto não lhes convém aceitar, porquê, se assim procedessem, teriam que alterar completamente o comportamento moral, adotando novos métodos existenciais de comportamentos. Estão sempre em busca de provas, como se todas as demonstrações dos séculos, das pesquisas honestas de mulheres e homens de alta importância nas várias ciências, examinando cuidadosamente os fenômenos mediúnicos, de nada valessem.

Neste cenário encontramos muitos cegos guiando outros cegos, muitos se dizendo verdadeiros profetas e angariando um séquito de seguidores, antes na casa das dezenas, quem sabe centenas, hoje com as redes sociais encontramos milhões de seguidores, pessoas que pouco enxergam se colocam como os condutores, o resultado desta atrocidade é uma grande catástrofe que estamos mergulhados, precisam enxergar as realidades da vida para depois começarmos o auxilio para aqueles que não conseguem visualizar, mas para que consigamos enxergar precisamos ter a coragem de seguir Jesus e ter a humildade de compreender que éramos cegos e agora vemos…

Um balanço da economia brasileira nos tempos de Bolsonaro

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Depois de quase 11 meses de governo Jair Messias Bolsonaro, muitos analistas se esforçam para fazer um balanço dos sucessos e dos fracassos deste governo na seara econômica. De um lado alguns comentaristas destacam as boas medidas econômicas, exaltando o governo e tentando mostrar que o país encontrou seu caminho e estamos iniciando um ciclo de forte crescimento econômico, para este grupo estamos iniciando num mini milagre na economia brasileira. De outro lado encontramos analistas detonando as medidas de cunho econômico, destacando a visão liberal deste governo e suas políticas a favor do mercado e contra a classe trabalhadora, num verdadeiro antagonismo cuja verdade nem sempre é apregoada como deveria, as crenças ideológicas, as vontades e os desejos se sobrepõem aos fatos na maioria das vezes.

Neste debate encontramos tantas rivalidades e intolerâncias que, muitas vezes, evitamos de participar mais ativamente em decorrência do fanatismo e da agressividade dos contendores, onde devemos destacar que esta intolerância não se restringe a um dos lados, ambos estão eivados de sentimentos de agressividade e buscam impor suas ideias e pensamentos, muitas vezes se utilizando de notícias falsas, as chamadas fake News, ou denegrindo aqueles que defendem teses e pensamentos diferentes, gerando confrontos que, em muitos momentos, descambam para violência física e agressividade verbal.

Analisando as ideias econômicos deste governo, podemos salientar que muitas delas são importantes e trarão benefícios para a sociedade, a desburocratização e a redução do papel do Estado na economia olham para o norte correto, estas medidas tendem a atacar alguns feudos que sempre se beneficiaram com a ineficiência do setor público, gerando dificuldades para vender facilidade, alimentando a corrupção e abrindo espaço para seus ganhos imediatos e elevados, extraindo da sociedade seus vultosos patrimônios financeiros e monetários.

O Estado tem um papel importante e fundamental na economia brasileira, muitas das conquistas só foram possíveis graças a atuação direta no planejamento, na regulação e nos investimentos em infraestrutura e no fomento industrial. Neste período nos tornamos uma das maiores economias do mundo, mas infelizmente nos fechamos e passamos a gerar graves constrangimentos internos, com benefícios a grupos organizados e pouca efetividade em políticas de inclusão, este Estado se tornou obeso, caro e ineficiente, mantê-lo assim importa pouco aos grupos mais fragilizados da sociedade.

Neste período algumas medidas foram propostas pelo atual governo, onde destacamos um amplo programa de desburocratização, onde foram reduzidos muitos processos e informatizados outros, dando maior celeridade as demandas da população e incrementando a produtividade do setor público e da economia de uma forma geral. As políticas desburocratizantes sempre estiveram na pauta dos governos anteriores, todos sabemos da necessidade desta desburocratização, a grande dificuldade da implementação destas medidas é a força política dos governos para aprovar estas propostas, sabendo que grupos que mais ganham são muito organizados e muito bem estruturados politicamente, num momento de perigo vão se unir para impugnar estas mudanças, pois sabem que serão fortemente afetados pelas medidas, como os funcionários públicos, os donos de cartórios, os advogados e escritórios que prestam estes tipos de serviços e ganham muito com esta burocracia exagerada que extrai recursos da população que busca estes serviços.

Nas discussões sobre desburocratização, que acreditamos ser bastante necessária, encontramos um viés muito voltado para os setores empresariais, muito para o mundo dos negócios e pouco para os trabalhadores, neste caso, percebemos um desequilíbrio em prol das forças do mercado que podem cobrar seu preço num dos momentos futuros. Os empresários acreditam que a liberalização beneficia os trabalhadores, que terão mais empregos, isto nem sempre acontecem e se acontecer, o que percebemos, é a criação de empregos degradados, com cargas de trabalho elevadas e ganhos reduzidos. Na medida provisória conhecida como Liberdade Econômica encontramos propostas de trabalho nos finais de semana e nos feriados, reduzindo com isso, o poder dos acordos coletivos e dos sindicatos, fragilizando os trabalhadores e aumentando a precarização no mercado de trabalho. Recentemente alguns tribunais chancelaram estas medidas criando uma jurisprudência perigosa para a sociedade. Reclamamos da fragilidade e da desagregação das famílias, mas adotamos e estimulamos a implementação de medidas que aumentam a carga horária de trabalho, degrada as condições dos trabalhadores e depois nos perguntamos: o que está acontecendo com as famílias brasileiras? Na verdade, foram degradadas pelas forças de um capitalismo selvagem, que mata o trabalhador e degrada seus rendimentos, mas ao mesmo tempo consegue produzir mais a preços reduzidos, gerando um desequilíbrio estrutural que já nos foi contado no século XIX, todos sabemos dele, mas continuamos a ignorar de forma veemente.

O viés pró mercado deste governo pode agradar a muitos empresários e banqueiros que querem extrair lucros e ganhos ascendentes na sociedade, mas estas medidas desequilibram as forças de poder e criam condições para problemas futuros, como estamos encontrando em outros locais da sociedade internacional, um exemplo mais próximo está em nosso vizinho, o Chile, mas outros países apresentam situação parecida, como Bolívia, Hong Kong, dentre outros. No momento em que escrevemos este texto, encontramos nos jornais informações de que as manifestações chegaram a Colômbia, onde a população se anima e sai as ruas com reivindicações variadas. O Chile sempre foi visto por muitos como um exemplo de políticas liberais, marcadas pela meritocracia e pelo reconhecimento dos esforços individuais, neste país encontramos todos os serviços públicos privatizados e transferidos para a iniciativa privada, famílias endividadas e jovens sem perspectivas, consequência de uma política que olha apenas para a oferta e deixa de lado a demanda, o poder aquisitivo e as perspectivas de trabalho dignos e decentes para seus trabalhadores, vistos como consumidores e não mais como cidadãos.

Uma proposta que surgiu recentemente e gerou grandes críticas foi a Medida Provisória do Contrato Verde e Amarelo, conhecida como uma mini reforma Trabalhista, nela o governo reduz a tributação para as empresas que contratarem jovens de 18 a 29 anos em primeiro emprego. A queda na arrecadação será bancada pela cobrança da contribuição previdenciária de quem recebe seguro desemprego, esta cobrança gerou graves constrangimentos para o governo, que sofreu duras críticas da oposição e dos especialistas.

As privatizações se transformaram em uma grande celeuma, sobre este tema encontramos divergências imensas, de um lado o governo propõe uma desestatização geral de empresas públicas, onde foram listadas mais de 600 empresas estatais ou com participação do Estado. Pelas propagandas do governo, a venda destas empresas liberaria bilhões de reais para a redução da dívida pública, com isso, as taxas de juros se reduziriam de forma mais consistente e sobrariam recursos para os investimentos em melhorias na infraestrutura física e em questões sociais, tais como educação, saúde e segurança pública, setores muito mal avaliados pelos governos brasileiros de uma forma geral. De outro lado encontramos grupos políticos que se opõem muito fortemente as privatizações, acreditam que muitas destas empresas são estratégicas para o país e sua venda só interessaria para os donos do capital e para os grandes oligopólios internacionais que, quando adquirirem estas empresas, terão papel significativo nas decisões estratégicas do país, que perderá a autonomia e a soberania sobre seu sistema produtivo.

Nesta discussão, percebemos um forte teor ideológico, vender empresas estatais e abrir espaço para o capital privado deve ser visto como uma estratégia de fortalecimento do capitalismo nacional, mas faz-se importante entendermos quais são as empresas que serão repassadas aos grupos privados e quanto será arrecadado com esta alienação? Outro ponto que deve ser pensado é como o Estado Nacional conseguirá regular estes setores que forem repassados a iniciativa privada, mantendo seu poder e ainda garantindo espaços de lucratividade e o interesse dos conglomerados estrangeiros.

Se temos mais de 600 empresas estatais ou participação em empresas estatais, precisamos analisar os ganhos que estas empresas estão trazendo ao setor público, será que a manutenção destes conglomerados está gerando os retornos necessários que a sociedade almeja? Para responder estas indagações, faz-se necessário aumentar as pesquisas científicas, feitas pelos institutos vinculados aos governos e órgãos privados e analisar os retornos que estas empresas estão trazendo para a coletividade. Se o saldo for positivo estas empresas devem ser fortalecidas e estruturadas para que se reduzam as influências políticas perniciosas que tantos constrangimentos trouxeram ao capitalismo nacional. Nesta discussão, os debates que estão sendo levantados pelo governo são saudáveis, pena que os grupos estão indo para o debate defendendo ideias e teorias antigas e ultrapassadas, as privatizações devem acontecer e não devem mais ser postergadas mas cabe a sociedade encontrar um caminho mais consistente para que consigamos encontrar os horizontes do progresso e do desenvolvimento inclusive que beneficie a todos e não um crescimento que gerava benesses para poucos grupos sociais organizados e estruturados.

O governo está propondo medidas liberais, muitas delas fazem sentido e visam dar uma maior eficiência para a estrutura produtiva, estas propostas movimentarão muito a sociedade e trarão impactos gigantescos, mas devem ser debatidos de forma democrática e inclusiva. O apoio incondicional as medidas privatizantes tiram o espaço para as discussões críticas e intensificam a intolerância, podendo levar os debates a confrontos mais do que verbais, podendo gerar conflitos físicos e intransigências. O modelo que embalou a sociedade brasileira nos últimos séculos está sendo reformado de uma forma bastante estrutural, de um modelo centrado nos recursos governamentais e na solidariedade entre classes e grupos sociais (embora controversos), está sendo todo transformado e o que está sendo colocado no lugar apresenta muitos pontos críticos que podem gerar graves desequilíbrios na sociedade brasileira, deixando grupos mais expostos e fragilizados socialmente.

Reduzir o tamanho e o papel do Estado na sociedade é algo difícil na sociedade brasileira, mas estamos num momento único para fazer esta redução, a crise econômica e as deficiências fiscais estão levando os governos a encampar propostas mais ousadas, muitas são necessários mas devemos ficar atentos, porque até o momento as medidas impactam muito mais rapidamente sobre os grupos mais vulneráveis da sociedade e, como estamos vendo, nada de medidas mais agressivas que impactem diretamente sobre os grandes grupos econômicos. A reforma mais importante aventada pelo governo é a reforma tributária, reverter o modelo injusto e concentrador de benesses para os grupos mais abastados deve ser um dos nortes mais importantes a serem adotados pelos governos, sem uma reforma tributária que deixe de lado os indicadores degradantes que sempre nos caracterizou, dificilmente vamos conseguir superar nosso subdesenvolvimento.

Com o pacote trazido a público recentemente, o governo traz uma discussão nova e bastante polêmica, envolvendo o chamado pacto federativo, com a proposta de acabar com cidades menores de cinco mil habitantes que geram menos de 10% dos recursos utilizados para cumprir com suas despesas. Por esta proposta, o governo angariou muitos desafetos, prefeitos e vereadores destes municípios, além de funcionários de órgãos públicos que viram nesta medida uma ameaça a seus empregos e a seus rendimentos futuros. No Brasil temos mais de 5,5 mil municípios, destes mais de 1,2 mil se encaixam na situação citada acima, com isso, correm sérios riscos de perder o status de municípios. Embora a medida possa ser vista como polêmica por muitos cidadãos, este assunto deve ser discutido mais intimamente pela sociedade, muitas destas cidades não conseguem sobreviver sem a ajuda dos governos estadual e federal, com isso, muitas delas deveriam voltar a condição de distritos e seus recursos deveriam ser investidos na melhora dos serviços públicos, na desburocratização e nas questões sociais, como educação, saúde e segurança pública.

A aprovação da reforma da previdência deve ser vista como algo positivo, a sociedade e os agentes econômicos comemoraram de forma efusiva, se adentrarmos numa discussão mais efetiva sobre o tema, devemos destacar que sua aprovação está mais relacionada aos esforços do poder legislativo do que ao empenho do Executivo, que ainda permanece muito frágil na composição e na articulação política, tendo grandes dificuldades para aprovar seus projetos, o que pode comprometer a governabilidade no médio prazo e enviar aos agentes econômicos uma péssima imagem do governo, comprometendo projetos importantes num futuro próximo. Os avanços desta reforma mostraram para a sociedade que estamos em condições de fazer uma discussão mais consistente sobre temas econômicos complexos, deixando de lado medidas salvacionistas e colocando discussões sérias na mesa de debate, convocando os grupos envolvidos e construindo consensos para a melhora dos indicadores econômicos.

Os grupos de esquerda atuam como atuaram no governo Fernando Henrique Cardoso (1995/2002), sendo implacáveis com as propostas trazidas pelo governante, se fossem propostas pelo presidente eram medidas neoliberais e que serviam apenas para beneficiar os banqueiros e os donos do dinheiro, prejudicando os trabalhadores e as classes menos abastadas. Mas para a alegria do governo Bolsonaro e seus apoiadores, neste momento as esquerdas não possuem o mesmo poder que já tiveram nos anos 90, com isso, o governo se mostra muito pouco eficiente e consegue bater cabeça todos os dias, sem articulação política e marcado por falas preconceituosas, postagens agressivas e comentários chulos e degradantes. As medidas liberais estão sendo propostas e sendo levadas a frente, alegrando os donos do dinheiro e gerando perspectivas incertas no futuro, neste momento, percebemos que a elite econômica brasileira deixou de lado valores mais civilizatórios para apoiar grupos políticos de direita que conseguissem entregar as reformas liberalizantes em curso. Na verdade, como dizia Nicolau Maquiavel, os fins justificam os meios.

Sem oposição organizada, os governistas conseguem, eles mesmos, dificultar a condução do governo, no meio ambiente encontramos medidas que aumentaram a devastação, os órgãos de pesquisas foram desacreditados pelo governo, as organizações não governamentais (ONGs) foram colocadas como responsáveis pelos nossos equívocos anteriores e vistas como inimigas e aproveitadoras. Com isso, mostramos ao mundo que não temos projeto algum para o meio ambiente, assim como para outras áreas, tais como a educação e os direitos humanos, estamos realmente numa nau sem rumo governada por lunáticos que se dizem conservadores nos costumes e liberais na economia.

Na Educação, percebemos um movimento preocupante, propostas oriundas do Ministério da Educação propõem que as faculdades privadas, elas mesmas se regulamentem, ou seja, o MEC deixa que as próprias faculdades criem instrumentos de regulação. Este movimento nos preocupa, se nossos indicadores estão defasados e as desigualdades crescem de forma acelerada, imaginem se, a partir de agora, as próprias instituições educacionais forem as responsáveis pelas regras e pelas regulações de seus mercados?

Um balanço do governo Bolsonaro me parece muito prematuro, muitas de suas políticas econômicas foram implementadas no governo anterior, de Michel Temer, e estão trazendo frutos no momento atual, dentre as propostas em curso, acreditamos que muitas delas são interessantes e só seriam implementadas por governos com perfis mais liberais, coisa não imaginada nos governos petistas, como as privatizações, concessões, redução do papel do Estado e desregulamentações. Neste balanço, o que mais me preocupa é que, quando os investidores apoiam e aplaudem com veemência, os resultados não demoram muito a chegar, num boom inicial de crescimento seguido por momentos de estagnação e crise econômica, onde reforçamos nossos mais tenebrosos estigmas de colônia dependente e periférica, que Deus tenha piedade deste país.

A imperfeição humana, a reencarnação e a evolução espiritual

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Na sociedade contemporânea, muitas são as dúvidas que surgem na cabeça das pessoas, muitos se indagam sobre os sentidos da existência, outros questionam da existência de Deus, muitas são as indagações e todas elas tem suas respostas, cabe ao ser humano buscar responder estas indagações, umas encontramos nas reflexões filosóficas, outras estão escondidas nos escaninhos das religiões, enquanto outras estão nos mananciais da ciência, o Espiritismo compila todas estas indagações e nos leva a viajar por mares, muitas vezes, antes navegados, desde que tenhamos curiosidade, dedicação e queiramos aprender.

A Doutrina Espírita destaca que como seres imperfeitos estamos sempre vivendo nos dois lados da vida, alterando vivências nos mundos material e imaterial, nestas excursões aprendemos e evoluímos para atingirmos um estágio maior de desenvolvimento espiritual, quando nossas viagens são reduzidas e passamos a vivenciar novas experiências ruma a um progresso cada vez maior, esta viagem depende de cada ser humano, uns a fazem de uma forma mais rápida enquanto outros demoram um bocado mais nestas andanças, mas todos vamos conseguir atravessar com êxito esta caminhada.

A descoberta da vida espiritual é uma contribuição imensa do Espiritismo, com ela nos foi dado a conhecer a existência de outros mundos, como nos mostrou a física quântica, com seus mundos convivendo simultaneamente, estamos muito próximos destes mundos, mas ao mesmo tempo estamos deverás distantes. Nestas andanças da ciência e do pensamento científico a Doutrina dos Espíritos nos descortina uma nova vida, onde os valores se transformam e passamos a acreditar na imortalidade da alma e nas vivências em outras épocas e lugares, com sensações, medos e percepções diferentes.

Somos seres imensamente imperfeitos e interesseiros, pensamos muito mais em nossos prazeres e em satisfazer nossas vontades do que no coletivo, invejamos outras pessoas que acreditamos ser profissional de sucesso ou exitosa no relacionamento, almejamos valores de terceiros e desejamos coisas que não são nossas, não que queiramos extrair diretamente de outrem, mas desejamos que este produto, esta mercadoria ou até mesmo esta pessoa, esteja ao nosso lado no cotidiano. Num mundo muito centrado no eu, estamos sempre desejando algo de alguém, observamos seu sucesso e não percebemos seus esforços, adoraríamos ter seus recursos financeiros e desdenhamos da grande carga de trabalho e dedicação, queremos o que vemos e nos é aparente, mas esquecemos daquilo que está escondido, seus esforços, estudos e dedicações, desta forma nos tornamos seres infelizes e cada vez mais interesseiros e imediatistas.

A Doutrina dos Espíritos nos concede um grande manancial para construir uma nova experiência no corpo material, não podemos mais alegar ignorância como fizemos durante muitos séculos, a literatura disponível é vasta e de grande valor espiritual, desde romances passando por dissertações, desde contos passando por biografias, o acervo é variado e de grande valor moral, cabe a cada indivíduo se debruçar nestes conhecimentos e utilizá-los para sedimentar nossa caminhada, afinal estamos cheios de caminhos pedregosos e esburacados, o espiritismo nos abre um novo mundo e uma nova realidade, dando-nos novas experiências e valores mais consistentes.

Através de nossas imperfeições atraímos obsessores constantemente ao nosso lado, através de nossas fragilidades morais atraímos energias deletérias a todos os momentos, nos esquecemos que podemos buscar o equilíbrio e compreender as razões dos progressos dos seres humanos, desde que entendamos que todas as grandes conquistas exigem esforços e dedicações intensas e entregas verdadeiras, sem elas nossas conquistas são cada vez mais temporárias, frágeis e centradas em um reduzido mérito.

Assistimos a televisão e vemos todos os dias nas mais variadas mídias digitais o crescimento acelerado da violência, da corrupção e de crimes dos mais violentos possíveis, nos assustamos com a sociedade e perdemos nossa confiança nos seres humanos e nos esquecemos que vivemos num mundo atrasado, marcado por provas e expiações, onde estamos aqui para sublimar todos os desajustes que acumulamos em vidas e em momentos anteriores, sem superar tais dificuldades não conseguiremos encontrar uma felicidade mais intensa e verdadeira que está reservada para cada indivíduo, desde que passemos a procurar nos locais corretos, não nos prazeres da matéria, mas nos valores do espírito.

As reencarnações anteriores nos servem de baliza para nosso crescimento atual, quando acumulamos valores mais consistentes, valores espirituais, marcados por bons sentimentos e atos mais consistentes, somos assistidos por espíritos mais evoluídos e nos aproximamos de energias mais salutares que nos ajudam em nosso progresso, somos inspirados e aceitamos a inspiração dos espíritos superiores e rumamos a um desenvolvimento espiritual. Quando acumulamos valores mais materializados e deixamos os valores do espírito de lado, atrasamos nosso progresso espiritual e não sentimos as inspirações dos bons espíritos, mas daqueles que vibram no mesmo diapasão, com isso, retardamos nosso progresso e acrescentamos mais equívocos para outras vivências no mundo material.

Somos o que nós nos deixamos fazer conosco nas mais variadas encarnações que vivenciamos, nesta viagem passamos pelas mais variadas experiências, encarnamos em corpos femininos e depois em corpos masculinos e vice-versa, fomos ricos e pobres, passamos por experiências variadas, sentimos as dores do abandono e do desajuste material, vivemos em culturas de opressão e experimentamos momentos de liberdade, deixamos de lado nossos valores éticos e exercitamos nossos valores morais, tudo isso nos auxiliou a moldar nossos valores mais íntimos, somos hoje um misto de todas estas experiências no mundo material, a reencarnação é uma grande dádiva de Deus e em ela temos muita dificuldade de compreender a justiça divina, sem a reencarnação construímos um mundo baseado numa falsa meritocracia.

A evolução humana é demorada e exige grande dedicação, a razão existe no mundo a uns quarenta mil anos, como nos mostrou o espírito André Luiz, neste período reencarnamos entre 800 e mil vezes, nestas experiências acumulamos progressos em várias áreas, passamos a dominar novos conhecimentos e novas culturas, línguas e vivências. Neste emaranhado de encarnações nos tornamos únicos e individuais, mas criados e mantidos por um Deus maior, de amor, de misericórdia e de solidariedade, nestas experiências percebemos que somos seres humanos e para evoluir precisamos estar sempre próximos, um auxiliando o outro, com isso progredimos e impulsionamos o progresso de nossos semelhantes.

O médium mineiro Francisco Cândido Xavier, analisando a chamada transição planetária, destacou que o Planeta Terra se tornará um mundo de regeneração somente a partir de 2057, ou seja, depois de duzentos anos da codificação espírita. Neste momento vivemos um período de grandes inquietações, as transformações são intensas, rápidas e aceleradas, gerando desesperança e muito medo, neste momento percebemos que nosso planeta está recebendo entidades inferiores, agressivas e que se comprazem com o mal, com a dor e com a violência. Estas entidades estão saindo das catacumbas do umbral, são espíritos que não mais queriam reencarnar, são entidades que viveram durante muitos séculos em condições de indignidade e foram, compulsoriamente, escaladas para retornar ao mundo material, estão tendo mais uma chance de se libertar destes sentimentos degradados e se resistirem e continuarem cultivando intimamente estes valores serão degradados para mundos inferiores, estão tendo suas últimas chances de se libertar deste mal e desta ignorância que cultivaram durante séculos, o mundo não mais pode esperar por estas entidades para continuar sua trajetória de progresso e de desenvolvimento.

Muitas doutrinas religiosas não acreditam na reencarnação, o próprio catolicismo a aboliu de suas fileiras no século V, algumas correntes passaram a acreditar no dia do juízo final, noutros no sono eterno, acreditam que a vida é única e não retornamos mais a este mundo, o espiritismo rechaça fortemente estes valores e destaca a reencarnação como o instrumento mais consistente para entendermos a justiça divina, sem a reencarnação não conseguiríamos compreender as dores do mundo, as desigualdades crescentes, as doenças em curso em crianças em tenra idade, os pecados originais e os assassinatos sanguinários e violentos, as propensões e as inspirações do bem e do mal, sem reencarnação não conseguiríamos compreender os verdadeiros significados da vida.

Evoluímos dos dois lados da vida, na obra Memórias de um suicida, de Yvonne do Amaral Pereira, nos deparamos com a história do grande escritor português Camilo Cândido Botelho, na obra percebemos como o escritor posterga o retorno ao mundo material, permanecendo no mundo espiritual, por mais de quarenta anos, neste período Camilo se dedicou imensamente ao estudo, lendo, fazendo cursos, conversando com os sábios da espiritualidade, aprendendo sempre e, com isso, angariou as forças necessárias para seu retorno ao mundo material. O escritor sabia que para progredir espiritualmente precisava retornar a matéria, seus equívocos foram inúmeros e apenas com a experiência de uma nova encarnação poderia começar a reconstruir seu equilíbrio, embora tenha aprendido que o equilíbrio para o suicida demora muitos anos, segundo lhe informaram mais de duzentos anos.

Noutra obra de relevo, também nos deparamos com experiências de crescimento do espírito no mundo espiritual, na obra Missionários da Luz, de Francisco Cândido Xavier ditado pelo espírito de André Luiz, nos deparamos com a história de Segismundo, nela percebemos como o trabalho consciente e responsável pode auxiliar no progresso e no desenvolvimento do espírito, embora marcado por graves desequilíbrios e desajustes, o melhoramento de Segismundo foi verdadeiro e suas obras foram tão grandiosas que atraiu auxílio de espíritos de escol, como Bezerra de Menezes e o instrutor Alexandre, somente o trabalho remove de nossos escombros os mais severos equívocos e dificuldades, fazendo com que consigamos evoluir e adotar a máxima atribuído a Chico Xavier: Embora nenhum de nós possamos refazer os erros do passado, todos podemos começar novamente e fazer um novo final.

Perseguições invisíveis, agressividades e inimigos espirituais

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Vivemos em uma sociedade de grandes extremos, num mundo materializado onde o dinheiro e a posição social são instrumentos de classificação dos seres humanos, todos vivem num constante embate para a sobrevivência. O ambiente descrito parece comum a muitas pessoas, o que muitos não sabem é que este confronto não se dá apenas no mundo material, os embates entre os dois polos da vida são constantes e motivam grandes reflexões entre os indivíduos, estamos sendo testados constantemente e devemos nos preparar para não sermos conduzidos pelos inimigos espirituais desencarnados, que são responsáveis por estimular muitos confrontos e impulsionar mágoas e ressentimentos dos dois lados da vida.

O trabalho no bem sempre nos equilibra e nos abre espaço para o crescimento e para o desenvolvimento espiritual, mesmo sendo algo que nos faz muito bem e nos conforta, os espíritos ora inferiores atuam no sentido de desequilibrar e gerar constrangimentos para estes colaboradores da Doutrina Espírita, buscando com isso desestabilizá-los e criar maiores desajustes e constrangimentos, afastando-os das obras edificantes e mantendo-os na escuridão da ignorância, por vingança de disputas anteriores ou por prazer em vê-los desequilibrados e constrangidos.

A Doutrina Espírita nos mostra que estamos sendo testados todos os momentos por irmãos desencarnados, alguns desafetos declarados estão motivando sentimentos menores como forma de incrementar confrontos e estimular uma violência gratuita, gerando constrangimentos e desequilíbrios que, em muitos casos, se perpetuam por muitos séculos, gerando rancores, ressentimentos e desafetos em todos os planos da vida, em algumas obras de vulto da Doutrina Espírita percebemos perseguições que duram mais de duzentos anos, criando um enorme rastro de violência, lágrimas e destruições.

Nos grupos mediúnicos encontramos um exemplo claro destes desafetos, irmãos desencarnados que, por ora, se comprazem com o bem, usam de todos os artifícios e artimanhas para impedir os médiuns, os passistas e os doutrinadores de participar dos trabalhos, isto porque sabem que o trabalho em curso tende a dificultar a atuação destes irmãos no desajuste de seus desafetos. Como conhecem o pensamento espírita ou suas ferramentas mais imediatas, usam seus conhecimentos para afastar os trabalhadores da jornada do bem, adotam posturas desprezíveis, se utilizam de atitudes e comportamentos mesquinhos e usam os piores recursos para evitar os medianeiros de trabalharem no bem e no auxílio daqueles irmãos que sofrem em desespero e em desalinho com os ideais superiores de amor, de paz e de solidariedade.

Estes irmãos que vibram num diapasão inferior, que se comprazem com o mal e se mobilizam para impedir o progresso, conhecem a força e os sentimentos superiores dos discípulos de Jesus, reconhecem na Doutrina Espírita conceitos consistentes para melhorar a conduta dos seres humanos e, com isso, usam de todos os instrumentos que possuem para impedir a adesão de seus perseguidos em suas fileiras, temendo que as portas abertas do desequilíbrio sejam fechadas e a influência espiritual que possuem seja encerrada por completo.

Muitas pessoas acreditam que ser médium é um privilégio concedido a poucas pessoas, o que a maioria desconhece é que todos somos médiuns, como nos diz Allan Kardec em O Livro dos Médiuns: “Toda pessoa que sente a influência dos Espíritos, em qualquer grau de intensidade, é médium. Essa faculdade é inerente ao homem. Por isso mesmo não constitui privilégio e são raras as pessoas que não a possuem pelo menos em estado rudimentar. Pode-se dizer, pois, que todos são mais ou menos médiuns. Usualmente, porém, essa qualificação se aplica somente aos que possuem uma faculdade mediúnica bem caracterizada, que se traduz por efeitos patentes de certa intensidade, o que depende de uma organização mais ou menos sensitiva”. A mediunidade é algo inerente a todos os seres humanos, a diferença é a intensidade e as características desta mediunidade, uns são psicofônicos, outros psicógrafos, outros doutrinadores, outros oradores, alguns de efeitos físicos, dentre outros tipos…

A mediunidade auxilia no progresso dos indivíduos, deve ser vista como um instrumento para o crescimento espiritual e coletivo da humanidade, os médiuns apresentam uma grande sensibilidade e, com isso, devem auxiliar aqueles que necessitam de uma orientação espiritual, motivando-os ao estudo e a reflexão sistemáticas como forma de compreender o verdadeiro e real significado da vida, estimulando os indivíduos a cultivarem mais valores espirituais e menos valores materiais, como estamos vendo na sociedade contemporânea, onde as pessoas estão se perdendo no materialismo e no imediatismo e deixando de lado valores morais e espirituais, estes sim os verdadeiros valores da vida e do ser humano.

O médium atrai muitas energias negativas e necessita de vigilância constante, isto porque em muitos momentos acaba atraindo espíritos desequilibrados e muitas entidades que desconhecem sua verdadeira situação, irmãos desencarnados que desconhecesse a existência de vida pós-morte e se encontram perdidos, algo muito mais comum do que as pessoas imaginam. A mediunidade para ser bem desenvolvida precisa de estudo, cabe as pessoas dotadas desta sensibilidade uma busca constante por conhecimento, a leitura da obra de Allan Kardec é imprescindível, o pentateuco espírita (O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Céu e o Inferno, A Gênese e O Evangelho segundo o Espiritismo) serve como uma bússola para a compreensão das realidades da vida.

Encontramos muitos espíritos que se comprazem com o mal, se desdobrando para evitar os trabalhos dos médiuns encarnados, entidades que sentem prazer no mal e no desequilíbrio se unem para gerar transtornos e constrangimentos para os médiuns que, segundo eles, ousam trabalhar para difundir os ideais trazidos para humanidade por Jesus Cristo. Estes irmãos se utilizam de sua invisibilidade para criar dificuldades e desviar estes trabalhos, estimulando caminhos alternativos e afastando-os das obras do bem, sentem prazer com as quedas e trabalham incessantemente para que as casas espíritas sejam fechadas e os ideais da Doutrina dos Espíritos sejam colocados de lado ou esquecidos.

Muitas pessoas sentem este ataque das entidades inferiores quando começam a frequentar a casa espírita, estes irmãos se organizam para que se atrasem aos trabalhos, estimulam seus melindres mais íntimos e buscam criar constrangimentos no cotidiano para que se afastem do trabalho, temem que as atividades no bem transformem estes irmãos e estes passem a ter controle e autonomia sobre suas vidas e suas escolhas mais íntimas e pessoais.

Os médiuns que se encorajam a trabalhar para o bem e para o crescimento do amor e da solidariedade, percebem que, com isso, se transformam em alvos dos irmãos que vibram no diapasão dos desajustes, sendo por eles perseguidos constantemente, onde são estudados intimamente para perceber seus desequilíbrios e, num segundo momento, atuar diretamente para inviabilizar seu trabalho, afastando-os das atividades do bem e transformando-os em motivos de escárnio e de desventuras. Na sociedade contemporânea encontramos inúmeros casos de médiuns dotados de grandes capacidades mediúnicas que se deixam levar por sentimentos menos dignos que trazem intimamente, estes sentimentos estão em suas entranhas mais íntimas e os espíritos inferiores buscam nestas entranhas estimular para que estes desequilíbrios gerem constrangimentos maiores para o médium e que, com isso, atinja a doutrina e fragilize seus ideais mais sinceros de amor e de solidariedade.

Nas reuniões mediúnicas encontramos espíritos inferiores agressivos, que ameaçam os trabalhadores da casa, se acreditam dotados de um poder sobrenatural, ofendendo e querendo agredir fisicamente, mas são contidos pelos mentores da casa, estes irmãos insatisfeitos com sua condição ameaçam até mesmo os familiares dos médiuns, seus filhos e parentes mais próximos, mostrando-nos, com isso, como a atuação do médium na casa espírita deve vir acompanhada de seus familiares, criando um conjunto de energias salutares para evitar a influência das entidades inferiores que se comprazem com o mal, o rancor e o ressentimento.

Neste embate constante entre forças dos dois lados da vida, é importante destacar, que os trabalhadores da seara do bem estão sempre muito bem protegidos pelos seus guias e simpatizantes, que se utilizam das forças do bem para proteger e perpetuar os trabalhos para que os valores do Cristo sejam eternos e sempre vencedores. Numa situação de embates constantes, cabem aos médiuns trabalhadores da seara do bem, a perseverança e o trabalho constante, além disso, um forte controle sobre seus pensamentos e o cultivo de hábitos simples e saudáveis, visando á fragilização dos irmãos que ora se comprazem com o mal e o fortalecimento dos ideais propostos e estimulados pelos prepostos do Cristo.

Quando estamos em momentos de invigilância, fragilizados e descuidados, abrimos nosso campo mental para a atração destas entidades inferiores, oferecendo campo as mentes desequilibradas que se acercarão de nós e, encontrando desguarnecidas as nossas defesas, terão possibilidades concretas de conseguir o nosso afastamento e de se regozijarem com a nossa queda. Como disse o espírito Emmanuel, mentor espiritual de Francisco Cândido Xavier, quando foram apresentados, e o primeiro lhe mostrou as credenciais necessárias para o trabalho sob as hostes de Jesus Cristo, enfatizando que para este trabalho eram necessários “Disciplina, disciplina e disciplina”.

            Os obsessores se utilizam de métodos conhecidos pelos espíritas, mas mesmo assim, muitos sucumbem a sua atuação e se rendem ao trabalho de desagregação do trabalho espiritual, dentre os métodos podemos destacar a ideia do comodismo para afastar as pessoas das reuniões, gerando argumentos tais como “as reuniões são boas, mas hoje não vou porque trabalhei muito”, “eu já produzi muito nas reuniões, por isso faltar hoje não faz mal” ou “eu sou muito assíduo, todo mundo falta menos eu”, todos estes argumentos são estimulados pelos espíritos inferiores para que os trabalhadores se afastem dos trabalhos, faltando numa semana e depois se ausentando na outra, quando vai ver o trabalhador acaba abandonando as atividades, alegrando os obsessores e deixando de trabalhar seu instrumento mediúnico, gerando constrangimentos individuais e coletivos.

Os perseguidores espirituais são astutos e inteligentes, se utilizam de sua capacidade reflexiva para fragilizar os trabalhadores do bem, estudam suas limitações e incutem em suas mentes pensamentos de perseguição, incrementando seus melindres e disseminando a desconfiança, com o intuito de fragilizar o trabalho e reverter uma luz que hora se acende para o esclarecimento, o equilíbrio e o fortalecimento dos ideais da espiritualidade maior.

Os espíritos esclarecidos não cansam de nos estimular para o bem, todos os momentos possíveis estão tentando nos alertar, reiterando a cada dia os apelos à nossa reforma íntima. Como nos diz Suely Caldas Schubert, na obra Obsessão e Desobsessão, “A maioria de nós ainda somos bastante teóricos, sabendo de cor e salteado páginas, citações, livros, mas pouco conseguindo vivenciar os ensinamentos adquiridos”.

O trabalho mediúnico desenvolvido com os verdadeiros ideais de Jesus Cristo nos auxilia no desenvolvimento e no crescimento espirituais, este instrumento não nos foi dado para que guardemos numa gaveta e olhemos para a janela e enxerguemos as dores alheias, na verdade são instrumentos de progresso e crescimento da humanidade, o amor e o saber devem andar juntos e de forma concomitante. Como nos disse o médium mineiro Francisco Cândido Xavier: “Quem sabe pode muito, mas quem ama pode mais”.

  As raízes do sofrimento humano

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Vivemos em uma sociedade marcada por muitos medos, dores e sofrimentos, os espíritos superiores nos mostram, constantemente, como estas dores estão crescendo e os seres humanos estão, cada vez mais, perdidos e atordoados, gerando um mundo marcado por ambiente degradantes, caracterizados por energias densas e desagradáveis, levando pessoas a cultivarem ideias de suicídio, incrementando a depressão, a ansiedade e a desesperança. Neste mundo de transformações aceleradas, o medo está dominando os corações e a esperança de um futuro melhor está diminuindo rapidamente.

Nesta sociedade centrada na concorrência e na competição, os indivíduos estão preocupados com sua sobrevivência cotidiana, se entregam ao trabalho e transformam suas vidas em uma constante busca por dinheiro e retornos monetários, mergulhando em um trabalho cada vez mais agressivo, que toma grande parte da vida das pessoas, restringindo os seres humanos a um verdadeiro sobreviver via trabalho, emprego, qualificação e capacitação constantes, deixando valores mais consistentes de lado, como família, amores e religião.

São inúmeras as preocupações para o indivíduo do século XXI, que o ser humano está deixando de lado seus valores mais consistentes, muitos destes valores vem sendo construídos pela coletividade a alguns séculos, datam do período conhecido como Iluminismo, como tolerância, liberdade, respeito e companheirismo, com isso, estamos vivendo uma sociedade onde as pessoas estão amedrontadas, o trabalho está gerando traumas intensos, os relacionamentos estão gerando frustrações e as famílias não mais conseguem suportar os dramas humanos, neste mundo de competição o dinheiro ganha relevância, promete satisfação, alegrias incomensuráveis e entrega desolação, solidão e frustrações.

Neste turbilhão de informações e tecnologias que surgem todos os dias, estamos ficando cada vez mais individualistas, estamos sempre nos deixando levar pelo imediatismo e pelos prazeres do agora, com isso, estamos perdendo a capacidade de colaborar e de cooperar, como nos diz o historiador israelense Yuval Harari: “Nós humanos somos os únicos mamíferos que conseguem cooperar em grandes quantidades. Coloque 10 mil chipanzés em um estádio e você tem o caos total”.

A Doutrina dos Espíritos nos mostra, que vivemos numa sociedade onde nos encontramos todos os momentos com entidades espirituais, irmãos que passaram do mundo material para o mundo espiritual, estes espíritos nos influenciam muito mais do que imaginamos, muitos pensamentos que cultivamos e acreditamos serem nossos, na verdade são inspirações que nos são trazidas por irmãos de outros planos da vida. Num momento como o que estamos vivendo, marcados por grandes inquietações, conflitos generalizados, medos e desesperanças, além de uma época de grande degradação do meio ambiente, as energias que circundam o Planeta Terra tendem a ser negativas e degradantes, com isso, cultivar bons pensamentos, boas leituras e estimular sentimentos saudáveis nos auxiliam e nos servem como uma vacina para os males da contemporaneidade.

Nesta atual situação da sociedade mundial, muitos irmãos do mundo espiritual, espíritos abnegados que se esforçam para que as ideias de Jesus Cristo sejam difundidas e possam contribuir para o crescimento espiritual da sociedade, estão preocupados e receosos do crescimento deste negativismo e desesperança. Estas entidades acreditam, que o mundo contemporâneo está passando por momentos de fortes transformações, mesmo percebendo o crescimento de constrangimentos na coletividade, estes acreditam que são momentos passageiros de uma mudança estrutural, onde os ganhos futuros serão maiores e mais consistentes para o planeta, mas para que isto se efetive, faz-se necessário que o ser humano compreenda a situação que passa a humanidade, um momento de transição e reequilíbrio, onde os valores devem passar por grandes transformações, a tecnologia está mudando o ser humano, mas os valores espirituais devem prevalecer, muitos dos desequilíbrios e dos sofrimentos humanos estão centrados na ausência de Deus, a tecnologia e os valores monetários e materiais estão levando os indivíduos a se afastarem do essencial, dos valores mais consistentes que nos foram dados pelo Criador.

Os sofrimentos estão atrelados aos excessos, tudo que é excessivo nos prende e nos limita em nossas potencialidades. Na sociedade contemporânea os prazeres materiais são dominantes, somos direcionados e estimulados por programas de computadores e algoritmos que nos conhecem muito mais das nossas vidas do que nós mesmos. Evitamos o famoso conheça-se a ti mesmo porque este conhecer nos leva a uma reflexão que pode nos assustar, neste autoconhecimento podemos nos preocupar com as descobertas, levando-nos a comportamentos assustadores que podem nos afastar dos padrões de normalidade de uma sociedade que atribui valores aos indivíduos que mais acumulam recursos financeiros.

Os sofrimentos humanos são fruto de nossas escolhas e de nossas trajetórias, antigamente podíamos alegar ignorância e desconhecimento, na atualidade este desconhecimento é algo que não podemos mais aceitar, os conhecimentos estão em todos os lugares, nas telas dos computadores, nas mais variadas mídias digitais e nos templos religiosos e nas casas espíritas, precisamos apenas aceitar nossas escolhas e entender que somos na atualidade aquilo que fizemos de nossa vida em momentos anteriores e que seremos no futuro aquilo que plantarmos no momento atual, quem planta degradação, orgulho e ressentimento, em momento algum colherá tolerância e solidariedade.

Nas reuniões mediúnicas, as entidades elevadas nos mostram os desajustes dos seres humanos, pedem oração e conduta serena, nos orientam em nossas escolhas e nos mostram as degradações do mundo, as lutas fratricidas e as ambições que cegam os seres humanos e os aproximam dos animais mais cruéis e desumanos da sociedade, estas imagens são reais e verdadeiras e nos influenciam muito mais do que imaginamos em nosso cotidiano.

Pesquisas recentes feitas no Brasil nos mostram que, para 78% da população, o trabalho ou a falta dele são responsáveis por doença e sofrimento, o trabalho que deveria ser fonte de regozijo e crescimento pessoal, passou a ser um grande gerador de desajuste e desequilíbrio, a carga excessiva, as cobranças crescentes, as metas impossíveis de atingir, os baixos salários, os medos de demissão e as grosserias dos gestores, todas estas questões somadas estão contribuindo para que o cenário profissional se transforme num grande gerador de mágoas e degradação.

Neste cenário de tantas transformações estruturais, os indivíduos estão esquecendo os ensinamentos deixados pelo Mestre de Nazaré, todas as suas mensagens estão sendo lidas e estão emocionando os indivíduos mas, ao mesmo tempo, não estão gerando as transformações que o mundo requer, as pessoas leem, mas não compreendem, as pessoas frequentam os cultos religiosos, mas não deixam seus ensinamentos adentrar seus corações, as pessoas conversam sobre assuntos engrandecedores, mas se negam a sua transformação pessoal, as resistências dos seres humanos são imensas e, com isso, perpetuam as lágrimas, muitas delas escondidas, e os rancores e ressentimentos, energias que corroem e maltratam as pessoas e geram sentimentos inferiores que se apoderam dos mais incautos e imediatistas.

Muitos indivíduos acreditam que suas dificuldades são oriundas de outras existências, aceitam seus equívocos e limitações e acreditam que não vão conseguir, pelo menos nesta encarnação, encontrar um outro caminho e deixar para trás os transtornos identificados. Alguns acreditam na reencarnação, se dizem adeptos da Doutrina dos Espíritos e acreditam que podem deixar seus dramas para uma outra oportunidade de retorno ao corpo físico, o grande problema deste raciocínio é que, com a redução das famílias no mundo contemporâneo, muitos espíritos teriam que aguardar uma nova oportunidade, coisa que nem sempre acontecerá facilmente, neste ínterim o espírito ao se conscientizar do equívoco cometido se arrependerá de não ter encarado seus problemas mais diretamente.

Seguindo este pensamento, muitas pessoas atribuem suas dificuldades a outras vidas e outras experiências físicas, acreditam que muitas de seus dramas, conflitos ou ressentimentos são originários de outras vivências, com isso se esquecem que a maior parte dos nossos desequilíbrios são construídos nesta vida material e devem ser resolvidos agora, evitando um retorno com as mesmas marcas que nos constrangem na atualidade. Muitos rancores acumulados em relacionamentos tóxicos, muitos conflitos familiares, muitos ressentimentos em amizades degradantes e muitos dramas pessoais são aumentados e acabam gerando problemas muito maiores, levando muitas pessoas a transtornos variados, atraindo uma gleba de entidades espirituais que vibram no mesmo diapasão, estes irmãos acabam aumentando os seus dramas e transformando pequenos contratempos em desequilíbrios acentuados que são levados por muitas encarnações, prendendo ambos os espíritos num espiral de desajustes e ressentimentos.

A preocupação dos espíritos superiores com o Planeta Terra é intensa e verdadeira, estas entidades percorrem todos os cantos do globo terrestre e percebem os dramas individuais e coletivos aumentarem de forma exponencial, países em crises constantes, irmãos se agredindo, famílias sendo destruídas com requintes de crueldade, governos conspirando contra sua população, indivíduos gananciosos planejando novos saques e pilhagens materiais, neste ambiente marcado por desequilíbrios individuais e coletivos, deslealdade e desavenças, onde as energias dominantes são deverás degradantes, os irmãos que ora se comprazem com o mal, o rancor e o ressentimento se locupletam fortemente e percebem que seus caminhos de degradação estão abertos, influenciando os irmãos mais incautos e desprotegidos, transformando-os em verdadeiras marionetes, seres humanos manipuláveis e controlados, cujas energias são fragilizadas e seus sentimentos ignorados, uma obsessão que se transforma rapidamente em possessão, aumentando os dramas pessoais e coletivos da humanidade.

Vivemos um momento de grandes inquietações, um momento de transição e grandes transformações, todas as estruturas estão sendo destruídas e reconstruídas, neste momento muitos dos dramas individuais e constrangimentos coletivos estão vindo a tona e perturbando os seres humanos, que num gesto tresloucado se afastam de Deus e das filosofias saudáveis e buscam crenças e religiões mais materializadas, muitas delas cheias de rituais, muitas destas buscas servem para uma convenção social e não se transformando em um espaço de reflexão e crescimento espirituais, com isso, percebemos um ser humano cada vez mais perdido e insatisfeito, com seus dramas íntimos aumentados e suas esperanças reduzidas, está na hora deste ser que se diz racional se voltar para suas origens espirituais, buscando Deus e construindo em locais sólidos e consistentes, deixando de lado valores transitórios e cultivando os verdadeiros valores espirituais, está na hora do reencontro do indivíduo com seu Deus, este sim tem potencial de elevação, equilíbrio e desenvolvimento moral e espiritual. Sem este reencontro, o ser humano continuará buscando as origens do seu sofrimento em outras pessoas e se desviará de compreender que a verdadeira origem de seus males e de seus sofrimentos estão em suas decisões equivocadas e em suas ambições desmesuradas e desequilibradas.

“O diagnóstico de Guedes sobre o Estado não se sustenta”, segundo Oreiro.

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IHU – 11/11/2019

 O Plano mais Brasil, um novo pacote econômico enviado pelo governo ao Congresso Nacional na semana passada, que inclui três Propostas de Emenda Constitucional – PECs – a PEC do Pacto Federativo, a PEC dos Fundos Públicos e a PEC Emergencial –, é fundamentado na ideia geral de que “para recuperar o crescimento da economia brasileira de forma mais sustentável, tem que diminuir o tamanho do Estado”, diz o economista José Luis Oreiro à IHU On-Line, na entrevista a seguir, concedida por telefone. Segundo ele, com este pacote o governo diz à sociedade que “é possível reduzir o volume de serviços que o Estado brasileiro presta à população”.

Para o economista, um exemplo concreto de que o governo quer reduzir a participação do Estado nos investimentos sociais se manifesta nas propostas de desindexação, desvinculação e desobrigação dos gastos sociais. “No fundo, Guedes quer acabar com a distinção entre despesa obrigatória e despesa discricionária desindexar as despesas públicas, porque muitas delas são indexadas à avaliação da inflação, como era o caso do salário mínimo”, afirma. Com uma possível desindexação do salário mínimo à inflação, argumenta, “corre-se o risco de ter uma situação na qual uma parte significativa dos benefícios previdenciários e de assistência social no Brasil não seja corrigida nem mesmo pela inflação. Isso, obviamente, vai aumentar a desigualdade de renda e a pobreza”.

Apesar de o governo argumentar que a PEC do Pacto Federativo possibilitará maior flexibilização aos gestores dos entes federativos em como administrar os recursos com saúde e educação, o economista pontua que “deixar isso a critério do político de plantão” não é “correto”. De outro lado, ele admite a possibilidade de “discutir se as atuais alíquotas para saúde e educação são as adequadas. “O Brasil está passando por um processo de envelhecimento, e quando a população envelhece, a proporção de velhos aumenta e a proporção de jovens diminui. Desse modo, é razoável que em algum momento tenha que se ajustar a vinculação de gastos em saúde e educação a fim de reduzir a alíquota para a educação e aumentar para a saúde, porque basicamente quem tem problema de saúde são os velhos e quem precisa de educação são os jovens. Mas se, de fato, estamos vivendo uma transição demográfica em que o percentual de jovens vai diminuir nos próximos 20 anos, então é razoável que se ajustem os percentuais de receitas aplicados à saúde e à educação”, pondera.

Entre os poucos pontos positivos do pacote econômico, Oreiro cita a proposta da PEC dos Fundos Públicos de usar o dinheiro de alguns fundos para abater a dívida pública. “Existem 220 bilhões de reais parados em 281 fundos públicos no Brasil. Seria interessante fazer um mapeamento desses fundos e ver quantos de fato não têm razão de ser e podem ser extintos para usar o dinheiro para abater a dívida pública. Essa é uma ideia bastante razoável”, destaca.

José Luís Oreiro possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, mestrado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio e doutorado em Economia da Indústria e da Tecnologia pela UFRJ. Atualmente é professor adjunto do Departamento de Economia da Universidade de Brasília.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – O pacote econômico apresentado pelo ministro Paulo Guedes inclui três PECs – PEC do Pacto Federativo, PEC dos Fundos Públicos e PEC Emergencial – e é considerado a maior reforma dos últimos 30 anos. Quais são as diretrizes, linhas gerais, que fundamentam o pacote econômico do governo?

José Luis Oreiro – O fundamento, ou seja, o que está na cabeça do Paulo Guedes é que, para recuperar o crescimento da economia brasileira de forma mais sustentável, tem que diminuir o tamanho do Estado. Esse é o fundamento mais geral e ele já vinha falando isso há muitos anos em artigos que escrevia no jornal O Globo. Para ele, o modelo social-democrata adotado no Brasil durante os governos FHC e Lula havia levado o país a uma armadilha de baixo crescimento e, portanto, só seria possível voltar a ter um crescimento elevado se retirasse o Estado. Esse fundamento mais geral se desdobra em algumas outras hipóteses.

Na argumentação do Guedes está implícita uma visão muito antiga em economia, que foi descartada pelo Keynes em 1936, quando ele escreveu “A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda”, que se chama a visão do Tesouro. Essa era a visão do Tesouro inglês no final da década de 1920 e início da década de 1930 sobre a possibilidade de usar o investimento público para tirar a economia britânica da grande depressão de 1929. Segundo a visão do Tesouro, toda vez que o governo aumentasse o seu investimento, isso iria reduzir na mesma magnitude e instantaneamente o investimento privado. Então, teria um efeito de deslocamento que faria com que, quando o governo aumentasse o investimento público, o investimento privado incidiria na mesma magnitude. Guedes tem este modelo na cabeça: ele acha que para aumentar o investimento privado, tem que reduzir o gasto público e é isso que está embasando, em termos mais gerais, a proposta dele.

IHU On-Line – O diagnóstico dele é correto ou não para enfrentar a atual situação econômica do país?

José Luis Oreiro – É completamente equivocado e ultrapassado. Primeiro, porque essa visão do Tesouro mostrou que, a não ser em casos excepcionais em que a economia está operando com pleno emprego da força de trabalho, o efeito de deslocamento, se ele existe, não é completo. O mesmo ocorre quando a economia está operando muito abaixo do pleno emprego, como é o caso da economia brasileira agora, que está operando com um hiato do produto de 5% – ou seja, o PIB está 5% abaixo do potencial. Temos um desemprego em sentido amplo, que envolve não só os que não estão trabalhando, mas aqueles que deixaram de procurar trabalho porque já desistiram e as pessoas que gostariam de trabalhar mais horas – isso representa aproximadamente 25% da força de trabalho. O Brasil está operando muito abaixo da força de trabalho e tem todo um espaço para estimular a economia por intermédio de investimento público. Esse diagnóstico de que o crescimento da economia é baixo porque o Estado está inchado, que é o argumento do Guedes, não se sustenta.

Numa das transparências (slides) da apresentação dele, que se chama “máquina que gasta muito”, ele fez uma conta de que em 2018 o governo brasileiro, nas suas três esferas, estaria gastando 49,2% do PIB. Mas essa conta está errada. O economista Sérgio Gobetti do Ipea, já mostrou que nessa conta existe um erro de dupla contagem por conta dos funcionários inativos da União, que são contabilizados duas vezes.

Outro erro é que adiciona os saques do FGTS como se fossem despesa pública e, além disso, considera os juros brutos e não os juros líquidos da dívida pública, pois o governo tem um determinado volume de dinheiro em caixa que também recebe juros. Então, ao serem feitas essas correções, a despesa cai para 41% do PIB, ou seja, um número muito menor do que aquele que o Paulo Guedes está mostrando. A justificativa que o Guedes apresenta para o seu plano emergencial é feita em cima de dados incorretos, ou seja, é aquilo que podemos chamar de contabilidade criativa.

IHU On-Line – As PECs propostas pelo governo indicam, de fato, uma redução da atuação do Estado? Pode nos dar alguns exemplos de como a proposta de redução do Estado se manifesta nessas propostas?

José Luis Oreiro – O primeiro exemplo são os “três Ds”: desindexaçãodesvinculação e desobrigação. No fundo, Guedes quer acabar com a distinção entre despesa obrigatória e despesa discricionária e desindexar as despesas públicas, porque muitas delas são indexadas à avaliação da inflação, como era o caso do salário mínimo – está na Constituição que ele tem que ser reajustado pelo menos pela inflação e existiu uma regra nos governos Lula e Dilma em que ele era reajustado segundo a inflação do ano anterior mais o crescimento do PIB de dois anos antes. O salário mínimo, por sua vez, indexa as despesas previdenciárias, ou seja, nenhum benefício previdenciário pode ser menor do que o salário mínimo. Então, ao desindexar o salário mínimo – e esse é um exemplo concreto do que pode acontecer caso a PEC seja aprovada, o que acho pouco provável –, corre-se o risco de ter uma situação na qual uma parte significativa dos benefícios previdenciários e de assistência social no Brasil não seja corrigida nem mesmo pela inflação. Isso, obviamente, vai aumentar a desigualdade de renda e a pobreza.

desvinculação é retirar a obrigatoriedade dos entes federativos de aplicarem até “x”% das suas receitas em saúde e educação. Isso também é algo que vai no sentido de reduzir o tamanho do Estado. No fundo, o que essas PECs estão querendo fazer é reduzir a dívida pública, dando calote não nos credores, mas em parte da sociedade, porque as PECs preveem, entre outras coisas, uma redução de até 25% do salário dos servidores públicos, permitem a desindexação de benefícios previdenciários e de assistência social à inflação. No fundo, é um pacote desenhado para atender aos interesses dos rentistas do Brasil. O governo vai sacrificar uma parte expressiva da população para garantir o pagamento de juros e das amortizações da dívida pública.

IHU On-Line – Especificamente sobre a fusão dos gastos obrigatórios com saúde e educação, tanto o governo quanto aqueles que são favoráveis à mudança afirmam que ela vai permitir uma maior flexibilidade para que os gestores possam utilizar esses recursos de acordo com as necessidades de cada estado ou município. Quais são suas ponderações sobre esse argumento?

José Luis Oreiro – Existe uma razão de ser dessas vinculações: por pior que sejam os serviços de educação e saúde no Brasil, eles são universais. Essa foi a maneira encontrada para transformar essas políticas em políticas de Estado e para não depender do político de plantão do momento. Até acho que é possível discutir se as alíquotas de saúde e educação são as adequadas. Dou um exemplo: o Brasil está passando por um processo de envelhecimento, e quando a população envelhece, a proporção de velhos aumenta e a proporção de jovens diminui. Desse modo, é razoável que em algum momento tenha que se ajustar a vinculação de gastos em saúde e educação a fim de reduzir a alíquota para a educação e aumentar para a saúde, porque basicamente quem tem problema de saúde são os velhos e quem precisa de educação são os jovens. Mas se, de fato, estamos vivendo uma transição demográfica em que o percentual de jovens vai diminuir nos próximos 20 anos, então é razoável que se ajustem os percentuais de receitas aplicados à saúde e à educação. Agora, deixar isso a critério do político de plantão, não acho correto.

IHU On-Line – Outro ponto que tem sido defendido pelo governo e por aqueles que são favoráveis ao pacote econômico é que ele permitirá o equilíbrio fiscal. Do ponto de vista fiscal, o pacote se sustenta ou não?

José Luis Oreiro – Do ponto de vista fiscal, estão adotando mais do mesmo. A ideia implícita de ajuste fiscal que vem desde o Joaquim Levy, passando pelo governo Temer e agora pelo governo Bolsonaro é que, para crescer, primeiro tem que cortar gastos. Primeiro, o Levy cortou pesadamente os gastos em investimentos e com isso aprofundou a recessão de 2014. Em 2016, o governo colocou o Teto dos Gastos que todo mundo sabia que era insustentável por conta dos gastos previdenciários que ainda vão crescer durante um tempo a 3% ao ano em termos reais. Em algum momento, isso levaria não só à necessidade da reforma da previdência, que acabou acontecendo, mas também à discussão sobre os gastos obrigatórios, particularmente os gastos com o funcionalismo público. Então, o que a PEC vai fazer é aprofundar esse modelo de ajuste fiscal, o qual vai aprofundar a crise, porque quando se cortam gastos se gera uma redução do PIB e isso ocasiona uma redução da arrecadação tributária. É como dar um tiro no próprio pé. Este modelo está equivocado.

Ajuste pela receita

Deveríamos pensar num ajuste fiscal que viesse pelo lado da receita: cobrar impostos dos mais ricos, particularmente, impostos de lucros e dividendos distribuídos, fazer uma reforma tributária que diminuísse o peso dos impostos indiretos e aumentasse o peso dos impostos diretos e sobre propriedade. No Brasil, os impostos sobre propriedade arrecadados pelos municípios são muito baixos. Em Brasília, onde estou morando, pago mais de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA do que de Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU, o que é um absurdo, porque o imóvel vale seis, sete vezes mais do que o valor do automóvel. Então, tem um espaço para municípios arrecadarem mais, aumentando o IPTU e o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR. Essa é a discussão que está sendo feita na Europa. Enquanto lá se discutem políticas via reformas tributárias para diminuir a desigualdade por meio da distribuição de renda, aqui estamos querendo desvincular gastos com saúde e educação, cortar os salários do funcionalismo público, como se o percentual do PIB no Brasil gasto com funcionalismo público fosse muito alto; não é.

Chile, por exemplo, gasta como proporção do PIB mais do que o Brasil: 4,7% do PIB, enquanto no Brasil é 4,5%. Nos EUA são gastos 10% do PIB com funcionalismo público. Então, existe um mito de que há um descontrole das contas públicas porque se gasta com funcionalismo público. Isso não é verdade. O descontrole das contas públicas se deu basicamente por causa da queda de receita tributária decorrente da crise de 2014 e 2016 e das desonerações feitas pela dona Dilma em 2012 e 2013.

IHU On-Line – Algum ponto do pacote pode ser positivo para o país?

José Luis Oreiro – Talvez a proposta dos fundos seja interessante, porque tem muito dinheiro parado em fundos, que não estão sendo utilizados. Outra coisa que achei interessante no pacote é o controle das isenções fiscais e subsídios. Não sou contra a desoneração tributária, mas isso tem que ser feito de forma muito criteriosa com base na análise de custo benefício, coisa que não foi feita, diga-se de passagem.

Sobre a PEC dos fundos públicos, segundo a apresentação do ministro, existem 220 bilhões de reais parados em 281 fundos públicos no Brasil. Seria interessante fazer um mapeamento desses fundos e ver quantos de fato não têm razão de ser e podem ser extintos para usar o dinheiro para abater a dívida pública. Essa é uma ideia bastante razoável. Mas aí não se trata de passar a régua e acabar com todos os fundos; tem que olhar caso a caso.

IHU On-Line – Tem algum outro ponto das PECs que precisaria ser reconsiderado, na sua avaliação?

José Luis Oreiro – A ideia de fazer um ajuste emergencial cortando salário dos servidores e serviços é uma maluquice do ponto de vista econômico e social. Do ponto de vista econômico, porque torna a política fiscal ainda mais pró-cíclica. Uma política fiscal pró-cíclica é aquela que vai na mesma direção do ciclo econômico: quando a economia entra em recessão, o governo arrecada menos e então ele pode reduzir os gastos com o funcionalismo em até 25%, o que vai reforçar a queda do produto em função da queda de demanda. Esse é um argumento econômico.

O argumento social é que se o governo vai reduzir o salário do servidor público, reduzindo jornada de trabalho, então o que ele vai fazer, por exemplo, com os professores? Vai reduzir a jornada de trabalho dos professores e eles vão dar menos aulas? Se é assim, então vai ter que haver menos alunos. Vai reduzir a jornada de trabalho dos médicos? Se reduzir a jornada dos médicos, terá que haver menos atendimentos médicos para a população. Vai reduzir a jornada de trabalho dos militares? O que vai se fazer com o Exército? As Forças Armadas deveriam ser, em termos dos servidores da União, aproximadamente 40% dos servidores. O governo vai reduzir em até 25% os salários dos militares, juízes, promotores? No fundo, o governo está dizendo que pode reduzir os serviços que o Estado presta à população. É isto que está nesta PEC: a ideia de que é possível reduzir o volume de serviços que o Estado brasileiro presta à população. Isso não faz o menor sentido.

 

 

O fim do Neoliberalismo e o nascimento da História, por Joseph Stiglitz.

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O declínio simultâneo da confiança no neoliberalismo e na democracia não é coincidência ou uma mera correlação. O neoliberalismo prejudica a democracia há 40 anos.

Jornal GGN

NOVA IORQUE – No final da Guerra Fria, o cientista político Francis Fukuyama escreveu um famoso ensaio chamado “The End of History?”. Ele argumentou que a queda do comunismo eliminaria o último obstáculo que separava o mundo inteiro do seu destino de democracia liberal e economia de mercado. Muita gente concordou.

Hoje, à medida que enfrentamos uma retirada da ordem global liberal baseada em regras, com governantes autocráticos e demagogos à frente de países que contêm bem mais da metade da população do mundo, a ideia de Fukuyama parece peculiar e ingénua. Mas reforçou a doutrina económica neoliberal que prevaleceu nos últimos 40 anos.

A credibilidade da fé do neoliberalismo em mercados desenfreados como sendo o caminho mais seguro para a prosperidade partilhada está na unidade dos cuidados intensivos nos dias de hoje. E com razão. O declínio simultâneo da confiança no neoliberalismo e na democracia não é coincidência ou uma mera correlação. O neoliberalismo prejudica a democracia há 40 anos.

A forma de globalização prescrita pelo neoliberalismo deixou indivíduos e sociedades inteiras incapazes de controlar uma parte importante de seu próprio destino, tal como Dani Rodrik da Universidade de Harvard explicou de forma tão clara e tal como afirmo nos meus recentes livros Globalization and Its Discontents Revisited People, Power, and Profits. Os efeitos da liberalização do mercado de capitais foram particularmente odiosos: se o principal candidato à presidência num mercado emergente “perdesse a graça” em Wall Street, os bancos retirariam o seu dinheiro do país. Os eleitores enfrentavam então uma escolha dolorosa: ceder a Wall Street ou enfrentar uma grave crise financeira. Era como se Wall Street tivesse mais poder político do que os cidadãos do país.

Mesmo nos países ricos, era dito aos cidadãos comuns: “Vocês não podem defender as políticas que desejam” – fosse ela a proteção social adequada, os salários decentes, a tributação progressiva ou um sistema financeiro bem regulamentado – “porque o país perderá competitividade, os empregos desaparecerão e vocês sofrerão”.

Tanto nos países ricos como nos pobres, as elites prometeram que as políticas neoliberais levariam a um crescimento económico mais rápido e que os benefícios iriam ser repartidos para que todos, inclusive os mais pobres, ficassem em melhor situação. Para se chegar a esse patamar, os trabalhadores teriam, contudo, de aceitar salários mais baixos e todos os cidadãos teriam de aceitar cortes em importantes programas governamentais.

As elites alegaram que as suas promessas eram baseadas em modelos económicos científicos e na “investigação com base em provas”. Bem, após 40 anos, os números estão aí: o crescimento diminuiu e os frutos desse crescimento foram na sua esmagadora maioria para um punhado que está no topo. À medida que os salários estagnavam e o mercado de ações subia, o rendimento e a riqueza espalhavam-se para os mais ricos, em vez de se espalharem para os mais pobres.

Como é que a restrição salarial – para alcançar ou manter a competitividade – e a redução dos programas governamentais podem resultar em padrões de vida mais elevados? Os cidadãos comuns sentiram como se lhes tivessem vendido uma lista de artigos. Estavam certos em sentirem-se enganados.

Agora estamos a enfrentar as consequências políticas deste grande artifício: desconfiança das elites, da “ciência” económica em que se baseava o neoliberalismo e do sistema político corrompido pelo dinheiro que tornou tudo isso possível.

A verdade é que, apesar do nome, a era do neoliberalismo estava longe de ser liberal. Impôs uma ortodoxia intelectual cujos guardiães eram totalmente intolerantes à dissidência. Os economistas com perspetivas heterodoxas eram tratados como hereges a ser evitados ou, na melhor das hipóteses, desviados para algumas instituições isoladas. O neoliberalismo continha poucas semelhanças com a “sociedade aberta” que Karl Popper defendia. Tal como George Soros enfatizou, Popper reconheceu que a nossa sociedade é um sistema complexo e em constante evolução, no qual quanto mais aprendemos, mais o nosso conhecimento muda o comportamento do sistema.

Em nenhum lugar essa intolerância foi maior do que na macroeconomia, onde os modelos predominantes descartaram a possibilidade de uma crise como a que vivemos em 2008. Quando o impossível aconteceu, foi tratado como se fosse uma inundação em 500 anos – um fenómeno insólito que nenhum modelo poderia ter previsto. Ainda hoje, os defensores dessas teorias recusam-se a aceitar que a sua crença nos mercados autorregulados e a sua rejeição de externalidades como inexistentes ou sem importância levaram à desregulamentação que foi essencial para alimentar a crise. A teoria continua a sobreviver, com tentativas ptolomaicas de ajustá-las aos factos, o que atesta a realidade de que as más ideias, uma vez estabelecidas, geralmente têm uma morte lenta.

Se a crise financeira de 2008 não conseguiu fazer-nos perceber que os mercados sem restrições não funcionam, a crise climática certamente deveria conseguir: o neoliberalismo acabará literalmente com a nossa civilização. Mas também está claro que os demagogos que querem que viremos as costas à ciência e à tolerância só pioram as coisas.

O único caminho a seguir, o único para salvar o nosso planeta e a nossa civilização, é um renascimento da história. Temos de revitalizar o Século das Luzes e reafirmar o nosso compromisso de horar os seus valores de liberdade, respeito pelo conhecimento e democracia.

Joseph E. Stiglitz, University Professor at Columbia University.

Racionalidade econômica, Liberalismo e Reformas do Estado Nacional  

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Muito se discute na sociedade brasileira as medidas que estão sendo propostas pelo governo com o intuito de tirar a economia da letargia e iniciar um novo ciclo de crescimento econômico, deixando para trás um período de caos e degradação da estrutura produtiva, marcado pelo incremento do desemprego, redução na renda e no salário agregados e uma piora considerável nos indicadores macroeconômicos, como juros, inflação e investimentos.

Nesta discussão encontramos uma miríade imensa de visões e pensamentos econômicos se alternando com o intuito de defender ou de criticar as medidas e as propostas que embalam o atual governo, muitas opiniões estão baseadas em um achismo que nos parece estrutural, onde os liberais defendem uma redução sistemática do Estado como forma de encontrarmos o crescimento da economia e, de outro lado, os grupos de economistas e pensadores da heterodoxia, ou algo parecido com o pensamento descrito como de esquerda, onde este último detona as medidas e destaca sua ineficiência, um embate infantil e muito mais ideológico e partidário do que científico e racionalizado.

Neste debate marcado por muita desinformação e desconhecimento, encontramos equívocos de ambos os lados, uns acreditando que os grandes e estruturais problemas nacionais não serão resolvidos sem uma participação ativa do Estado Nacional, enquanto de outro lado, encontramos teóricos acreditando que o mercado será o grande condutor da economia, o responsável pelos investimentos e pela condução da sociedade, visões antagônicas baseadas em ideologias e pouco centrada em racionalidade econômica e em experiências práticas, isto porque ambos os modelos não passam de experiências teóricas e experimentais, nenhuma delas existe no mundo real, este sim baseado em grandes organizações que dominam o mercado e controlam os governos nacionais, muitas vezes fragilizando-os e colocando em xeque o sistema democrático.

Os grupos à esquerda querem nos fazer crer, que os desequilíbrios econômicos recentes foram inteiramente gerados pelos governos posteriores, julgam ser os donos da verdade, os grandes defensores da população brasileira mais humilde e terem as formas para melhorar as condições e os indicadores macroeconômicos e os desequilíbrios sociais e políticos, mais Estado e incremento nos investimentos governamentais, sem estas medidas o país tende a chafurdar na lama da degradação econômica.

Depois de um período de forte crescimento econômico e grandes investimentos nos chamados campeões nacionais, a herança deixada por governos descritos como de esquerda são bastante controversos em toda região, crescimento econômico acelerado num primeiro momento com fortes repasses para todos os grupos sociais, gerando um grande contingente de ganhadores, euforia e uma suposta exuberância, numa equação que, claramente, não se sustentaria num período de tempo maior, obrigando os governos a escolhas complexas que impactariam sobre a popularidade, levando muitos governantes a optarem por políticas populistas com repasses financeiros elevados e endividamento num futuro próximo. Os grupos de esquerda brasileiros se esquecem facilmente de que, na crise atual vivida pela sociedade brasileira o DNA esquerdista se faz presente de forma evidente, foram políticas públicas generalizadas para os grupos mais vulneráveis e políticas de isenção fiscal para os mais aquinhoados que levaram o país a esta degradação econômica, nos momentos de abundância os gastos foram excessivos e a prudência, fundamental na gestão pública e na iniciativa privada, foram deixadas de lado, com isso, o endividamento público cresceu e a atividade econômica se degradou, levando o país a uma recessão sem precedentes em décadas recentes, com mais de 28 milhões de trabalhadores desempregados, subempregados e na informalidade, além de uma quebradeira generalizada em empresas privadas, desde micro, pequenas, médias e grandes conglomerados.

De outro lado encontramos governos imbuídos de pensamentos descritos como liberais, defendem firmemente políticas de abertura econômica, menos intervencionismo estatal, privatização e uma forte desregulamentação do sistema produtivo, reduzindo benefícios trabalhistas e estimulando um empreendedorismo que nunca fez parte do ideário social brasileiro, nesta visão o Estado é o grande responsável pelo caos econômico e a suposta esquerda é comparada a um comunismo que nunca se instalou com ênfase da sociedade brasileira, discurso confuso, elitista e altamente ideologizado.

Neste embate poucos estão preocupados com os reais problemas da sociedade brasileira, restringem a discussão a questões apenas de ordem econômica, nos discursos defendem que primeiro precisamos arrumar os indicadores destruídos pelos governos de esquerda e depois vamos criar as bases para um crescimento sólido e consistente, elevando a economia brasileira a um novo patamar com investimentos externos crescentes e Bolsas de Valores batendo recordes de exuberância, enquanto isto o lado real da economia, o lado do emprego e da sobrevivência vai ficando para segundo plano, afinal a prioridade é a economia.

Reduzir o tamanho do Estado é uma necessidade urgente e imediata, olhar para os indicadores de solidez fiscal é fundamental, aumentar a produtividade da economia é condição sine qua non para alcançarmos um melhor patamar nesta economia globalizada, altamente oligopolizada, dominada pelas finanças e centrada em novas tecnologias disruptivas e revolucionárias, onde os menos adaptados tendem a se frustrar em um futuro imediato, sem emprego, sem Estado e sem perspectivas. Neste ambiente de conflitos econômicos e desafios crescentes, os grupos políticos precisam se conscientizar, que todos os países que conseguiram se tornar desenvolvidos e deixar para trás a armadilha da renda média o fizeram com uma forte e consistente parceria entre os governos de plantão e os setores empresariais e de mercado, o desenvolvimento é fruto desta união destes agentes econômicos e produtivos, superar esta dicotomia é urgente e extremamente necessário para retomarmos os rumos que perdemos desde as crises externas dos anos oitenta.

Neste momento estamos tomando contato com reformas importantes para a retomada do crescimento econômico, depois da exitosa Reforma da Previdência, outras medidas urgentes estão entrando na pauta do governo, dentre elas destacamos as reformas Tributária, Administrativa e do Estado Nacional, todas elas essenciais para reencontrarmos o crescimento econômico, sem elas a bancarrota total estará cada dia mais próxima e seus impactos serão mais ameaçadores, com fortes tendências de sublevação social, como estamos visualizando em várias regiões do mundo, desde os vizinhos Chile, Bolívia e Peru, até sociedades consideradas mais desenvolvidas, como Hong Kong e Barcelona.

Reformar o Estado Nacional é um dos maiores desafios dos governos, neste momento o Ministro da Economia, Paulo Guedes, enviou para apreciação dos congressistas, algumas medidas que se forem adotadas tendem a revolucionar os órgão públicas, desde transformações efetivas no funcionalismo público, com flexibilização da estabilidade até redução de salário em momentos de crise econômica, além de medidas concretas para reduzir o número excessivo de municípios no país, muitos deles criados em momentos de euforia financeira, com pouco ou nenhuma sustentação econômica e produtiva, transformando-os em mais espaço para gastos públicos exagerados e poucos resultados efetivos para a população, degradando ainda mais os serviços prestados por este ente federativo.

Muitas destas propostas são vistas como importantes e imprescindíveis para estimular a solidez fiscal do Estado Brasileiro, embora muitas delas sejam vistas como ambiciosas, acreditamos que estas só seriam propostas por governos mais sintonizados com o pensamento da direita, isto porque afetam diretamente grupos políticos fortemente atrelados ao pensamento da esquerda, embora ambiciosas estas medidas são importantes e devem suscitar o debate sobre qual país queremos e imaginamos para um futuro imediato.

Em um ambiente de grandes instabilidades, fazem-se necessário a adoção de inúmeras medidas de impacto, dentre elas, destacamos uma forte reversão de muitas isenções fiscais e tributárias, calculadas em mais de 330 bilhões de reais, que beneficiam grandes grupos organizados que extraem do Estado Nacional altas somas de recursos públicos para suas próprias benesses, levando o governo a fortes desequilíbrios em suas contas, com isso, os serviços públicos se degradam rapidamente e os mais prejudicados são as classes menos favorecidas que mais utilizam os serviços públicos. Mudar esta equação insana não deve ser uma tarefa para um ou outro grupo político, mas para todos aqueles que pensam a sociedade brasileira e vislumbram um futuro mais consistente, com serviços públicos melhores, mais eficientes e contas públicas equilibradas.

Vivemos em um país dual, com realidades contraditórias e crescentes, de um lado estamos discutindo sobre os desafios da Quarta Revolução Industrial, estimulando as start-up, propondo práticas educativas empreendedoras e inovadoras, debatendo sobre desafios dos recursos humanos, da inteligência artificial, da internet das coisas e da qualificação para o século XXI e, ao mesmo tempo, nos encontramos um país marcado por um contingente de 100 milhões de casa sem saneamento básico, onde crianças e jovens crescem com esgoto a céu aberto, sujeito a doenças primárias e alimentação precária, vivemos em duas ou mais sociedade, uma no século atual enquanto outra se rasteja nas trevas da degradação, da marginalidade e na corrupção generalizadas.

As transformações da sociedade mundial estão num ritmo muito acelerado, os governos devem adotar políticas efetivas e atuam mais na regulação, consolidando as instituições e capacitando a mão de obra, fortalecendo as empresas nacionais e investindo recursos em pesquisa, ciência e tecnologia, todas estas ações devem ser concatenadas com a iniciativa privada visando uma melhora na produtividade da economia e uma maior empregabilidade dos trabalhadores nacionais, deixando de lado o Estado gigante, lento e ineficiente, marcado pelo excesso de atribuições econômicas e caracterizado por serviços públicos de péssima qualidade, a economia do século XXI se caracteriza pelo conhecimento e pela inovação, estamos muito atrasados mas temos, internamente, as energias necessárias para nos consolidarmos como um dos eixos deste sistema global de inovações e conhecimento, desde que nos libertemos de uma visão medíocre e patrimonialista que está na raiz da sociedade brasileira. A Reforma do Estado é fundamental e deve ser feita de uma forma efetiva e abrangente, mas não podemos deixar que os esforços destas reformas recaiam apenas sobre os trabalhadores das classes sociais mais aviltadas e degradadas, a reforma deve ser feita e todos os grupos sociais, tantos os mais aquinhoados e a classe média, devem dar seu quinhão de contribuição para a melhoria do Estado e para o desenvolvimento inclusivo e estruturado da sociedade brasileira.